Desenhar
o cenário político brasileiro em 2018 não é tarefa fácil. O velho sentimento
antipolítica, nutrido no Brasil há muito, seja pelo abismo que separa Estado e
sociedade, seja pela desmoralização quase completa dos políticos de carreira,
anda revigorado. Escândalos de corrupção e justiçamentos com direito a
espetáculo midiático reacenderam nosso “ódio pela política”.
Isso
torna muito imprevisível o cenário para as eleições de outubro. Todo mundo
sabe: Lula, se puder ser candidato, é favorito. Também é notório que os
esforços do Judiciário para retirá-lo do processo eleitoral são ostensivos.
Trata-se, para eles, de completar a tarefa do golpe.
Mesmo
se conseguir impedir Lula no tapetão, os problemas do establishment brasileiro
não estarão resolvidos. Até aqui não conseguiram encontrar uma alternativa
eleitoral “segura”. Muitos dos seus representantes chafurdaram em malas e
propinas, o que foi demonstrado publicamente com algo mais do que convicções.
As
velhas raposas perdem pelo e a popularidade daqueles “de sempre” é
desalentadora. Sabem que um candidato com programa similar ao de Michel Temer,
isto é, privatizações, cortes de investimentos e ataques frontais a direitos
constituídos, tem poucas chances de vencer nas urnas.
Isso
talvez explique a bigorna amarrada ao pé de Geraldo Alckmin nas pesquisas. O
mesmo argumento explica em parte a popularidade de Jair Bolsonaro, que mobiliza
sentimentos antissistêmicos com seus discursos de ódio e intolerância, alguém
que vai “acabar com esta bandalheira”.
Vende
peixe podre e esconde-se atrás de uma imagem que não é a sua, mas tem
encontrado boa audiência. O ex-capitão não é, no entanto e exatamente, um
candidato do establishment. Seu flerte com o liberalismo ainda não convenceu a
turma do mercado nem o partido da mídia. É preciso encontrar uma solução.
Um
candidato do suposto “centro”, da base de Temer, como Meirelles ou Maia, sofre:
não pode falar a verdade sobre seu programa, pois não teria a mínima chance.
Foi por esta razão que Alckmin afastou-se de Temer como se fugisse de um
vampiro.
O
governador de São Paulo segue como o plano A do establishment, até que se prove
o contrário. Ou melhor, até que as pesquisas de opinião mostrem que ele não
decola. E se, de fato, não decolar, precisarão de um plano B, que há meses está
no forno.
Alguém
que pudesse sustentar uma imagem “de fora” da política, mas ao mesmo tempo
mantivesse o compromisso dos “de dentro”; que não esteja envolvido na vida
política do País, que consiga mobilizar sentimentos populares e dialogar com
todo o Brasil. Que tal um jovem empresário e apresentador da TV Globo? Loucura?
Luciano
Huck é um jovem milionário. Foi empresário de entretenimento antes de se tornar
celebridade nacional. Conectado com a ideia de empreendedorismo, administra
ONGs e financia a produção de filmes, fazendo valer também seu lado de
“empreendedor social”. Em seu programa, reforma casas e carros, além de outras
pirotecnias que sustentam a sua popularidade.
Tido
por alguns como um benfeitor desprendido, consegue entrar na casa do povão e
transmitir confiança. Bom menino, trabalhador e cheio de sucesso. Vai
transformar essa “lata-velha” num “lar doce lar”.
Elogiado
por FHC como alguém que poderia “chacoalhar” a política tradicional, Huck
tentou incorporar o “novo”. Há um roteiro escrito e ele esteve tentado a
protagonizá-lo. Mas, como diria um velho sábio, sempre tem um porém... Huck não
está em um programa de auditório. E não é tão “novo” assim.
Apesar
de ter apagado as fotos de suas redes sociais, Huck não poderia fazer esquecer
que posou com Aécio em plena torcida na apuração de 2014. Pouco adiantaria
dizer que “se decepcionou” com o amigo. Também não poderia negar ser ou ter
sido muito próximo de Eike Batista e Sérgio Cabral, que, aliás, fez um decreto
para garantir o seu “direito” de manter um casarão em Angra dos Reis que
invadiu uma área pública.
Seria
ainda lembrado, se fingisse esquecer, do episódio das camisetas utilizadas por
crianças com a frase “Vem ni mim que eu tô facin”, à venda no site de uma
empresa sua. A mais recente pedrada no telhado de Huck foi a divulgação de um
empréstimo tomado no BNDES, com juros subsidiados, para comprar um jato
particular. Um pouco incoerente com a ética “renovadora” e “liberal” da estrela
global.
Ainda
assim, Huck surge (surgia?) como possibilidade real de solucionar um impasse
para a ordem. Pode ser um balão de oxigênio para manter a sobrevida da Nova República
por aparelhos, ao canalizar imaginariamente a insatisfação geral com a
política. Mas, conhecendo os personagens atrás das máscaras, a “solução” seria
de curto alcance. (Por Guilherme Boulos,
na CartaCapital).
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Ao lado de Aécio Neves e Ronaldo, Luciano Huck ganha o prêmio "Os Brasileiros do Ano". (Foto: Omar Freire/ Imprensa MG). |
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