Direitos Humanos e Talibã: uma breve reflexão, por Cristina Tadielo

 

Fuga do Afeganistão. (FOTO/ Reprodução).

A Declaração Universal dos Direitos Humanos observa em seus preceitos “como o ideal comum a ser atingido por todos os povos e todas as nações, com o objetivo de que cada indivíduo e cada órgão da sociedade” a liberdade, a igualdade em dignidade e direitos bem como o “espírito de fraternidade” entre os povos.

Traz ainda, a potencial responsabilidade dos países em promover e tutelar a Paz mundial respeitando as sociedades em suas características próprias e culturais, a partir do momento em que não sejam permissivas em práticas e ataques graves e severos aos Direitos Humanos.

Pois bem, nos últimos dias a comunidade mundial assistiu estarrecida, cenas da tentativa de fuga em massa do Afeganistão, país cuja história é descrita sob égides de extrema ditadura religiosa que, misturadas a objetivos sociais próprios, impôs práticas extremistas e de violação dos declarados direitos humanos.

Tais praticas, comandadas pelo Talibã, grupo fundamentalista islâmico formado no fim da invasão soviética do Afeganistão (1979-1989) por estudantes, defendem uma rígida interpretação do Alcorão (livro sagrado do Islã) para governar o país. O grupo acredita na sua representação como sendo os verdadeiros portadores do islamismo e tem uma visão peculiar da religião na qual, não há brechas para diversidade.

 Cristina Tadielo. (FOTO/ Divulgação).

A volta do Talibã ao poder após 20 anos de ter sido expulso por tropas norte-americanas faz emergir na população afegã, bem como de toda comunidade internacional, a preocupação quanto a violação dos direitos humanos e as ações extremistas de tal governo, o que justifica a tentativa de fuga. A formação do Talibã, no Afeganistão, é um dos muitos efeitos colaterais da bipolarização entre Estados Unidos e URSS (União das Repúblicas Socialistas Soviéticas) durante a Guerra Fria (1945-1991) e em seus contornos revanchistas, atingem a política e economia internacional de forma efetiva e com conseqüências sociais de peso humanitário. O conflito é um misto de política e religião em suas formas mais radicais e extremistas. A laicidade é coloca a termo e direitos culturais e humanos são colocados em xeque.

Tomando em conta a igualdade de direitos e a dignidade do ser humano, um recorte há ser minuciosamente observado, diz respeito a condição das minorias e, principalmente, à condição da mulher afegã todo este contexto de tomada de poder pelo Talibã.

O ser humano “mulher”, sob a interpretação radical, extremista e severa do grupo, é desprovido de autonomia e, portanto de direitos. Mulheres têm que estar sempre subjugada às ordens dos homens. Enquanto o Talibã esteve no poder, as mulheres foram tolhidas em liberdade, respeito, dignidade e, em inúmeras vezes, punidas violentamente por “desobedecerem”.

Ainda no período em que estiveram fora do poder, demandavam perseguições aqueles que defendiam direitos universais humanos, principalmente mulheres. Exemplo disso é a história de Malala Yousafzai baleada por combatentes do grupo após se tornar conhecida mundialmente defendendo o direito das mulheres e que meninas como ela tivessem pleno acesso às escolas.

Repercutindo os fatos narrados, e para além de relativismos culturais e articulações feministas o recorte social e de gênero insere aspectos imersos na Declaração dos Direitos Humanos e a necessidade de um discurso objetivo acerca da tutela humana bem como na defesa efetiva de Direitos fundamentais. A demanda é complexa e existe um histórico de violação aos direitos humanos, aos tratados e acordos internacionais por parte do Talibã que não pode ser ignorado. Assim como não pode ser ignorado um ocidente que, guardadas as proporções, em nome de divindades descarta as humanidades de acordo com interpretações próprias na intenção de guerra de poderes e domínios territoriais.

O que se vê é uma enorme lacuna entre declarações universais e realidades de sistemas políticos impostos. É fundamental que sob o véu midiático como um indicativo de solidariedade, estejam os reais mecanismos mundiais de assistência e cumprimento dos preceitos humanitários declarados em pactos e tratados internacionais. A preocupação precisa se embasar no refazimento de nações, não pelo espectro do terrorismo, mas moldado na silhueta e na culturalidade da pessoa humana com o atento olhar as minorias regimentadas pela isonomia de seus direitos.

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Publicado originalmente no Notícia Preta.

Cristina Tadielo é  advogada, Educadora, Psicopedagoga e Pesquisadora. Membro da Comissão de Igualdade Racial da OAB/MG.

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