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Tornar-se negro é libertador

 

A jornalista Ana Cristina Rosa - Keiny Andrade/Folhapress.

Sempre me surpreendo quando uma pessoa negra afirma que nunca sofreu preconceito ou discriminação racial no Brasil. Não foi diferente quando soube do relato de uma mulher preta —a primeira a ocupar um alto posto numa instituição hierarquizada e historicamente comandada por homens brancos— que disse nunca ter enfrentado barreiras de raça ou de gênero para chegar aonde está.

Gostaria de poder acreditar. Mas, por mais que me esforce para respeitar a perspectiva do outro, esse me parece um feito impossível.

Especialmente diante das fartas e escandalosas evidências de racismo estrutural, institucional e sistêmico cada vez mais corriqueiras no nosso cotidiano.

Salvo algum caso absolutamente excepcional de “vida isolada e protegida” (que desconheço), não há homem ou mulher preto ou pardo que chegue à vida adulta incólume aos efeitos nocivos e degradantes do racismo no Brasil.

Por isso é preciso reconhecer e prezar o simbolismo e a força embutidos na presença de todo e cada negro que ascende social e culturalmente. Tratam-se de referências, exemplos de pertencimento, provas vivas de que temos o direito e a capacidade de ser e estar onde quisermos. Sobretudo numa sociedade machista e que se organizou a partir de uma lógica baseada num conceito de hierarquia racial que deprecia o que está distante do eurocentrismo e nega oportunidades diariamente à maioria da população, que é preta e parda.

Na obra “Tornar-se Negro”, a psiquiatra e psicanalista Neusa Santos Souza aponta o quanto é emocionalmente doloroso ser negro em uma sociedade de hegemonia branca. A ponto de alguns introjetarem o “padrão branco” como único caminho de mobilidade, adotando estratégias para ascensão cujo preço é a negação e o apagamento da própria identidade.

Neste novembro de 2022, mês da consciência negra, convido todos à reflexão sobre o que é ser negro no Brasil contemporâneo. Reconhecer-se negro é libertador.

___________

Por Ana Cristina Rosa, na Folha de São Paulo e reproduzido no Geledés.

Para encontrar Oliveira Silveira: O Poeta da Consciência Negra

 

Oliveira Silveira. (FOTO/ Divulgação/ LiteraturaRS).

 encontrei minhas origens

no leste

no mar em imundos tumbeiros

encontrei

em doces palavras

……..cantos

em furiosos tambores

………ritos

encontrei minhas origens

na cor da minha pele

nos lanhos de minha alma

em mim

em minha gente escura

em meus heróis altivos

encontrei

encontrei-as enfim

me encontrei

Esta escrita surge a partir das nossas vidas e se constrói com o objetivo de realizar um registro histórico que ao mesmo tempo em que é singular expressa uma vivência coletiva. Por isto, ela também é o encontro de nós mesmas, por um ideal comum – a luta pela consciência negra e a preservação das memórias de todos aqueles que vieram antes de nós e que brigaram muito para que chegássemos até aqui.

Nossa infância deu-se na década de 70. Foi naquele tempo que pela primeira vez pessoas negras reuniram-se em uma casa no bairro Bonfim, Porto Alegre, pretendendo dar início a estudos com o objetivo de encontrar uma data mais significativa ao povo negro, fugindo da narrativa de que sua liberdade teve por protagonistas pessoas brancas que defenderam o fim da escravização no Brasil.

O anfitrião era o Professor José Maria, sobre quem todos falavam como um amante do magistério, que cultivava a negritude. Ele abriu as portas de sua casa para que o genro, Oliveira Silveira,reunisse o Grupo Palmares, que fazia uma oposição ao dia 13 de maio, com o olhar crítico para a abolição da escravidão no Brasil.

Dali surgiu o primeiro ato evocativo do Grupo Palmares, no Clube Marcílio Dias, o qual apenas se realizou após obterem a licença da Censura (Afinal: o que um grupo de negros pretendia em reunião?).

 Firmou-se ali, em 1971, o primeiro 20 de novembro!

A data da morte de Zumbi dos Palmares emerge como referência de luta e o quilombo é reverenciado como espaço coletivo de fortalecimento e resistência em oposição a um sistema que não reconhecia identidade e subjetividade a negras e negros em nosso país.

Assim era Oliveira Silveira, também professor, poeta gaúcho, natural de Rosário do Sul, que sempre viu nos espaços coletivos uma possibilidade de fortalecimento:

— Ele sempre trabalhou com grupos! Terminava um grupo ele já formava outro e formava outro, mais outro!

