11 de fevereiro de 2022

Desafios da cultura no Crato: Uma tarefa coletiva

 

Desafios da cultura do Crato. Na imagem, Raimundo José da Silva, mais conhecido como Raimundo Aniceto. (FOTO/ Samuel Macedo).

Por Alexandre Lucas, Colunista

O Crato tem grandes desafios a serem superados no âmbito das políticas públicas para a cultura. Não cabe aqui receitas pré-determinadas, até mesmo para não correr o risco desconsiderar os esforços e avanços, muito menos podemos desprezar os retrocessos, nem cair no simplismo que desconsidera as estruturas econômicas, políticas e burocráticas em que se contextualiza a gestão pública.

 A situação não é confortável. Não podemos analisar a situação do Crato, de forma localizada ou a partir do calor do momento. A conjuntura política nacional interfere diretamente no âmbito local. A extinção do Ministério da Cultura e a descontinuidade das políticas para cultura, em especial com o desmonte do Sistema Nacional de Cultura e do Cultura Viva apontam cenários de instabilidades, junto a essa gravidade vivenciamos uma crise sanitária que afeta diretamente o setor da economia da cultura. Mesmo diante deste caos, o setor teve  redução dos impactos econômicos, a partir de  ampla articulação política nacional que reuniu trabalhadores e trabalhadoras da cultura, gestores e parlamentares, o que   que resultou na aprovação da Lei Aldir Blanc, representando   descentralização de recursos com repasse  da união para estados e municípios, premissa prevista no  Sistema Nacional de Cultura, concomitantemente a isso impôs que os entes federados estruturarem minimamente, os seus mecanismos de gestão, tendo como norte, os Sistemas Municipais de Cultura. Se a Lei Aldir Blanc serviu como política emergencial, a Lei Aldir Blanc 2, se apresenta como política permanente e tramita em urgência na Câmara dos Deputados, juntamente com a Lei Paulo Gustavo que tem caráter mais momentâneo. Ambas são importantes para o enfrentamento da crise e têm efeitos diretos nos municípios.

A política estadual de cultura também teve reflexos no Crato, diversas foram as organizações que movimentaram a economia do Município neste período pandêmico, o que abrange uma cadeia que compreende profissionais, serviços e empresas dos mais diversos setores. A manutenção das atividades e dos espaços culturais são essenciais para o processo de resistência, acalento afetivo e comunitário.

No mesmo rumo, a gestão da cultura no Crato, apesar das críticas, a maioria relacionadas a burocratização, conseguiu desenvolver editais que abrem brechas para inclusão de novos atores no circuito estético, artístico e cultural do município. Isso possibilita também o aperfeiçoamento na política de editais, inclusive, no sentido de compreensão das demandas e particulares do setor cultural.        

Quando observamos por outro lado os equipamentos culturais do Município: Museus, bibliotecas, teatros, auditórios, escola de música, praças e outros espaços, podemos perceber precarização, necessidade de adequação e de mecanismos republicanos de ocupação. O que impõe restabelecer o seu uso em condições adequadas e vinculadas às práticas de ocupação contemporâneas dos equipamentos culturais que prevê editais de programações. Mas como fazer isso?  Essa resposta talvez não esteja diante de um olhar externo, mas que passa também por ele. As engrenagens do setor público são bem mais complexas, às vezes, a chamada “vontade política”, não é o único elemento realizador. As condições objetivas são sempre os elementos para serem considerados, como recursos disponíveis, equipe, compreensão política, capacidade de articulação, aspectos jurídicos e correlação de forças políticas.           

Por outro lado, o Crato tem dois grandes marcos legais, a Lei do Sistema Municipal de Cultura ( Lei 3.070, de 18 de dezembro de 2014) e a Lei Municipal do Cultura Viva ( Lei 3.799, de 30 de junho de 2021), importantes instrumentos jurídicos para pensar uma política estruturante para o município.  Não basta apenas ter os marcos legais, é preciso consolidar (“culturalizar”) enquanto política pública.

O Sistema Municipal de Cultura apresenta um conjunto de mecanismos que apontam para a necessidade de planejamento participativo a partir aspecto da diversidade e pluralidade cultural, estética e artística e a transversalidade da cultura, controle e participação social e garantia de recursos, a Lei do Cultura Viva, voltada para os Pontos de Cultura envereda na mesma perspectiva, resguardadas as suas peculiaridades.

