20 de fevereiro de 2022

Países africanos ganham de volta arte roubada na era colonial

 

Os dois Bronzes de Benin de volta ao palácio do Obá. (FOTO/ Tife Owolabi/REUTERS).

Dois Bronzes de Benin foram devolvidos ao seu lar natal, 125 anos depois que soldados britânicos os roubaram da África Ocidental. Uma cerimônia neste sábado (19/02) celebrou o retorno dos dois objetos de arte, um representando um galo e o outra a cabeça de um rei, ao palácio de Obá, na cidade de Benin, que fica na Nigéria.

"Elas não são apenas arte, mas objetos que realçam o significado de nossa espiritualidade", disse um porta-voz do palácio de Obá, Charles Edosonmwan.

Os Bronzes de Benin são uma coleção de milhares de peças criadas desde o século 16 que estavam no palácio real da cidade do Benin quando foram saqueadas pelas forças britânicas, em 1897. Hoje, estão espalhadas por museus na Europa e nos Estados Unidos.

As peças entregues ao palácio de Obá estavam na Universidade de Aberdeen e no Jesus College Cambridge, no Reino Unido, as primeiras instituições do mundo a devolver Bronzes de Benim à Nigéria, no ano passado – a cerimônia só foi realizada neste ano.

Na época, o professor Abba Isa Tijani, diretor-geral da Comissão Nacional de Museus e Monumentos da Nigéria, exortou "outros museus e instituições em todo o mundo a aproveitar essa oportunidade e seguir o exemplo".

Muitas peças seguem fora da África

Durante a era colonial, muitas peças de arte africanas foram obtidas ilegalmente e acabaram em coleções europeias. Como resultado, estima-se que 80% a 90% do patrimônio cultural da África subsaariana esteja em museus ocidentais.

Apenas o Musée du Quai Branly-Jacques Chirac, em Paris, guarda cerca de 70 mil objetos africanos, e o Museu Britânico em Londres tem mais dezenas de milhares.

O Reino Unido, a Bélgica, a Holanda e a Alemanha receberam pedidos de países africanos para devolver tesouros saqueados na era colonial.

Em abril de 2021, a Alemanha anunciou um plano para enviar, a partir deste ano, centenas de peças dos Bronzes de Benin de volta para a Nigéria.

Benin expõe peças devolvidas pela França

Enquanto os nigerianos saudavam o retorno dos dois bronzes à cidade de Benin, na Nigéria, o presidente do país vizinho Benin abriu uma exposição de obras de arte históricas devolvidas pela França em 2021.

As 26 peças haviam sido roubadas em 1892 por forças coloniais francesas do antigo reino de Dahomey, no sul do atual Benin.

A exposição "Arte do Benin ontem e hoje" estava "devolvendo ao povo beninense parte de sua alma, parte de sua história e de sua dignidade", disse o ministro da Cultura, Jean-Michel Abimbola.

Abimbola afirmou que havia conversas em andamento para a devolução de outros objetos, incluindo uma escultura do deus Gou, que ainda está no Louvre, em Paris.

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Com informações do DW e do Reuters, AFP.

Abdias do Nascimento terá obra exposta pelo Masp

 

Abdias do Nascimento foi um dos maiores ativistas do movimento negro no Brasil . (FOTO/ Paulo Moreira/ Agência O Globo).

O MASP — Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand apresenta, de 25 de fevereiro a 5 de junho de 2022, a mostra Abdias Nascimento: um artista panamefricano, que ocupa os espaços da galeria e do mezanino, no 1 o subsolo do museu. Com curadoria de Amanda Carneiro, curadora assistente, e Tomás Toledo, curador-chefe do MASP, a exposição está inserida no biênio dedicado às Histórias Brasileiras no museu e exibe a faceta artística deAbdias Nascimento (1914-2011), intelectual, ativista político, dramaturgo, ator, escritor e diretor.

A exposição tem patrocínio do escritório Mattos Filho e apoio cultural do IPEAFRO, instituiçãofundada em 1981 pelo artista e que guarda seu acervo.

Figura fundamental para a história do país, Nascimento desempenhou papéis que marcaram o século 20 em diversos campos, tais como a política, a cultura e a intelectualidade.

