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Comunidade do Gesso: Urbanização para o encontro

 

Comunidade do Gesso, em Crato. (FOTO/ Reprodução/ Whatsapp).

Por Alexandre Lucas, Colunista

O largo do Gesso (Crato-CE), onde fica localizada sua quadra, funciona como epicentro da comunidade, a partir de seus condicionadores históricos e sociais. O Largo abrigou por anos um depósito de gipsita (Gesso), nas margens da linha férrea, onde eram transportadas nos vagões de trem para serem beneficiadas na capital cearense. O que deu origem ao nome da comunidade. O depósito e a linha férrea são elementos importantes para compreensão dos processos de organização e estratificação socioespacial.

O largo do Gesso, tinha um triangulação inscrita pela linha férrea que serviu como divisor de pessoas e demarcação de uma das maiores zonas de prostituição da região Sul do Estado do Ceará, o “Cabaré do Gesso”, composto por cerca de 4 quadras preenchidas por bares, boates e quartos que serviam como residências para as profissionais do sexo. A Zona de prostituição teve início na década de 50 do século passado por ordem judicial, uma juíza da época determinou que todas as casas de prostituição localizadas no centro da cidade deveriam se instalarem na localidade e estipulou um prazo de alguns dias.

Esses dois fatores, a triangulação férrea e a zona de prostituição são elementos estruturantes para refletir sobre ocupação do lugar, as relações identidades e organização comunitária e o perverso processo histórico de estigmatização social e exclusão das políticas de urbanização e planejamento urbano.

Quando tomamos como objeto de estudo, o largo do Gesso e o colamos como epicentro da comunidade, podemos perceber que suas ramificações de circulação de  transportes são interrompidas e a as vias de acessibilidade são caracterizadas por obstáculos, o que demonstra de forma nítida o significado das intervenções urbanas como ações indissociáveis das relações humanas.

Outro fator que deve ser considerado neste aspecto é a localização  geográfica da comunidade que tem no seu entorno cinco bairros da cidade do Crato (Palmeiral, São Miguel, Santa Luzia, Pinto Madeira e Centro), o qual denominamos desde Território Criativo do Gesso desde 2015. A criação e animação do conceito desse Território, é uma estratégia politica de articulação em rede das organizações da sociedade civil e do poder público visando contribuir para integração territorial, no sentido de aproximação ações e de reduzir as distâncias entre Lugar e Território.

O Território Criativo do Gesso, surge em 2015, por iniciativa do Coletivo Camaradas pela necessidade de tentar entender como a lugar (comunidade do Gesso) se relacionava como o seu entorno, bem como o inverso.

Quando é realizada a somatória de organizações da sociedade civil e do poder público no Território Criativo do Gesso fica evidente a sua potência a partir da cultura, tendo em vista, o conjunto de iniciativas no campo da educação  e da cultura que atuam de forma direta e indireta no Território (escolas, universidade, ONGs, coletivos, grupos da tradição, igrejas, centros espiritas, terreiros, pousadas, hotéis, bibliotecas, espaços de memória, etc.).

O Território Criativo do Gesso fortalece a ideia de retirar as linhas divisórias que separam as pessoas e os seus espaços e aponta como caminho de urbanização a reparação histórica, a criação de linhas de encontros entre as gerações, redução de impactos ambientais e reconhecimento da sua potência criativa.

Uma urbanização para encontro neste caso especifico, pressupõe ter o largo do Gesso, como centro de gravitação da mistura de crianças, adolescentes, jovens, adultos e idosos. Possibilitar a criação de um espaço com condições envolver as diversas gerações é essencial para combater a estigmatização social e as zonas de conflito. Uma urbanização que contemple a segurança e o bem estar social das crianças, mulheres e idosos é essencial para promover uma lógica que se afaste da dureza dos planejamentos urbanos construído na frieza e na distância da realidade de quem constrói as paisagens sociais e culturais locais.

Nesta perspectiva,  a linha férrea, é algo que essencialmente deve desaparecer para constituir um novo fluxo de circulação na comunidade que possibilite condições de acessibilidade, iluminação e mobiliários urbanos, o que incluir também abertura de novas vias de acesso.

A política urbana do improviso, populista e a ausência do planejamento urbano tem gerado consequências diretas como: alagamentos, redução de ruas, pavimentações inconsistentes e o desenfreado asfaltamento.