Nossa ancestralidade e nosso presente são produtos de muitos grupos, pois somados talentos, experiências, habilidades, diferentes modos de pensar e agir, potencializam-se forças e a história é preservada!

Oliveira percebeu nas diversas tribos em África: grupos; nas pessoas em sofrimento nos navios negreiros: grupos; nos privados de liberdade das senzalas: grupos; nosquilombos:nossos mais valiosos grupos!

Depois da lei de Isabel, nas reuniões de família e amigos: grupos!Nos clubes sociais Marcilio Dias, Associação Satélite Prontidão, Floresta Aurora, formados apenas por pessoas negras: grupos!

Nas escolas de samba, Bambas da Orgia, Imperadores do Samba, União da Vila do IAPI: grupos.Sempre estivemos reunidos em grupos! 

E foram esses grupos – lugares existenciais de sociabilidade, refúgio e luta contra o racismo- que não permitiram e não permitem que sejamos eliminados, pois é no coletivo que encontramos sentido para nossas existências. Pela oralidade transmitimos, de uma geração para outra nossos conhecimentos, nossa sabedoria, hábitos alimentares, as curas, a fé. Pensamos em coletivo, pensamos em grupo, para resistirmos ao dia a dia, para fortalecermos nossas subjetividades, para construirmos identidades próprias.

Na verdade, Oliveira Silveira vivia de construir quilombos: espaços em que negras e negros pretendiam fugir da nova escravidão e viver em liberdade.

Surgiram Palmares, Semba, Associação Negra de Cultura, dentre tantos outros, todos viabilizando encontros com nós mesmos. Como diz a poesia, pessoas de pele escura, buscando umas pelas outras para enfim poderem encontrar a si próprias.

Encontre negros e negras unidos e resistindo e estará diante de um grupo, lugar onde Oliveira Silveira se encontrou! Lugar onde sua memória permanece viva!

Por isto, para encontrar Oliveira Silveira, o poeta da Consciência Negra, procure um grupo de pessoas negras que buscam por identidade e compreendem a liberdade como um processo de luta, e não como algo que foi entregue pelo opressor.

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Por Karen Luise Souza e Naiara Rodrigues da Silveira Lacerda, originalmente no Justificando.

O movimento negro brasileiro e a circulação de referenciais para a luta antirracista

 

(FOTO/ Reprodução).

Ainda é muito comum no Brasil, em diversos meios de comunicação e até mesmo na universidade, a afirmação de que o movimento negro brasileiro na contemporaneidade seria uma cópia, em menores proporções, do movimento negro pelos direitos civis dos Estados Unidos, que mobilizou a atenção de populações negras mundo afora nas décadas de 1950 e 1960. Não há dúvidas de que o que hoje chamamos de “movimento negro contemporâneo”, constituído no Brasil a partir da década de 1970, recebeu, interpretou e utilizou informações, ideias e referenciais produzidos na diáspora africana de uma maneira geral, especialmente nas lutas pelos direitos civis em território estadunidense e nas lutas por libertação nos países africanos na segunda metade do século XX, sobretudo aqueles sob o regime colonial de Portugal.

Entretanto, esse adensamento político que contribuiu e ainda contribui para a luta antirracista no mundo nunca foi uma “via de mão-única”. Pelo contrário, podemos verificar nitidamente até os dias de hoje a circulação de repertórios críticos e pessoas pelo “Atlântico negro”. Aliás, não podemos esquecer que o racismo, um elemento estruturante das desigualdades com as quais convivemos historicamente no Brasil, é uma das faces da “modernidade” que se consolida em meio ao imperialismo europeu no século XIX. Esse racismo não respeita limites territoriais. Da mesma forma, a luta antirracista precisa ser entendida a partir de uma perspectiva transnacional, que deve contemplar as diferentes contribuições produzidas na luta política em diferentes contextos nacionais. O que pouca gente sabe é que o movimento negro brasileiro, especialmente durante a década de 1930, também contribuiu consideravelmente para a circulação de referenciais para a luta antirracista, servindo inclusive como fonte de inspiração para a dinâmica de transformações nas lutas das populações negras na diáspora africana.

Ainda durante o início do século XX, já era possível notar a importância da circulação de ideias e perspectivas de construção das lutas por melhores condições de vida para as populações negras em perspectiva global. A dinâmica das transformações, tanto nas formulações políticas quanto nas estratégias adotadas nas diferentes lutas por emancipação das populações negras, é sempre muito complexa. A partir dos anos de 1920 e 1930, a circulação de informações na diáspora negra se ampliou muito. Podemos objetivamente verificar essa circulação na imprensa negra do Brasil e dos Estados Unidos na primeira metade do século XX, onde ocorreram até mesmo intercâmbios entre jornais dos dois países.