Suas pinturas associam orixás à abstração geométrica, formas livres a símbolos africanos —como os adinkras —, além de explorarem gêneros mais tradicionais, como paisagens e retratos.

No Brasil, seu trabalho artístico ainda merece maior atenção e esta é, portanto, a razão da exposição Abdias Nascimento: um artista panamefricano e do catálogo que a acompanha.

Reunindo 62 pinturas — desde o início de sua produção em 1968 até o ano de 1998 —, amostra enfatiza o repertório de ideias, cores e formas do movimento pan-africanista, com noções, fontes e imaginário ladino-amefricano — termo cunhado por Lélia Gonzalez (1935-1994), amiga e interlocutora política e intelectual do artista e formuladora do conceito de amefricanidade para se referir à experiência negra na América Latina.

A mostra retoma conceitos formulados por Nascimento, como o quilombismo, para destacar o projeto de transformação social sobre bases que retomam a experiência dos quilombos. O artista materializou seu pensamento também na pintura homônima, presente na exposição e visualmente representada pela união do tridente de Exu aos ferros de Ogum, divindades iorubás que se popularizaram no Brasil com a umbanda e o candomblé.

Em 1968, ano que marca o início de sua produção de pinturas e sua mudança para os Estados Unidos, Nascimento já era um nome laureado no Brasil. Participou da formação da Frente Negra Brasileira, movimento e depois partido político criado na década de 1930, e dafundação do Teatro Experimental do Negro, o TEN, uma das mais radicais experiências de dramaturgia do país, nos anos 1940; realizou o concurso Cristo de cor, que contou com diversos artistas, como Djanira da Motta e Silva (1914-1979), para a representação de um Jesus negro, em 1955; e na mesma década idealizou o Museu de Arte Negra, cujo acervo é referência nos debates sobre museus e comunidades. Já seus trabalhos de artes visuais foram mais celebrados em solo estadunidense, onde realizou exposições nos conceituados Studio Museum em Harlem, Nova York; Museum of Fine Arts, em Syracuse; e Crypt Gallery, da Universidade de Columbia.

Parte das pinturas desta mostra apresenta ao público a pesquisa de Nascimento sobre símbolos e bandeiras de projetos e identidades nacionais, que podem ser lidas de uma perspectiva simultaneamente pan-africanista e amefricanista.

Os trabalhos Okê Oxóssi e Xangô, ambos de 1970, por exemplo, estabelecem paralelos entre representações do Brasil e dos Estados Unidos por meio de uma recomposição de símbolos nacionais, mais especificamente os elementos de suas bandeiras. Segundo Amanda Carneiro, curadora da exposição, “ao subverter o sentido das bandeiras, incorporando referências de matriz africana, questionam-se medidas de incorporação (ou seria retomada?) de signos culturais mais plurais, não exclusivamente alicerçados no eurocentrismo, repensando as comunidades imaginadas”. Okê Oxóssi, inclusive, pode ser considerada um dos grandes pontos de partida para a mostra individual de Abdias Nascimento no MASP. A pintura — doada ao acervo do museu em 2018 no âmbito da mostra Histórias Afro-Atlânticas por Elisa Larkin Nascimento, cofundadora e atual presidente do Instituto de Pesquisas e Estudos Afro-Brasileiros (Ipeafro) — ganha agora novos significados no contexto expositivo dedicado a histórias brasileiras, em conjunção com a extensa produção do artista.

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Com informações da Revista Raça.

19 de fevereiro de 2022

Em Olinda, lei proíbe homenagear a escravidão e pessoas ligadas à ditadura

 

Rua com nome de senhor de engenho, em Olinda - Rua Bernardo Vieira de Melo - Divulgação/Google Street View.

Na última quinta-feira, 17, foi divulgada a informação de que vereadores de Olinda, município de Pernambuco, aprovaram a primeira lei do Brasil que proíbe homenagens a escravocratas e pessoas relacionadas à ditadura militar no Brasil (1964 -1985).

