Com inflação já em alta, conta de luz pode ficar até 21% mais cara em 2022

 

Segundo o IPCA-IBGE, gasto com energia residencial subiu 30% em 12 meses. (FOTO/ Reprodução).

A energia elétrica, um dos itens que alimenta a alta a inflação, vai provocar um severo reajuste na conta de luz no ano que vem. Na semana que passou, o IBGE informou que o IPCA de outubro (1,25%) foi o maior para o mês em quase 20 anos. O índice oficial da inflação no país já soma 10,67% em 12 meses.

De acordo com a área técnica da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), o reajuste tarifário médio em 2022 deve ser de 21,04%, para cobrir o “rombo” da crise deste ano. As informações foram publicadas pelo jornal O Estado de S.Paulo e posteriormente confirmadas por outros veículos. Segundo nota da Aneel, essas informações “correspondem a estimativas preliminares baseadas em cenários hipotéticos que ainda não consideram as medidas de atenuação tarifárias que serão implementadas em 2022”.

Coma crise hídrica no país, o governo acionou as usinas termelétricas, mais onerosas. Ainda assim, mesmo com a aplicação da bandeira de escassez hídrica nas contas pagas pelo consumidor, a agência fala em déficit de arrecadação. Há ainda um gasto relativo a compra emergencial de energia de reserva.

O Ministério de Minas e Energia deve apoiar novo empréstimo às distribuidoras para cobrir custos extras com geração de energia. Isso para evitar que o custo seja integralmente repassado à conta de luz dos consumidores em 2022 – que é um ano eleitoral.

Segundo os dados do IPCA-IBGE, a energia elétrica residencial subiu 19,13% no ano e 30,27% nos últimos 12 meses. Perde para a gasolina, com 38,29% e 42,72%, respectivamente.

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Com informações da RBA.

Agora é Lei! Estatuto da Equidade Racial garante direitos à população negra do Pará

 

(FOTO/ Reprodução/ Brasil Escola).

De autoria do deputado Bordalo (PT), foi publicada nesta sexta-feira (12) no Diário Oficial do Estado do Pará e sancionada pelo Governador do Estado Helder Barbalho a Lei nº 9.341 que institui o Estatuto da Equidade Racial no Pará e se estabelece como o primeiro Estatuto Estadual da região Norte, um marco histórico para a legislação paraense.

Na semana que antecede a celebração do  Dia Nacional da Consciência Negra, a Lei nº 9.341 objetiva garantir à comunidade negra do Pará a abertura de oportunidades, a defesa dos direitos raciais individuais e difusos, ou seja, que atende a população negra em sua coletividade. A proposição abrange um conjunto de regras e princípios jurídicos que visam coibir a discriminação racial.

Esses princípios abrangem direitos fundamentais como saúde, educação, trabalho, acesso à terra e à moradia, cultura, esporte e lazer, além de assegurar que a herança e participação da população negra estejam presentes nas produções veiculadas nos órgãos de comunicação do Estado.

Uma das diretrizes da Lei são os programas de ação afirmativa que vão se constituir em políticas públicas destinadas a reparar as distorções e desigualdades sócio-raciais e de gênero e demais práticas discriminatórias adotadas, nas esferas pública e privada, durante o processo de formação social do Estado do Pará e do País.

Para o autor da lei, deputado Bordalo, o Estatuto da Igualdade Racial, que passou a ser denominada de Estatuto da Equidade Racial, altera o padrão civilizatório do país, deixando para trás o padrão trazido pelo escravismo, pela opressão de raça, o preconceito e a forma não-igualitária como as pessoas negras são tratadas na nossa sociedade.

“O Pará tem que ser uma terra de direitos, uma terra de oportunidades, uma terra onde todos e todas, independente de raça, credo, orientação sexual possam ser felizes parabenizo o movimento negro do Pará, em particular o Cedenpa por esta vitória. É uma vitória da sociedade paraense e que iniciemos a partir daqui uma nova etapa, uma etapa de progresso civilizatório transformando o Pará numa terra de direitos assegurados e de reconhecimento aos negros e as negras do Pará”, declara o parlamentar.