O mais importante jornal da imprensa negra nos EUA, o Chicago Defender, fundado em 1905 na cidade de Chicago, estabeleceu um intercâmbio com O Clarim d’Alvorada, um dos mais importantes jornais da imprensa negra brasileira, que circulou entre as décadas de 1920 e 1930, em São Paulo. O Clarim d’Alvorada publicava informações sobre a comunidade negra nos EUA em uma coluna criada especificamente para esse fim, chamada de O mundo negro – que inclusive acabou sendo escolhida para dar o título de meu livro. Da mesma forma, o Chicago Defender publicava informações sobre as lutas da população negra no Brasil. Pesquisando nos arquivos do Chicago Defender encontrei 114 matérias, entre 1914 e 1978, não somente comparando as relações raciais no Brasil e nos Estados Unidos, mas também exaltando as formas pelas quais os brasileiros tratavam a questão racial, principalmente na década de 1930.

Clarim d’Alvorada, 14 de julho de 1929. Fonte: Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional.

Aqui preciso falar um pouco sobre a importância da imprensa negra nos EUA da primeira metade do século XX. Segundo o historiador James Meriwhether, a imprensa negra norte-americana chegou ao “seu auge de poder e influência” durante as décadas de 1930 e 1940. Já Gunnar Myrdal afirmava em 1944, em seu livro An American Dilemma, que esses jornais passavam de família para família e poderiam ser encontrados em barbearias, igrejas, lojas. Seus conteúdos eram transmitidos pelo “boca a boca” entre aqueles que não podiam ler. Para Myrdal, “a importância da imprensa negra para a formação de opinião entre os negros, para o funcionamento de todas as outras instituições negras, para as lideranças negras e para as ações geralmente conjuntas é enorme”. Já W.E.B. Du Bois (1868-1963), primeiro negro a receber o título de doutor (Ph.D. em História) na Universidade Harvard, em 1895, e uma das principais lideranças negras norte-americanas no início do século XX, em matéria publicada no dia 20 de fevereiro de 1943 no Chicago Defender dizia que “houve um tempo, mesmo antes da Reconstrução” (1865-1877), em que “só um negro aqui e outro lá lia um jornal da imprensa negra, e mesmo assim pedia desculpas por isso”. E terminava dizendo: “Hoje provavelmente é verdade que raramente há um negro nos Estados Unidos que sabe ler e escrever e que não lê a imprensa negra. Ela tornou-se uma parte vital da sua vida”. Nas palavras de Hayward Farrar, “a imprensa negra tem mostrado o mundo para a comunidade negra, a comunidade para si mesmo, e a comunidade para o mundo”.

Justamente durante o período considerado o ápice da imprensa negra nos EUA, há no arquivo do Chicago Defender 41 reportagens sobre a questão racial no Brasil entre 1934 e 1937. Um ótimo exemplo é a reportagem publicada no Chicago Defender em 26/10/1935 sobre uma manifestação realizada pela Frente Negra Brasileira (FNB) no Rio de Janeiro e que, segundo o jornal, teria mobilizado dez mil pessoas: “Esta organização, composta exclusivamente por brasileiros negros, tem direcionado suas energias contra a invasão dos direitos civis e constitucionais. Batendo na tecla da solidariedade nacional, ela tem conseguido eminentemente derrotar as forças do preconceito que, por pouco, ameaçaram minar o tradicional espírito de jogo limpo e igualdade pelo qual o Brasil foi conhecido antes do advento da insidiosa propaganda norte-americana”.

Reportagem sobre a Frente Negra Brasileira. The Chicago Defender, 26 de outubro de 1935. 

É interessante perceber a referência à luta por “direitos civis” levada a cabo pela FNB no Brasil. Segundo o jornal, lutava-se no Brasil pela manutenção de direitos civis e constitucionais, direitos ainda negados à população negra nos EUA. O texto seguia apresentando a FNB para o leitor negro norte-americano: “A Frente Negra é hoje a organização mais poderosa em todo o Brasil, exercendo uma influência política que mantém afastados todos aqueles que poderiam negar as garantias específicas da Constituição nacional”. Somente entre 1935 e 1937 a Frente Negra Brasileira esteve presente em nada menos do que 20 reportagens do Chicago Defender, em matérias como: “Brazilian politics seeking support of the Black Front” [Políticos brasileiros buscam apoio da Frente Negra] (20 de março de 1937), que, ao referir-se às vindouras eleições, afirmava que “os associados à Frente Negra, de acordo com fontes autênticas, vão muito além dos 40 mil, com novos membros se associando diariamente”, e que “com sua solidez, esta organização representa hoje uma das forças mais poderosas a serem consideradas no Brasil”. Essa e outras reportagens foram publicadas sempre em sua edição semanal com circulação nacional.

