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Lélia Gonzales. (FOTO/ Reprodução). |
Lélia González tem uma atuação ampla e é
considerada um dos maiores nomes do movimento negro e de mulheres negras, não
só no Brasil, mas no mundo. Além de ser historiadora, antropóloga e filósofa
sua atuação percorreu partidos políticos e o Movimento Negro Unificado (MNU),
movimento em que auxiliou na fundação.
Vim por meio dessa nota, compartilhar a
leitura com vocês. São textos magníficos, onde Lélia González nos instiga a
pensar como o mito da democracia racial vai agir de
forma específica em relação às mulheres negras e como a africanização do Brasil
está presente no nosso cotidiano, mesmo que o racismo queira apaga-lo a todo
custo. São inúmeros os motivos que me faz vos instigar a ler os escritos das
mulheres negras e indígenas desse país. Nisso, pensei na proposta desse breve
resumo para instigar-lhes a essa imersão.
Um pouco sobre os textos:
O racismo é apontado como o
elemento que constitui e caracteriza a sociedade brasileira e quando se junta
ao sexismo, se torna um duplo fator que violenta de forma particular as
mulheres negras. González traz para a discussão a importância de pensarmos as
mulheres negras para além das paredes socioeconômicas que nos atravessam e
impõe ao debate outras categorias, que seria a noção de mulata, doméstica e
mãe preta.
Essas classificações citadas
anteriormente (mulata, doméstica e mãe preta) são fundamentais para a
compreensão do texto e a referida autora utilizará o exemplo do carnaval para
exemplificar o mito da democracia racial e o seu simbolismo nessa época de
festejo. Seria esse o período onde a mulher negra (mulata) vai sair do seu anonimato para ser o centro das atenções
nos desfiles das escolas de samba. O carnaval se configura nesse evento, em que
o sujeito negro sai das matérias policiais, para aparecer nas capas de
revistas, é quando o mundo vai voltar seus olhos para a negritude que deixa de
ser marginal para se tornar o símbolo. Nesse caso, se caracteriza o único
momento onde o branco “aceitaria o protagonismo” que se dá a partir da imagem
da “mulata” que representará para o
mundo a fora, a “harmonia brasileira entre as raças”.
O mito da democracia racial vai agir diferente em relação a mulher
negra, porque para além do “endeusamento” que o carnaval vai impor a “mulata”, tem o outro lado que também irá
compor essa mulher perante a sociedade, que será quando a mesma se transfigura
na doméstica. No caso, os dois conceitos (mulata-doméstica)
fazem parte da mesma mulher negra e a forma com que ela será vista vai depender
da situação que estarão postas. Chegando nas “mucamas”, que seria a mulher
negra que por muitas vezes foi a ama de leite, quem criou os filhos das
mulheres brancas e que era obrigada a satisfazer o senhor de engenho, chegamos também
à "mãe preta”, que seria aquela que cuidou, deu banho e ensinou a falar.
A mãe preta seria aquela mulher que cumpriu a função materna no
lugar da mulher branca e com essa função, a mesma passaria os valores que tinha
para a criança tida como “brasileira” que irá praticar o pretuguês, que havia aprendido com ela. O pretuguês, segundo González (1983) seria uma marca da africanização
do Brasil, principalmente, no que diz respeito às trocas das letras “L” por “R”
em algumas palavras, exemplo: framengo,
pois no idioma africano não existiria a pronúncia da letra “L”. Isso foi um dos
porquês que Gonzalez procurou amadurecer mais o que estava pensando e que logo
viraria conceito, que seriam as categorias “amefricanos”
e améfrica ladina.
González vai revelar que por conta de marcas iguais às citadas
anteriormente (sobre a linguagem, marca da africanização) era preciso uma elaboração
de um novo conceito que pensasse a América como um todo, pois quando se falava
em “americano” automaticamente as pessoas associavam aos Estados Unidos. Então
o que seríamos nós, pessoas localizadas nos outros lugares da América central,
insular, sul, norte?
Então nos explica que o fato dos Estados Unidos ser imperialista
fazia com que as pessoas dos outros países das regiões já citadas ficassem
passivas politicamente e ideologicamente. Por isso a urgência de refletirmos
sobre amefricanidade. O termo
“afro-americano” também vai parecer que só existem negros nos Estados Unidos e
mais uma vez González (2019) destaca a importância de usarmos o conceito “amefricanos” para categorizar a todes
nós, pois seria um termo mais democrático e não ficaria limitado a questões
territoriais, linguísticas e ideológicas.
E ai, gostaram do que leram? Deixo aqui as referências para que se
aprofundem mais nas intelectuais tão necessárias para as ciências humanas e
sociais desse país. A relevância de compreendermos conceitos cunhados por
mulheres negras faz com que nós enquanto humanidade reconhecêssemos a potência
que está nos nossos saberes. Quem como eu, escreve como quem denuncia o
mundo?
Referências
GONZALEZ, Lélia. A Categoria Político-Cultural da Amefricanidade.
In: Pensamento Feminista –Conceitos Fundamentais. BUARQUE DE HOLLANDA, Heloisa
(org.). Rio de Janeiro: Bazar do Tempo, 2019, pp. 340-352.
GONZALEZ, Lélia. Racismo e Sexismo na Cultura Brasileira. In: SILVA, Luiz Antônio Machado et alii. Movimentos sociais urbanos, minorias étnicas e outros estudos. Brasília, ANPOCS, p.223-44, 1983.
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