Consolidar esses dois marcos legais, talvez seja o grande e o principal desafio, tendo em vista, que eles são responsáveis por atender a totalidade das demandas da gestão da política pública do Município.  Mas isso não acontece num toque de mágica! 

Neste sentido, é preciso colocar que os dois marcos legais colocam para a gestão pública dispositivos democráticos para execução da política pública, o que é um avanço, mas ao mesmo tempo, requer mais trabalho e inevitavelmente mais conflito.  Marcos legais que propõem participação e controle social, não estão isentos da contradição, do conflito, da disputa de narrativas e dos diálogos (quase impossível existe apenas diálogos). Romantizar a democracia como espaço apenas de diálogos é fugir da realidade, acolher  um lado da história e desconsiderar a dinâmica social (ou dialética).    

Neste sentido, o Sistema Municipal de Cultura e Cultura Viva é um avanço e ao mesmo tempo um pesadelo para os que têm descompromisso com a democracia, ou para aqueles, que desconhecem o seu significado político e acabam romantizando o seu conceito, principalmente numa sociedade antagônica, onde os conflitos são mais evidentes.    

No Crato, especificamente, os dois marcos legais, servem para desconstruir uma compreensão mofada, equivocada e elitizada que  é  eleger o município como “cidade da cultura” ou “capital da cultura”, historicamente essa compreensão só serviu para excluir as camadas populares do acesso à produção cultural, estética e artística e refletir um pensamento da elite econômica, tendo incidência ao longo dos anos nas políticas públicas para cultura. O Crato com os dois mais legais passar a ser reconhecido como “cidade das culturas”, a evidenciar a escavação de lugares, territórios e sujeitos soterrados pelos discursos estreitos de cultura e ao mesmo tempo evidencia a necessidade de construir uma engenharia complexa, delicada e estruturante de cidade, onde a cultura está na transversalidade e na centralidade da política pública.   

Quem disse que era fácil?  Existe uma intenção de construir essa engrenagem, estão sendo criados os espaços de escuta, ainda temos um longo caminho, talvez de poucos beijos e abraços, é bem possível que tenhamos fartura de dores de cabeças e lágrimas. É preciso insistir na consolidação do Sistema Municipal de Cultura e no Cultura Viva e ao mesmo tempo continuar defendendo a criação de um percentual mínimo de investimentos, no mínimo 2%  do orçamento do Município.             

Essa tarefa só pode ser coletiva, deve unir os mais diferentes sujeitos, as vozes mais discordantes, os desejos utópicos, as compreensões estruturantes e emancipatórias de sociedade. Esse é o desafio, construir no conflito.

Brasil é o país que mais mata pessoas trans pelo 13º ano consecutivo

 

Imagem ilustrativa da bandeira trans - National Progress Party via Wikimedia Commons

O Brasil continua sendo o país que mais mata pessoas trans pelo 13º ano consecutivo, apontaram dados do Dossiê Assassinatos e Violências Contra Travestis e Transexuais Brasileiras, realizado pela Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra).

Segundo o relatório, 140 pessoas transgênero foram assassinadas no país em 2021, número composto pelas mortes de 135 travestis e mulheres transexuais e cinco homens trans e pessoas transmasculinas.

Comparado a 2020, os casos diminuíram, quando foram registradas 175 assassinatos de pessoas trans. Ainda assim, o número permanece superior ao de 2019, anterior à pandemia de covid-19, ano em 124 pessoas trans foram mortas.

Ainda de acordo com o dossiê da Antra, é importante ressaltar que os assassinatos computados em 2021 permanecem superiores à média 123,8 homicídios desse tipo desde 2008, como reportou a Agência Brasil.

O perfil das vítimas mostra que a maioria se considerava preta ou parda e estava entre os 18 e 39 anos. Além disso, 78% das pessoas trans mortas também atuavam como profissionais do sexo.

Segundo a autora da pesquisa, Bruna Benevides, muitas foram “empurradas para a prostituição compulsoriamente pela falta de oportunidades, onde muitas se encontram em alta vulnerabilidade social e expostas aos maiores índices de violência, a toda a sorte de agressões físicas e psicológicas.