“Políticos brasileiros buscam apoio da Frente Negra”. The Chicago Defender, 20 de março de 1937.

É impressionante como os editores do Chicago Defender olhavam para o Brasil até meados dos anos 1930 e viam muitos exemplos a seguir, tanto na possibilidade de viver num contexto de “harmonia racial” quanto em algumas formas de luta implementadas por negros brasileiros. Havia uma admiração declarada pela Frente Negra Brasileira nas reportagens do periódico norte-americano.

Um bom exemplo, nesse sentido, é a edição do dia 11 de janeiro de 1936, que trazia no topo da primeira página, em letras garrafais, a seguinte manchete: “Grupo de negros americanos segue exemplo do Brasil; Mapeia campanha para livrar-se dos grilhões em 1936”, que apresentava para seus leitores os planos da “North American Fronte Negra” para o ano de 1936! Ainda na mesma edição, na página 24, havia outra matéria interessante: “Puerto Ricans organize Black Militant Front”, na qual o jornal afirmava que a criação da nova organização em Porto Rico também “foi inspirada no sucesso alcançado pela Frente Negra no Brasil”.

“Grupo de negros Americanos segue exemplo do Brasil; Mapeia campanha para livrar-se dos grilhões em 1936”. The Chicago Defender, 11 de janeiro de 1936.

Veículos como os jornais O Clarim d’Alvorada e o Chicago Defender tiveram um papel fundamental para a circulação de informações, ideias e referenciais para a luta antirracista no Brasil, nos EUA e em outras partes do globo. Se levarmos em consideração a importância da imprensa negra para a formação do movimento negro politicamente organizado nos Estados Unidos, principalmente nas décadas de 1930 e 1940, e a cobertura dada às relações raciais e ao movimento negro no Brasil no Chicago Defender, é possível perceber que o movimento negro brasileiro não foi apenas receptor, mas que também contribuiu para essa circulação de referenciais e até mesmo serviu como exemplo ou inspiração para outros negros em suas lutas na diáspora africana. Precisamos conhecer mais e melhor as Nossas Histórias!

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Por Amilcar Pereira, originalmente no Geledés.

Assista ao vídeo do historiador Amilcar Araujo Pereira no Acervo Cultne sobre este artigo:

https://youtu.be/rk6ZYE7WQ3w

Nossas Histórias na Sala de Aula

O conteúdo desse texto atende ao previsto na Base Nacional Comum Curricular (BNCC):

Ensino Fundamental: EF09HI03 (9º ano: Identificar os mecanismos de inserção dos negros na sociedade brasileira pós-abolição e avaliar os seus resultados); e EF09HI04 (9° ano: Discutir a importância da participação da população negra na formação econômica, política e social do Brasil.)

Ensino Médio: EM13CHS101 (Identificar, analisar e comparar diferentes fontes e narrativas expressas em diversas linguagens, com vistas à compreensão de ideias filosóficas e de processos e eventos históricos, geográficos, políticos, econômicos, sociais, ambientais e culturais).

Amilcar A. Pereira Doutor em História (UFF), com pós-doutorado em História e Educação na Columbia University (EUA). Professor da Licenciatura em História e dos programas de pós-graduação em Educação e em Ensino de História na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Coordenador do Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação Antirracista (Gepear-UFRJ); E-mail: amilcarpereira@fe.ufrj.br.

Conheça cinco livros para refletir sobre a Consciência Negra

 

Alguns livros da biblioteca do jornalista Juca Guimarães. (FOTO/ Acervo/ Pessoal).


A literatura é um dos meios de compreender a grandiosidade do 20 de novembro a partir de obras de autores negros e negras sobre a luta da população negra por direitos e a cultura afro-brasileira.

Consciência Negra é tema de programa na Rádio Livre Universitária

 

Consciência Negra é tema de programa na Rádio Livre Universitária. 
(FOTO/ Reprodução).

Por Nicolau Neto, editor-chefe

A Rádio Livre Universitária é um projeto cultural que tem como principal instrumento a comunicação. É uma grande movimentação cultural desenvolvida dentro da Universidade Regional do Cariri (URCA), campus pimenta, em Crato e foi idealizada pelo professor do departamento de Ciências Sociais, o Dr. Carlos Alberto Tolovi e hoje conta com Júlia Simão, estudante de Ciências Sociais, como uma das apresentadoras.