ESTATUTO

O Brasil já possui um Estatuto de Igualdade Racial, determinado pela Lei Nº 12.288/2010, que em 2020 completou uma década, contudo até hoje o Pará não possui políticas específicas voltadas à população negra, como afirma Amador.

O Estatuto da Igualdade Racial adota os princípios da Lei Federal nº 12.288, de 20 de julho de 2010, que cria o Estatuto de Igualdade Racial e que em 2020 completou uma década. A proposição trata de questões específicas do Estado como, por exemplo, alterações das leis estaduais n° 5.810, de 24 de janeiro de 1994, nº 6.941, de 17 de janeiro de 2007.

A sua construção foi feita a partir da realidade e especificidades do Pará, resultado de debates e análises coletivas entre o mandato do Deputado Bordalo e o movimento negro do Pará. A primeira reunião ocorreu em março de 2020, na sede da Assembleia Legislativa, onde foi montado um Grupo de Trabalho que debateu sobre a construção do PL a partir daí inúmeras reuniões foram realizadas. Com a pandemia, reuniões virtuais. No dia 15 de março o projeto foi protocolado à mesa diretora da Alepa e desde lá o Deputado Bordalo trabalhou para que a proposição fosse aprovada como Lei.

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Com informações do site do Dep. Bordalo.

Gilberto Gil é eleito para Academia Brasileira de Letras

 

(FOTO/ Reprodução).

Na tarde desta quinta-feira (11), o músico baiano Gilberto Gil, de 79 anos, foi eleito por maioria absoluta à cadeira de número 20 da Academia Brasileira de Letras (ABL). Gil teve 21 votos, enquanto o poeta Salgado Maranhão teve 7 votos e o autor e crítico literário Ricardo Daunt não foi votado.

A vaga ficou disponível após o falecimento do acadêmico e jornalista Murilo Melo Filho, em maio do ano passado. A cadeira 20 tem como patrono o médico e jornalista Joaquim Manuel de Macedo e já pertenceu a um dos fundadores da ABL, Salvador de Mendonça. Também foram ocupantes da cadeira Emílio de Meneses, Humberto de Campos, Múcio Leão e Aurélio de Lyra Tavares.

Gilberto Gil é cantor, compositor, multi-instrumentista e produtor musical. No currículo, o artista tem dois prêmios Grammy Awards, nos anos de 1998 e 2005. Ele também ganhou duas vezes o Grammy Latino, em 2001 e em 2002. Em 1999, foi nomeado “Artista pela Paz”, pela Unesco. O novo imortal tem uma extensa discografia com mais de 50 álbuns.

Mudanças na ABL

Na semana passada, a Atriz Fernanda Montenegro foi eleita à cadeira 17, sendo a única candidata à vaga. Na ocasião, a atriz de 92 anos recebeu 32 votos. Fernanda se tornou a primeira atriz a receber o título.

Faltam mulheres negras

A Academia Brasileira de Letras ainda não elegeu nenhuma mulher negra. Em 2018, a ABL elegeu Cacá Diegues para a cadeira número 7 para vai substituir o cineasta Nelson Pereira do Santos. Na ocasião, ele derrotou outros dez candidatos, entre eles Conceição Evaristo, a escritora, de 71 anos, que tem seis livros publicados e já venceu o Jabuti, o mais tradicional prêmio da literatura brasileira.

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Com informações do Notícia Preta.

Câmara de Altaneira aprova feriado para o dia Nacional da Consciência Negra

 

Câmara de Altaneira aprova feriado para o dia Nacional da Consciência Negra.
Zumbi e Dandara Palmares são símbolos da luta contra o racismo e a exploração.
(FOTO/ Reprodução).

Por Nicolau Neto, editor

A Câmara de Altaneira aprovou nesta quarta-feira (10) o Projeto de Lei 026/2021 que institui feriado no município no dia 20 de novembro, data em que simboliza todo um histórico de luta e de resistência da população negra que por mais de três séculos foi escravizada. Marca também a morte de um dos principais líderes e defensores da comunidade negra, o Zumbi dos Palmares.