O estado de São Paulo ocupa o primeiro lugar na relação de distribuição geográfica dos homicídios, com 25 assassinatos, seguido por Bahia, com 13, Rio de Janeiro, 12, Ceará e Pernambuco, contando com 11 mortes de pessoas trans em 2021. Também foram registrados dois casos de brasileiras na França e em Portugal.

O dossiê ressaltou que a pandemia de covid-19 tornou agravou a situação difícil da comunidade trans no Brasil, dificultando o acesso a auxílios governamentais e empregos, por exemplo, em decorrência da crise sanitária, econômica e social.

O contexto também se reflete na dificuldade de acesso a dados sobre pessoas LGBTQ+ e informações sobre violações de seus direitos, o que aconteceu durante a pesquisa, em que foram encontradas dificuldades de obtenção de dados com recortes incluindo essas pessoas.

Nos casos de assassinatos, muitas vezes esses dados se perdem nos próprios registros de ocorrência. Da mesma forma, nos laudos dos Institutos Médicos Legais, ignora-se a identidade de gênero da pessoa, se destoante do padrão sexual binário”, explicou Benevides.

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Com informações do Aventuras na História.

10 de fevereiro de 2022

5 Razões para entender por que a defesa da legalização de um partido nazista é crime no Brasil

(FOTO /Reprodução/ Brasil de Fato).

 

Urge enfrentar o tempo como ele nos procura.”

Shakespeare, Cimbelino

Muitas pessoas ficaram estarrecidas com a fala do “influencer” Monark, apresentador do Flow Podcast, no último dia 8, ao afirmar que: “Deveria existir um partido Nazista legalizado no Brasil”, que “as pessoas têm o direito de ser idiotas” e, ainda, “se o cara for anti-judeu ele tem o direito de ser anti-judeu”. As falas resultaram na perda de patrocinadores e, finalmente, em seu próprio desligamento. Em sua defesa, o apresentador alegou que “estava bêbado”.

Se você está entre aqueles que não se escandalizaram com a afirmação de Monark e não entende o motivo de tanta repercussão, esse texto é para você. Vamos explicar, em cinco tópicos, porque afirmações desta natureza são criminosas e não podem ser toleradas.

1) Não é liberdade de expressão

Inicialmente, é conveniente lembrar que o regime nazista, instaurado a partir da ascensão ao poder do Partido Nacional Socialista alemão, na década de 30, conduziu a Alemanha a uma guerra que resultou em “mais de 6 milhões e meio de alemães mortos, (...) a divisão e a repartição do país, o fim de sua existência como Estado”. Todavia, o que caracteriza o nacional-socialismo alemão é o fato de se tratar, inicialmente de um movimento e, posteriormente, um regime político assumidamente racista, xenófobo, misógino e homofóbico. Ou seja, o nazismo elevou a ideologia da supremacia racial, já presente nas guerras coloniais do século XIX, ao “status” de verdadeiro “paradigma” para todos os ramos do conhecimento: a ciência, a educação, a política, a organização administrativa e militar do Estado Alemão e o próprio direito alemão da época, todos se fundaram no “mito da raça ária, adotado como central na concepção nazista do mundo”.

A execução de leis destinadas esterilizar e, depois, simplesmente eliminar pessoas com deficiência; proibir o casamento entre judeus e não judeus, desapossá-los de seus bens, de suas casas, de suas profissões, de suas nacionalidades, encerrá-los em guetos e posteriormente, exterminar mais de 6 milhões de pessoas, entre judeus - a população mais atingida -, poloneses, ciganos, negros, homossexuais e adversários políticos nos campos de concentração são parte do legado macabro que o nazismo deixou para a história.

Esse brevíssimo e, ainda assim, atroz retrospecto tem a finalidade de demonstrar que o regime nazista é intrinsecamente criminoso, pois se assenta na ideia de desumanização e extermínio de grupos populacionais inteiros. Não se trata da defesa de um movimento, regime político ou de um partido político como qualquer outro, mas da defesa de crimes em massa, praticados em escala industrial, numa organização fria e calculada de “massacres administrativos”, como qualificou a filósofa Hannah Arendt.

Não há uma “parte boa” no nazismo.