“Se o racismo não dá trégua, a luta também não”, diz ex-ministra da Igualdade Racial

 

Matilde Ribeiro. (FOTO/ Pedro Borges/ Alma Preta).

Nada de nós, sem nós”. É a partir dessa máxima que Matilde Ribeiro, ministra-chefe da extinta Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), pensa o desenvolvimento de políticas públicas contra o racismo e ecoa as múltiplas vozes do movimento negro.

Entenda o que é CONSCIÊNCIA RACIAL


(FOTO/ Reprodução/ Geledés).

No mês da Consciência Negra, Sueli Carneiro, filósofa, ativista e escritora, aponta a realidade da população negra, sobretudo às mulheres e os jovens. Fala sobre um cenário em que o racismo reforça o processo de inferiorização e estigmatização dessas pessoas.

Onde é feriado no dia 20 de novembro? Confira a lista


Zumbi dos Palmares. (FOTO/Reprodução).

O Dia da Consciência Negra é comemorado na data da morte de Zumbi dos Palmares, em 20 de novembro. Ele foi o último líder do maior quilombo no período colonial, o de Palmares.

O problema do tratamento das questões raciais e de gênero como pautas identitárias


(FOTO/ Coletivo Di Campana).

O tratamento das questões racial e de gênero como questões identitárias é um problema porque ofusca as relações de exploração que estruturam essas construções. No caso da questão racial, a sublocação da força de trabalho negra na economia é evidente em estatísticas recentes do mercado de trabalho brasileiro.

12 autoras negras para ler e lembrar que o Dia da Consciência Negra é o ano inteiro


Conceição Evaristo fala durante "Latinidades - Festival da Mulher Afro Latina Americana e Caribenha 2013".
(Foto: Reprodução/Hypeness)
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Quantas autoras negras você já leu? Provavelmente, poucas. Quem fez o Enem este ano teve até um gostinho da obra de Conceição Evaristo, autora mineira nascida em 1946 que podia se tornar a primeira mulher negra a ocupar uma cadeira na ABL, mas perdeu o posto para o cineasta Cacá Diegues.

Felizmente, algumas iniciativas já buscam oferecer mais espaço a mulheres negras na literatura, como esta livraria especializada em escritoras negras ou esta editora que buscava uma autora negra com um livro inédito para publicação. Acontece que, mais do que publicar, essas mulheres precisam ser lidas – e nossa seleção promete te ajudar a selecionar algumas obras incríveis para começar.

Maria Firmina dos Reis

Primeira romancista brasileira, essa moça nascida em 1825 no Maranhão é autora de livros como Úrsula e A Escrava. Além de escrever, era professora e fundou uma aula mista e gratuita para alunos que não podiam pagar pela educação.

Pintura de Maria Firmina dos Reis, de autoria de Tony Romerson Alves.
(Foto: Wimimedia Commons).

Chimamanda Ngozi Adichie

Chimamanda é um dos nomes queridinhos da atualidade. A nigeriana autora de Americanah, Hibisco Roxo, No Seu Pescoço, Sejamos Todos Feministas, Meio Sol Amarelo e Para educar crianças feministas (ufa!) ficou conhecida por um poderoso TED em que relata os perigos de se contar uma história única sobre a África – vai por mim, você merece ver.

Chimamanda Ngozi Adichie.
Carolina Maria de Jesus


Se você ainda não ouviu, pode ter certeza de que vai ouvir falar muito sobre ela. Carolina Maria de Jesus trabalhava como catadora de lixo e escrevia nas páginas que encontrava nas ruas. Seu livro mais famoso é Quarto de Despejo – Diário de uma favelada, mas ela também assina obras como Casa de Alvenaria, Pedaços de fome e Provérbios.

Carolina Maria de Jesus autografando o livro Quarto de Despejo, em 1960.
(Foto: Arquivo Nacional).


Alice Walker

Em seu livro Rompendo o Silêncio, Alice Walker relata suas passagens por Ruanda, Congo, Palestina e Israel, quando foi convidada por organizações feministas e de direitos humanos. Seus comentários em tom poético lhe renderam duas premiações: um Pulitzer e um National Book Award. Outra obra da autora, A Cor Púrpura, foi adaptada para o cinema e indicada a 11 Oscars.

Alice Walker. (Foto: CC BY-SA 2.0 Virginia De Bolt - Wikimedia Commons).

