A
Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara Federal está discutindo a
redução da maioridade penal e o tema é considerado prioritário pela Bancada da
Bala. A votação da Proposta de Emenda
Constitucional PEC 171/93 foi adiada mas a discussão continua quente no
congresso e também na sociedade civil. Separamos aqui 18 motivos que explicam
porque reduzir a maioridade penal não resolve o problema na segurança pública.
1°. Porque já responsabilizamos
adolescentes em ato infracional
A
partir dos 12 anos, qualquer adolescente é responsabilizado pelo ato cometido
contra a lei. Essa responsabilização, executada por meio de medidas
socioeducativas previstas no ECA, têm o objetivo de ajudá-lo a recomeçar e a prepará-lo para uma vida adulta
de acordo com o socialmente estabelecido. É parte do seu processo de
aprendizagem que ele não volte a repetir o ato infracional.
Por
isso, não devemos confundir impunidade com imputabilidade. A imputabilidade,
segundo o Código Penal, é a capacidade da pessoa entender que o fato é ilícito
e agir de acordo com esse entendimento, fundamentando em sua maturidade
psíquica.
2°. Porque a lei já existe, resta
ser cumprida
O
ECA prevê seis medidas educativas: advertência, obrigação de reparar o dano,
prestação de serviços à comunidade, liberdade assistida, semiliberdade e
internação. Recomenda que a medida seja aplicada de acordo com a capacidade de
cumpri-la, as circunstâncias do fato e a gravidade da infração.
Muitos
adolescentes, que são privados de sua liberdade, não ficam em instituições
preparadas para sua reeducação, reproduzindo o ambiente de uma prisão comum. E
mais: o adolescente pode ficar até 9 anos em medidas socioeducativas, sendo
três anos interno, três em semiliberdade e três em liberdade assistida, com o
Estado acompanhando e ajudando a se reinserir na sociedade.
Não
adianta só endurecer as leis se o próprio Estado não as cumpre!
3°. Porque o índice de reincidência
nas prisões é de 70%
Não
há dados que comprovem que o rebaixamento da idade penal reduz os índices de
criminalidade juvenil. Ao contrário, o ingresso antecipado no falido sistema
penal brasileiro expõe as(os) adolescentes a mecanismos/comportamentos
reprodutores da violência, como o aumento das chances de reincidência, uma vez
que as taxas nas penitenciárias são de 70% enquanto no sistema socioeducativo
estão abaixo de 20%.
A
violência não será solucionada com a culpabilização e punição, mas pela ação da
sociedade e governos nas instâncias psíquicas, sociais, políticas e econômicas
que as reproduzem. Agir punindo e sem se preocupar em discutir quais os reais
motivos que reproduzem e mantém a violência, só gera mais violência.
4°. Porque o sistema prisional
brasileiro não suporta mais pessoas
O
Brasil tem a 4° maior população carcerária do mundo e um sistema prisional
superlotado com 500 mil presos. Só fica atrás em número de presos para os
Estados Unidos (2,2 milhões), China (1,6 milhões) e Rússia (740 mil).
O
sistema penitenciário brasileiro NÃO tem cumprido sua função social de
controle, reinserção e reeducação dos agentes da violência. Ao contrário, tem
demonstrado ser uma “escola do crime”.
Portanto,
nenhum tipo de experiência na cadeia pode contribuir com o processo de
reeducação e reintegração dos jovens na sociedade.
5°. Porque reduzir a maioridade
penal não reduz a violência
Muitos
estudos no campo da criminologia e das ciências sociais têm demonstrado que NÃO
HÁ RELAÇÃO direta de causalidade entre a adoção de soluções punitivas e
repressivas e a diminuição dos índices de violência.
No
sentido contrário, no entanto, se observa que são as políticas e ações de
natureza social que desempenham um papel importante na redução das taxas de
criminalidade.
Dados
do Unicef revelam a experiência mal sucedida dos EUA. O país, que assinou a
Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança, aplicou em seus
adolescentes, penas previstas para os adultos. Os jovens que cumpriram pena em
penitenciárias voltaram a delinquir e de forma mais violenta. O resultado
concreto para a sociedade foi o agravamento da violência.