A defesa de um partido nazista incorpora, necessariamente, o endosso a práticas resultantes de decisões políticas voluntárias e conscientes de implementação de programa radicado nos paradigmas da inexistente divisão da humanidade em raças e da supremacia de uma suposta raça, em detrimento das demais.

Ora, se os direitos fundamentais consistem em projeções do princípio fundante da dignidade humana, não é possível conceber exercício do direito fundamental à liberdade de expressão que inclua, em seu âmbito normativo, a defesa do extermínio de seres humanos em razão de critérios de identidade ou opções fundamentais. Não há direito fundamental à defesa da aniquilação da dignidade humana ou do extermínio de fração da humanidade.

2) Não se trata do mero “direito de ser idiota”

Uma das frases utilizadas por Monark em sua defesa foi a existência de um suposto “direito de ser idiota”.

Sem deixar de registrar que a expressão “idiota” já traz em si uma carga pejorativa, preconceituosa e discriminatória, não é preciso grande esforço para entender que qualquer direito, seja ele qual for, tem como limite a esfera jurídica de terceiros.

Se o alegado “direito de ser idiota” resultar em dano unicamente a si próprio, não há nada a responder, do ponto de vista criminal. Quebrar ovos sobre si mesmo, jogar tortas na própria face, dizer coisas tolas e sem sentido, sem consequências que desbordem sua própria esfera de disponibilidade de direitos são condutas que, a princípio, são indiferentes para o direito penal.

Entretanto, se o suposto “direito de ser idiota” atingir direitos de outras pessoas, não se está diante de um direito, mas sim de uma conduta ilícita e que, a depender de sua gravidade, pode ser considerada crime.

A defesa pública do nazismo, nesse sentido, atinge de maneira frontal o direito de outras pessoas, não apenas daquelas comunidades diretamente atingidas pelos horrores do Holocausto, mas de toda a sociedade que se assenta no primado da dignidade humana.

3) Não se trata de mera opinião pela “descriminalização de uma conduta”

Há quem defenda, ainda, que as afirmações de Monark consistiram em mera defesa da descriminalização de condutas, de forma similar ao discurso de descriminalização das drogas, por exemplo.

O argumento é claramente inaceitável.

Ora, apenas um conhecimento rudimentar da história contemporânea já permite identificar que a fala do apresentador consistiu na defesa da “legalização” de um partido com plataforma reconhecidamente genocida. Não há nenhuma base de comparação entre as duas situações. A criminalização do uso de drogas envolve outra ordem de argumentação, notadamente, o direito à autonomia e à autodeterminação, entre outros.

Já a defesa da “legalização” de um partido nazista parte da ideia de que o genocídio é uma prática tolerável e que poderia, dentro de um quadro institucional democrático, ter alguma aceitação, o que é, evidentemente, um grande absurdo.

4) Não é brincadeira

Qualquer pessoa com o mínimo conhecimento histórico tem condições de discernir que o legado de horror do nazismo não pode ser defendido sob hipótese alguma, nem por brincadeira. Não se trata de intolerância ou de uma postura de rigidez “politicamente correta”, mas sim de não permitir que determinadas ideias desumanizadoras e que naturalizam extermínios circulem em nossa sociedade, mesmo sob a dissimulada forma de humor.

Ademais, como bem afirmou Adilson Moreira em sua obra “Racismo Recreativo”, o suposto “dolo de brincar” é um recurso largamente utilizado para que os responsáveis por delitos de racismo sejam isentos de qualquer consequência no campo penal. A ampla aceitação desta tese defensiva pelos tribunais brasileiros é mais um sintoma do racismo estrutural e institucional que constituem o sistema de justiça.

5) Partidos políticos devem defender, e não destruir, direitos fundamentais

A ordem constitucional brasileira somente admite partidos políticos que se comprometam a resguardar os direitos fundamentais da pessoa humana (art. 17 da Constituição Federal). A Lei nº 9.096/95 – Lei Orgânica dos Partidos Políticos – prevê que os partidos políticos se destinam a defender os direitos fundamentais (art. 1º).

Essas normas jurídicas inviabilizam por completo, no direito brasileiro, a possibilidade de “legalizar” um partido cuja ideia central é a defesa da supremacia racial e a prática do genocídio.