Elizandra Souza

Natural da zona sul paulista, Elizandra é jornalista, mas também poetisa. Seu livro Águas de Cabaça aborda temáticas relacionadas ao candomblé. Se não bastasse, ela é também criadora do fanzine Mjiba que hoje se tornou um projeto maravilhoso, com direito a lançamento de livros de outras mulheres porretas como ela.




NoViolet Bulawayo

Natural do Zimbábue, NoViolet é autora do impactante Precisamos de Novos Nomes, que relata sob a ótica de uma criança temas sérios que vão de assassinatos políticos a estupros. É quando a protagonista Darling vai estudar nos Estados Unidos que as reflexões sobre a vida na África se transformam em uma forma de entender suas origens.


NoViolet Bulawayo / Foto: Paul Kariuki Munene.

Djamila Ribeiro

Esse mulherão dá uma aula sobre racismo, sexismo e, de quebra, sobre a sociedade como um todo. Em O que é lugar de fala? ela reflete sobre esse termo que já se tornou quase clichê e parte daí para debater sobre desigualdades. Seu segundo livro, Quem tem medo de feminismo negro, virou um dos ícones sobre o assunto no Brasil – e muita gente fez questão de levá-lo às urnas para deixar aquele recado nas últimas eleições.


Djamila Ribeiro /Foto:CC BY 3.0 Agência PT - Wikimedia Commons.


Jenyffer Nascimento

Pernambucana, Jenyffer é poeta que lançou recentemente seu primeiro livro solo: Terra Fértil. O lançamento foi feito através do coletivo Mjiba e retrata temas como amor, identidade, racismo e machismo.


Jenyffer Nascimento / Foto: Elaine Campos - Reprodução - Facebook.


Toni Morrison

Com um retrato cru da experiência da mulher negra, Toni Morrison já entrou para o seleto grupo de escritores que podem se gabar de ter levado para casa um Prêmio Nobel de Literatura. Vale ler Jazz, um romance que evidencia as consequências do assassinato de uma jovem no Harlem.


Toni Morrison. Foto: CC BY-SA 2.0 Angela Radulescu - Wikimedia Commons.


Cristiane Sobral

Misturando prosa com poesia, Cristiane Sobral é autora de três livros: Não Vou Mais Lavar os Pratos; Espelhos, Miradouros, Dialéticas da Percepção; e Só por Hoje Vou Deixar Meu Cabelo em Paz. Sua obra retrata os desafios da mulher negra de forma leve, mas sem nunca deixar de lado a postura engajada.


Cristiane Sobral / Foto: Reprodução - Facebook.


Mel Duarte

Paulista, Mel Duarte é autora de Fragmentos Dispersos e Negra, Nua e Crua, mas sua obra vai muito além das páginas dos livros. Escritora, ativista e produtora cultural, ela possui até poemas inspirados em Jair Bolsonaro.




Conceição Evaristo

Ela abriu esse texto, mas merece também um lugar de destaque aqui no finzinho da lista. Seu primeiro poema data de 1990 e continua escrevendo. Doutora em literatura e nascida em uma favela de Belo Horizonte, Conceição Evaristo é autora de Olhos d’Água, Ponciá Vicêncio, Becos da Memória, Poemas da Recordação e Outros Movimentos. (Com informações do Hypeness).

Você sabe o que é “consciência negra”?

Uma vez adquirida, brancos e negros precisam afirmar essa consciência.
(Foto: Márcio Ferreira/Reprodução/Revista Trip).

20 de novembro se fortaleceu como data comemorativa e de luta no país

O black power, que quer dizer “poder negro”, turbantes de cores vivas, roupas no estilo africano, o orgulho da identidade negra. Essa é uma das dimensões da consciência negra, como afirma o filósofo, historiador e militante do movimento negro Marcos Cardoso. São ações e reflexões de pessoas que passaram a se sentir parte da história do seu povo - o povo negro e de descendência africana.

Mas o reconhecimento e pertencimento não acontece para todos da mesma forma. Segundo Marcos, existem dois aspectos que podem determinar esse processo: a formação e a informação de cada indivíduo. Enquanto alguns possuem famílias que, desde a infância, ensinam sobre a negritude, outros adquirem essa consciência por meio da discriminação e preconceito por que passam.

Ao se perguntar por que está sofrendo, a pessoa começa a tomar consciência de si. A dimensão individual é construída em processos de intenso sofrimento, sobretudo diante da humilhação, da negação da sua humanidade no seu cotidiano. Isso força necessariamente a tomada da consciência negra, da consciência política diante desse tipo de situação”, explica Markim, como é conhecido. “A luta por dignidade pessoal é política”, completa.

