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Escola de samba Paraíso do Tuiutí no Desfile das Campeãs do Carnaval do Rio, na Sapucaí. 18/02/2018. (FOTO/Tânia Rêgo | Agência Brasil). |
O
samba, como expressão cultural do povo negro brasileiro, é marcado em sua
história pelo símbolo de luta, uma característica também presente na festa mais
popular do país: o carnaval. As escolas de samba, com a visibilidade que
adquirem nessa época do ano, muitas vezes usam os holofotes sob a festa para
pautar questões relacionadas aos grupos marginalizados e à política
institucional.
A
escola do grupo especial do Rio de Janeiro, Paraíso do Tuiuti, ganhou destaque
no carnaval passado ao levar para a Sapucaí o enredo sobre os 130 anos da Lei
Áurea, onde questionava se a escravidão está realmente extinta. A escola causou
polêmica ao denunciar o golpe de 2016 colocando na avenida um vampiro com faixa
presidencial, em alusão a Michel Temer, que ocupava o posto da Presidência da
República.
Neste
ano, a vice-campeã traz o samba-enredo O Salvador da Pátria, e no último ensaio
técnico, exibiu na Comissão de Frente homens engravatados representando
políticos, e bailarinas com roupas e perucas na cor mais comentada do ano: a
laranja, representando as recentes polêmicas de candidaturas do PSL, partido de
Jair Bolsonaro.
Também
do Rio de Janeiro, a Estação Primeira de Mangueira vai contar a história de
heróis populares através do samba História pra Ninar Gente Grande, enaltecendo
o legado de pessoas como Luísa Mahin, Dandara e Marielle: “Brasil, meu dengo /
A Mangueira chegou / Com versos que o livro apagou / Desde 1500 tem mais
invasão do que descobrimento / Tem sangue retinto pisado / Atrás do herói
emoldurado / Mulheres, tamoios, mulatos / Eu quero um país que não está no
retrato” canta o enredo.
De
acordo com Tiaraju Pablo, coordenador do Centro de Estudos Periféricos (CEP) e
pesquisador sobre carnaval, os sambas-enredo sempre incomodaram o poder
político exatamente por trazer esse caráter crítico. Em 1969, por exemplo, o
Império Serrano teve seu desfile cerceado por helicópteros por criticar a ditadura
militar na avenida, com o samba Heróis da Liberdade.
Entre
os anos 80 e 90, houve um ápice de enredos com esse caráter através de sátiras,
ou de denúncia das mazelas sociais como fazia a escola São Clemente. Em 1988, a
Unidos de Vila Isabel e a Mangueira questionavam o mito da abolição da
escravatura, e em 1989, a Beija-Flor emplacou o samba Ratos e Urubus Larguem
Minha Fantasia, conquistando o segundo lugar, atrás da Imperatriz Leopoldinense
com Liberdade, Liberdade.
Para
o especialista, as escolas de samba retornam a essa vocação crítica a partir de
2016. A Imperatriz Leopoldinense, por exemplo, foi perseguida em 2017 pelo
agronegócio por tratar dos povos do Xingu em seu desfile. “Jardim sagrado, o
caraíba descobriu / Sangra o coração do meu Brasil / O belo monstro rouba as
terras dos seus filhos / Devora as matas e seca os rios / Tanta riqueza que a
cobiça destruiu!” diz o samba Xingu, o Clamor Que Vem da Floresta.
O
samba sempre foi negro, e colocar em pauta as africanidades é um papel que as
escolas desempenham desde sempre. Isso acontece, principalmente, nas escolas
que possuem uma raiz ainda mais popular como a Nenê de Vila Matilde, Camisa
Verde e Branco e Unidos do Peruche, que esse ano traz o samba Nascem do Ventre
Africano, Os Valores do Mundo. África, um Passado Presente no Futuro da
Humanidade. Segundo a historiografia, o primeiro tema afro foi o do Salgueiro,
no carnaval de 1960, falando de Zumbi dos Palmares. Mas, em 1956, a Nenê de
Vila Matilde já havia levado o enredo Casa Grande Senzala, como explica
Tiaraju.
Ele
acredita que, atualmente, os enredos sobre negritude e africanidades estão em
alta por três motivos: os setores progressistas da sociedade passaram a notar o
potencial crítico das escolas, o debate racial está em um nível avançado e
existem críticas de setores conservadores da sociedade sobre as religiões de
matriz africana. “Quando as escolas de samba e as religiões afrobrasileiras
estavam sob ataque, por volta de 2016, perceberam que só sobreviveriam se
incorporassem essa vertente crítica. Elas foram para o ataque.”
Para
o pesquisador, as escolas de samba se tornam ainda mais importantes quando
retratam o país de forma crítica. “O carnaval é irreverente, crítico e um
momento de denúncia. As escolas de samba são uma síntese do Brasil, e são
capazes de retratar sensações e passar uma mensagem de maneira épica e através
de um cortejo. Quando ela se reencontra com esse Brasil profundo e consegue
levar isso para a avenida, é quando a escola de samba cumpre ao máximo seu
papel.”
Esse
ano, a Vai-Vai, Unidos do Peruche, Mancha Verde, Pérola Negra, Paraíso do
Tuiuti e Mangueira são algumas das escolas colocam no Sambódromo do Anhembi e
na Marquês de Sapucaí a cultura afrobrasileira e as denúncias das mazelas da
política nacional. (Com informações do Brasil de Fato).
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