(FOTO/Fábio Rodrigues Pozzebom). |
Um
erro comum na análise política é interpretar as vitórias eleitorais como sinal
da superioridade dos mais votados e da inferioridade dos derrotados. Os
ganhadores seriam “melhores” porque souberam “se dar bem”.
O
tempo passa e, muitas vezes, chega-se ao oposto. Quem ganhou se apequena e o
derrotado fica maior. Ri melhor quem ri mais tarde.
Mais
de 70 dias depois da posse, Bolsonaro está menor, antes sequer de que o
desgaste inevitável do governo produza efeitos. Não tem sido necessário
aguardar para que a realidade frustre as expectativas da população.
Em
seu caso, essa tendência à entropia é acelerada e agravada pelo discurso de
campanha. Tomando emprestada a ficção, disseminada nas elites e nas classes
médias, de que todos os problemas nacionais são “culpa do PT”, Bolsonaro dispensou-se de fazer qualquer diagnóstico
sério e adotou o antipetismo como bandeira fundamental. De própria, apenas uma
ideia: “Matar bandido”.
Se
os problemas brasileiros se resumiam a um só, a solução era simples e
produziria resultados imediatos. Removido o PT, tudo estaria resolvido, ou, no
mínimo, encaminhado, em questão de meses. Como é evidente, isso não aconteceu e
não vai ocorrer em qualquer prazo razoável, muito menos no prometido.
Mudança foi apenas um solavanco
Quem
saudou a vitória de Bolsonaro como demonstração de competência e sagacidade
política talvez admita o equívoco. É bem possível que, em horizonte não muito
distante, todos venhamos a perceber que, ao contrário de inaugurar uma “nova era”, ela não foi mais que um
solavanco, uma espécie de mal súbito que acometeu um pedaço de nossa sociedade,
do qual está se recuperando mais cedo do que o previsto.
Fez
parte da supervalorização do resultado a imagem de um tsunami que teria varrido
a política brasileira, com a vitória do capitão e o séquito de bizarrices que
com ele foi para o Congresso Nacional. Ainda hoje, especialmente na mídia
internacional, há quem insista nessa lenda. Alguma aritmética ajuda, contudo, a
ver que a noção de maremoto é descabida.
Não
há dúvida de que são muitos os 10 milhões de votos que Bolsonaro obteve a mais
que Fernando Haddad no segundo turno, mas, nas eleições presidenciais dos
últimos 25 anos, só superam a vantagem que Dilma Rousseff conseguiu em relação
a Aécio Neves em 2104. Fernando Henrique, em 1994 e 1998, Lula, em 2002 e 2006
(quando estabeleceu o recorde ao bater Geraldo Alckmin com 21,2 milhões de
votos de frente) e Dilma em 2010, todos venceram com margens mais dilatadas que
o capitão.
Seu
partido de aluguel, o PSL, beneficiou-se do ambiente que o elegeu, mas com
resultados que não chegaram a significar nenhuma inundação. Recebeu 11,4
milhões de votos para a Câmara dos Deputados, o que representa 7,7% do
eleitorado brasileiro. É um número expressivo, embora queira também dizer que
mais de 92% dos eleitores preferiram outras opções.
Qual o tamanho de Bolsonaro?
É
cedo para estimar o tamanho da base social de que Bolsonaro dispõe atualmente.
Por enquanto, os números de sua popularidade não querem dizer quase nada, como
diziam pouco os de seus antecessores em momento semelhante. A rigor, ele está
abaixo de todos no início de seus primeiros mandatos, o que é compreensível,
considerando-se sua patética biografia.
O
que temos para calculá-la é a evolução das intenções de voto na eleição
passada, que mostra que, até agosto, Bolsonaro mal atingia 20% no conjunto das
pesquisas. Em outras palavras, a dois meses do pleito, só havia conseguido
atrair um em cada cinco eleitores. Até o primeiro turno, cresceu mais 15 pontos
percentuais, incorporando eleitores que demoraram a aceitá-lo, muitos
ludibriados por mentiras disseminadas a preço de ouro pela internet.
Analisando
os resultados finais com base nas pesquisas de intenção de voto, é possível
dizer que cerca de 60% da votação de Bolsonaro saiu do antipetismo, mas que
apenas um em cada quatro de seus votos veio de eleitores fortemente
antipetistas. Mais de 75% daqueles que o escolheram podiam até não gostar do
PT, mas afirmavam não ser adversários ideológicos ou militantes contra o
partido.
No
governo, ele e sua turma parecem achar que todo o Brasil pensa igual a eles.
Dirigem-se ao conjunto da sociedade com um discurso sintonizado com o
sentimento de, no máximo, 10% do País, proporção parecida à daqueles que foram
buscar no PSL o candidato a deputado. A hidrofobia ao PT existe, mas é muito
menor do que supõem.
Ao
cabo de uma eleição, é costume recomendar aos derrotados que aprendam com o
insucesso. Mas, às vezes, quem mais precisa desse conselho é o vitorioso. Saber
ganhar pode ser mais difícil. Especialmente para uma turma como a de Bolsonaro,
a pior que já tivemos no governo em nossa história. (Por Marcos Coimbra, na
CartaCapital).
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