Em 1833, 55 anos antes da abolição formal da escravatura, nascia no Rio de Janeiro um dos percursores da imprensa negra no Brasil (ver: Imprensa negra no Brasil do século XIX, de Ana Flávia Magalhães). Intitulado “O Mulato” ou “O homem de cor”, o jornal foi fundado pelo tipógrafo e escritor Francisco de Paula Brito e é considerado o primeiro a tratar das questões da população negra, denunciando e lutando contra a discriminação racial.
Editado
anonimamente, O Homem de Cor foi suspenso já na sua 5° edição. Apesar disso, a
perseguição das autoridades não foi suficiente para impedir que o periódico se
tornasse o carro-chefe do surgimento da imprensa negra no Brasil, sendo seguido
de títulos como o “Brasileiro Pardo”,
“O Cabrito”, “O Crioulinho”, entre outros.
O
jornal foi mais uma das formas utilizadas pelo povo preto para combater a
escravidão e as desigualdades formadoras deste país. No cabeçalho de todas as
publicações que ocorreram constava a transcrição do parágrafo 14º do artigo 179
da Constituição de 1824: “Todo o Cidadão pode ser admitido aos cargos públicos
civis, políticos e militares, sem outra diferença que não seja a de seus
talentos e virtudes”. Além disso, o jornal foi utilizado como uma ferramenta de
educação, conhecimento, entretenimento e avisos ao seu próprio povo, trazendo
poesias e também datas de falecimento, por exemplo.
Reprodução de O Homem de Cor |
A
iniciativa de criação desse tipo de jornal naquela época foi, sem dúvidas, um
ato revolucionário. Hoje, passados tantos anos, existem diversos portais de
informação e notícias nesse sentido, criados por, para e sobre pessoas e causas
do povo negro. Conhecer a questão da imprensa negra no Brasil em tempos de
escravidão mostra como a organização de uma rede de contato que visasse nossa
própria comunidade é coisa antiga e essencial.
À
época, as ideias de socialismo e anarquismo, por exemplo, não eram difundidas
no Brasil, mas a organização que o povo brasileiro encontrou para romper de
forma radical com a então mídia burguesa e racista é mais uma demonstração da
nossa história de luta e anseio por liberdade.
Como
Clóvis Moura aponta, com o tempo a imprensa negra “toma conotações de
reivindicação racial e social. Isso aconteceu em consequência do aguçamento da
luta de classes e da exclusão do negro dos espaços sociais mais remunerados e
socialmente compensadores na estrutura do sistema de capitalismo dependente que
se formou após a Abolição”.
Ainda
nas palavras dele: “A imprensa negra
ficou na penumbra, como se fosse pouco significativa. A sua importância foi
desgastada por uma visão branca da imprensa, que marginalizou os jornais negros
impressos […]. Assim como os negros foram marginalizados social, econômica e
psicologicamente, também foi marginalizado culturalmente, sendo, por isso, toda
a sua produção cultural considerada subproduto de uma etnia inferior ou
inferiorizada.”
Sendo
assim, é tarefa de cada um e cada uma que luta pelo fim da discriminação racial
resgatar cada vez mais profundamente nosso histórico de luta em todos os
âmbitos da vida social, difundir e fortalecer espaços da imprensa e da mídia
como um todo onde nossas narrativas contra a direitização da imprensa e a
colonização do pensamento possam ser colocadas.
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Por
Karol Lima, no A Verdade.
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