![]() |
(Foto: Eduardo Anizelli/Folhapress). |
Jair
Bolsonaro falou uma montanha de barbaridades em sua entrevista no programa Roda
Viva, da TV Cultura, na noite desta segunda (30). Mesmo assim, Jair Bolsonaro
provou que sua competitividade pode ser maior do que a certeza dos que dizem
que ele murchará assim que a campanha começar por conta de seus míseros sete
segundos nos blocos de propaganda na TV.
Não
importa que demonstre não dominar nenhuma proposta para as áreas de economia,
educação, saúde, ciência e tecnologia… Aliás, as soluções que dá aos problemas
do país não sobreviveriam a uma sessão de interrogatório do coronel Brilhante
Ustra, o finado torturador-açougueiro da ditadura, autor do livro que repousa,
segundo Bolsonaro, em sua cabeceira. Ele se esquiva de perguntas e inventa
números. Mas sabe se comunicar. Fala para uma parte dos extremistas o que eles
querem ouvir. E conversa da maneira que uma parte menos radical dos eleitores entende,
mesmo que discorde. Com isso, vai preenchendo medos, ansiedades e sensação de
vazio com essa conexão. O conteúdo, nesse caso, é menos importante que a forma.
É
triste, mas venho escrevendo a mesma coisa neste espaço há mais de dois anos.
Parte das elites intelectual, social e política segue tratando-o como morbidade
passageira e não entende esse tipo de conexão que ele estabelece. Essas elites
chamam os eleitores de Bolsonaro de ignorantes e acham que a inércia
democrática e o recall das eleições passadas irão mudar o cenário na hora
certa. Com isso, não se preocupam se trabalhadores e o restante da classe média
estão entendendo o velho discurso que eles próprios seguem usando. Apenas se
preocupam com as alianças para ganhar tempo de TV e em dizer aquilo que consideram
racional. O problema é que apenas a razão, neste caso, não nos libertará.
Pois
a racionalidade abandonou o debate político brasileiro há tempos. E o que ficou
foi o fígado da ultrapolarização.
(Já
a elite econômica recebeu o recado e entendeu: Bolsonaro entregará a economia
para o mercado se vencer. E, com isso, parte dele abandonou Geraldo Alckmin.
Essa parte da elite se esqueceu que somos craques em estelionato eleitoral e em
mudanças de posição no day after.).
Mais
uma vez, é irresistível comparar a situação com a de Donald Trump. Uma parcela
da imprensa e da classe política tinha grande dificuldade de imaginá-lo
despachando no Salão Oval. Quando percebeu que o negócio era sério e tentou mostrar
quem ele era e o que significava o seu discurso, já era tarde. Hoje, parcela
considerável da imprensa e da classe política brasileira tem dificuldade de
imaginar Bolsonaro sentado na cadeira do Palácio do Planalto. Dizem que ele não
conta com tempo de TV, palanques em locais importantes e que isso é balão que
se esvazia.
Bolsonaro
não é Trump e o PSL não é um Partido Republicano na democracia bipartidária
norte-americana. Mas Trump não foi eleito por ser misógino e preconceituoso,
mas por conseguir tocar eleitores de Estados-chave da federação norte-americana
ressentidos por serem órfãos econômicos da globalização. Tocar os eleitores,
essa é a chave.
No
Brasil, os temas comportamentais e morais, apesar de fazerem sucesso nas redes
sociais com a extrema-direita, não serão o fiel da balança do voto. São
insuficientes para levar o centro do espectro político e eleger alguém. Para a
massa, os dois principais temas da campanha serão os mais de 13 milhões de
desempregados e os mais de 62 mil homicídios anuais.
Bolsonaro
tem uma resposta para a segurança pública que passa por armar a população e
apoiar a letalidade policial. Na geração de empregos, contudo, vai mostrando
que a qualidade de vida do trabalhador é menos importante que o desenvolvimento
econômico. Na entrevista, afirmou que. fiscalização do trabalho atrapalha a
geração de emprego no campo. Fiscalização que libertou mais de 52 mil escravos
desde 1995. Pelo visto, bom mesmo era antes da Lei Áurea, quando havia pleno
emprego.
Mas
ao falar de suas propostas, mesmo que de maneira vazia, de forma que o cidadão
comum sinta que estabelece com um candidato um canal de comunicação sobre suas
frustrações e dificuldades, conquista votos. Afinal, as pessoas querem alguém
que fale para elas. Mesmo que não fale nada.
A
falta de resposta decente dos atuais governantes à necessidade de empregos e à
garantia de segurança pública pode jogar o Brasil não mãos de qualquer um no
ano que vem. Um ''salvador da pátria'' que demonstra orgulho por não ter apreço
pelas instituições, por exemplo.
Bolsonaro
sabe conversar com um público que quer saídas rápidas e fáceis para seus
problemas e que precisa de alguém que lhe entregue uma narrativa – mesmo que
inconsistente – para poder tocar sua vida. Narrativa que os partidos tradicionais
solaparam em oferecer.
O
melhor para Bolsonaro é que, agindo como azarão e não representando nada além
dele mesmo, não precisa ganhar nada. Por isso está livre para fazer o que for
preciso para ganhar. Inclusive passar por cima da democracia ao afirmar que as
eleições deste ano estão sob suspeição por falta do voto impresso. Mas a lisura
do processo será questionada apenas se ele não ganhar, claro. (Por Leonardo Sakamoto, em seu Blog).
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Ao comentar, você exerce seu papel de cidadão e contribui de forma efetiva na sua autodefinição enquanto ser pensante. Agradecemos a sua participação. Forte Abraço!!!