O
Centro Acadêmico de História Francisca Fernando Anselmo – CAHFFA/URCA tornou
pública carta aberta endereçada a professora Antânia Otonite de Oliveira
Cortez, professora do Departamento de História da Universidade Regional do Cariri
(URCA) e que está como Secretária de Educação do município de Crato para que
esta se posicione publicamente acerca da emenda a Lei Orgânica que proíbe a
discussão de gênero e sexualidade (sob o nome de disciplina “ideologia de
gênero") na rede pública e particular de ensino.
Para
obter facilmente sua aprovação (o que se verificou na manhã de desta segunda,
23), já que a emenda exige que se tenha 3/5 dos votos dos (as) vereadores (as),
houve uma articulação política entre seus apoiadores para transformá-la em
Projeto de Lei, necessitando, pois, de maioria simples.
O
Projeto é de autoria do vereador Roberto Anastácio, conhecido por Bebeto, com
assento na casa pelo Podemos e foi aprovado por nove parlamentares. Sete foram
contrários (as). Professores (as), alunos (as) e outras pessoas foram, segundo
informações publicadas em grupos de Whatsapp agredidas durante a sessão. Os
agressores gritavam o nome de Bolsonaro e o autor da matéria disse que ela é de
todos aqueles que acreditam em Cristo e ajoelhou-se tão logo houve a aprovação
da emenda.
Votaram
a favor do texto, os vereadores Gilson (PTdoB), Tico da Serrinha (PSC), Nando
Bezerra (PTB), Jales Velloso (PSB), Adil (PSC), Vicência (PMN), Fernando Brasil
(PP), Lunga (PSD), além do Bebeto (Podemos). Contra, estiveram Antonio de Mano
(PPL), Ticiane Guer (PSDB), Guri (PV), Júnior Matos (PDT) e Pedro Lobo e Amadeu
de Freitas, ambos do PT. Pedro Alagoano (PSD) se absteve da votação e Thiago
Esmeraldo (PP) não compareceu.
Abaixo você confere a Carta Aberta
“CARTA ABERTA À PROFESSORA ANTÔNIA OTONITE DE
OLIVEIRA CORTEZ, PROFESSORA DO DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA DA UNIVERSIDADE
REGIONAL DO CARIRI E ATUAL SECRETÁRIA DE EDUCAÇÃO DO MUNICIPIO DE CRATO (CE)
Crato (CE), 23 de Outubro de 2017
Cara professora,
Como a senhora deve saber, hoje, no
dia 23 de Outubro de 2017 foi aprovada, na câmara de vereadores do município de
Crato (CE), a absurda proposta de emenda à lei orgânica nº 1610001, de autoria
do vereador Roberto Anastácio (Podemos), que pretende proibir o ensino de
“ideologia de gênero” nas escolas públicas do município. Durante a votação,
muitos estudantes apanharam e foram desrespeitados pela casa e pelos eleitores
de Jair Bolsonaro.
Em tempos como o que estamos passando
hoje, em que os mais diversos atos de violência e discriminação são legitimados
e em que o exercício da docência está sendo censurado e sucateado, é
inconcebível que um profissional de História, formador de professores, deixe
uma situação como essa passar despercebida. A violência contra mulheres, negros
e LGBTT’s ainda é, no Brasil, um fator alarmante, e precisa ser debatida e
desconstruída em todos os âmbitos que circulam a vida social do ser humano.
A falta/garantia de assistência e de
políticas públicas que amparem a população LGBTT em qualquer instituição da
sociedade é muito forte e o debate sobre gênero é extremamente necessário para
amenizar os índices de violência, bullying e evasão nas escolas. Se a senhora
olhar para os lados, verá, sem dificuldade, o porquê de o Brasil liderar o
ranking dos países que mais matam LGBTTs no mundo. Não muito distante de sua
realidade, poderá ver que, na academia, ainda há um vazio epistemológico
gigantesco, tanto na História como em outras ciências, que reconheça a dimensão
da alteridade, que dê alternativas aos indivíduos marginalizados de exercer sua
liberdade de expressão e que os garanta o direito de ocupar os espaços que
tanto a senhora quanto nós ocupamos, combatendo, sempre, as tentativas
fascistas de associar essas questões a uma roupagem de “ideologia” alienadora.
É de se reconhecer o quanto o curso
de Licenciatura em História da Universidade Regional do Cariri evoluiu.
Estamos, mesmo que aos poucos, conseguindo inserir as questões de gênero e
ensino de história e cultura afro-brasileira e africana na nossa grade curricular,
trazendo conosco problematizações e debates ricos e frutíferos acerca desses
assuntos. Tivemos espaços para essas discussões na Semana de História realizada
em agosto desse ano e receberemos, por exemplo, eventos que discutirão questões
em torno do autoritarismo, cultura política, os direitos humanos e do papel da
História na compreensão do Brasil profundo. E, claramente, estamos esperançosos
que a senhora, como sujeito público e importante na constituição desses
espaços, os aproxime da comunidade.
Por fim, observando o quão absurdos
foram os acontecimentos recentes em torno da questão, esperamos que, como
professora do Departamento de História da Universidade Regional do Cariri e
como Secretária de Educação do Crato, a senhora se pronuncie publicamente sobre
o caso. Infelizmente, na situação atual da sociedade brasileira, nunca a
expressão “quem cala, consente” teve tanta serventia.
Agradecemos a atenção.
Atenciosamente,
Centro Acadêmico de História
Francisca Fernando Anselmo – CAHFFA/URCA”.
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Sob protestos, Câmara de Crato aprova PL que proíbe discussão de gênero e sexualidade nas escolas. (Foto: Reprodução/ Whatsapp). |