Com a instauração da norma aprovada de forma unânime na Câmara Municipal, a alteração de nomes de ruas ou de locais públicos que atualmente homenageiam tais personalidades do passado está permitida.

A lei nº 6.193/2021 é de autoria do vereador Vinicius Castello (PT), segundo o político é necessário fazer uma análise de quem está sendo homenageado nas vias públicas da região. As informações são do portal de notícias g1.

O projeto vem para evidenciar que não mais cabe fazer homenagens dentro de uma democracia a figuras que representem vergonha, genocídio e morte, afirmou Castello.

Segundo revelado na reportagem, o vereador realizou um levantamento que apontou que pelo menos 13 escolas, ruas, avenidas, bustos e estátuas podem ter os nomes alterados, já que não seguem os critérios da nova regra.

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Com informações do Aventuras na História.

Alvos durante e após o Reich: a saga dos gays perseguidos pelos nazistas

 

Prisioneiros homossexuais em Buchenwald - Museu Estadunidense Memorial do Holocausto (USHMM).

Durante a Segunda Guerra Mundial, o regime nazista perseguiu e aniquilou cerca de 6 milhões de judeus. Entretanto, o grupo não foi o único a ser caçado incessantemente: negros, ciganos, Tersemunhas de Jeová, deficientes e homossexuais também se tornaram alvos do Terceiro Reich.

A perseguição contra o último grupo citado, aliás, começou a ocorrer bem antes do início do conflito — em 1º de setembro de 1939. Desde quando o Partido Nazistas ascendeu ao poder, em 1933, os homossexuais passaram a ser repreendidos.

Sob as leis do parágrafo 175 do estatuto do código penal alemão, os nazistas prenderam cerca de 100.000 homossexuais, sendo que pouco mais da metade desse número acabou sendo condenado. Em casos mais extremos, muitos foram levados aos campos de concentração.

Embora, segundo artigo publicado pelo Museu Memorial do Holocausto dos Estados Unidos (United States Holocaust Memorial Museum), nem todos os presos que foram enquadrados no parágrafo 175 fossem identificados como gays, qualquer homem que tivesse relações com outro homem poderia ser preso na Alemanha nazista — independentemente de como ele entendesse sua própria sexualidade.

O parágrafo 175

De acordo com o parágrafo 175 do estatuto do código penal alemão, era proibido que qualquer ato sexual fosse praticado entre homens, o mesmo não se aplicava às mulheres, conforme aponta o USHMM.

O estatuto fazia parte da Seção Treze do Código Penal Alemão, que regulamentava os chamados “Crimes e Ofensas contra a Moralidade”. Bigamia, incesto, agressão sexual e bestialidade também se enquadravam no artigo.

Embora o parágrafo 175 fizesse parte do código penal alemão desde o período imperial alemão (1871-1918), e também se fez presente durante a República de Weimar (1918-1933), ele se tornou ainda mais rígido quando o Terceiro Reich assumiu o poder. Importante ressaltar que o artigo foi aplicado de forma diferente de acordo com os governos e regimes citados.

Para se ter ideia disso, apesar do parágrafo 175 criminalizar os atos sexuais entre homens, se identificar como gay nunca foi considerado um crime na Alemanha. Entretanto, com o nazismo, a perseguição ao grupo se tornou mais brutal e constante.

A consolidação de comunidades gays pré-Guerra

Na parte final do século 19, as comunidades gays floresciam pela Alemanha. Com o crescimento, também se tornava mais frequente o debate sobre a natureza da sexualidade humana, não só na Europa como também nos Estados Unidos.

A Alemanha encabeçava essa discussão, principalmente por conta do parágrafo 175, que foi promulgado em 1871. As condições políticas e sociais da época permitiu com que grupos fizessem campanhas públicas em prol da descriminalização das relações homossexuais entre homens e pela revogação do parágrafo 175. Assim, iniciou-se a organização de grupos com esses ideais.

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Por Fabio Previdelli, no Aventuras na História. Leia o texto completo aqui.

18 de fevereiro de 2022

Degola, linchamento e cassação: gente negra pode mesmo eleger e ser eleita?

 

Ana Flávia Magalhães (Foto: Webert da Cruz).

