E
segue a ofensiva do governo interino de Michel Temer contra o Ministério da
Cultura. Um dia após a reintegração de posse do Palácio Gustavo Capanema, sede
da Funarte no Rio de Janeiro, ocupada desde maio em protesto ao peemedebista,
foram exonerados 81 funcionários da pasta.
Publicado
originalmente no Brasileiros
Ministro
da Cultura dos presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, Juca Ferreira acredita que o governo interino
tenta “destruir” o Ministério da Cultura “por dentro, como cupins” porque não
pôde extingui-lo, como gostaria. Ferreira diz que a defesa da cultura “não é
uma questão de esquerda ou direta, mas de civilização ou barbárie”: “Essa turma não está preparada para conduzir
o Brasil a uma posição de destaque no século 21. Pelo contrário, são
regressivos, reacionários, antipopulares, antidemocráticos e contra a soberania
brasileira”.
Abaixo, os principais trechos da entrevista:
Brasileiros – Na opinião do
senhor, o que está por traz dessas
demissões no Ministério da Cultura?
Juca Ferreira
- Não puderam extinguir o ministério, então agora estão destruindo ele por
dentro. Estão tirando a capacidade do ministério de realizar suas políticas,
programas e ações. A demissão, o grosso dela, foi DS1, DS2 e DS3, pessoal que
ganha em torno de R$ 3 mil reais. Muitos deles estão lá desde a época de Fernando
Henrique, outros desde 2003, 2004, são pessoas que não trabalham política,
muitos não são nem politizados, sei que alguns são até simpatizantes do PSDB e
de outros partidos de oposição. Ou seja, não se trata de desaparelhamento, como
disse o ministro interino, mas é muito mais um processo de desmonte do
ministério. Algumas áreas vão ficar muito afetadas, áreas muito importantes
para a soberania nacional, como a digital. Botaram para fora uma pessoa que é
considerado um dos maiores quadros nessa área digital, a área privada sempre
quis tirá-lo de lá oferecendo o dobro, triplo do salário. Não vou dar nomes,
não quero expor pessoas que eu não sei qual é a posição deles. A Cinemateca vai
ser afetada, que é uma instituição importante de preservação da memória do
cinema brasileiro. A área financeira também, eles depois vão ficar com
dificuldade de fazer o manejo administrativo do ministério e vão inventar
outras desculpas. É um processo de desmonte mesmo.
Por que o governo interino estaria
tentando acabar com o MinC?
O
neoliberalismo não tem um projeto de nação, não tem um projeto de país que seja
complexo. Eles resumem tudo a uma questão de moeda e circulação de mercadoria.
Eles são economicistas, sob o ponto de vista do capital. Não conseguem
compreender o que é uma nação, a complexidade de uma nação, a importância do
desenvolvimento cultural para o Brasil se afirmar no século 21. É uma visão estreita e, no caso brasileiro,
se associa às alianças que o PSDB fez com o que há de mais atrasado no Brasil.
O projeto deles é regressivo, estão atacando a educação. Com esse negócio de
educação sem partido querem que a educação seja desenvolvida sem construção de
consciência critica. Estão atacando a área de comunicações, afetando em outros
aspectos a soberania brasileira diante de uma atividade altamente monopolizada
e globalizada. Em todas as áreas é a mesma postura regressiva e reducionista.
Acabar com a cultura é uma
estratégia de acabar com a possibilidade de resistência ao golpe?
Quanto
mais eles agridem, mais acende a reação. A resistência na cultura hoje tende a
aumentar por essas atitudes arbitrárias e pouco respeitosas do ministro
interino. Se for isso, vai fracassar. Cada dia mais o governo isola uma
dimensão importante do Brasil, que é sua cultura, sua dimensão simbólica.
Qual é a importância da cultura
para o Brasil se afirmar no século 21?
São
muitas. Não há nação que possa abrir mão do desenvolvimento cultural. Eu me
lembro que na época da Margaret Thatcher, onde o neoliberalismo teve seu
período áureo, os teatros públicos funcionavam, os centros culturais públicos
funcionavam, a produção cultural funcionava. Não é uma questão de esquerda ou
direta, mas de civilização ou barbárie. Essa turma não está preparada para
conduzir o Brasil a uma posição de destaque no século 21. Pelo contrário, são
regressivos, reacionários, antipopulares, antidemocráticos e contra a soberania
brasileira.
Qual a opinião do senhor sobre
essas ocupações na Funarte e a recente reintegração de posse no Rio de Janeiro?
Essa
ocupação foi exatamente uma reação à tentativa de extinguir o ministério, as
ocupações em geral tomaram uma posição contra o golpe. Essa reintegração de
posse é a luta do governo com a cultura, ou seja, o conflito continua.
Foi uma vitória da classe artística
conseguir a volta do MinC?
Claro,
foi uma reação do setor artístico e cultural. A equipe do filme brasileiro
Aquarius, que estava representando o Brasil no Festival de Cannes, protestou no
próprio festival. Brasileiros do mundo todo, artistas protestaram. Aqui dentro
artistas escreveram artigos, como Caetano Veloso. Ou seja, a área cultural se
levantou contra essa tentativa de extinguir o MinC. Mas o governo interino
agora está renovando a mesma atitude, mas comendo por dentro, como cupins,
destruindo as estruturas e a capacidade de ação do MinC.
Qual é a capacidade de ação desse
setor artístico para resistir ao golpe?
Estão
fazendo o que podem. Mas a área cultural não sustenta essa luta sozinha. Eu
acho que o impeachment não passa, o golpe não se consolida se houver uma
atitude conjunta da sociedade brasileira.
Juca Ferreira, ministro da cultura dos governo Lula e Dilma, diz que o governo Michel Temer está "destruindo o MiinC por dentro - como cupins". |