Ademais, a partir da ideia de que os partidos políticos integram o quadro institucional das democracias, é no mínimo paradoxal que, após a experiência da 2ª Guerra Mundial ainda se conceba a possibilidade de defesa de partidos nazistas ou fascistas, já que a própria ideia de institucionalidade, no período pós-1945, se assenta no valor da dignidade humana. Ou seja, existência e o funcionamento das instituições, dentre as quais os partidos políticos, somente se justificam no interesse de defender e concretizar a dignidade das pessoas, sem discriminações.

Todas essas 5 razões podem parecer óbvias.

Mas, se o melhor argumento em debate é o suposto “direito de ser idiota”, o óbvio precisa ser dito.

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Com informações do Brasil de Fato.

O projeto de país do movimento negro na constituinte

 

(FOTO/ Reprodução/ Instituto Búzios).

Você sabia que a Constituição Federal do Brasil completou 33 anos no último 5 de outubro? A Constituição é o documento mais importante do Brasil, considerada a lei máxima e obrigatória entre todos os cidadãos, serve como garantia dos seus direitos e deveres.

Muitas vezes nomeada como Constituição Cidadã, a carta magna de 1988 foi um dos primeiros processos em que a sociedade brasileira realmente participou. Isso se deu logo após a redemocratização e fim da Ditadura Civil-Militar no país.

Para os movimentos progressistas do período, não existia a menor condição de transitar para uma nova sociedade com um documento dos tempos ditatoriais. Esta é a primeira constituição do Brasil a reconhecer o racismo como crime, por exemplo.

Antes dela, as leis eram criadas sem ouvir a população. O processo constituinte que levou até a promulgação da Constituição de 1988 contou com uma participação massiva das pessoas. Durante 583 dias, pelo menos 10 mil pessoas passaram diariamente pelo parlamento. Estima-se que 9 milhões passaram pelo Congresso Nacional, sem contar as caravanas, cartas e demais sugestões que foram enviadas.

Para entender melhor a história da Constituição pelo olhar dos militantes negros e quão importante foi essa participação para a garantia de direitos básicos, o Nós, mulheres da periferia ouviu a pesquisadora Natália Neris, mestra em Direito pela FGV e doutoranda em Direitos Humanos. Em 2018, Natalia lançou o livro “A voz e a palavra do movimento negro na Constituinte de 1988”, pela editora Letramento.

Segundo a pesquisadora, é nítido que os militantes negros tinham um projeto de país mais democrático para todos e todas. “Fico pensando que havia um projeto de país desse movimento de um jeito muito profundo, e que foi pensado e idealizado por homens e mulheres negros nesses movimentos de base mesmo”.

Para Natália Neris, se a tarefa daquela geração foi desmontar a ideia de uma democracia racial, a atual geração tem como papel honrar a memória de quem lutou para ter os direitos garantidos. “A gente consegue ver com clareza que a tarefa da geração anterior à nossa era desmantelar o ideário de democracia racial, e falar claramente sobre desigualdades raciais”.

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Com informações do Instituto Búzios. Confira a entrevista na íntegra aqui.

9 de fevereiro de 2022

Contra ódio aos pobres, Lei Padre Lancelotti avança no Congresso e se multiplica pelo país

 

Padre Júlio contra a "arquitetura hostil" e a aporofobia (FOTO/ Henrique de Campos/Reprodução).

O projeto de autoria do senador Fabiano Contarato proibindo a “arquitetura hostil”, que já passou pelo Senado e atualmente tramita na Câmara, onde foi aprovado na Comissão de Desenvolvimento Urbano, se multiplica nas casas legislativas país afora. A exemplo do Senado, em todos os lugares onde a proposta aparece é chamada de “Lei Padre Lancelotti” ou “Lei Padre Júlio Lancelotti”, em homenagem ao sacerdote e protetor dos sem-teto que, em fevereiro do ano passado, destruiu a marretadas pedras pontiagudas instaladas pela prefeitura embaixo de viadutos de São Paulo.

Arquitetura hostil” é o termo utilizado para denominar os “equipamentos” urbanos destinados a tornar ainda mais difícil a vida dos que não têm moradia –ou a abominável arte de impedir pessoas sem-teto de dormir na rua, como já chamamos aqui no site. Projetos idênticos ao de Contarato já apareceram em São Paulo, Rio, Brasília, Belo Horizonte, Fortaleza, São José do Rio Preto, Araraquara, Ribeirão Preto e no Recife.

