Um
papel sintético feito de plástico reciclado - resultado de pesquisa
desenvolvida com apoio da FAPESP - está ajudando a preservar o conhecimento
sobre plantas medicinais transmitido oralmente há séculos pelos pajés do povo
Huni Kuĩ do rio Jordão, no Acre.
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Foto/divulgação/Gustava Miranda |
Descrições
de 109 espécies usadas na terapêutica indígena, bem como informações sobre a
região de ocorrência e as formas de tratamento, foram reunidas no livro Una Isĩ
Kayawa, Livro da Cura, produzido pelo Instituto de Pesquisa do Jardim Botânico
do Rio de Janeiro (IJBRJ) e pela Editora Dantes.
A obra teve uma tiragem de 3 mil exemplares em papel comum, cuchê, voltada ao grande público e lançada recentemente no Rio de Janeiro e em São Paulo. Outros mil exemplares, destinados exclusivamente aos índios, foram feitos com papel sintético, que é impermeável e tem a textura de papel cuchê, com o intuito de aumentar a durabilidade no ambiente úmido da floresta. O lançamento foi realizado com uma grande festa em uma das aldeias dos Huni Kuĩ do rio Jordão.
O trabalho de pesquisa e organização das informações durou dois anos e meio e foi coordenado pelo botânico Alexandre Quinet, do Jardim Botânico do Rio de Janeiro. O grande idealizador do projeto, porém, foi o pajé Agostinho Manduca Mateus Ĩka Muru, que morreu pouco tempo antes de a obra ser concluída.
"O pajé Ĩka Muru era um cientista da floresta, observador das plantas. Há mais de 20 anos ele vinha reunindo esse conhecimento até então oral em seus caderninhos. Buscando informações com os mais antigos e transmitindo para os aprendizes de pajé. Ele tinha o sonho de registrar tudo em um livro impresso, como os brancos fazem, e deixar disponível para as gerações futuras", contou Quinet.
Também
conhecidos pelos nomes de "Kaxinawá" - termo que os índios não gostam
- , "gente verdadeira" ou "gente do cipó", os Huni Kuĩ
formam o grupo indígena mais numeroso do Acre. Sua presença vai até parte do
Peru. No Brasil, somam mais de 7 mil indivíduos, divididos em 12 diferentes
terras. O "livro da cura" retrata a terapêutica praticada nas 33
aldeias de uma dessas terras indígenas que se estende pelo rio Jordão.
Além
das informações sobre as plantas, a obra apresenta, por meio de relatos e
desenhos, um pouco da cultura do povo Huni Kuĩ, como seus hábitos alimentares,
suas músicas e suas concepções sobre doença e espiritualidade. Todo o conteúdo
está escrito em "hatxa kuĩ" - língua falada nas aldeias do rio Jordão
- e traduzido para o português.
De
acordo com Quinet, foram feitas cinco viagens à região acreana para a realização
da pesquisa, além de quatro períodos de residência de tradutores Huni Kuĩ no
Rio de Janeiro.
"Realizamos uma oficina que durou 15 dias e
reuniu os 22 pajés das aldeias do rio Jordão. Os capítulos do livro são, na
verdade, transcrições literais dos temas abordados por eles, organizados dentro
da sistemática indígena. Apenas sofreram revisões para facilitar a compreensão",
contou Quinet.
Das
351 espécies elencadas pelos pajés como medicinais, os pesquisadores coletaram
196 amostras - resultando na seleção das 109 plantas que integram o livro. O
material botânico foi identificado de acordo com as técnicas taxonômicas e
depositado no herbário do Instituto de Pesquisa do Jardim Botânico do Rio de
Janeiro.
Via
Planeta Sustentável
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