Exposição conta a história de Carolina Maria de Jesus, uma das mais importantes escritoras do país

 

Carolina Maria de Jesus (FOTO/ Acervo IMS).

Mulher, negra, semianalfabeta, catadora de papelão. Poderia ser mais uma história de sofrimento das tantas que o Brasil coleciona, se não fosse a determinação e a ousadia de Carolina Maria de Jesus, uma das mais importantes escritoras do país.

E, pela primeira vez, a vida e a obra dela saíram dos livros e foram parar em uma das principais salas de exposição de São Paulo. A mostra “Carolina Maria de Jesus: um Brasil para os brasileiros” ocupa dois andares do Instituto Moreira Sales, na Avenida Paulista, a partir deste sábado (25).

No processo de pesquisa para montar essa exposição, os curadores foram atrás de manuscritos originais e descobriram um verdadeiro tesouro – a maior parte da obra dela ainda não foi revelada.

Cerca de 80% do material é inédito. “O público vai encontrar uma Carolina escritora, multiartista, que também foi cantora, escritora de contos, crônicas, letras de música, peças de teatro, artista têxtil que confeccionou vestidos e adornos para desfile. Foi uma intérprete do Brasil”, explicou Hélio Menezes, curador da exposição.

Foram quase 6 mil paginas escritas à mão, sendo que muitas ajudaram a embalar o sono de Vera Eunice de Jesus, professora e filha da escritora.

Ali eu ficava a noite inteira, quietinha ali, com aquele barulho da caneta tinteiro, que dá um arrepio. Até hoje eu tenho essa caneta tinteiro na cabeça, mas, ali, eu ficava com ela”, contou Vera ao Bom Dia São Paulo.

A mostra também traz obras de outros artistas, que dialogam com o legado de Carolina, como uma chamada “Meu lindo colar de pérolas”.

Eu tenho que ter muita responsabilidade para representar essa mulher, essa grande mulher, que foi Carolina Maria de Jesus. E eu, como artista, ouvi muito sobre ela, pesquisei muito, e falei: ‘Nossa, ela precisa de um colar, que vai se chamar ‘Meu lindo colar de pérolas””, disse a artista Lídia Lisbôa.

‘Quarto de Despejo’

Neta de escravos e filha de mãe analfabeta, Carolina nasceu em Minas Gerais e, em 1947, veio para São Paulo. Ela foi morar na favela do Canindé, que ficava às margens do Rio Tietê.

Chegou a passar fome e morar na rua. Dessa experiência e de uma profunda capacidade de observação, ela tirou a inspiração para escrever a sua principal obra: “Quarto de Despejo”.

Quando ela recebe o livro ‘Quarto de Despejo’ impresso, ela coloca assim, no alto, eu lembro como se fosse hoje, e ela lê. Eu vi a felicidade no olhar dela – ‘Carolina Maria de Jesus, Quarto de Despejo’. Ela estava muito feliz porque tinha alcançado o objetivo dela”, contou Vera.

O livro já vendeu 3 milhões de cópias e foi traduzido para 16 línguas.

O biógrafo de Carolina, o jornalista Tom Farias, conta que os acadêmicos rejeitaram muita coisa que ela escreveu por causa dos “erros de português”.

Tom Farias defende que o sucesso que os livros dela fazem até hoje no mundo todo comprova a qualidade do material. “A voz do negro no Brasil, desde 1500, quando começaram a vir as primeiras levas de escravizados pra cá, nunca foi ouvida, né, e a Carolina veio no século 1920 pra quebrar esse estigma de que o negro não tem voz”, afirmou.

Já a filha diz que ela escrevia em “pretoguês”. “Nós estamos no século 21, esse livro é da década de 1940, 1937, e os problemas continuam vigentes porque a gente vê todos dias acontecerem essas coisas, essa discriminação, essa violência. Então, eu sempre digo que a Carolina de Jesus é uma escritora atual”, disse Vera.

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Com informações do Geledés.


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