Blog Negro Nicolau promove roda de conversa com mulheres altaneirenses no Dia Internacional da Mulher

 

Blog Negro Nicolau promove roda de conversa com mulheres altaneirenses no Dia Internacional da Mulher. (FOTO/ Reprodução/ Google Meet).

Por Nicolau Neto, editor

O Blog Negro Nicolau (BNN) promoveu na tarde desta segunda-feira(08), Dia Internacional da Mulher, uma roda de conversa com quatro mulheres altaneirenses. Com o tema “Mulheres: Lutas, Resistência e Múltiplas Vozes”, a roda durou duas horas e ocorreu Via Google Meet.

As convidadas foram Leocádia Rodrigues (Secretaria Municipal de Governo), Maria Vilar (Nutricionista), Josyanne Gomes (Assessora de Comunicação da Câmara) e Francilene Oliveira (Guia de Turismo Nacional) e o encontro virtual ocorreu em três momentos, a saber: contextualização histórica do dia, apresentação de dados estatísticos, desigualdades de gênero e raça, ocupação de mulheres em espaços de poder feito por este editor; o segundo momento foi para exposição de vivências das convidadas correlacionando com a data em que elas responderiam a indagação – “o que você está fazendo dentro da sua ambiência de trabalho para o reconhecimento e a valorização da mulher”? e o terceiro ficou paras as considerações finais.

Contextualização

Este editor trouxe para a diálogo afirmando que esta data não pode e nem deve ser retratada simplesmente como uma homenagem e que o momento não é para romantizar a causa, mas precisa ser vista como mais uma oportunidade para reivindicação de direitos e de assegurar os já conquistados mesmo em tempos de pandemia. Destaquei ainda que o Dia Internacional da Mulher, oficializado pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 1975 tem raízes históricas profundas e que nasceu ainda no início do século passado organizado por mulheres que foram às ruas em algumas partes do planeta para exigir direitos básico.

Dados

Mostrei de forma simplificada dados estarrecedores que só reforçam que o dia não deve ser romantizado, mas politizado, como: a cada dois minutos cinco mulheres são espancadas no Brasil; 80% dos casos de violência cometidas contra as mulheres tem o parceiro como responsável; O pais está em 7º lugar quando o assunto é assassinato de mulheres; Mais da metade dos brasileiros conhecem um homem que já tenha agredido sua parceira; 50% dos homens agressores afirmam como motivo para a violência a infidelidade; Pesquisa dos Institutos Vladimir Herzog e Patrícia Galvão cravou que 90% das mulheres dizem que já deixaram de fazer alguma coisa por medo da violência.

Mulheres nos espaços de poder

Por fim, mencionei que apesar das mulheres serem maioria no pais, a paridade/equidade de gênero ainda está distante. O Brasil em mais de 500 anos de História só teve uma mulher no comando do pais e mesmo assim foi e continua sendo vítima de ataques machistas e misógino (Dilma Rousseff), ao passo que foi afastada do cargo em 2016 sem ter cometido crime que justifique o fato. No STF há apenas duas mulheres e nenhuma negra; no Congresso Nacional esse número de mulheres é irrisório. Em que pese ao município, frisei que os dados de representatividade vem dando um salto e melhorando nos últimos anos: no executivo, por exemplo, das 11 nomeações para o primeiro escalão, 5 foram mulheres e apenas uma se autodeclarou negra. Esse número corresponde a 45,4% e no legislativo, das nove cadeiras, 4 são ocupadas por mulheres (44,4%); além de ter no quadro de assessoria três mulheres entre quatro nomes (75%).

O número ainda não é o ideal em que pese a paridade e equidade de gênero tão sonhada e desejada por todos aqueles/as que lutam por uma sociedade mais justa, mas essa representatividade feminina nas posições de tomada de decisão não deixa de ser significativa. Em que pese ao quesito raça, os dados demonstram que o caminho para que se tenha representatividade negra em cargos de tomada de decisão e para romper com o racismo institucional é mais difícil e doloroso.

Vivência das convidadas

Francilene Oliveira

Graduada com licenciatura plena em História (URCA) e Guia de Turismo Nacional, Francilene relatou um pouco da sua infância no Sitio Tabuleiro, em Altaneira. Ela contou que seu pai, José Luiz, e sua mãe, Nair Pereira, eram agricultores/as e foi na agricultura que conseguiram garantir o sustento da família. E foi desse momento que ela falou com entusiasmo, pois, segundo ela, esse contato com a natureza, o acesso a bens essenciais - como a água e a terra – é algo que lhe acompanha ainda hoje, mesmo vivendo na cidade.

Francilene destacou ainda que quando criança teve muita dificuldade de acesso a educação e que o fato de morar no campo contribuiu para isso. Seu sonho era aprender a ler e escrever. “Lembro que quando tinha cinco anos tentei entrar na primeira série, mas fui recusada por não ter idade suficiente”, mencionou, o que só vinha a tê-la ano subsequente.  Voltei pra casa com o caderno na mão chorando. Eu queria estudar. E quando cheguei em casa minha mãe disse tenha calma, minha filha. Ano que vem você estuda”, destacou. “Isso marcou muito minha vida”, contou ela.

Como contribuição em sua vida de estudante, ela destacou os professores Fabrício Ferraz e este editor. “Foram professores fundamentais na minha visão crítica, no meu posicionamento”, disse. Ela comentou ainda que a vivência no terceiro setor, como a Fundação ARCA e o experiência como locutora na Rádio Comunitária Altaneira FM também foram essenciais para sua formação profissional e como pessoa.