Imagina se uma vereadora negra de Catanduva (SP) e um vereador negro de Curitiba (PR) tivessem seus mandatos ameaçados de cassação após participarem de atos contra o racismo e por justiça para o jovem congolês Moïse Kabagambe e Durval Teófilo Filho, assassinados no Rio de Janeiro?

A previsão desse desfecho escapou até mesmo a exímios pessimistas. Mas essa é a situação vivida respectivamente por Taise Braz e Renato Freitas, ambos do Partido dos Trabalhadores (PT) e alvo de acusações de quebra de decoro parlamentar. Os dois teriam violado regras de conduta perante monumentos históricos, especificamente ligados à igreja católica.

O imbróglio começou a ser montado no dia do ato por Moïse em Curitiba, em 5 de fevereiro, quando Renato Freitas e outros manifestantes entraram na Igreja Nossa Senhora do Rosário dos Pretos de São Benedito, após a missa daquele sábado, como forma de encerrar a manifestação que ocorria na praça pública que circunda a construção. Essa teria sido a violação.

A propósito, a edificação da igreja original remonta ao século 18, quando pessoas negras escravizadas, libertas e livres vinculadas às irmandades do Rosário e de São Benedito, muitas com origem na região do Congo, se empenharam para ter um espaço para praticar sua fé católica. Em 1931, a antiga construção foi demolida e substituída pela atual, de 1946, na qual foram mantidos azulejos que decoravam a primeira. Embora a gestão do espaço tenha se alterado, a Igreja do Rosário segue associada à presença negra no Paraná.

Voltando à manifestação que terminou com a ocupação do templo, nenhuma pessoa foi agredida, nem o espaço foi profanado material e simbolicamente. As imagens mostram manifestantes ocupando os bancos, falando e ouvindo sobre informações que justificavam atos como aquele em todo o país. Todavia, o episódio serviu de deixa para uma onda de acusações de desrespeito religioso. Quatro representações contra o vereador Renato Freitas foram admitidas pela Mesa Diretora da Câmara de Curitiba, na quinta-feira seguinte, 10.

Mensagens falsas

No dia 12 de fevereiro, foi a vez de Taise Braz se ver envolvida em acusações semelhantes em Catanduva. Na cidade do interior paulista de pouco mais de 120 mil habitantes, entidades de movimento negro e partidos políticos de esquerda promoveram uma roda de conversa na Praça da Matriz, que também leva o nome de Monsenhor Albino.

No local há uma estátua de Albino Alves da Cunha e Silva (1882-1973), padre português que migrou para o Brasil após a implantação da República no país europeu em 1910, instalou-se em Catanduva em 1918 e se tornou uma figura símbolo da cidade. Ao longo da vida, esteve envolvido com a construção da igreja matriz, hospitais, escolas, faculdades, entre outras obras no município.

Seja porque as pessoas presentes viram a estátua como patrimônio de todos ou por essa representar algo a ser problematizado, o fato é que o registro da atividade aconteceu justamente em volta da imagem de Padre Albino, que foi decorada com uma bandeira do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL). A sigla, portanto, nem era a do partido de Taise Braz, mas isso não impediu que detratores tentassem enquadrá-la como mais uma violadora do catolicismo, tal como feito com Renato. Até o momento, nenhuma representação foi formalizada na Câmara Municipal de Catanduva, mas a circulação de mensagens falsas nas redes sociais já fez bastante estrago.

Os comentários acerca desses dois casos poderiam se encerrar com alguma piada sobre exageros, numa perspectiva bem abstrata. Ou ainda, enveredar por um debate sobre patrimônio histórico sem lidar com temas sensíveis de nossa formação nacional. Porém, o que está acontecendo com Taise e Renato se soma a uma série de outros episódios de tentativa ou mesmo de efetiva interdição da participação de pessoas negras no chamado jogo político democrático da República brasileira.

