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Operação resgata 34 pessoas de condições análogas à escravidão em fazenda de café em MG - Sérgio Carvalho/Inspeção do Trabalho. |
O
Brasil encontrou 2.575 pessoas em situação análoga à de escravo em 2022, maior
número desde os 2.808 trabalhadores de 2013, segundo informações do Ministério
do Trabalho e Emprego. Com isso, o país atinge 60.251 trabalhadores resgatados
desde a criação dos grupos especiais de fiscalização móvel, base do sistema de
combate à escravidão no país, em maio de 1995. Nesses 28 anos, R$ 127 milhões
foram pagos a eles em salários e valores devidos.
Celebra-se,
no próximo sábado (28), o Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo, que
também marca o aniversário da Chacina de Unaí, quando funcionários do
Ministério do Trabalho foram executados durante uma fiscalização rural em 2004.
Ao
todo, foram 462 operações para verificar denúncias em todo o país. Elas não
flagraram o crime apenas em Alagoas, no Amapá e no Amazonas. Minas Gerais foi o
estado com mais operações de combate ao trabalho escravo, com 117 empregadores
fiscalizados e o maior número de resgatados: 1.070. Desde 2013, o estado lidera
em número de flagrados em situação de escravidão contemporânea.
Neste
ano, Minas também ficou com o maior resgate individual de trabalhadores, no
município de Varjão de Minas, com 273 no corte de cana. O recorde histórico
ainda está na mão da usina Pagrisa, em Ulianópolis (PA), com um resgate de 1064
resgatados em 2007.
Goiás
(49) e Bahia (32) vêm logo atrás na quantidade de fiscalizações, mas Goiás
ficou em segundo lugar (271) em número de vítimas, seguido por Piauí (180), Rio
Grande do Sul (156) e São Paulo (146).
Os
2.575 resgatados receberam R$ 8,19 milhões em salários e verbas rescisórias.
Mais de R$ 2,8 milhões foram recuperados para o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço
(FGTS).
As
operações são coordenadas pela Inspeção do Trabalho em parceria com o
Ministério Público do Trabalho, a Polícia Federal, a Polícia Rodoviária
Federal, o Ministério Público Federal e a Defensoria Pública da União, entre
outras instituições. Ou por equipes ligadas às Superintendências Regionais do
Trabalho nos estados, que também contam com o apoio das Polícias Civil, Militar
e Ambiental.
“O
resgate tem por finalidade fazer cessar a violação de direitos, reparar os
danos causados no âmbito da relação de trabalho e promover o devido
encaminhamento das vítimas para serem acolhidas pela assistência social”,
afirmou o auditor fiscal do trabalho Maurício Krepsky, chefe da Divisão de
Fiscalização para Erradicação do Trabalho Escravo (Detrae) do Ministério do
Trabalho e Emprego.
Mais de 80% dos resgatados se declararam
negros
Dos
resgatados, 92% eram homens, 29% tinham entre 30 e 39 anos, 51% residiam no
Nordeste e 58% nasceram na região. Quanto à escolaridade, 23% declararam não
ter completado o 5º ano do ensino fundamental, 20% haviam cursado do 6º ao 9º
ano incompletos e 7% eram analfabetos.
No total, 83% se autodeclararam negros,
15% brancos e 2% indígenas.
Três
indígenas Guarani-Kaiowá de 23, 20 e 14 anos foram resgatados de condições
análogas às de escravo em uma área de produção de eucalipto em Ponta Porã (MS),
em 19 de abril do ano passado, Dia dos Povos Indígenas. Contando com pouca
comida, eles caçavam passarinhos para matar a fome quando foram encontrados.
Os
três estavam alojados em um barraco de lona, usando espumas e colchões velhos
para dormir sobre o chão de terra. Usavam um brejo para tomar banho e uma
cacimba para retirar água a fim de cozinhar e beber. A comida era descontada do
pagamento, o que é ilegal. No momento da fiscalização, havia pouca à
disposição, então os jovens se alimentavam com passarinhos que eles mesmos
caçaram.
Dos
resgatados, 148 eram migrantes de outros países, o que representa o dobro em
relação a 2021, sendo 101 paraguaios, 14 venezuelanos, 25 bolivianos, quatro
haitianos e quatro argentinos.
No
ano passado, 35 crianças e adolescentes foram submetidos ao trabalho análogo ao
de escravo. Desses, dez tinha menos de 16 anos e 25 possuíam entre 16 e 18 anos
no momento do resgate. O cultivo de café foi a atividade em que mais crianças e
adolescentes foram resgatados, com 24% das vítimas.
Mas
escravidão contemporânea também foi flagrada junto a menores de 18 anos em
atividades esportivas, produção florestal, cultivo de arroz, cultivo de
coco-da-baía, criação de bovinos, fabricação de produtos de madeira, produção
de carvão vegetal, cultivo de soja e confecção de roupas.
O
cultivo da cana-de-açúcar foi a atividade com maior número de resgatados em
2022, segundo dados do Ministério do Trabalho e Emprego, com 362 vítimas. Na
sequência, aparece atividades de apoio à agricultura (273), produção de carvão
vegetal (212), cultivo de alho (171), de café (168), de maçã (126), a extração
e britamento de pedras (115), criação de bovinos (110), cultivo de soja (108),
extração de madeira (102) e construção civil (68).