6°. Porque fixar a maioridade penal
em 18 anos é tendência mundial
Diferentemente
do que alguns jornais, revistas ou veículos de comunicação em geral têm
divulgado, a idade de responsabilidade penal no Brasil não se encontra em
desequilíbrio se comparada à maioria dos países do mundo.
De
uma lista de 54 países analisados, a maioria deles adota a idade de
responsabilidade penal absoluta aos 18 anos de idade, como é o caso brasileiro.
Essa
fixação majoritária decorre das recomendações internacionais que sugerem a
existência de um sistema de justiça especializado para julgar, processar e
responsabilizar autores de delitos abaixo dos 18 anos.
7°. Porque a fase de transição
justifica o tratamento diferenciado
A
Doutrina da Proteção Integral é o que caracteriza o tratamento jurídico
dispensado pelo Direito Brasileiro às crianças e adolescentes, cujos
fundamentos encontram-se no próprio texto constitucional, em documentos e
tratados internacionais e no Estatuto da Criança e do Adolescente.
Tal
doutrina exige que os direitos humanos de crianças e adolescentes sejam
respeitados e garantidos de forma integral e integrada, mediando e
operacionalização de políticas de natureza universal, protetiva e
socioeducativa.
A
definição do adolescente como a pessoa entre 12 e 18 anos incompletos implica a
incidência de um sistema de justiça especializado para responder a infrações
penais quando o autor trata-se de um adolescente.
A
imposição de medidas socioeducativas e não das penas criminais relaciona-se
justamente com a finalidade pedagógica que o sistema deve alcançar, e decorre
do reconhecimento da condição peculiar de desenvolvimento na qual se encontra o
adolescente.
8°. Porque as leis não podem se
pautar na exceção
Até
junho de 2011, o Cadastro Nacional de Adolescentes em Conflito com a Lei
(CNACL), do Conselho Nacional de Justiça, registrou ocorrências de mais de 90
mil adolescentes. Desses, cerca de 30 mil cumprem medidas socioeducativas. O
número, embora seja considerável, corresponde a 0,5% da população jovem do
Brasil, que conta com 21 milhões de meninos e meninas entre 12 e 18 anos.
Sabemos
que os jovens infratores são a minoria, no entanto, é pensando neles que surgem
as propostas de redução da idade penal. Cabe lembrar que a exceção nunca pode
pautar a definição da política criminal e muito menos a adoção de leis, que
devem ser universais e valer para todos.
As
causas da violência e da desigualdade social não se resolverão com a adoção de
leis penais severas. O processo exige que sejam tomadas medidas capazes de
romper com a banalização da violência e seu ciclo. Ações no campo da educação,
por exemplo, demonstram-se positivas na diminuição da vulnerabilidade de
centenas de adolescentes ao crime e à violência.
9°. Porque reduzir a maioridade
penal é tratar o efeito, não a causa
A
constituição brasileira assegura nos artigos 5º e 6º direitos fundamentais como
educação, saúde, moradia, etc. Com muitos desses direitos negados, a
probabilidade do envolvimento com o crime
aumenta, sobretudo entre os jovens.
O
adolescente marginalizado não surge ao acaso. Ele é fruto de um estado de
injustiça social que gera e agrava a pobreza em que sobrevive grande parte da
população.
A
marginalidade torna-se uma prática moldada pelas condições sociais e históricas
em que os homens vivem. O adolescente em conflito com a lei é considerado um
‘sintoma’ social, utilizado como uma forma de eximir a responsabilidade que a
sociedade tem nessa construção.
Reduzir
a maioridade é transferir o problema. Para o Estado é mais fácil prender do que
educar.
10°. Porque educar é melhor e mais
eficiente do que punir
A
educação é fundamental para qualquer indivíduo se tornar um cidadão, mas é
realidade que no Brasil muitos jovens pobres são excluídos deste processo.
Puni-los com o encarceramento é tirar a chance de se tornarem cidadãos
conscientes de direitos e deveres, é assumir a própria incompetência do Estado
em lhes assegurar esse direito básico que é a educação.
As
causas da violência e da desigualdade social não se resolverão com adoção de
leis penais mais severas. O processo exige que sejam tomadas medidas capazes de
romper com a banalização da violência e seu ciclo. Ações no campo da educação,
por exemplo, demonstram-se positivas na diminuição da vulnerabilidade de
centenas de adolescentes ao crime e à violência.