Na verdade, depois da brutal execução de Marielle Franco, é preciso estar muito à vontade com o racismo na política e no cotidiano para não admitir a gravidade do que tem acontecido com vereadoras e vereadores negros, como: Ana Lúcia Martins (Joinville); Benny Briolly (Niterói); Bruna Rodrigues, Daiana Santos, Karen Santos, Laura Sito e Matheus Gomes (Porto Alegre); Andréia de Jesus (Belo Horizonte); Paolla Miguel (Campinas); Carol Dartora (Curitiba), entre outros exemplos. Isso sem falar de deputados e deputadas estaduais e federais.

O próprio vereador Renato Freitas, após um conflito durante uma manifestação em julho de 2021, chegou a ser preso por policiais militares, que empregaram um método muito semelhante ao que levou à morte de George Floyd, em maio de 2020. Ou seja, não adiantou ser vereador, nem ter se formado bacharel e mestre em direito pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), onde defendeu a monografia “Abolicionismo ou barbárie: elementos para uma crítica do direito” (2012); e a dissertação de mestrado “Prisões e quebradas: o campo em evidência” (2017). Renato era e segue sendo visto como incompatível com a condição de vereador e de sujeito de direitos.

Os mesmos dramas do primeiro deputado federal negro

As experiências desses vereadores, aliás, guardam várias semelhanças com o vivido por Manoel da Motta Monteiro Lopes, considerado por muitos o primeiro deputado federal negro da República. Sua trajetória tem sido estudada pelos historiadores Carolina Vianna Dantas e Juarez Silva Júnior e está repleta de episódios de discriminação racial ora assumidos, ora mal dissimulados. Monteiro Lopes nasceu negro e livre na cidade do Recife, Pernambuco, em 1867, filho de pai e mãe também negros. Formou-se pela Faculdade de Direito de Recife, mas logo se mudou para o Amazonas e, em seguida, para o Rio de Janeiro, onde se fixou a partir de 1893.

Bastante envolvido com as causas operárias, foi eleito como membro do Conselho Municipal do então Distrito Federal em 1903, mesmo sem ter vínculo partidário. Tentou a reeleição no ano seguinte, mas não foi empossado, apesar de uma expressiva votação. Era a chamada degola eleitoral, uma fraude que interditava a participação de figuras indesejadas, algo bem comum nos pleitos da Primeira República (1889-1930). Em 1905, mais uma vez sem apresentar vinculação partidária, candidatou-se a deputado federal. Novamente, ganhou, mas não levou. Mais uma degola o impediu de ser reconhecido e diplomado.

Isso, porém, não o fez desistir. Em 1909, apresentou candidatura pelo Partido Republicano Democrata e promoveu uma mobilização de norte a sul do país, chegando a atravessar as fronteiras nacionais. Na campanha, o enfrentamento ao “preconceito de cor” foi motivo da adesão de muita gente, embora não se tratasse de uma agenda política explicitamente defendida por ele. Talvez porque sua própria presença já fosse barulhenta demais, sobretudo se considerarmos os insultos racistas de toda ordem que recebia nas páginas de jornais e revistas, e, por certo, em outros espaços sociais.

A estratégia funcionou e foi comemorada por várias pessoas negras e mais outras muitas brancas que se sentiam representadas por Monteiro Lopes. Trata-se de um episódio que desafia a ideia de povo alienado, que não se importa com a política. Ao mesmo tempo, é também um fato histórico que, quando aproximado a outros de temporalidades variadas, nos convida a refletir sobre a viabilidade do exercício do direito político de votar e ser votado para pessoas negras no Brasil.

Lamentavelmente, Monteiro Lopes faleceu em dezembro de 1910, poucos meses depois de empossado, aos 43 anos. Sua experiência não foi exaltada pelos anais do parlamento brasileiro por muito tempo. Caiu no esquecimento e outra candidatura com aquela empolgação não se repetiu no pleito seguinte. O que vimos em nosso percurso republicano foi uma presença negra numericamente tímida e encurralada, tendo que coexistir com as estatísticas de linchamentos e genocídio a atingir uma maioria de cidadãs e cidadãos negros brasileiros.

Nesse cenário, quem ganha com a deslegitimação ou mesmo a cassação de mandatos como os de Renato Freitas e Taise Braz perante eleitores negros ou brancos com compromisso antirracista?