Afirmando a negritude

A professora de literaturas africanas Íris Amâncio destaca a consciência negra em outro patamar. Uma vez adquirida, ela precisa ser afirmada por toda a sociedade, brancos e negros, através de atitudes antirracistas. Isso significaria realizar uma reeducação do imaginário da sociedade.

A estratégia é, segundo a professora, colocar em prática ações que ela chama de “discriminações positivas”, que significa “utilizar os critérios do racismo para combater o próprio racismo”. Como no Brasil dois dos maiores fatores de discriminação racial são a fisionomia e a cor da pele, Iris defende que eles podem ser usados ao contrário: que pessoas com fisionomia afrodescendente e pele escura tenham portas abertas em empregos, escolas, concursos, como acontece com as cotas. Assim como passem a ter uma imagem positiva na mídia.

20 de novembro: Dia de Zumbi

O dia nacional da consciência negra, 20 de novembro, relembra a morte de Zumbi dos Palmares, último líder do quilombo dos Palmares, assassinado em 1695. Há décadas o mês de novembro tem se tornado referência para atividades que afirmam a negritude. Para Markim Cardoso, significa também a valorização de um dos mais importantes líderes da América Latina, que traz consigo a consciência da luta pelo seu coletivo.

O movimento que não quis homenagear a princesa

A consciência negra não foi sempre marcada assim. No livro “Educação e Ações Afirmativas” o historiador Oliveira Silveira conta como os negros e negras mudaram a data de lembrança da libertação. Antes, ela era celebrada oficialmente em 13 de maio, dia da assinatura da abolição da escravatura pela princesa Izabel.

A homenagem a Palmares em 20 de novembro de 1971 foi o primeiro ato evocativo dessa data que, sete anos mais tarde, passaria a ser referida como dia nacional da consciência negra”, escreve Oliveira. O Grupo Palmares, do Rio Grande do Sul, organizou atividades ano a ano até que, em 1978, o Movimento Negro Unificado Contra a Discriminação Racial (MNUCDR) escreve um manifesto declarando a data como dia nacional da consciência negra. O governo federal brasileiro somente veio a oficializá-la em 2011, com a lei 12.519. (Com informações do Brasil de Fato).

No 3º dia como vereador, Holiday do MBL quer acabar com Dia da Consciência Negra



No terceiro dia como vereador de São Paulo, Fernando Holiday (DEM), líder do grupo direitista MBL, disse que vai apresentar uma proposta para revogar o Dia da Consciência Negra, data celebrada em 20 de novembro. O vereador também disse em entrevista à TV Câmara nesta quarta-feira que vai propor o fim das cotas raciais em concursos públicos municipais da capital paulista.

Em novembro do ano passado, Holiday publicou no facebook que é "um absurdo" existir uma data como o Dia da Consciência Negra, que "homenageie um homem assassino escravagista”. Tal declaração sim é um grande absurdo, pois o dia 20 de novembro foi escolhido como homenagem à morte de Zumbi dos Palmares, líder do Quilombo dos Palmares, maior quilombo brasileiro que esteve a frente da resistência contra o tráfico de africanos e a escravidão negra, e foi assassinado neste dia justamente devido a sua luta contra a escravidão.

Fernando Holiday ainda afirmou que levará suas propostas de campanha a frente, que são as propostas da direita racista, machista e LGBTfóbica do MBL. "Vou ter propostas de várias frentes, algumas delas mais polêmicas, como propor o fim das cotas raciais em concursos públicos municipais em São Paulo", explicou na TV Câmara.

O vereador recém eleito, assim como seu grupo MBL, que já investigamos aqui no Esquerda Diário, e também seu partido DEM e toda sua direita misógina e racista aliada, não possuem nenhum interesse em de fato combater o racismo e nem nenhuma forma de opressão. Fernando Holiday surge como uma figura jovem, carismática, negro e homossexual, para ajudar a direita a “surfar na onda” da representatividade - que vem ganhando força principalmente no movimento negro e de mulheres - e assim ganhar a confiança desses setores oprimidos para fazer a política da direita dentro da câmara.

Mais uma vez o discurso da representatividade mostra suas debilidades. A direita consegue se apropriar das demandas democráticas mais latentes dos setores oprimidos e colocar um jovem negro em evidência para defender políticas racistas, uma grande contradição que só é possível quando a opressão é vista de maneira isolada e completamente descolada de elementos de classe.

