Por
Maria Pionório, na Revista Parâmetro
Simone
de Beauvoir sem sombra de dúvidas foi uma das figuras mais importantes do
feminismo, conquanto não quisesse ser relacionada com este termo. Como afirma
em A força das coisas “nunca nutri a ilusão de transformar a condição feminina,
ela depende do futuro do trabalho no mundo (…) É por isso que eu evitei me
fechar no que chamam de ‘o feminismo’.” (BEAUVOIR, 1963, p. 267). Dramaturga,
escritora e filósofa existencialista Simone de Beauvoir juntamente com Jean –
Paul Sartre foi uma das fundadoras da revista Os Tempos Modernos (Les Temps
Modernes em francês) criada em 1945, periódico este que se caracterizava por
suas posições radicais consideradas esquerdistas. Beauvoir publicou mais de 20
obras e seus escritos estão separados em ensaios, romances e memórias.
Beauvoir publicou mais de vinte obras. |
Dentre
seus livros mais famosos não poderia deixar de citar O segundo sexo, obra que a
consagrou no rol das escritoras feministas em 1949 e que causou grande reboliço
no Vaticano que o colocou no index e Os Mandarins (1954) obra que lhe concedeu
o disputado prêmio de literatura francesa Goncourt.
Além
das obras citadas, Simone de Beauvoir publicou as seguintes obras: A Convidada
(1943), O Sangue dos Outros (1945), Todos os Homens são Mortais (1946), Por uma
Moral da Ambigüidade (1947), Deve-se Queimar Sade? (1955), O Pensamento de
Direita, Hoje (1955), A Longa Marcha (1957), Memórias de uma Moça
Bem-Comportada (1958), A Força da Idade (1960), A Força das Coisas (1963), Uma
Morte Muito Suave (1964), A Velhice (1970), Balanço Final (1972), Quando o
Espiritual Domina (1979), A Cerimônia do Adeus (1981), dentre outras mais cujas
traduções não foram realizadas para o português.
A
obra de Simone de Beauvoir não se circunscreve apenas as questões feministas de
sua época, ao contrário sua obra ultrapassa o dialogo do feminismo e
preocupa-se intensamente com a questão da liberdade. Em sua obra Por uma Moral
da Ambigüidade Simone afirma “(…) o indivíduo é definido apenas por sua relação
com o mundo e com outras pessoas, ele só existe por transcender a si. E sua
liberdade só pode ser alcançada através da liberdade dos outros.” (BEAUVOIR,
2004. p.125).
Beauvoir
defende a ideia de que a liberdade não deve ser concebida como a liberdade de
uns contra os outros, mas sim a liberdade de todos (o que muitas correntes do
movimento feminista não entendiam). Beauvoir entendia a liberdade como um
compromisso, compromisso com o outro e consigo mesmo e em uma de suas célebres
frases declara “Eu existo fora de mim, e por toda parte do mundo não há uma
polegada sequer de meu caminho que não se insinue num caminho alheio.”
É
devido a sua abordagem crítica filosófica, como afirmam muitos estudiosos de
sua obra que Simone é considerada uma mulher à frente de seu tempo. E
justamente por isso é que seria um erro pensar que suas obras estão
ultrapassadas. Ao contrário, quanto mais se lê Simone de Beauvoir maior é a
certeza de que seus escritos ainda são essenciais para refletirmos e
repensarmos nossas ações.
O
legado de Simone de Beauvoir tida como pioneira do feminismo (embora não
gostasse desse rótulo) influenciou de forma significativa os estudos e
discussões sobre o movimento feminista, contudo penso que o conjunto de sua
obra não deve ser lembrado apenas pelo advento do feminismo, mas sim pela a sua
audácia em expor suas ideias e contraposições de maneira singular defendendo a
liberdade de expressão, bem como os ideais existencialistas em que acreditava e
praticava.
Geralmente
as pessoas lembram Simone de Beauvoir associando-a apenas a uma única obra: O
segundo sexo e esquecem que seus escritos contribuíram para a sociedade
transcendendo a esfera do feminismo e abordando vários conceitos da vida
cotidiana. Por exemplo, em Todos os Homens são Mortais Beauvoir realiza uma
profunda reflexão sobre o sentido da existência humana, em A Velhice critica as
ações da sociedade perante os idosos e em A Convidada expõe as alternativas
existencialistas da liberdade, da ação e da responsabilidade individual.
Talvez, uma de suas maiores heranças seja a reflexão da mulher como o “outro” e
que nos dias atuais podemos alocá-la para uma concepção mais ampla. O “outro”
pode ser entendido atualmente como o diferente (as diferentes etnias, o
pluralismo de religiões, as diferentes opções sexuais e etc.), ou seja, quantos
e tantos “outros” nós construímos ao longo de nossa história por meio de nossa
cultura? Além disso, o “outro” pode ser entendido como o diferente e o igual ao
mesmo tempo, o oposto de mim, dentro de mim, ou seja, o “outro” também somos
nós!
Na
medida em que construímos “outros” em nosso cotidiano, haja vista que o ser
humano pode ser entendido como um ser multifacetário que busca incansavelmente
corrigir-se para superar suas limitações. O ser humano vive em um processo
contínuo de construção e como afirma Pedro Goergen “é um “ser a caminho de si mesmo”
e ele é o único que pode percorrer esta estrada.” (GOERGEN, 2005, p. 84).
Está
aí uma proposta interessante de estudo que merece ser mais bem abordada e
porque não pelo viés da obra de Simone de Beauvoir. Enfim, Simone de Beauvoir
realmente foi uma mulher à frente de seu tempo e ainda há de nascer alguém que
ultrapasse a grandeza de seu legado.
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