O escopo da proibição é comum a todos os projetos: braçadeiras em bancos, pedras pontiagudas, espetos e pinos metálicos sobre calçadas e sob viadutos, jatos d’água em marquises e outras ideias sádicas para impedir a pessoa em situação de rua de se deitar e dormir.

São fartos os exemplos da “criatividade” dos gestores e administradores de edifícios na hora de inventar artefatos para espantar os sem-teto para longe das “regiões nobres” das grandes cidades. O perfil do padre Júlio no instagram mostra dezenas destes instrumentos de tortura espalhados pelas cidades utilizando a tag #aporofobia, termo cunhado pela filósofa espanhola Adela Cortina para definir o horror ou a aversão aos pobres. Algumas das imagens ilustram este post.

Na capital paulista, um projeto contra a “arquitetura hostil”, de autoria dos vereadores Toninho Véspoli (PSOL) e Eduardo Suplicy (PT), foi aprovado em primeiro turno na Câmara em dezembro do ano passado. Na Assembleia Legislativa de São Paulo há outro projeto de “Lei Padre Júlio” tramitando, de autoria do petista Paulo Fiorilo. No Distrito Federal, o projeto do deputado distrital Fábio Félix (PSOL) foi aprovado na Comissão de Assuntos Fundiários em outubro.

Em São José do Rio Preto (SP), o projeto de uma “Lei Padre Júlio” foi apresentado pelo vereador João Paulo Rillo (PSOL) em dezembro passado, mesmo mês em que a vereadora Fabi Virgílio, do PT, fez o mesmo em Araraquara (SP).Outra iniciativa no interior paulista foi o projeto do vereador Sergio Zerbinato (PSB), protocolado em março de 2021.

Em Belo Horizonte, as vereadoras Bella Gonçalves e Iza Lourença deram entrada em seu projeto de lei proibindo a “arquitetura hostil” em janeiro deste ano. Simultaneamente, uma proposta semelhante foi apresentada na Assembleia Legislativa de Minas pela deputada Beatriz Cerqueira (PT). A vereadora Larissa Gaspar (PT) foi pioneira e apresentou um projeto contra este tipo de “equipamento urbano” ainda em 2018 em Fortaleza, que se encontra parado até hoje na Câmara Municipal.

Em agosto do ano passado, também inspirado no padre Júlio, um projeto dos vereadores Chico Alencar (PSOL), João Mendes de Jesus (Republicanos), Reimont (PT) e outros proibindo a “arquitetura hostil” foi aprovado pela Câmara Municipal do Rio, mas acabou sendo vetado pelo prefeito Eduardo Paes (DEM), que alegou ser “inconstitucional”. “A definição de padrões urbanísticos e construtivos é competência do Chefe do Poder Executivo, de vez que se trata de matéria regulamentar de política urbana”, disse a prefeitura na justificativa.

Agora foi a vez de o Recife ter um projeto similar, apresentado em janeiro pela vereadora Liana Cirne Lins (PT). “A administração pública, ao invés de colocar blocos de concreto para evitar que as pessoas em situação de rua usem os espaços públicos como abrigo, deveria prover assistência a essas famílias”, diz Liana. “Nossa inspiração nesse projeto de lei é o padre Júlio Lancellotti, que a marretadas derrubou os blocos que a prefeitura de São Paulo instalou embaixo de viadutos para que a população em situação de rua não utilizasse aquele espaço como abrigo. E quais foram as alternativas apresentadas?”

Na audiência pública que debateu o projeto na Câmara dos Deputados, em outubro, entidades representativas dos arquitetos rejeitaram o termo “arquitetura hostil” como ofensivo à profissão. Ednezer Rodrigues, representante do CAU (Conselho de Arquitetura e Urbanismo), disse que “atrelar a arquitetura à palavra ‘hostilidade’ parece um pouco complicado” e sugeriu “elementos construtivos hostis”. Já a presidenta da Federação Nacional dos Arquitetos e Urbanistas, Eleonira Mascia, defendeu “técnicas hostis de construção do espaço urbano”.

