Definida
a votação em que a Câmara salvou o presidente Michel Temer de uma denúncia por
formação de quadrilha e obstrução da Justiça, o deputado Carlos Marun (PMDB-MS)
não conseguiu esconder sua alegria na noite de quarta-feira 25. Em frente a
jornalistas, dançou e cantou. "Tudo
está no seu lugar. Graças a Deus, graças a Deus. Surramos mais uma vez essa
oposição, que não consegue nenhuma ganhar". A música, com sua rima
improvisada, foi flagrada pela Folha de S.Paulo.
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Marun na CPI da JBS: essencial para o governo no Congresso. (Foto: Alex Ferreira/ Câmara). |
A
alegria de Marun não é de se espantar. O deputado, atualmente vice-líder do
PMDB na Câmara, é um dos mais ferrenhos defensores de Temer e esteve em
posições estratégicas. Foi vice-líder do governo e também presidente da
comissão especial de reforma da Previdência, onde se discutiu um dos carros-chefe
do Planalto no Legislativo.
Após
a votação de quarta-feira, Marun foi o porta-voz da linha-dura que o governo
deve adotar com quem votou contra Temer. "Os deputados que votaram contra
o presidente devem ser excluídos da base e serem tratados como oposição. Não
devem ser nem recebidos pelos ministros", afirmou.
A
postura de escudeiro não é estranha a Marun. Só que antes de proteger Temer,
quem estava na posição de soberano era Eduardo Cunha. Ao longo de 2015, quando
o então presidente da Câmara, hoje preso, atuou para inviabilizar o mandato de
Dilma Rousseff, Marun esteve ao seu lado. Defendeu o desembarque do PMDB do
governo, o impeachment e participou de manifestações de rua contra a petista em
Campo Grande, capital de seu estado. No ocaso de Cunha, alvo de pedido cassação
por mentir à Câmara, Marun não o abandonou. No Conselho de Ética, trabalhou
para anistiar o colega e, na sessão que culminou com o expurgo de Cunha, foi um
dos nove deputados que votou contra a cassação, sendo o único a defender o
correligionário em plenário.
A
prisão de Cunha afastou os dois. Na véspera do Natal de 2016, o deputado
sul-mato-grossense usou verba da Câmara para visitar o colega cassado no
Paraná, onde está preso por ordem de Sérgio Moro. Após a revelação do
escândalo, Marun prometeu devolver os 1,2 mil reais que usou na visita
natalina.
Com
a saída de Cunha de cena, Marun se tornou automaticamente um defensor do
governo e de Temer. Hoje, o deputado é relator de um colegiado que o governo
observa com atenção, a CPI da JBS. O fato de Marun ter recebido, nas eleições
de 2014, 103 mil reais em doações do frigorífico (50 mil por intermédio da
senadora Simone Tebet e 53 mil via Nelson Trad Filho, ex-prefeito de Campo
Grande), não foi empecilho para ele obter a posição. A CPI da JBS é vista nos
bastidores como foro ideal para que a delação de Joesley Batista e outros
executivos da gigante fabricante de proteínas seja anulada. Seria um alívio
para Temer e Cunha.
Na
denúncia que foi barrada na quarta-feira 25 pela Câmara, Temer era o
protagonista, mas Cunha tinha um papel relevante. Segundo o ex-procurador-geral
da República Rodrigo Janot, Temer lidera uma organização criminosa formada
pelos ministros Eliseu Padilha (Casa Civil) e Moreira Franco
(Secretaria-Geral), além de Cunha e dos também ex-deputados Geddel Vieira Lima
(BA) e Henrique Alves (AL), ambos também presos.
Das
investigações da Polícia Federal e do Ministério Público Federal, depreende-se
que Cunha e Temer eram (são?) aliados e tinham em seu entorno uma série de
deputados escudeiros, que em troca receberiam ajuda antes, durante e depois das
eleições. Temer e Cunha tinham hierarquia semelhante no grupo, escreveu a PF em
um relatório, mas o presidente tinha "a
função de conferir oficialidade aos atos que viabilizam as tratativas acertadas
por Eduardo Cunha, dando aparente legalidade e legitimidade em atos que
interessam ao grupo."
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Marun e Cunha: aliado até o fim. (Foto: J. Batista/ Câmara). |
A
conclusão dos investigadores vai ao encontro de acusações feitas abertamente
por alguns políticos, como o ex-ministro Ciro Gomes, segundo quem a aliança
teria uma natureza ilegal. "Na verdade, Temer é o homem do Cunha, e não o
inverso. Parte importante das loucuras que faz é por estar completamente
comprometido", disse Ciro ainda em dezembro de 2015 a CartaCapital.
Contra
Marun, nada pesa nas investigações da Lava Jato. O deputado tem, entretanto,
seu próprios rolos. Nascido em Porto Alegre, Marun fez sua carreira política no
Mato Grosso do Sul. Foi vereador de Campo Grande e deputado estadual. Depois,
foi secretário estadual de Habitação e presidente da Agência de Habitação Popular
de Mato Grosso do Sul (Agehab), cargos que exerceu no mandato do governador
André Puccinelli, que hoje usa uma tornozeleira eletrônica por ser investigado
por fraudes em licitações e desvios de dinheiro público.
Por
conta de sua atuação no último cargo, Marun é alvo de um processo por
improbidade administrativa. Desde 2013, é acusado de beneficiar a DigithoBrasil
Soluções em Software Ltda, que prestava serviços à Agehab, em contratos de 16,6
milhões de reais. "Estou me defendendo, e tenho certeza de que o processo
resultará na minha absolvição”, afirmou Marun recentemente ao jornal O Estado
de S.Paulo. A empresa também alega inocência.
O
fato de ambos, deputado e empresa, serem acusados de desvio de dinheiro público
não provoca constrangimento. Nas eleições de 2014, a DigithoBrasil foi a
principal financiadora da campanha de Marun – bancou 300 mil reais do 1,6
milhão de reais arrecadados.
Outras
empresas com problemas judiciais também doaram ao escudeiro de Cunha e Temer. A
H2L Equipamentos, cujo dono, Rodolfo Pinheiro Holsback, foi investigado na
Operação Lama Asfáltica, investiu 145 mil reais no deputado; a Guizardi Júnior
Construtora, cujo dono, Giovani Guizardi, é réu e delator da Operação Rêmora,
banco outros 20 mil reais. (Com informações de CartaCapital).
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