24 de dezembro de 2025

Líderes da luta antirracista inspiram nomes de brasileiros; veja lista

 

O revolucionário  e então presidente de Moçambique, Samora Machel, discursa no estádio de Machava, celebrando o primeiro aniversário da independência mocambicana, Maouto, 25 de junho de 1976. (FOTO | AFP).


Líderes nacionais e internacionais da luta antirracista serviram de inspiração para nomes de brasileiros, segundo lista divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O levantamento feito mostrou quais são os nomes mais populares e inusitados entre os brasileiros. A lista de nomes do IBGE é liderada por Maria, com 12 milhões de registros, e José, com cinco milhões de pessoas no país.

Líder do quilombo dos Palmares, Dandara é um dos nomes mais populares, com 17.892 registros. O nome ocupa a 1.144ª posição na lista dos mais utilizados no país. O estado com mais Dandaras no Brasil, em números absolutos, é o Rio de Janeiro, com 2.593 pessoas, seguido pela Bahia, com 1.944 pessoas.

Dandara é uma das lideranças do Quilombo dos Palmares, um dos mais importantes marcos de resistência negra do país. Entre os séculos XVI e XVII, 30 mil pessoas chegaram a habitar a região, polo de resistência contra a escravidão no Brasil, localizado na Serra da Barriga, no atual estado de Alagoas.

Para o pesquisador e cientista social Lucas Obalerá, autor da pesquisa de mestrado “Orúkọ: o sentido político-filosófico dos nomes próprios de origem africana na diáspora brasileira”, publicada em 2023 na Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), a figura de Dandara assume um papel importante para o fortalecimento da memória negra.

Todo o investimento do movimento negro e de mulheres negras no processo de visibilidade da figura feminina na luta e isso me leva a pensar sobre a importância que a construção de imaginários positivos em relação aos heróis e às heroínas do Brasil, porque os nomes estão ligados às referências culturais. Dandara é uma referência que foi construída”, explica

Obalerá acredita que esses nomes são uma forma de conectar pessoas negras à sua ancestralidade.

O resgate dos ‘nomes ancestrais’ está ligado à valorização positiva da identidade, da história, da cultura e da ancestralidade negra. Trata-se de um caminho para romper com o referencial branco-ocidental que insiste em desumanizar e inferiorizar nossos modos de vida”.

Algumas referências internacionais da luta contra o racismo também podem estar entre os nomes mais populares entre os brasileiros. Malcolm, uma possível referência ao líder dos direitos civis norte-americanos Malcolm X, é o nome de 214 pessoas, sendo 110 em São Paulo e 20 no Rio de Janeiro. Obalerá acredita que a referência é uma leitura possível, mas exigiria estudos adicionais para confirmar a influência do líder entre os brasileiros.

Líderes africanos também são nomes de brasileiros

Assim como nos EUA de Malcolm X, a segregação espacial também foi um problema na África do Sul, que de 1948 a 1994 viveu sob o regime do Apartheid. Naquele período, pessoas negras não tinham a possibilidade de votar e ainda precisavam de um documento de autorização para frequentar regiões centrais de Joanesburgo e a Cidade do Cabo.

Nelson Mandela e Winnie Mandela foram dois importantes nomes na luta contra o Apartheid e reconhecidos internacionalmente. No Brasil, o sobrenome Mandela é usado por 142 pessoas, sendo 31 no estado de Minas Gerais.

Os processos de independência no continente africano começaram a partir de 1950 e influenciaram o universo dos negros brasileiros. Samora Machel liderou Moçambique na luta contra o colonialismo português, liberdade conquistada em 1975, e se tornou o primeiro presidente eleito democraticamente da nação africana.

No Brasil, 63 pessoas se chamam Samora, enquanto 3.009 pessoas têm o sobrenome de Samora, a maior parte no Espírito Santo, que tem 905 registros.

Apesar da documentação do IBGE, para o pesquisador Obalerá, nomes de origem africana não são algo recente da história brasileira.

A retomada de nomes próprios de origem africana tem se afirmado como um movimento crescente no Brasil. Observam-se dois processos simultâneos: a nomeação de crianças negras com nomes africanos e o aumento de pessoas negras que se renomeiam, compreendendo a dimensão política, cultural e espiritual do nome”, afirma.

Ele conta que isso está ligado com a retomada das organizações de movimento negro, na segunda metade do século XX, que ganhou corpo com a fundação do Movimento Negro Unificado (MNU), em 1978.

Embora atual, esse movimento não é inédito. Desde a década de 1980, o movimento negro brasileiro já destacava a importância de nomear as novas gerações com nomes africanos e de lideranças negras da luta antirracista, como parte da reconexão política e cultural com o continente africano”, explica.

Para Obelará, a manutenção dessa tendência na atualidade é uma forma de exaltar e fortalecer a memória da luta antirracista.

No presente, essa prática representa um processo de ressignificação e ampliação do próprio sentido da luta política do movimento negro e de suas conquistas. Nomear crianças negras com palavras que exaltam nossa história e memória coletiva vitoriosa tem profundo valor simbólico e impacta diretamente a vida desse novo sujeito, que já nasce carregando um nome que dignifica sua existência negra”, conclui.

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Por Pedro Borges, na Alma Preta Jornalismo.

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