O Dia da Consciência Negra foi uma conquista do movimento negro para que a resistência contra a escravidão não seja apagada da história do país, sendo feita a partir da memória de Zumbi dos Palmares. Assim como as cotas, que não são reparação histórica, mas representam também uma conquista do povo negro, que estatisticamente (e visivelmente) é o que ocupa os postos de trabalho mais precários, enche as filas do desemprego e as celas da prisão e possuem menor acesso à educação de qualidade. Tanto o Dia como as cotas são medidas elementares que dão um bem pequeno passo em escancarar que a escravidão brasileira acabou oficialmente, mas em seguida os negros foram jogados nas favelas e empregos precários, pagando o custo do racismo institucional até hoje.

Fernando Holiday não representa o povo negro. Não representa LGBTs. Apenas representa a direita ao dizer que a resistência negra é que reforça o racismo, falando da necessidade de uma “consciência humana”, discurso comum dos racistas. Ora, se vivemos em um país onde negros são maioria populacional, mas ínfima minoria nas classes mais altas, entre os ricos, empresários e políticos, e a maioria assassinada pelas armas da polícia e do Estado – inclusive crianças – onde entra a ideia de que todos somos iguais e humanos, e a cor da pele não pode influenciar nisso? Esses são os argumentos de Holiday para suas propostas, mas a realidade mostra na prática que a cor da pele tem sim seu significado quando Rafael Braga segue preso por carregar um pinho-sol, mas racistas destilam seu ódio e violência livre e impunemente.

A cor da pele negra para o povo negro significa resistência, e as propostas do MBL servem apenas para tentar tirar do movimento negro as poucas conquistas arrancadas com muita luta. Mas a resistência continua e se organiza, com os trabalhadores e a juventude, contra o racismo e todas as formas de opressão que o capitalismo se apropria para seguir nos explorando mais e mais. Não aceitaremos perder as parcas conquistas, e seguiremos em luta por muito mais, até derrubar não apenas Holidays, MBL e sua direita, mas para colocar fim no racismo, machismo, LGBTfobia e todas as formas e opressão e exploração. Holiday quer nos intimidar, quer nos calar, mas seguiremos, até que caia o capitalismo.




O papel das heroínas negras em nossa história


Comemoramos em ‪20 de novembro ,o dia da consciência negra, pois neste dia, em 1695 , Zumbi  morreu assassinado por soldados da Coroa Portuguesa, teve a cabeça cortada e conservada para ser exposta em praça pública na cidade de Recife. O propósito era desacreditar as pessoas que diziam que Zumbi era imortal.

Por Hilda Dobal no Esquerda Online

Zumbi era neto de Aqualtune, princesa do Congo que foi trazida em situação de escrava para o Brasil . Aqualtune foi obrigada a ter relações sexuais com um escravizado para fins de reprodução, uma prática de abuso comum na época praticada pelos senhores, no final de sua gestação organizou sua fuga e de alguns escravos para o quilombo na Serra da Barriga. Neste local deu a luz a Gamba Zumba e ao lado dele começou a organização do Estado negro de Palmares. Depois ela deu a luz a Ganga Zona que também ajudou a chefiar Palmares e também a Sabina, a mãe de Zumbi dos Palmares, o principal líder e guerreiro do Quilombo Palmares. Aqualtune foi fundamental para a consolidação da república, pois possuía conhecimentos políticos, organizacionais e de estratégia de guerra.

Dandara era a companheira de Zumbi com quem teve três filhos, dominava técnicas de capoeira, lutou ao lado de homens e mulheres e participava na elaboração das estratégias de defesa de Palmares. Foi uma mulher de ação, opinião e forte resistência. Caçadora, lutadora, trabalhadora, mãe e companheira.

As mulheres estiveram sempre presentes nas lutas do Quilombo dos Palmares, no século XVII e hoje,  as mulheres negras continuam presentes na luta. Em especial na luta pela vida. De nossas ancestrais heroínas na libertação do povo negro em nosso país, nos fazemos na atualidade guerreiras frente ao aumento de 54,2% no feminicídio de mulheres negras entre 2004 e 2014. .


Nossas Dandaras, Sabinas, Aqualtunes, Winnies, Marias, Terezas estão nas periferias de nossas cidades são a maioria das chefes de família, trabalhadoras exploradas pela terceirização, mães que choram pela morte de seus filhos, pois cerca de 30 mil jovens de 15 a 29 anos são assassinados por ano no Brasil, sendo cerca de 77% negros. É urgente resgartar e dar visibilidade ao nosso papel histórico de protagonistas na luta pela sobrevivência e liberdade. Devemos não só comemorar no Dia 20 de Novembro, mas sim nos 365 dias em que lutamos por liberdade e igualdade dos negros e negras da classe trabalhadora brasileira.

Dandara.