Precisamos
valorizar o jovem, considerá-los como parceiros na caminhada para a construção
de uma sociedade melhor. E não como os vilões que estão colocando toda uma
nação em risco.
11°. Porque reduzir a maioridade
penal isenta o estado do compromisso com a juventude
O
Brasil não aplicou as políticas necessárias para garantir às crianças, aos
adolescentes e jovens o pleno exercício de seus direitos e isso ajudou em muito
a aumentar os índices de criminalidade da juventude.
O
que estamos vendo é uma mudança de um tipo de Estado que deveria garantir
direitos para um tipo de Estado Penal que administra a panela de pressão de uma
sociedade tão desigual. Deve-se mencionar ainda a ineficiência do Estado para
emplacar programas de prevenção da criminalidade e de assistência social
eficazes, junto às comunidades mais pobres, além da deficiência generalizada em
nosso sistema educacional.
12°. Porque os adolescentes são as
maiores vitimas, e não os principais autores da violência
Até
junho de 2011, cerca de 90 mil adolescentes cometeram atos infracionais.
Destes, cerca de 30 mil cumprem medidas socioeducativas. O número, embora
considerável, corresponde a 0,5% da população jovem do Brasil que conta com 21
milhões de meninos e meninas entre 12 e 18 anos.
Os
homicídios de crianças e adolescentes brasileiros cresceram vertiginosamente
nas últimas décadas: 346% entre 1980 e 2010. De 1981 a 2010, mais de 176 mil
foram mortos e só em 2010, o número foi de 8.686 crianças e adolescentes
assassinadas, ou seja, 24 POR DIA!
A
Organização Mundial de Saúde diz que o Brasil ocupa a 4° posição entre 92
países do mundo analisados em pesquisa. Aqui são 13 homicídios para cada 100
mil crianças e adolescentes; de 50 a 150 vezes maior que países como
Inglaterra, Portugal, Espanha, Irlanda, Itália, Egito cujas taxas mal chegam a
0,2 homicídios para a mesma quantidade de crianças e adolescentes.
13°. Porque, na prática, a pec
33/2012 é inviável
A
Proposta de Emenda Constitucional quer alterar os artigos 129 e 228 da
Constituição Federal, acrescentando um paragrafo que prevê a possibilidade de
desconsiderar da inimputabilidade penal de maiores de 16 anos e menores de 18
anos.
E
o que isso quer dizer? Que continuarão sendo julgados nas varas Especializadas
Criminais da Infância e Juventude, mas se o Ministério Publico quiser poderá
pedir para ‘desconsiderar inimputabilidade’, o juiz decidirá se o adolescente
tem capacidade para responder por seus delitos. Seriam necessários laudos psicológicos
e perícia psiquiátrica diante das infrações: crimes hediondos, tráfico de
drogas, tortura e terrorismo ou reincidência na pratica de lesão corporal grave
e roubo qualificado. Os laudos atrasariam os processos e congestionariam a rede
pública de saúde.
A
PEC apenas delega ao juiz a responsabilidade de dizer se o adolescente deve ou
não ser punido como um adulto.
No
Brasil, o gargalo da impunidade está na ineficiência da polícia investigativa e
na lentidão dos julgamentos. Ao contrário do senso comum, muito divulgado pela
mídia, aumentar as penas e para um número cada vez mais abrangente de pessoas
não ajuda em nada a diminuir a criminalidade, pois, muitas vezes, elas não
chegam a ser aplicadas.
14°. Porque reduzir a maioridade
penal não afasta crianças e adolescentes do crime
Se
reduzida a idade penal, estes serão recrutados cada vez mais cedo.
O
problema da marginalidade é causado por uma série de fatores. Vivemos em um
país onde há má gestão de programas sociais/educacionais, escassez das ações de
planejamento familiar, pouca oferta de lazer nas periferias, lentidão de
urbanização de favelas, pouco policiamento comunitário, e assim por diante.
A
redução da maioridade penal não visa a resolver o problema da violência. Apenas
fingir que há “justiça”. Um autoengano coletivo quando, na verdade, é apenas
uma forma de massacrar quem já é massacrado.