Durante a audiência, o autor do projeto original, Fabiano Contarato, justificou que as cidades precisam ser inclusivas, não excludentes. “Como é que um prefeito, um governador implementa políticas públicas se ele não sabe nem quem são as pessoas que vivem em situação de rua?”, observou o senador, lembrando que essas pessoas “não conseguem se proteger das intempéries da natureza, sofrem com o calor e com a chuva, são pessoas que não têm acesso a saneamento básico, que não têm banheiro para tomar banho, que convivem com ratos, baratas, doenças, que presenciam a violência urbana diariamente”.

Com o número de pessoas em situação de rua agravado em virtude da pandemia –quase dobrou em São Paulo nos últimos dois anos, segundo dados da prefeitura–, projetos semelhantes devem ser replicados em outras Câmaras de Vereadores do país para garantir alguma mudança pelo menos em nível local, já que o próprio padre Lancelotti não acredita que a proposição vingue no Congresso.

Penso que essa proposta de lei contra intervenções hostis dificilmente prosperará”, disse o sacerdote ao site ArchDaily esta semana. “Os interesses do mercado imobiliário são muito fortes no Congresso Nacional. É preciso ser realista. O Congresso está mais preocupado com os moradores de rua ou com os empreendimentos imobiliários? Dará mais importância a um morador de rua que está sendo fustigado por intervenções arquitetônicas hostis, ou às incorporadoras, empreiteiras e grandes corporações imobiliárias?”

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Com informações da Agência Câmara e do Socialista Morena.

8 de fevereiro de 2022

Educação digital e a importância da conscientização do uso da internet

(FOTO/ Reprodução).

A importância da internet atualmente é inegável, faz parte do nosso dia a dia e é praticamente impossível fugir dela. Utilizamos para informar, comprar e entreter, porém é preciso saber administrar a forma que se utiliza e as quantidades de informação que se recebe.

Uma dúvida recorrente é como proteger crianças e adolescentes da utilização excessiva e do compartilhamento de dados e informações pessoais sem moderação? Estamos na época dos virais, memes e noticias que se proliferam por todas as redes. Também temos ouvido falar no fake News, na tradução livre “notícia falsa”, essas informações são compartilhadas excessivamente sem precedentes e acabam gerando burburinho e confusão.

Para combater a disseminação desse tipo de notícia é preciso investir na educação digital, pois a checagem da veracidade do que se compartilha ainda é um desafio enfrentado por jornalistas e usuários das redes sociais. Então, para que se comece a usar a internet de forma positiva e proveitosa é preciso fazer a conscientização e treinamento das pessoas para o uso das tecnologias.

Qual o papel da escola no combate a fake News e na educação digital? Na sala de aula é importante levantar debater sobre o que está acontecendo no mundo, o professor presta papel importante na formação de cidadãos conscientes de seu papel na sociedade. A educação digital não é apenas ensinar sobre o uso correto da tecnologia, mas instruir sobre o impacto e importância da internet na atualidade.

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Com informações do Educação Digital.

7 de fevereiro de 2022

No Dia Nacional de Luta dos Povos Indígenas, escritora macuxi defende que literatura é ativismo

A data foi estabelecida pela Lei 11.969/2008 e rememora o dia de falecimento, em 1756, do guerreiro guarani Sepé Tiaraju - Arquivo Pessoal.

O 7 de fevereiro – Dia Nacional de Luta dos Povos Indígenas - chega em 2022 em momento de embates que deverão se acirrar ao longo do ano. Tomando formas específicas do atual contexto, as pautas dos povos originários envolvem, no entanto, questões que se arrastam ao longo dos cinco séculos de colonização. 

A escritora e pesquisadora macuxi Julie Dorrico explica que, intrinsecamente vinculada às lutas dos povos originários, a literatura indígena aborda, em forma de arte, “conflitos que envolvem ser indígena hoje no Brasil”. "Passamos essa mensagem de que os povos indígenas existem, que têm subjetividades e direito à soberania, autonomia, terra, narrativas ancestrais e culturas próprias", completa.

Os conflitos, como se sabe, não cessam há pelo menos 522 anos. Movimentos indígenas recentemente ganharam uma queda de braço com o órgão do governo federal que supostamente deveria defender seus direitos.

