![]() |
Santa Teresa D'Ávila, padroeira de Altaneira. (Foto/Imagem capturada por João Alves durante a procissão ocorrida no último dia 15 no encerramento dos festejos dedicado a santa). |
Das
obras de Santa Teresa d'Ávila, a grande doutora da Igreja, cujo aniversário de
nascimento foi comemorado no dia 28 de março, o "Caminho de
Perfeição" é que mais pode auxiliar de forma prática aqueles que querem
iniciar a vida de oração.
A
bibliografia de Teresa tem início com o "Livro da Vida", um registro
autobiográfico, em que a santa revela os fenômenos místicos com que foi
agraciada por Deus. Esta obra foi censurada pela Inquisição Espanhola, que não
desejava que as carmelitas tivessem acesso a tais informações. Portanto, o
"Caminho de Perfeição" era o primeiro escrito de Teresa que as monjas
liam.
Tomando
por base os estudos históricos e a sua própria autobiografia, sabemos que
Teresa d'Ávila nasceu em uma família de origem judaica que, porém, fazia
questão de esconder sua conversão ao catolicismo. Seus pais eram virtuosos e
sua mãe faleceu logo cedo.
Recebeu
uma boa educação religiosa. Quando era criança, sua brincadeira favorita era
brincar de "fundar mosteiros", o que é quase profético, porque é o
que ela fará quando adulta.
Ela
gostava também de meditar sobre a vida eterna, com seu irmão Rodrigo. A ideia
da eternidade entusiasmou de tal forma as duas crianças que elas decidiram
fugir de Ávila e entregar-se aos mouros para serem degolados como mártires.
Chegaram, porém, tão somente ao portão da cidade, onde foram encontrados pelo
tio e levados de volta à casa paterna. Esse episódio mostra que ela teve uma
infância acalentada por ideais religiosos.
Teresa,
no entanto, adquiriu de sua mãe o mau hábito de ler livros de romance. Com
isso, ficou vaidosa e acabou se envolvendo em namoricos com um primo. Quando o
pai descobriu, não titubeou, colocou-a num convento de agostinianas, o que lhe
serviu de correção.
No
convento, conheceu uma monja que, instigando-a à récita do Santo Terço, lhe
ensinou a rezar novamente e fez renascer nela o ardor perdido na adolescência,
a ponto de Teresa considerar a possibilidade de entrar na vida religiosa.
Todavia,
a santa tinha uma certa aversão à ideia de ir definitivamente para o convento e
ainda desejava casar-se. Decidiu-se pela vida religiosa quando raciocinou que
seu desejo maior era ir para o céu e que o melhor modo de isso ocorrer era se
tornando monja.
No
entanto, seu pai queria que ela cuidasse da casa e dos irmãos menores, pois a
sua mãe havia falecido. Assim, Teresa passou dois anos obedecendo ao pai, mas,
quando percebeu que ele não lhe daria a permissão, fugiu e, com 20 anos de
idade, entrou no Convento das Irmãs Carmelitas da Encarnação de Ávila, o famoso
Mosteiro da Encarnação.
A
Ordem Carmelita evidentemente ainda não tinha sido reformada, pois quem faria a
reforma seria a própria Teresa de Jesus. Naquele mosteiro viviam cerca de duzentas
monjas, as quais levavam uma vida muito pouco exemplar. Tendo que providenciar
sua própria alimentação, as irmãs oriundas das classes mais inferiores tinham
que pedir esmolas para não passar fome, enquanto as monjas mais abastadas
gozavam das próprias rendas. Havia também um grande movimento de pessoas no
convento, que iam para o lugar somente para conversar com as religiosas. Tudo
isso fazia com que se levasse uma vida muito pouco piedosa.
Teresa
entrou nesse convento e logo adoeceu. Essa doença desconhecida foi o seu
caminho de salvação. O pai, vendo que ela não melhorava, tomou as rédeas da
situação e decidiu levá-la para um tratamento com uma "curandeira"
numa outra localidade. No caminho, o seu tio deu-lhe o livro "O Terceiro
Abecedário Espiritual", do Frei Francisco de Osuna, a partir do qual
Teresa começou a orar.
O
tratamento não deu certo e ela continuou doente. Decidiu voltar para o convento
e lá piorou tanto que sofreu um paroxismo, passando dois ou três dias em coma.
Chegaram inclusive a abrir uma cova para ela. O pai, porém, não permitiu que
ela fosse enterrada. De fato, Teresa saiu do coma e, dias depois, as irmãs a
surpreenderam engatinhando no chão do quarto e louvando a Deus.