Apresentado pelo vereador e presidente da casa, Deza Soares (PT), o PL destaca que a data ainda que incluída no calendário escolar, não é efetivamente cumprida mesmo depois de 18 anos e não é feriado em todos os municípios. Levantamento feito pelo Blog Negro Nicolau dão conta de que pouco mais de mil municípios decretaram o dia como feriado e apenas cinco estados instituíram o feriado legalmente.

Na justificativa, ele afirmou que esta propositura contribui para que o grupo que representa mais de 56% da população, possa se sentir contemplado, além de demonstrar que Altaneira, por meio deste parlamento, está acenando positivamente para reconhecer a importância da negritude na formação do país.

Tornar o dia em que se relembra toda uma história de resistência e de luta da população negra do país, é uma das 11 (onze) propostas do Plano Municipal de Combate ao Racismo e de Promoção da Equidade apresentado pelo professor e fundador deste Blog, Nicolau Neto, junto aos poderes executivo e legislativo no mês de maio do ano em curso.

Com a aprovação que ocorreu por unanimidade, Altaneira se torna o primeiro município do Ceará a instituir o 20 de novembro como feriado e entra para a seleta lista que conta com pouco mais de 1.000 que já fizeram o mesmo. Altaneira é também o primeiro do Ceará que conta com um Plano Municipal de Combate ao Racismo e de Promoção da Equidade.

A propositura segue agora para a sanção do poder executivo municipal.

Clique aqui e confira o Plano Municipal de Combate ao Racismo e de Promoção da Equidade.

A potência do Povo Negro

 

O Enem 2021 é considerado o mais branco da história. (Foto/Pexels).

O Brasil passa por uma das maiores crises de sua história. A falta de emprego, a volta da fome e um número absurdo de alunos fora da escola são alguns exemplos das mazelas que estamos enfrentando. E nós, jovens negros, estamos sendo atingidos diretamente com o descaso deste governo.

Já em 2020, o IBGE divulgou dados de 2019 mostrando que, dos 10 milhões de jovens brasileiros entre 14 e 29 anos de idade que deixaram de frequentar a escola sem ter completado a educação básica, 71,7% são pretos ou pardos. E isso não são só números! Em minhas “andanças” pelas escolas públicas do Brasil, conheço tantos jovens negros potentes que deixam a escola para trabalhar e ajudar a renda da família… Quando vejo e escuto isso, mesmo com todo um trabalho de resgate que tento fazer, penso no futuro do Brasil…

Penso neste futuro que estará perdendo essas potências. Lembro que, assim como eu, que quero ser a primeira da minha família a cursar uma Universidade, existem tantos outros jovens negros que também desejam realizar este sonho. Mas me revolto em saber e ver que existe um enorme descaso do Governo Bolsonaro com as políticas públicas que dificultam a entrada de tantos na faculdade. E isso não é achismo meu. Temos prova, o Enem de 2021 é o mais branco e elitista desde 2009, de acordo com dados do levantamento feito pelo Semesp (Sindicato das Mantenedoras de Ensino Superior).

O resultado da política de extermínio de Bolsonaro será sentida. Daqui a quatro, cinco, seis anos, não teremos grande parte da juventude negra se formando. Perde o Brasil, perde a economia, perdemos todos. Por isso, é imprescindível que lutemos agora, com toda força que temos, contra o desmonte nas escolas, contra a evasão escolar, contra a fome.

Neste novembro negro, assim como os demais meses do ano, vamos mostrar a nossa força para resgatar o nosso povo fora da escola. Vamos participar de campanhas, nos posicionarmos politicamente e mostrarmos que somos potência! Ninguém tira o Trono de Estudar!

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Por Rozana Barroso*, originalmente no Notícia Preta.

*Tem 22 anos, natural de Campo dos Goytacazes (RJ), é estudante de cursinho pré-vestibular popular, ativista da Educação e presidenta da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (UBES)

Secretário de Cultura do Estado participará de ato de entrega do projeto Urbanístico e Paisagístico na Comunidade do Gesso

Comunidade do Gesso, em Crato-CE. (FOTO/ Reprodução/ Whatsapp).

O projeto contemplou a construção de escadarias, corrimões, calçadas, canteiros, espaços de convivência, oratórios e revitalização de terreiros culturais. O trabalho envolveu mão de obra da própria comunidade. De acordo com os integrantes do Coletivo Camaradas, essa ação visa ocupar criativamente a cidade e ao mesmo atrair para localidade ações artísticas, culturais e bem-estar social.         