Depois que a Fundação Nacional do Índio (FUNAI) excluiu cerca de 239 terras indígenas (TIs) não homologadas das suas atividades de proteção, foi por meio do Supremo Tribunal Federal (STF) que 15 organizações indígenas conseguiram suspender os atos administrativos do órgão, no último dia 1º de fevereiro.

E é exatamente o Supremo que deve ser palco de um dos mais importantes embates das lutas indígenas no país nesse ano eleitoral.

No dia 23 de junho, o STF voltará a analisar o Marco Temporal. Se aprovado, as únicas terras que poderão ser reivindicadas como território tradicional indígena serão aquelas ocupadas até a data da promulgação da Constituição, em 1988. O julgamento, iniciado em setembro do ano passado com mais de 6 mil indígenas acampados em Brasília, está empatado. 

Enquanto isso, retomadas indígenas seguem se espalhando pelo país, resistindo a sistemáticas agressões – como é o caso de denúncias feitas contra ações de desmatadores na retomada Guarani Mbya em Canela (RS) e contra ataques praticados por seguranças privados contra os Guarani e Kaiowá da retomada Aratikuty em Dourados (MS). 

Para abordar como essas questões são elaboradas por indígenas em todo o território nacional também de forma literária, o Brasil de Fato conversou com Julie Dorrico. 

Doutora em teoria da literatura pela PUC-RS, ela é autora do livro Eu sou Macuxi e outras histórias, publicado pela editora Caos e Letras. Além de administrar o perfil @leiamulheresindigenas no Instagram, Julie é curadora da I Mostra de Literatura Indígena: o território das palavras ancestrais, inteiramente online. 

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Com informações do Brasil de Fato.

6 de fevereiro de 2022

Estudantes africanos e movimentos sociais protestam em Redenção, no Ceará, pedindo justiça pela morte de Moïse

 

Estudantes homenagearam o congolês Moïse em frente ao monumento “Negra Nua”, em Redencão. (FOTO/Walbert Costa/SVM).

Participantes de movimentos sociais e alunos da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab) realizaram, na tarde deste sábado (5), um protesto pela morte do congolês Moïse Kabagambe, vítima de espancamento em um quiosque de praia do Rio de Janeiro, no dia 24 do mês passado.

O ato ocorreu em frente ao campus da Liberdade, sede da Unilab, em Redenção, primeira cidade brasileira a libertar todos os seus escravos, em 1883, cinco anos antes da abolição da escravatura no Brasil, com a Lei Áurea em 1888. A Unilab é destinada a alunos da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) como Brasil, Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique e Timor Leste.

O protesto foi promovido pelo coletivo das Associações de Estudantes Africanos da instituição.

O ato

Usando máscaras de proteção contra a Covid-19, os estudantes exibiam faixas que pediam Justiça e respeito pela população negra. Os cartazes traziam mensagens como "justiça por Moïse", "a carne mais barata do mercado é a carne negra" e ainda "nós somos humanos".

O estudante Abel Calombo se mostrou preocupado com a quantidade de pessoas negras mortas no país e afirmou que não vai parar de lutar pelos direitos da população negra.

A nossa luta é contínua por isso estamos aqui em solidariedade a família de Moise. Vamos continuar resistindo, não vamos nos calar. A cada dia ouvimos relatos de pessoas pretas morrendo e o estado brasileiro não faz nada para mudar isso, disse.

De acordo com o estudante de administração pública da Unilabrede, Jorge Fernando Lodna, o ato é para mostrar a indignação contra o crime além de pedir justiça e o fim do racismo. “O objetivo do ato é pedir justiça, porque nós queremos que seja feita Justiça. E também mostrar que nós somos contra homicídio por questões raciais – um ato que consideramos xenofóbico e racista”, afirmou.

Para o professor moçambicano do Instituto de Humanidades, Segone Ndangalila Cossa, além de prestar uma homenagem a Moïse, os participantes celebram a comunhão da nação africana.

Será também um momento de celebração de comunhão e de organização negra africana para homenagear Moïse Kabagambe, que foi um imigrante congolês brutalmente assassinado no Rio de Janeiro. E o nosso coro junta-se ao coro nacional”, explicou.

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Com informações do G1 CE.