Após
uma longa e difícil recuperação, Teresa abandonou a vida de oração. Nesse mesmo
tempo, o seu virtuoso pai, ao contrário, passou a praticar com intensidade a
oração. Gostava de conversar com a filha sobre a vida espiritual e ela não
tinha coragem de lhe contar que já não praticava a sua oração íntima e pessoal,
rezando somente a oração com o coro.
Após
a morte do pai, Teresa voltou decididamente à oração. Tinha o que chamava de
"determinada determinación" [1]. Em uma época na qual as mulheres
eram tidas como fracas, como o sexo frágil, ela, ao contrário, sempre foi uma
mulher muito forte e decidida.
Um
belo dia, rezava diante de uma imagem de Jesus sofredor, coroado de espinhos,
flagelado e com as mãos atadas e perguntou-Lhe por que Ele sofria tanto. Ao que
Ele respondeu - num dom místico extraordinário - que sofria por causa das
conversas vãs travadas por ela no parlatório. A partir daí, Teresa se
converteu. Estava com 40 anos de idade quando iniciou a sua vida mística.
Após
muitas dificuldades, Teresa recebeu licença para fundar um carmelo pequeno,
pobre e que recebeu o nome de Carmelo São José de Ávila. Ali nasce o movimento
de reforma que receberá o nome de Carmelitas Descalças. Saiu do Convento da
Encarnação acompanhada de quatro monjas. Com a chegada de mais oito monjas,
fixou-se em treze o número de religiosas do carmelo descalço.
Naquela
época, Santa Teresa estava na Sextas Moradas, ou seja, já estava na fase da
vida plenamente mística. As monjas viam que a Madre Priora tinha dons místicos
e pediram que ela as ensinasse a rezar. Foi assim que Teresa escreveu o
"Caminho de Perfeição".
Os
fenômenos místicos por ela vivenciados já haviam sido relatados no "Livro
da Vida", escrito para os confessores, para os homens letrados e
espirituais da época. Ela viveu tempos terríveis, sem saber se aquelas
manifestações místicas provinham de Deus ou de outras fontes. Isso se explica
porque naquela época era grande a profusão de alumbrados, de mulheres
pseudo-místicas e de farsantes. Os próprios confessores, muitos deles, não
criam nos fenômenos místicos e aconselhavam Teresa a evitar essas coisas.
Até
que Jesus apareceu e dirimiu de vez as suas dúvidas. Ela foi também consolada
por alguns confessores jesuítas e sobretudo por alguns homens santos, como São
Francisco Borja e São Pedro de Alcântara, o qual foi essencial para que ela
compreendesse que tudo aquilo era um dom de Deus.
O
"Livro da Vida" havia sido censurado pela Inquisição, como já foi
dito, pois o Santo Ofício não queria que as monjas tivessem conhecimento dos
fenômenos místicos da Santa Madre, para não incentivá-las. Assim, o primeiro
manuscrito do "Caminho de Perfeição" foi escrito para as primeiras
doze monjas do Carmelo de São José, num estilo muito tranquilo, bonito,
familiar e desenvolto, porque ela tinha certeza de que não sairia dali. Ela
chamava o "Livro da Vida" de "o livro" e o "Caminho de
Perfeição" de "livrinho".
O
Carmelo de São José "floresceu" em novas fundações. E Santa Teresa,
prudente que era, entregou o livrinho para um frei dominicano seu amigo e que
também era inquisidor. Ele censurou e melhorou o livro, de modo que Santa Teresa
o reescreveu. Embora haja duas versões do livro, a mais comum é a chamada
"oficial", pois foi revisada e reescrita pela própria santa.
O
livro pode ser dividido, grosso modo, em três partes. Nos capítulos 1 e 3, a
santa dá a identidade das carmelitas, a finalidade do Carmelo São José. Depois
ela fala sobre as virtudes necessárias para viver a vida de oração e,
finalmente, a vida de oração propriamente dita, onde ela, mui livremente,
comenta o Pai Nosso.
Como
provocação, para que todos queiram ler, selecionamos alguns trechos que darão a
tonalidade daquilo que a Santa Madre quer fazer quando aponta esse caminho de
perfeição:
Nesta
ocasião, tive notícias dos prejuízos e estragos que faziam os luteranos na
França, e o quanto ia crescendo esta desventurada seita.
Deu-me grande aflição e, como se pudesse ou valesse alguma coisa, chorava com o Senhor, suplicando-lhe para remediar tanto mal. Parecia-me que mil vidas daria eu para salvação de uma só alma das muitas que ali se perdiam. [2]
Santa
Teresa vive num tempo de tumulto para a Igreja, como os atuais. Em sua época
não havia protestantismo e, de repente, ela recebe a notícia de que países
inteiros estavam deixando a Igreja Católica.