Estamos em ano eleitoral e é fundamental questionar: que garantias essa Nação oferece para que UM OU UMA DE NÓS esteja nesses espaços institucionais com condições de exercer seu mandato com a coerência que esperamos? Nossa condição de eleitores serve para quê?

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Por Ana Flávia Magalhães, originalmente no Uol

*Ana Flávia Magalhães Pinto é integrante da Rede de Historiadoras Negras e Historiadores Negros.

Renafro lança pesquisa sobre intolerância religiosa no Brasil

 

(FOTO/ Reprodução).

A Rede Nacional de Religiões Afro-Brasileiras e Saúde (Renafro) e o Ilê Omolu Oxum lançam nesta sexta-feira (11), uma pesquisa que irá mapear o racismo religioso no Brasil, a partir dos 53 Núcleos Regionais da rede, situados em todo o território nacional. A ideia é organizar um verdadeiro raio-x sobre a violência contra os povos de religiões de matriz africana, a partir de um formulário dirigido às lideranças religiosas.

Além do objetivo principal, focado no crescente número de casos de intolerância religiosa, será possível também traçar um perfil dos terreiros, suas tradições e relações com a comunidade com esta pesquisa inédita, que só é possível graças ao apoio da organização internacional Raça & Igualdade. De acordo com a Coordenadora Nacional da Renafro e idealizadora do projeto “Respeite o meu terreiro”, Mãe Nilce de Iansã, “é preciso revelar onde e de que formas o racismo religioso se manifesta e fomentar ações protetivas de combate à escalada da violência, contra as religiões de matriz africana”, afirma.

Durante os próximos três meses, as informações coletadas com a pesquisa serão compiladas e analisadas pelo projeto e o seu resultado será entregue ao Ministério Público Federal, Comissão de Direitos Humanos (Senado Federal), Comissão de Direitos Humanos e Minorias (Câmara dos Deputados), Comissão Nacional de Direitos Humanos (OAB), Conselho de Direitos Humanos (ONU), Comissão Interamericana de Direitos Humanos (ONU) e Comissão Interamericana de Direitos Humanos (OEA).

O projeto Respeite o meu terreiro” prevê ainda neste semestre, a realização de capacitação para líderes religiosos sobre direitos dos povos de terreiro, e também para os profissionais da área jurídica, em parceria com o Instituto de Defesa dos Direitos das Religiões Afro-Brasileiras (Idafro).

O formulário da pesquisa leva em média cinco minutos para ser respondido e estará disponível nas redes sociais da Renafro e Ilê Omolu Oxum, até o dia 30 de maio.

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Com informações do Notícia Preta.

Excludente, elitista e patriarcal: pesquisadora amplia olhar crítico sobre Semana de 22

 

Tropical, obra de Anita Malfatti: modernismo brasileiro buscou retratar uma identidade genuinamente brasileira - Reprodução.

É possível dizer que o centenário da Semana de Arte Moderna de 1922 vem levantando debates e críticas que, de certa forma, rememoram alguns dos questionamentos que o evento recebeu quando foi realizado, mas acrescentam novos e importantes pontos à discussão.

Idealizado por artistas que se tornaram símbolo do modernismo brasileiro, o acontecimento ambicionava romper com a linguagem tradicional da época e retratar uma identidade genuinamente brasileira. Mas, já na época, foi muito questionado.

Da parte dos conservadores, vinham críticas à estética modernista, sendo a Semana classificada por eles como "um escândalo" e "um fracasso". Além disso, mesmo contradições que parecem estar em pauta apenas atualmente já eram apontadas.

Quatro anos após o evento, o jornal Getulino, que defendia os direitos da população preta, publicou um artigo criticando as relações entre o modernismo e a elite cafeeira. O texto cita a Semana de Arte Moderna, que foi patrocinada por barões do café.

Em 1942, o próprio Mário de Andrade afirmou que o movimento do qual participou falhou em captar a realidade e não buscou "revolta" contra a situação da época. Nesse mesmo sentido, a falta de diversidade e de representação popular do encontro de artistas também foi apontada décadas depois, levantando análises até hoje.

