Por Alexandre Lucas, Colunista
O
Cultura Viva enquanto política pública e posteriormente como política de
estado, o qual ficou conhecido a partir dos Pontos de Cultura, é
substancialmente uma metodologia e campo de disputar para repensar a relação da
sociedade civil e o poder público, no tocante, ao reconhecimento, o
aparecimento e a legitimação do protagonismo dos sujeitos e de suas
organizações, nos territórios e nos lugares.
O
Cultura Viva coloca em evidência o conflito, as contradições e a fragilidade do
conceito de gestão democrática e participativa, em especial, no âmbito dos
municípios, onde as disputas são mais acirradas.
Reconhecer
o papel e o protagonismo dos movimentos sociais na deliberação das políticas
públicas, no controle social e no aparecimento da comunicação institucional
continua sendo um desafio, um espaço para ser conquistado.
Decolonizar
parece ser um termo conveniente para romper com uma lógica de pensamento
hegemônico de política pública baseada na negação deliberada do aparecimento
das vozes e ações oriundas da sociedade civil, o indeferimento do conflito e da
contradição com tática política de silenciamento dos movimentos sociais e o
equivocado discurso de gestão democrática e participativa que não se sustenta
quando se apresentam as vozes das contraposições, das discordâncias e das
oposições.
A
democracia não é um conjunto de iguais, pelo contrário, é um caminho
divergente. É na divergência que se constrói a democracia, dito de outra forma,
é com a participação de diversos e
divergentes sujeitos e organizações
sociais que se constrói uma gestão democrática e participativa. Não se constrói
democracias entre iguais, pelo contrário se alicerça a ditadura ou
distanciamento do conceito democracia que não é uno, mas que está longe ser um
conjunto de compreensões de iguais.
O
Cultura Viva enquanto perspectiva de política pública e de movimento social tem
muito para nos ensinar sobre gestão democrática e participativa. Precisamos
ficar atentos e desmascarar as tentativas constantes de ataques à democracia
ventiladas e orquestradas de forma mais nítida e robustas pela direita
representada por um discurso que elege a participação e a democracia como
inimigas.
Por
lado os setores do campo democrático e progressista, incluindo setores da
esquerda, precisam aprofundar o debate sobre a necessidade do protagonismo dos
sujeitos e de suas organizações na construção e deliberação das políticas
públicas, tendo em vista que é notório, ainda, uma visão romanceada de
democracia por alguns setores, baseada em concepções negacionistas do conflito,
da contradição e da luta de classes. O
diálogo e o consenso não é em hipótese alguma uma homogeneidade numa sociedade
dividida antagonicamente em classes sociais irreconciliáveis.
Qual
a necessidade do protagonismo dos sujeitos e de suas organizações na
deliberação das políticas públicas? Se queremos aprofundar os mecanismos de
participação e de acessibilidade das políticas públicas, minimamente os
espaços, os micros espaços de poder, precisam ser compartilhados. Neste sentido
é preciso também mudar a direção do holofote da comunicação institucional,
democratizar a comunicação é um ato político, que orienta quem deve
protagonizar as narrativas.
Historicamente,
os sujeitos e suas organizações foram excluídos do direito de participar e decidir
sobre as políticas públicas e consequentemente de aparecer enquanto
construtores da democracia. Isso não é um detalhe, é uma deliberação.
Participar,
decidir e aparecer é indispensável para que os movimentos sociais ocupem outro
lugar na esfera da política pública. Afinal, é sempre importante entender que a
comunicação cumpre uma função política central na ocupação dos espaços de poder
e isso nunca foi detalhe.