Daniel Cara fala da importância de Paulo Freire: o maior educador do mundo no século 20. (Foto: reprodução/YouTube). |
Se
a Emenda Constitucional (EC) 95 não for revogada, por mais 20 anos o Brasil
será um país de privilegiados. O alerta é do sociólogo Daniel Cara, coordenador
geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, durante o programa Entre
Vistas, na TVT. A emenda que congela investimentos da União por 20 anos afeta
sobretudo as áreas sociais.
"A emenda impede a aplicação dos R$ 37
bilhões conforme determina o Plano Nacional de Educação, um recurso adicional
para a gente poder garantir uma escola digna para os estudantes. Por mais 20
anos, não poderá haver mais recursos para a educação, apenas o reajuste
inflacionário. Isso significa o aprofundamento do nosso atraso",
afirmou Daniel Cara, que é pré-candidato do Psol ao Senado em São Paulo.
O
coordenador da Campanha, que vem discutindo a questão com o Ministério Público
Federal, destacou que a União tem orçamento de R$ 3,5 trilhões. "E estamos pleiteando apenas R$ 37 bi para
cumprir a Constituição e o Plano Nacional de Educação." Segundo
ele, a cada R$ 1 investido no setor, a
União coloca apenas R$ 0,18 – quando fica com 57% de tudo o que se arrecada em
impostos no Brasil.
O
ativista acredita que os efeitos da política perversa serão determinantes na
sua derrubada. "O próximo presidente
não terá como governar com a EC 95. E vai perceber que a medida é absurda. Há
ainda uma crescente mobilização popular, com adesão da CNBB, do MST, Frente
Brasil Popular, Povo Sem Medo e nossa campanha Revoga 95."
'Assunto
mais importante do mundo'
"Educação
é o assunto mais importante do mundo. O Brasil é o que é porque ainda não deu a
atenção devida para o tema", disse o jornalista Juca Kfouri, ao abrir o
programa e apresentar o entrevistado. Na conversa, que contou com a presença da
única vereadora negra de São Bernardo do Campo, no ABC paulista, Ana Nice (PT),
foram tratados também temas como a importância de Paulo Freire para a educação mundial
e propostas para o país avançar.
Daniel
Cara é membro do Fórum Nacional de Educação, em que ocupa a cadeira da Campanha
Nacional pelo Direito à Educação. É doutorando em Educação pela Universidade de
São Paulo e mestre em Ciência Política. Defende que, na história do Brasil,
existem dois grandes pensadores que deveriam servir de modelo para uma
estrutura funcional na área, que resultaria em desenvolvimento social: Paulo
Freire e Anísio Teixeira.
O
mediador Juca Kfouri perguntou sobre os modelos "favoritos" de
educação para o pensador. "A pergunta é até fácil de responder",
disse. "Esses dois educadores são reconhecidos no mundo todo, mas não como
mereceriam no Brasil. Anísio Teixeira foi o educador com maior influência
política, embora seu trabalho nunca tenha sido implantado efetivamente. Ele foi
muito à frente de seu tempo e teve como defensor o Leonel Brizola",
acrescentou.
"O
outro, Paulo Freire, é o maior educador do mundo no século 20. O educador mais
lido em todo o mundo, mais citado em todas as referências nos Estados Unidos e
Europa. O principal educador da reforma finlandesa da educação, um país com uma
das melhores educações do mundo que tem ele como referência", disse
Daniel.
Por
sua vez, o apresentador questionou a perseguição que Freire sofre entre os
setores radicais ultraconservadores da sociedade, representados por movimentos
de extrema direita. "Vocês ouviram
que a Finlândia, que tem o melhor modelo reconhecido de educação no mundo adota
Paulo Freire? Não consta que seja um país comunista. Até vou dar uma olhada
depois para descobrir se é", ironizou. "Como o Brasil tem um educador reconhecido mundialmente e aqui ele é
escondido sob pretexto de ser comunista?", questionou.
"Paulo Freire trabalha sob a perspectiva de
emancipação. Um educador que acredita em relações horizontais. Ele enfrenta o
tradicionalismo pedagógico barato. Ele vai fazer com que as pessoas tenham
pensamento crítico. Essa educação do Paulo Freire prevê o educador no mundo do
educando para desenvolver o pensamento crítico e construir a relação de
cognição para se apropriar do mundo da cultura. Isso gera temor dos
ultraconservadores", respondeu o educador.
Ele
explicou que o ensino emancipador defendida por Paulo Freire é visto como
nocivo por setores que querem manter sistemas desiguais. "Escolheram o Escola sem Partido, o movimento
que lidera essa luta contra o Paulo Freire, o educador como inimigo porque ele
propõe o rompimento da realidade do status quo, de desigualdade, que é
inaceitável. Mas para eles é aceitável, porque eles defendem a manutenção da
desigualdade. Pensamento crítico não é aceitável para muitos setores da
sociedade."
No
ano passado, esses setores, articulados com políticos do Congresso, tentaram
tirar o título de Paulo Freire de patrono da educação brasileira, sem sucesso.
"Infelizmente, no Brasil, não só ele
não é lido, não só não é implementado, mas também quase perdeu o título de
patrono da educação brasileira no ano passado. Mas conseguimos manter ele como
patrono, com um motivo muito claro. Tínhamos uma senadora, a Fátima Bezerra
(PT-RN), que conseguiu conter a tramitação desse projeto no Senado",
lembrou Daniel.
Experiência no ABC
Juca
Kfouri e o entrevistado aproveitaram a presença de Ana Nice para conversar
sobre a situação da educação no ABC. "A educação na nossa cidade é
boa", avaliou ela. "Alcançamos,
no governo de Luiz Marinho (PT), o Índice Nacional de Desenvolvimento da
Educação Básica (Ideb), de 6.8. Estava previsto mais tempo para alcançarmos
essa nota. Claro que há sempre o que melhorar, temos que trabalhar por mais
investimentos. Em São Bernardo, falando em creches, temos em torno de 15 mil
crianças fora do sistema, o que é muito", completou.
Daniel
argumentou que para resolver os problemas estruturais de educação, são
necessárias ações integradas. "Só
política de educação não vai dar conta do problema brasileiro. Em São Bernardo,
por exemplo, temos locais de vulnerabilidade. Só política de educação não vai
fazer com que a criança permaneça na escola. Precisa de política de trabalho e
renda, assistência social, saúde. Essas coisas têm que caminhar em conjunto.
São Bernardo teve um trabalho conjunto entre diferentes áreas. Construíram
grandes equipamentos de creches, uma das mais avançadas do país. São poucas
prefeituras que conseguem fazer com que as secretarias conversem",
disse.
"Existem direitos e problemas, e as soluções
não passam pelo protagonismo de uma pasta ou um secretário. O exemplo de São
Bernardo é positivo, bem como em São Paulo na época da Luiza Erundina, que teve
um secretariado de peso, como um ministério. Paulo Freire, Marilena Chauí, um
sonho aquela composição. Como foi em alguns momentos com a Marta Suplicy",
completou Cara. Entretanto, o cenário positivo vem decaindo, de acordo com os
presentes, após a vitória do tucano Orlando Morando, em 2016. "Uma espécie de clone do João Doria (PSDB),
em São Paulo", definiu Kfouri. (Com informações da RBA).
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