Medidas
como essa têm caráter de vingança, não de solução dos graves problemas do
Brasil que são de fundo econômico, social, político. O debate sobre o aumento
das punições a criminosos juvenis envolve um grave problema: a lei do menor
esforço. Esta seduz políticos prontos para oferecer soluções fáceis e rápidas
diante do clamor popular.
Nesse
momento, diante de um crime odioso, é mais fácil mandar quebrar o termômetro do
que falar em enfrentar com seriedade a infecção que gera a febre.
15°. Porque afronta leis
brasileiras e acordos internacionais
Vai
contra a Constituição Federal Brasileira que reconhece prioridade e proteção
especial a crianças e adolescentes. A redução é inconstitucional.
Vai
contra o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE) de princípios
administrativos, políticos e pedagógicos que orientam os programas de medidas
socioeducativas.
Vai
contra a Doutrina da Proteção Integral do Direito Brasileiro que exige que os
direitos humanos de crianças e adolescentes sejam respeitados e garantidos de
forma integral e integrada às políticas de natureza universal, protetiva e
socioeducativa.
Vai
contra parâmetros internacionais de leis especiais para os casos que envolvem
pessoas abaixo dos dezoito anos autoras de infrações penais.
Vai
contra a Convenção sobre os Direitos da Criança e do Adolescente da Organização
das Nações Unidas (ONU) e a Declaração Internacional dos Direitos da Criança
compromissos assinados pelo Brasil.
16°. Porque poder votar não tem a
ver com ser preso com adultos
O
voto aos 16 anos é opcional e não obrigatório, direito adquirido pela
juventude. O voto não é para a vida toda, e caso o adolescente se arrependa ou
se decepcione com sua escolha, ele pode corrigir seu voto nas eleições
seguintes. Ele pode votar aos 16, mas não pode ser votado.
Nesta
idade ele tem maturidade sim para votar, compreender e responsabilizar-se por
um ato infracional.
Em
nosso país qualquer adolescente, a partir dos 12 anos, pode ser
responsabilizado pelo cometimento de um ato contra a lei.
O
tratamento é diferenciado não porque o adolescente não sabe o que está fazendo.
Mas pela sua condição especial de pessoa em desenvolvimento e, neste sentido, o
objetivo da medida socioeducativa não é fazê-lo sofrer pelos erros que cometeu,
e sim prepará-lo para uma vida adulta e ajuda-lo a recomeçar.
17°. Porque o brasil está dentro
dos padrões internacionais
São
minoria os países que definem o adulto como pessoa menor de 18 anos. Das 57
legislações analisadas pela ONU, 17% adotam idade menor do que 18 anos como
critério para a definição legal de adulto.
Alemanha
e Espanha elevaram recentemente para 18 a idade penal e a primeira criou ainda
um sistema especial para julgar os jovens na faixa de 18 a 21 anos.
Tomando
55 países de pesquisa da ONU, na média os jovens representam 11,6% do total de
infratores, enquanto no Brasil está em torno de 10%. Portanto, o país está
dentro dos padrões internacionais e abaixo mesmo do que se deveria esperar. No
Japão, eles representam 42,6% e ainda assim a idade penal no país é de 20 anos.
Se
o Brasil chama a atenção por algum motivo é pela enorme proporção de jovens
vítimas de crimes e não pela de infratores.
18°. Porque importantes órgãos têm
apontado que não é uma boa solução
O
UNICEF expressa sua posição contrária à redução da idade penal, assim como à
qualquer alteração desta natureza. Acredita que ela representa um enorme
retrocesso no atual estágio de defesa, promoção e garantia dos direitos da
criança e do adolescente no Brasil. A Organização dos Estados Americanos (OEA)
comprovou que há mais jovens vítimas da criminalidade do que agentes dela.
O
Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA) defende o
debate ampliado para que o Brasil não conduza mudanças em sua legislação sob o
impacto dos acontecimentos e das emoções. O CRP (Conselho Regional de
Psicologia) lança a campanha Dez Razões da Psicologia contra a Redução da idade
penal CNBB, OAB, Fundação Abrinq lamentam publicamente a redução da maioridade
penal no país.
Mais
de 50 entidades brasileiras aderem ao Movimento 18 Razões para a Não redução da
maioridade penal.