“MP de Bolsonaro contra pandemia é inconstitucional e criminosa”, diz juíza do trabalho


Bolsonaro e Paulo Guedes. (FOTO/ Marcelo Casal Jr/ Agência Brasil).

O governo federal publicou, na noite de quarta-feira 01, uma medida provisória (MP) autorizando empresas a suspenderem contratos ou reduzirem jornadas de trabalho e salários durante a crise provocada pela pandemia de coronavírus. As reduções podem chegar a 70% e tem prazo máximo de 90 dias e contratos poderão ser suspensos por até dois meses.

Para se diferenciar da última medida apresentada, que foi excluída após críticas, o governo incluiu um benefício que os funcionários que tiverem o salário reduzido ou o contrato suspenso poderão receber uma porcentagem do seguro desemprego. Já a negociação dessa suspensão e diminuição de salário, o texto da medida diz que poderá ser diretamente entre a empresa e o empregado, não tendo a necessidade da intervenção dos sindicatos.

Essa medida, no entanto, é inconstitucional. É o que diz a juíza do trabalho do RS e presidente da Associação Juízes para a Democracia, Valdete Souto Severo. A jurista explica que a Constituição Federal é clara quando permite redução de salário apenas em um acordo coletivo, excluindo a negociação entre patrão e empregado, como propôs o governo.

Em um momento em que a gente precisa que as pessoas tenham mínimo de segurança e de renda para enfrentar essa pandemia do covid-19, o que o governo faz é apostar na aprovação dessa medida. Se você considerar que a maioria das pessoas que vivem no Brasil recebem entre 1 e 2 salários mínimos, significa dizer que as pessoas vão passar a receber 200, 300, 400 reais por mês. Ninguém sobrevive com esse valor”, ressaltou a juíza.

Por ser uma MP, o texto passou a vigor assim que foi publicado, tendo 120 dias para o Congresso aprovar ou caducar. No entanto, o projeto pode ser derrubado no STF, mas não será o caso segundo Valdete. ” O problema é que o STF não tem se posicionado desse jeito em relação aos direitos trabalhistas.  Então nós estamos diante de uma questão mais profunda, que é contar com um judiciário que muitas vezes não honra o que diz a Constituição e acaba chancelando medidas que são destrutivas de direitos”, disse a juíza.

Sobre a garantia do governo de permitir que esses trabalhadores tenham acesso a uma porcentagem do seguro desemprego, Valdete não enxerga como algo positivo.

Não é a totalidade e sim um porcentual, o que vai reduzir muito a renda das pessoas. O seguro desemprego é um valor para as pessoas que estão sem trabalho. Seria uma desvirtuação da própria razão. Além disso, temos um outro problema prático: o governo não está pagando o Bolsa Família, está sendo resistente em pagar os R$ 600 aos trabalhadores informais e agora vai colocar mais uma coisa na conta que vai ter que ser processada e alcançada através de mecanismo do Estado que não estão sendo agis. Enquanto isso, os trabalhadores ficarão sem receber seus salários”, explicou.

Outro ponto levantado pela jurista são as consequências dessa medida na economia. Valdete explica que diminuir renda neste momento é tirar dinheiro de circulação e diminuir o consumo, que futuramente será devastador para o país.

Na prática isso significa que o governo vai arrecadar menos e quem produz vai deixar de ter consumidores. Não só agora, porque quando essa crise maior do covid-19 passar e as lojas voltarem a abrir e as empresas voltarem a produzir, as pessoas estarão endividadas, não conseguindo consumir. Então essa proposta que o governo está fazendo é absurda, é perversa e é criminosa na verdade. Vai atingir quem vive do trabalho quanto quem produz”, ressaltou.

E como solucionar essa crise causada pelo coronavírus que atinge o mundo? Valdete acredita que  caminho seja a taxação das grandes fortunas. “O governo precisa injetar dinheiro aos pequenos e médios empresários, a quem realmente emprega. E não empréstimo com juros baixo como foi anunciado. Esse dinheiro deve ser retirado das grandes fortunas. Existe na Constituição a previsão de impostos sobre quem quem ganha muito dinheiro para garantir as possibilidades do Estado social. Então agora seria a hora de colocar em prática essa medida”, defende.

A juíza diz que já existem dois projetos no Congresso que possibilitam que o governo tome essa medida. “As instituições bancárias ganharam bilhões de lucros em 2019 enquanto a classe trabalhadora perdia com as reformas. Então a hora é deles devolverem uma parte desses lucros para essa sociedade nessa crise. É uma medida fácil de ser tomada, inclusive por medida provisória, só falta vontade”, concluiu a jurista.
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Com informações de CartaCapital.

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