'Temos visto um judiciário ativista, extremamente ativista, que tem se acovardado diante de uma opinião pública ou publicada'. (Foto: Geraldo Magela/ Agência Senado). |
Para
a professora de Direito Penal e Criminologia da Faculdade de Direito da
Universidade de Brasília (UnB), Beatriz Vargas Ramos, todo o episódio
envolvendo a decisão do desembargador Rogério Favreto, que determinou a soltura
do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, decisão contestada primeiro pelo
juiz Sérgio Moro, e depois suspensa pelo desembargador Carlos Eduardo Thompson
Flores é algo que "saiu
completamente da normalidade em situações semelhantes".
"Temos visto um Judiciário ativista,
extremamente ativista, que tem se acovardado diante de uma opinião pública ou
publicada e tem se distanciado do padrão do procedimento do rito",
avalia. "O procedimento jurídico é
intermediado por regras e nesse caso a regra é claríssima. O juiz pode ter
simpatias políticas, isso não necessariamente vai fazer que ele se oriente ou
não por elas, e isso pode ser constatado na motivação da decisão. E lendo a
motivação do plantonista, ela não é absurda, tem um lastro em uma compreensão
do problema face ao Direito perfeitamente legítima e refletida no próprio
Supremo."
A
professora também destaca a conduta do juiz Sérgio Moro que não teria mais
jurisdição no caso e mesmo assim interveio. "Se houvesse da parte do Ministério Público Federal um recurso contra a
liminar, jamais cairia na mão do Moro, o que poderia acontecer era, por via de
um recurso, a decisão ser novamente apreciada pelo próprio TRF 4, por meio de
um recurso regimental, para analisar a decisão liminar", aponta.
Confira
abaixo trechos da entrevista:
Fora da normalidade
Não
conheço nada no mesmo modelo, saiu completamente da normalidade em situações
semelhantes. Primeiro, é indiscutível a competência do plantonista
desembargador, que decide nesta condição, com cobertura legal e regimental.
Certo ou errado, não vou entrar no mérito da decisão em si, a competência é
inegável. Isso por si traz a primeira perplexidade.
Um
juiz de primeiro grau, no caso Sérgio Moro, sem nenhuma jurisdição no caso, que
terminou no momento em que deu sua sentença, pega a caneta e chama esse texto
de 'decisão'. É um texto que não tem forma nem figura jurídica porque não é uma
decisão, pede o esclarecimento sobre como proceder. Isso é extremamente
chocante porque ele não é uma pessoa que tenha que proceder dessa ou daquela
forma porque não tem mais jurisdição.
Se
o desembargador defere uma liminar em habeas corpus, quem tem que proceder é a
Polícia Federal para o cumprimento dessa ordem. Se houvesse da parte do
Ministério Público Federal um recurso contra a liminar, jamais cairia na mão do
Moro, o que poderia acontecer era, por via de um recurso, a decisão ser
novamente apreciada pelo próprio TRF 4, por meio de um recurso regimental, para
analisar a decisão liminar.
O "conflito de competência"
Desembargadores
avocam o processo para tirar das mãos do plantonista. Não me consta que isso
tenha acontecido antes. O plantonista ser derrubado da sua competência passa
uma ideia de haver um ativismo sob o pretexto de que existe um conflito de
competência. O (desembargador João Pedro) Gebran, por sua vez relator,
atualmente nem relator é mais. Como o Moro, a 8º turma esgotou sua competência,
não está mais nas mãos dele. Não estou convencida, com toda honestidade, estou
fazendo um esforço para compreender, em respeito ao Judiciário, qual a
procedência do argumento jurídico usado por Thompson Flores e não consigo.
Tenho me esforçado para ver isso.
Judiciário ativista
É
absolutamente lamentável esse esforço de desacreditar o Favreto como acho que
qualquer esforço de desacreditar um juiz por essa única linha, sem olhar para a
decisão em si, atenta contra o Judiciário como um todo. Isso vai se voltar
contra o Judiciário. Temos visto um Judiciário ativista, extremamente ativista,
que tem se acovardado diante de uma opinião pública ou publicada e tem se
distanciado do padrão do procedimento do rito.
O
procedimento jurídico é intermediado por regras e nesse caso a regra é
claríssima. O juiz pode ter simpatias políticas, isso não necessariamente vai
fazer que ele se oriente ou não por elas, e isso pode ser constatado na
motivação da decisão. E lendo a motivação do plantonista, ela não é absurda,
tem um lastro em uma compreensão do problema face ao Direito perfeitamente
legítima e refletida no próprio Supremo. A questão da execução provisória de
uma condenação, ainda que venha a acontecer, não é automática, e a gente sabe
que no campo do Direito igualmente se legitimam as decisões que vão em um
sentido e em outro. Se a decisão do Favreto fosse absurda, até admito que
pudesse ter se orientado pelas suas simpatias ideológicas, mas ela tão
respeitável quanto a decisão do Supremo de mandar prender.
Tentativa de execrar Favreto
Essa
execração pública é simplista, apaixonada, não ajuda em nada agora e o
Judiciário está dando um tiro no pé quando desconstrói isso. Se a decisão do
Favreto for cair, que caia pelo procedimento legal, e não por meio dessa
avocação de competência. O Moro deu o 'start', e o pessoal foi lá apagar o
incêndio. (Com informações da RBA).
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