Concomitantemente,
outros fatos ocorriam e a deixavam perplexa, principalmente a descoberta da
América, um continente todo para ser evangelizado e a necessidade de se chegar
primeiro que os protestantes. O que Teresa faz para ajudar a Igreja? Diante da
situação do mundo, ela num carmelo paupérrimo, vivendo de esmolas e preocupada
com o futuro da Igreja, diz:
Sendo mulher e ruim, senti-me incapaz de trabalhar como desejava para a glória de Deus. Tendo o Senhor tantos inimigos e tão poucos amigos, toda a minha ânsia era, e ainda é, que ao menos estes fossem bons. [3]
Ela
sabia que nada podia e nada valia diante da situação do mundo. E tinha noção do
que significava a "vida eterna", por isso pensava na salvação das
almas.
Determinei-me então a fazer este pouquinho a meu alcance, que é seguir os conselhos evangélicos com toda a perfeição possível e procurar que estas poucas irmãs aqui enclausuradas fizessem o mesmo. [4]
Teresa
chegou à conclusão que para salvar a Igreja deveria ser santa, seguindo os
conselhos evangélicos (pobreza, obediência e castidade) com toda a perfeição
possível.
Mas achei necessário fazer como em tempo de guerra, quando o inimigo invade uma região. O soberano, em apuros, se recolhe a uma cidade, que fortifica muito bem. Dali sai para atacar os adversários. Os da cidadela são gente tão escolhida que podem mais, eles sozinhos, que muitos soldados, se estes são covardes. Desta maneira muitas vezes conseguem a vitória. Se não ganham, ao menos não são vencidos, porque, não havendo traidores, ninguém os sujeita, a não ser pela fome. Em nosso caso não há fome que nos obrigue a nos render. A morrer sim, não a cair vencidas. [5]
Ela
compara as carmelitas a guerreiras, soldados defendendo um castelo. Teresa tem
certeza de que sua oração é apostólica, move o mundo. E ela pode sustentar os
grandes homens da época na defesa da fé.
Já
que de nada valemos - nem pra um, nem pra outro - na defesa do nosso Rei,
procuremos ser tais que nossas orações possam ajudar a esses servos de Deus que
à custa de tantos esforços se consolidaram com a ciência e a santa vida e se
empenham agora em combater pelo Senhor. [6]
Com
as irmãs enclausuradas, portanto, iriam guerrear por Cristo. Tinham convicção
de que a oração não é um mero passatempo, mas algo salvífico para a Igreja e
para elas próprias. A oração de uma carmelita é capaz de converter um país.
O curso
fará parte do "pouco" que cada um pode fazer, que é buscar a
santidade. Trata-se, portanto, de uma operação de guerra. Importa aprender a
orar, para que a oração santifique a cada um e ao mundo e que cada um possa
"dar mil vidas" para a salvação de tantos que necessitam.
Referências
Caminho
de Perfeição, XXI, 2
Ibidem,
I, 2
Idem
Idem
Ibidem,
III, 1
Ibidem,
III,
_________________________
Texto da aula do Padre Paulo Ricardo durante o curso sobre a vida de Santa Teresa D’Ávila.
Em tempo. Em
Altaneira, município cujo a Santa Teresa é padroeira, há certo conflito em que
pese o nome. Seja na grafia ou mesmo quanto ao termo. Uns chamam Teresa D’Ávila,
outros “De Jesus”. Apesar de ser a mesma, o advogado e blogueiro Raimundo
Soares Filho adverte que antes mesmo de ocorrer a emancipação política em 1958
o nome popular adotado pela comunidade foi “D’Ávila” e que o “De Jesus” surgiu
após a criação da Paróquia. O nome, no entanto, segundo o blogueiro, “não caiu
no gosto popular”.
Outra
confusão que ocorre é na grafia. Todos os anos os cartazes de
divulgação dos festejos dedicado a padroeira que ocorre entre 6 e 15 de
outubro, aparece “Tereza” escrito com “Z”, quando na realidade a escrita do
nome é com “S”, o que não se testemunhou, por exemplo, na procissão ocorrida no último dia 15 que no
cartaz estampado dizia “Aprendamos com
Santa Teresa (grifo meu) a confiar totalmente em Jesus".
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Ao comentar, você exerce seu papel de cidadão e contribui de forma efetiva na sua autodefinição enquanto ser pensante. Agradecemos a sua participação. Forte Abraço!!!