Do
total de resgatados, 87% estavam em atividades rurais.
Trabalhadora resgatada após 72 anos
escravizada pela mesma família
A
Inspeção do Trabalho vem registrando um aumento de casos de trabalho escravo
doméstico nos últimos anos. Em 2022, foram 30 vítimas em 15 unidades da
federação, sendo dez apenas na Bahia.
O
caso mais emblemático foi o de uma mulher de 84 anos resgatada de condições
análogas às de escravo, em março, após 72 anos trabalhando como empregada
doméstica para três gerações de uma mesma família no Rio de Janeiro. Nesse período,
ela cuidou da casa e de seus moradores, todos os dias, sem receber salário,
segundo a fiscalização.
De
acordo com dados do Ministério do Trabalho, essa é a mais longa duração de
exploração de uma pessoa em escravidão contemporânea desde que o Brasil criou o
sistema de fiscalização para enfrentar esse crime.
Quando
a trabalhadora, que é negra, passou a atuar para a família, a Lei Áurea (1888)
tinha apenas 62 anos, o presidente era Eurico Gaspar Dutra e o Rio, a capital
do país.
De
acordo com a fiscalização, seus pais trabalhavam em uma fazenda no interior do
estado que pertencia à família Mattos Maia. Aos 12 anos, ela se mudou para a
residência do casal proprietário para realizar serviços domésticos. Quando
faleceram, migrou para a casa da filha deles, onde manteve suas atividades,
incluindo o cuidado com as crianças.
Ao
ser resgatada, atuava como cuidadora da empregadora, apesar de ambas terem
idade semelhante. Ao todo, serviu três gerações da família, uma vez que, na
residência na Zona Norte da cidade, também reside o neto dos patrões originais.
Os empregadores foram procurados época do resgate, mas não responderam os
pedidos por um posicionamento.
“Em
razão da grande repercussão do resgate da trabalhadora doméstica Madalena
Gordiano no final de 2020 em Patos de Minas, o número de denúncias aumentou”,
afirmou o auditor fiscal Maurício Krepsky.
Chacina de Unaí completa 19 anos sem cumprimento
de pena dos mandantes
O 28
de janeiro foi escolhido como Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo para
marcar o aniversário da Chacina de Unaí, quando os auditores fiscais do
trabalho Erastóstenes de Almeida Gonçalves, João Batista Soares Lage e Nelson
José da Silva e o motorista Ailton Pereira de Oliveira foram executados em uma
fiscalização de rotina no Noroeste de Minas Gerais em 2004.
Os
irmãos Antério e Norberto Mânica, grandes produtores de feijão, foram apontados
como os mandantes do crime pela Polícia Federal. Entre ida e vindas,
julgamentos e anulações, eles foram condenados. Porém, aguardam recursos em
liberdade.
O
inquérito entregue pela Polícia Federal à Justiça sobre a chacina de Unaí
afirmou que a motivação do crime foi o incômodo provocado pelas insistentes
multas impostas pelos auditores à família de fazendeiros, sendo que o
auditor-fiscal do trabalho Nelson José da Silva era o alvo principal. Ele já
havia aplicado cerca de R$ 2 milhões em infrações a fazendas da família Mânica
por descumprimento de leis trabalhistas.
O
motorista Oliveira, mesmo baleado, conseguiu fugir do local com o carro e foi
socorrido. Levado até o Hospital de Base de Brasília, Oliveira não resistiu e
faleceu. Antes de morrer, descreveu uma emboscada: um automóvel teria parado o
carro da equipe e homens fortemente armados teriam descido e fuzilado os
fiscais. Os auditores fiscais morreram na hora.
Trabalho escravo hoje no Brasil
A
Lei Áurea aboliu a escravidão formal em maio de 1888, o que significou que o
Estado brasileiro não mais reconhece que alguém seja dono de outra pessoa.
Persistiram, contudo, situações que transformam pessoas em instrumentos
descartáveis de trabalho, negando a elas sua liberdade e dignidade.
Desde
a década de 1940, o Código Penal Brasileiro prevê a punição a esse crime. A
essas formas dá-se o nome de trabalho escravo contemporâneo, escravidão
contemporânea, condições análogas às de escravo.
De
acordo com o artigo 149 do Código Penal, quatro elementos podem definir
escravidão contemporânea por aqui: trabalho forçado (que envolve cerceamento do
direito de ir e vir), servidão por dívida (um cativeiro atrelado a dívidas,
muitas vezes fraudulentas), condições degradantes (trabalho que nega a
dignidade humana, colocando em risco a saúde e a vida) ou jornada exaustiva
(levar ao trabalhador ao completo esgotamento dado à intensidade da exploração,
também colocando em risco sua saúde e vida).
Como denunciar
Denúncias
de trabalho escravo podem ser feitas de forma sigilosa no Sistema Ipê, sistema
lançado em 2020 pela Secretaria de Inspeção do Trabalho do Ministério do
Trabalho e Emprego em parceria com a Organização Internacional do Trabalho
(OIT). Em 2022, 1.654 foram enviadas pelo sistema. Denúncias também podem ser
feitas através do Ministério Público do Trabalho, unidades da Polícia Federal,
sindicatos de trabalhadores, escritórios da Comissão Pastoral da Terra, entre
outros locais.
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Com informações do Brasil de Fato