O projeto também está servindo para consolidar o Sítio Urbano do Gesso, experiência reconhecida por lei municipal, que compreender as margens da linha férrea, no percurso da comunidade. O Sitio Urbano é um exemplo de agricultura urbana que envolve participação comunitária, cuidado coletivo e gestão pública.  

Além da intervenção urbanística e paisagística, o projeto beneficiou cerca de 16 organizações que atuam no Território Criativo do Gesso.

O secretário de Cultura Estado do Ceará, Fabiano Piúba foi um dos articuladores nacionais pela aprovação da Lei Aldir Blanc que contribuiu para reduzir os impactos na economia da cultura no período pandêmico.  

Deverão participar do ato, outros representantes da Secretaria de Cultura do Estado, representantes de pontos de cultura, coletivos, associações comunitárias, universidades, gestores municipais e mestres da cultura popular.

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Texto encaminhado ao Blog por Francisco Nascimento.

Enem 2021: Governo Bolsonaro recomeça a temporada de sacanear estudantes

 

Jair Bolsonaro e o ministro Milton Ribeiro. (FOTO/ Reprodução/ Facebook/ Jair Bolsonaro)

Fazer Enem é uma longa corrida de obstáculos, ainda mais quando você é pobre. O governo Jair Bolsonaro, ao invés de ajudar a suavizar o caminho dos estudantes, coloca areia movediça, lagos com jacarés, canhões de raio laser e cercas eletrificadas no meio.

Como a nota do Exame Nacional do Ensino Médio é usada para a seleção em universidades dentro e fora do país, a prova é um momento em que o governo federal deveria garantir segurança e tranquilidade aos estudantes. Mas a gestão Jair Bolsonaro, por incompetência ou sadismo, tem transformado o antes, o durante e o depois em um inferno desde 2019.

Nesta segunda (😎, a 13 dias do Enem 2021, 29 servidores do Inep, instituto ligado ao Ministério da Educação, pediram exoneração de seus cargos. Desses, 27 trabalham em áreas ligadas à prova, de acordo com reportagem do UOL. Com essas, são 31 demissões do Inep em uma semana.

No pedido de dispensa, citam a "fragilidade técnica e administrativa da atual gestão máxima do Inep". Danilo Dupas, presidente do órgão, é acusado por servidores de tomar decisões sem critérios técnicos, realizar assédio moral e se omitir de responsabilidades.

O bafafá começa a nova temporada de dores de cabeça imposta pelo governo Bolsonaro aos estudantes. Neste ano, o responsável pela lojinha é o pastor Milton Ribeiro, o ministro da Educação que acredita que crianças com deficiência estudando junto com as demais "atrapalha".

A realidade apontou que o principal problema envolvendo o Enem, mais do que ideologia, seria a incompetência aliada à soberba e à falta de transparência.

Com o MEC transformado na Casa da Mãe Joana já sob o ministro Ricardo Vélez Rodríguez, com pessoas que não ficavam no cargo o suficiente para esquentar a cadeira, sem planejamento, comando ou autocrítica e tendo sido loteado com grupos de extrema direita, o ministério tornou-se mais vulnerável a falhas.

O resultado veio a galope. Mais de 170 mil estudantes enviaram reclamações ao MEC por conta de sua nota no Enem 2019.

Alguns registraram representações no Ministério Público Federal, exigindo revisão geral da correção da prova, auditoria transparente nos processos e suspensão da seleção pelo Sisu (o Sistema de Seleção Unificado) enquanto tudo não fosse resolvido. As reclamações pipocaram nas redes sociais logo após o então o ministro Abraham Weintraub ter dito que aquele tinha sido "o melhor Enem de todos os tempos" em 17 de janeiro de 2020.

Quando os problemas do Enem 2019 ainda se faziam sentir, o governo federal veio com outra bomba, mantendo as datas para a realização do Enem 2020, desconsiderando que milhões de alunos do ensino médio de escolas públicas estavam com os conteúdos atrasados devido à pandemia de coronavírus. Foi tomar o caldo de uma segunda onda sem tempo de respirar após a primeira.