Ela frisou ainda que o histórico de violência de pessoas próximas a ela, de pessoas que por terem a pele branca se comportarem como “superiores” e se acharem “superiores” fez dela uma mulher de resistência, de luta e a se posicionar contra esse sistema racista. E foi dentro desse contexto que Francilene tocou nas suas raízes, na sua descendência afro-indígena e destaca que o preconceito, o silenciamento, a ausência de discussões profundas nas escolas e a falta de representatividade na sociedade contribuiu para que ela não se reconhecesse sua identidade indígena.

Formada em História, Francilene conta que tem duas paixões. A sala de aula (sua prioridade) e a área turística, que ela também tem formação. “Meu sonho é ser professora, é estar em sala de aula”, contou. “A minha segunda opção é o turismo”. E disse que deseja contribuir para que Altaneira entre de vez na rota do turismo.

Por fim, respondendo a indagação desde mediador da roda de conversa, ela disse que busca sempre trilhar pelo caminho da inclusão com ética e com justiça.

Josyanne Gomes

Formada em Ciências Sociais e hoje Assessora de Comunicação da Câmara de Altaneira, Josyanne Gomes é a filha mais velha dos quatro que compõem sua família. Relatou que acabou reproduzindo até certo momento o que a sociedade percebe como “padrão”. “Fui reproduzindo esses comportamentos, o de servir, ser obediente e de não pensar em si”, frisou.

Josyanne contou também que foi quando entrou no ensino superior que esses comportamento e ações foram sendo questionados. Segundo ela, “foi no curso de ciências sociais que começou a se posicionar no mundo” e que quando esteve em sala de aula começou a tocar em temas como “gênero, racismo e política”.

Ela destacou ainda que quando toca em temas como “política”, por exemplo, “quando isso acontece, a gente começa a perceber o peso de ser mulher pois há um pensamento de que essa discussão deve ser feita por homens”, comentou. “Mas é nesse momento que começamos a pôr em prática o feminismo”, relatou.

Josyanne disse ainda que no seu mestrado em Antropologia (UFRN) pesquisou sobre gênero e sexualidade e ao responder ao questionamento da conversa, ponderou que o caminho é sempre a discussão, a troca de ideias e que momentos como esse contribui para o fortalecimento das causas das mulheres por paridade e equidade.

Leocádia Rodrigues

Professora com formação em Letras, ex-diretora escolar, ex-secretária municipal de Educação e atualmente Secretária Municipal de Governo, Leocádia iniciou destacando como se identifica enquanto cor/raça/gênero. “Sou mulher, negra e gorda”, disse. Segundo ela, sua infância foi marcada por envolvimento em esportes coletivos e que isso a fez forte, determinada e sabedora dos espaços a ocupar e lutar por eles. “Foi nesses esportes coletivos que disputamos os espaços com os homens aqui em Altaneira”, disse ela. “Não tínhamos medo de disputar, de nos impor”, contou.

Mãe de quatro filhos e tendo passado uma temporada no Estado da Paraíba para fins de estudos, ela contou que essa fase um divisor de água na sua vida, pois lá foi um estágio para o enfrentamento das adversidades e menciona que foi a primeira da família a estudar fora do Ceará.

Ela destacou ainda que dentro de sua família se pratica o respeito a diversidade ao relatar que tem uma irmã que nasceu homem aos olhos da sociedade tradicional e hoje se reconhece mulher. Leocádia disse também que sempre lutou para não ser uma mulher feminista, se referindo ao “extremismo” e que se sente uma mulher realizada. Mas ponderou que é necessário trazer para o debate o fato “de que a mulher faz tudo, dá conta de tudo”. Para ela, isso deve ser abolido. “Nós não devemos dar conta de tudo, não devemos e nem podemos”, avaliou se considerando “uma grande mulher pelas vivências”.

Em que pese ao fator do questionamento proposto na roda de conversa, ela frisou que as mulheres possuem um olhar holístico e que é fundamental lutar para que elas tenham poderes de decisão, que é necessário oportunizar e que faz isso na sua ambiência de trabalho.

Maria Vilar

Formada em Nutrição e a filha mais nova de seis na família, Maria Vilar relatou que já na infância sentia dificuldades em “aceitar ordens” (arbitrárias) e que teve nas figuras de sua vó e de sua mãe exemplos do que não queria para sua vida. “Cresci sabendo o que não queria”, disse.

Vilar destacou que seu histórico, suas ações e decisões sempre foram na contramão do que a sociedade tradicional pensa ser o certo para as mulheres. “Nunca sonhei pensando em casar e em ser mãe e de certa forma isso contraria a resposta que a sociedade tradicional espera de nós”, ponderou.

Ela mencionou que sempre pensou em estudar e destaca suas aprovações em concursos público no âmbito do município em 2009 (nível médio) e 2015 (nível superior) e relata a sua gratidão ao Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (FIES) e que por conta da distâncias e das condições financeiras deixou de cursar outros cursos superiores.

Vilar relata também que uma das grandes dificuldades da vida foi conciliar, na época da faculdade, as tares de casa, do trabalho e do próprio estudo, mas que teve força suficientes e hoje já possui especialização na sua área de atuação.

Ela contestou de forma veemente os rótulos dados as mulheres e que “não existe isso de esposa ajudar nas atividades diárias de casa”. Para ela, é preciso dividir tarefas, compartilhar as atribuições” e disse que “sempre faz o que precisa fazer”.

Por fim, respondendo ao questionamento, frisou que é necessário que se trabalhe o empoderamento feminino e deu um exemplo de como o faz no se u ambiente de trabalho, inclusive como uma maneira de chocar o pensamento tradicional da sociedade. “Eu trabalho a questão da alimentação lidada à saúde e não a estética”, destacou relantando que isso ajuda as mulheres no enfrentamento da sociedade tradicional.

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