Com
a palavra, Juca Ferreira, Ministro da Cultura, quando participou, em 2007, como
secretário executivo do MinC, de um evento em celebração da cultura dos povos
indígenas:
“É uma grande alegria para mim e para todos
nós, do Ministério da Cultura, estarmos hoje aqui celebrando a diversidade da
cultura dos povos indígenas do Brasil. Esta é uma oportunidade para que todos
os brasileiros comecem a perceber que aqueles que nos acostumamos a chamar, de
uma maneira genérica e redutora, de ‘índios’, constituem, na verdade, um
conjunto de povos muito diferentes entre si, povos com uma extraordinária
diversidade cultural. Construímos um país sincrético, múltiplo e diverso. (…)
Temos hoje consciência de que nós, brasileiros em geral, somos o que somos em
grande parte graças a vocês, indígenas.
Podemos considerar como evidente
que toda relação intercultural saudável implica o respeito ao outro e o desejo
de compreendê-lo por aquilo que ele é, e não através do filtro do nosso próprio
condicionamento. As culturas são como rios, como disse o antropólogo Marshall
Sahlins, pois não se pode mergulhar duas vezes nas mesmas águas, porque elas
estão sempre mudando. E quanto maior for o grau de partilha, mais democrática,
criativa e tolerante será nossa sociedade.
Nesse sentido, é normal que, num
dado momento do seu desenvolvimento, uma sociedade seja levada a abandonar ou a
modificar esta ou aquela forma tradicional de sua cultura, na medida em que
esta não responde mais às aspirações antes cultivadas. Não fazer esta
modificação seria levar à cultura à esclerose e ao imobilismo.
Mas o que hoje consideramos como
grande risco é a perda da memória, da história desses povos. Conjuntos inteiros
de conhecimentos, fielmente transmitidos de uma geração para outra durante
séculos de tradição oral, estão desaparecendo por falta de receptores e de
estruturas adaptadas à sua transmissão. Estou pensando em particular no imenso
domínio dos mitos e de outras histórias tradicionais, portadores de sabedorias
ancestrais e fontes de saberes e de formas de vida incomparáveis. Estou
pensando na grande quantidade de línguas ameaçadas.
Durante dez mil anos os povos
indígenas acumularam valiosos saberes, culturas, artes e tecnologias
extremamente sofisticadas. Aprenderam a viver em seus diferentes ecossistemas,
seja a floresta tropical, o cerrado ou os pampas, onde identificaram inúmeros
tipos de árvores frutíferas e desenvolveram uma medicina própria a partir dos
conhecimentos tradicionais.
Também desenvolveram um rico
patrimônio artístico que vai desde a cerâmica, a tecelagem e a arte plumária
até a arquitetura, os grafismos corporais. Tiveram primazia no campo da
astronomia e desenvolveram técnicas de caça, pesca e coleta. Sem nos esquecer
de que toda atividade indígena está impregnada de senso estético, o que
demonstra o nível de sofisticação e sensibilidade desses povos.
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#ArteKusiwa
#PatrimônioMundial – A arte Kusiwa celebra 12 anos de reconhecimento como
Patrimônio da Humanidade. O título concedido pela Unesco, em 2003, ressalta a
importância desta representação para os povos indígenas Wajãpi, no Amapá. Além
de simbolizar um adorno, a pintura está diretamente ligada ao cotidiano, à
organização social da comunidade e aos conhecimentos tradicionais passados de
pais para filhos.
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Essas manifestações têm despertado
interesse crescente da sociedade, envolvendo fins científicos, informativos,
educacionais e comerciais. Da mesma forma, as nossas manifestações culturais
têm interessado os indígenas, como computadores, internet banda larga, câmera
digital, ilhas de edição etc. Gravam seus próprios filmes e CDs. Esta interação
é positiva. Afinal, essas trocas constantes e essa antropofagia cultural fazem
parte das vitalidades das culturas.
Devemos, sim, valorizar suas
culturas, mas sem pretender congelá-las, nem preservá-las de uma forma
artificial, até porque hoje muitos indígenas precisam recriar linguagens e
costumes, ou seja, reinventar-se para criar um presente a partir de um passado.
O desafio de implementação no
Brasil dos princípios da Convenção da Unesco sobre a Proteção e a Promoção das
Expressões Culturais passa pela criação de políticas públicas capazes de
abranger a perspectiva dos diferentes povos que contribuem para a construção do
cenário cultural brasileiro.
(…) Ao Ministério da Cultura cabe a
tarefa da desconstrução das representações de desigualdade na cultura
brasileira. Para todos nós, a diversidade cultural brasileira e mundial deve
ser libertada de todas as formas de racismo, discriminação e preconceitos de
modo que seja possível a democracia cultural e o convívio fraterno entre os
povos.”