No
último dia 12 de abril a ministra dos direitos humanos Luislinda Valois falou
em nome das mulheres negras brasileiras afirmando que Michel Temer seria “um
padrinho das mulheres negras”. A Marcha de Mulheres Negras de São Paulo não
reconhece essa posição. Ao afirmar que Michel Temer tem feito bem para nós
negras deste país acaba demonstrando profundo desconhecimento de qual vem sendo
a posição apresentada pelo nosso movimento nos últimos anos.
Negro Belchior
- A política do apadrinhamento remete aos tempos coronelistas. Era através
dessa forma de lidar com as pessoas que a Casa Grande mostrava sua força junto
a população local e negra. Reivindicar isso é reivindicar que as mulheres
negras brasileiras são seres de segunda classe e que devem baixar a cabeça para
“padrinhos” brancos para assim poderem estar nos espaços de poder e da
política.
A
ministra pode se sentir apadrinhada por Michel Temer, pode falar em seu próprio
nome, mas não no nosso!
É
inconcebível para nós reconhecer um homem, branco, heterossexual, golpista e
representante direto da Casa Grande e da retirada de direitos da população
negra como padrinho. Em São Paulo, mais de 3 mil mulheres negras ocuparam as
ruas do centro no dia 25 de julho de 2016 denunciando o racismo e machismo
existente na política e também nos colocando na rua contra o governo Temer.
Luislinda pode acreditar que o golpista Temer é seu padrinho político, mas não
pode ignorar a intensa movimentação política que o movimento de mulheres negras
vem fazendo se colocando contra os ataques que temos sofrido e que se
aprofundam com o golpe.
Falar
que nossos passos vem de longe e que uma sobe e puxa outra tem um valor para
nós mulheres negras de nos reconhecermos no combate cotidiano contra o racismo
e o machismo. São os nossos corpos e daqueles que amamos que tombam todos os
dias pelas mãos do Estado racista e misógino enquanto os que apoiam o governo
de Michel Temer negam o racismo e o machismo, vociferam para que o genocídio da
nossa população continue acontecendo e que morramos presos. Nossos passos vem
de longe por que não baixamos a cabeça para aqueles que insistem em nos
exterminar.
Os
ataques que Michel Temer tem feito desde que assumiu a presidência nos atingem
diretamente. Luislinda deveria ter lembrado disso ao colocar em nossas bocas e
em nossos nomes posição que não reivindicamos. Houve corte de 61% do orçamento
federal para o combate à violência contra mulher e nós mulheres negras morremos
mais por causa de feminicídio e a ação deste governo golpista é nos relegar
ainda mais à morte.
O
desmonte da educação e saúde através do congelamento de investimentos por 20
anos é mais uma demonstração do quanto Temer não se importa com as nossas vidas
e dos nossos. Temos o fechamento de programas como a Farmácia Popular e o
aumento do valor da inscrição para o PROUNI. São as mulheres negras que mais
recorrem aos serviços públicos e que terão sua saúde e educação negligenciadas
por 20 anos.
Não
podemos esquecer também do carro-chefe do governo Michel Temer: a Reforma da
Previdência. A proposta de modificar a idade mínima para aposentadoria é uma
proposta para nos matar de trabalhar. A nossa expectativa de vida média no
Brasil é praticamente igual à proposta apresentada de idade mínima pelo
governo. Em algumas regiões chega a ser menor do que 65 anos. Temer não
aprofunda apenas a precarização das nossas vidas, mas inclui requintes de
crueldade para nossa morte.
A
ministra pode se sentir apadrinhada por Michel Temer, pode falar em seu próprio
nome, mas não no nosso! Ser mulher negra no Brasil, com tudo o que significou a
diáspora africana forçada e o processo de escravidão nesse país , não é fácil.
Enfrentamos violências cotidianas e Luislinda também vive isso e por viver isso
não pode nos colocar nesta posição subserviente à Casa Grande. Não aceitaremos
isso! Continuamos os passos de nossas ancestrais na luta contra o racismo e o
machismo, continuamos a resistência, nos aquilombamos e não ajoelhamos frente
àqueles que tiram de nós a nossa vida.
Seguimos
a nossa luta diária contra o racismo, machismo, misoginia, lesbofobia e
transfobia. Contra o genocídio da juventude negra, pela demarcação das terras
indígenas e quilombolas, contra a violência sexista que nos mata e estupra a
cada minuto e contra a retirada de direitos que Temer vem fazendo!
Temer
não é nosso padrinho! Estamos aqui pra dizer que nós fazemos por nós esse
enfrentamento cotidiano!