O aniversário de 100 anos do evento vem acrescentando outras pautas à análise crítica do movimento. Em entrevista ao programa Central do Brasil, parceria do Brasil de Fato com a TVT, a escritora e pesquisadora Márcia Camargos fala sobre esses acréscimos ao debate sobre a Semana de Arte Moderna.

Autora do livro Semana de 22 - Entre Vaias e Aplausos, ela é taxativa ao afirmar, no entanto, que os questionamentos não diminuem a importância e o legado da Semana para a arte e a cultura brasileiras. "A Semana de 22 teve uma importância muito grande, e a prova disso é que nós estamos aqui debatendo, passados 100 anos", destaca.

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Com informações do Brasil de Fato. Clique aqui e leia a íntegra da entrevista.

17 de fevereiro de 2022

Diretor da Globo é afastado após denúncias de racismo


 
Vinicius Coimbra. (FOTO/ Reprodução).


Na manhã desta quinta-feira (17), a jornalista Carla Bittencourt, do site Notícias da TV, revelou que a Globo afastou Vinicius Coimbra da direção da próxima novela das seis, Mar do Sertão, em razão das investigações de denúncias por segregação do elenco negro nos bastidores de ‘Nos Tempos do Imperador’. Coimbra foi substituído por Allan Fiterman.

A emissora oficializou a decisão na última terça-feira (15), em resposta à denúncia foi realizada pelas atrizes Roberta Rodrigues, Cinnara Leal e Dani Ornellas. De acordo com as informações do Notícias da TV, as atrizes alegaram falas preconceituosas vindas do diretor e de sua equipe. Elas também afirmam que em documentos, separações como ‘elenco branco’ e ‘elenco negro’ eram feitas pela equipe. Até mesmo os camarins eram separados nos estúdios da novela, conta o site.

Em janeiro, Roberta Rodrigues chegou a compartilhar em suas redes sociais uma nota de esclarecimento sobre a falta de um desfecho para sua personagem, afirmando que não foi motivada pelo fato de a atriz ter pego Covid-19: “Muitos seguidores, amigos e até alguns jornalistas tem me perguntado muito sobre meu final na novela “Nos Tempos do Imperador”.

Em respeito a todos vocês que me acompanham, e pela pessoa transparente que sempre fui, eu resolvi falar. NÃO, o que me afastou do fim novela NÃO FOI COVID-19. Eu tive Covid-19 em setembro/21 e cheguei a retornar às gravações dia 24 do mesmo mês. No dia 07 de Outubro /21 fiz teste de figurino e ensaio de dança para a personagem. Então, ao contrário do que está sendo propagado por aí, o real motivo de eu não estar na etapa final da novela tem a ver com outras questões.

Fake News é algo muito sério, então aos amigos jornalistas, que admiro demais, vale ressaltar a importância da responsabilidade de checar as informações antes de darem. Aos meus fãs e seguidores, não acreditem em tudo que leem na internet.

No demais, eu e minha assessoria estaremos sempre aqui à disposição para esclarecer qualquer coisa.Obrigada!”

Em janeiro, quando a novela foi indicada ao Prêmio APCA na categoria ‘Novela/Minissérie’, Dani Ornellas compartilhou um texto falando sobre o trabalho de pessoas negras na televisão. “ara muitas pessoas o trabalho de nós artistas da resistência dos 70 anos da Tv brasileira, os de melanina acentuada, a carne mais barata do mercado, os que sempre vão responder sim segundo vocês do mercado patriarcal do exército branco do audiovisual brasileiro. Vocês que não se dão ao trabalho de perceber nossa individualidade que nos chamam de elenco negro tentando nos coisificar, subtrair minha individualidade, estima e ancestralidade. Que passam por mim sem olhar para mim!!! Que não nos enxerga nem para o zero nem para o dez. Independente da doação diária para reviver dores dentro e fora de cena.Por tudo isso sou grata por cada pessoa que me escreve e me fala o quanto ficou emocionada vendo determinado trabalho ou cena. Esse reconhecimento alimenta minha gana de seguir”

Amparadas por um corpo jurídico, as atrizes também estão fazendo tratamento psicológico e psiquiátrico por estarem abaladas com os acontecimentos.

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Com informações da Revista Raça.