No quesito asfaltamento é preciso reconhecer que o largo do Gesso recebe um volume significativo de água provindas de diversas ruas asfaltadas das áreas mais altas gerando uma situação temerosa e de dificuldade de trânsito.      

A urbanização deve considerar a sua área verde, impulsionando um paisagismo que potencialize o Sítio Urbano do Gesso, uma imensa conquista comunitária reconhecida por lei municipal que prevê plantio de árvores frutíferas e plantas medicinais nas margens da linha férrea.

A iluminação pública é uma questão primária para promover o encontro e a circulação de pessoas, o largo do Gesso, precisa ter um sol artificial durante a noite, como forma de tornar uma rota segura para população.

A comunidade do Gesso precisa se integrar espacialmente ao seu território para não ser uma espacialidade isolada e excluída da cidade como vem se caracterizando ao longo dos anos. 

Entretanto, qualquer processo de urbanização na comunidade exige escuta, percepção das histórias e das afetividades comunitárias o que pressupõe um planejamento urbano participativo e norteado por uma perspectiva estruturante e civilizatória que se paute na redução dos impactos ambientais e na promoção da qualidade de vida da presente e das futuras gerações. O improviso, o tapa buraco e o ouvido de mercador atrofiam o direito à cidade. Uma outra urbanidade exige soluções para resolver o quebra-cabeça esfacelado por longos anos  exclusão socioespacial, logicamente, isso exige ciência e a uma gestão democrática e participativa, o que não acontece com receitas, muito menos do dia para noite.     

Cidade preparada para as eleições

 

Praça da Sé, em Crato. (FOTO/ Reprodução/ Fooba).

Por Alexandre Lucas, Colunista

Urbanização sem planejamento e participação popular é negar o direito à cidade.  Planejar a ocupação espacial e a sua urbanidade exige ciência e a observância dos devidos   elementos que interligam a cidade.  As intervenções urbanas afetam as relações humanas e suas transversalidades como o meio ambiente, economia, segurança e as práticas sociais, ou seja, é impossível separar o inseparável, dito de outra forma, a ação humana de alteração do espaço urbano modifica as formas de acessibilidade e interação com o espaço, isso pode ser positivo, mas também pode provocar danos irreparáveis, como por exemplo o aumento de acidentes no trânsito  ou ainda implicações  no escoamento das águas.

Planejar a cidade não pode ser um tiro no escuro, não pode desprezar a ciência e eleger uma vontade ideogicamente construída, a exemplo das práticas populistas e equivocadas de apontar o censo comum como parâmetro para definir   políticas que exigem uma tomada de decisão política alinhada à ciência, a racionalidade e a redução dos impactos ambientais.

Concomitantemente o planejamento deve alinhar ciência com participação popular, o que muda completamente uma roteirização urbanística orientada pelo senso comum.  É preciso escutar e deliberar em conjunto com os movimentos sociais e a população, para compreender de forma mais apurada, as demandas locais e não aniquilar a memória dos lugares e as práticas saudáveis da população. Esconder e negar o protagonismo dos movimentos sociais e comunitários nos rumos e discussões sobre a cidade é uma forma evidente de negligenciar o direito à cidade, de excluir a participação popular e de criar uma urbanização de gabinete e eleitoral.

A cidade que tem a sua espacialidade esquartejada aprofunda os problemas estruturais e age no calor do imediatismo e do improviso, perdendo a sua dimensão macro e suas interligações.

O imediatismo e o improviso tem sido historicamente uma prática da urbanização que tem como viés de alcance ser moeda de troca eleitoral.  O desenfreado processo de asfaltamento das áreas excluídas do direito à cidade é uma prova incontestável que se constrói uma cidade para eleições representada pelo irrestrito descompromisso com os impactos ambientais e a engenharia urbanística.

Esse é o retrato da maquiagem urbana que gera a cidade veloz, barulhenta, insegura  e  adoecedora e que ideologicamente   é  vendida como desenvolvida e moderna para esconder as fraturas sociais,  fruto do processo de produção e acumulação do capital que ergue espacialidades esquartejadas. 

Faz-se necessário debater o direito à cidade para compreender que a aparência esconde uma essência severamente perversa, complexa e alinhada aos interesses da classe economicamente dominante. Essa discussão está intimamente ligada à democratização da sociedade, se compreendemos a cidade como um sustentáculo das interações humanas.  Enquanto isso,  precisamos aglutinar forças para construir uma outra cidade, em que a defesa da vida esteja no primeiro plano.