O Ministério da Educação chegou ao ponto de veicular uma campanha em que justificava para esses jovens que era legal ser largado à própria sorte. Dizendo que "a vida não pode parar", que "é preciso ir à luta", "se reinventar", "superar", quatro jovens atores pedem para que todos "estudem", "de qualquer lugar", "de diferentes formas", pois "seu futuro já está aí".

Enquanto a vida nas boas escolas particulares seguiu seu curso na pandemia, com plataformas de educação à distância, rico material didático e professores minimamente treinados para aulas pela internet, aulas em realidade virtual, na maioria das escolas públicas, estudantes foram obrigados a entrar em férias. Depois, a se conectar com uma realidade precária de ensino à distância, não por culpa dos docentes e dos gestores educacionais, mas pelas deficiências de parte do sistema público. Muitas casas não tinham acesso à internet, outras nem computador.

Fazer Enem é uma corrida de obstáculos, ainda mais quando você é pobre, como disse acima. Bolsonaro parece querer deixar claro que só os fortes devem sobreviver.

A menos, é claro, que você tenha o sobrenome "certo". Como mostrou a história da admissão da filha de Bolsonaro no concorrido Colégio Militar de Brasília sem passar pelas provas como os outros mortais, nós temos meritocracia sim. Pena que, por aqui, ela é hereditária.

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Por Leonardo Sakamoto, em seu Blog. Lei a íntegra aqui.

O movimento negro brasileiro e a circulação de referenciais para a luta antirracista

 

(FOTO/ Reprodução).

Ainda é muito comum no Brasil, em diversos meios de comunicação e até mesmo na universidade, a afirmação de que o movimento negro brasileiro na contemporaneidade seria uma cópia, em menores proporções, do movimento negro pelos direitos civis dos Estados Unidos, que mobilizou a atenção de populações negras mundo afora nas décadas de 1950 e 1960. Não há dúvidas de que o que hoje chamamos de “movimento negro contemporâneo”, constituído no Brasil a partir da década de 1970, recebeu, interpretou e utilizou informações, ideias e referenciais produzidos na diáspora africana de uma maneira geral, especialmente nas lutas pelos direitos civis em território estadunidense e nas lutas por libertação nos países africanos na segunda metade do século XX, sobretudo aqueles sob o regime colonial de Portugal.

Entretanto, esse adensamento político que contribuiu e ainda contribui para a luta antirracista no mundo nunca foi uma “via de mão-única”. Pelo contrário, podemos verificar nitidamente até os dias de hoje a circulação de repertórios críticos e pessoas pelo “Atlântico negro”. Aliás, não podemos esquecer que o racismo, um elemento estruturante das desigualdades com as quais convivemos historicamente no Brasil, é uma das faces da “modernidade” que se consolida em meio ao imperialismo europeu no século XIX. Esse racismo não respeita limites territoriais. Da mesma forma, a luta antirracista precisa ser entendida a partir de uma perspectiva transnacional, que deve contemplar as diferentes contribuições produzidas na luta política em diferentes contextos nacionais. O que pouca gente sabe é que o movimento negro brasileiro, especialmente durante a década de 1930, também contribuiu consideravelmente para a circulação de referenciais para a luta antirracista, servindo inclusive como fonte de inspiração para a dinâmica de transformações nas lutas das populações negras na diáspora africana.

Ainda durante o início do século XX, já era possível notar a importância da circulação de ideias e perspectivas de construção das lutas por melhores condições de vida para as populações negras em perspectiva global. A dinâmica das transformações, tanto nas formulações políticas quanto nas estratégias adotadas nas diferentes lutas por emancipação das populações negras, é sempre muito complexa. A partir dos anos de 1920 e 1930, a circulação de informações na diáspora negra se ampliou muito. Podemos objetivamente verificar essa circulação na imprensa negra do Brasil e dos Estados Unidos na primeira metade do século XX, onde ocorreram até mesmo intercâmbios entre jornais dos dois países.

O mais importante jornal da imprensa negra nos EUA, o Chicago Defender, fundado em 1905 na cidade de Chicago, estabeleceu um intercâmbio com O Clarim d’Alvorada, um dos mais importantes jornais da imprensa negra brasileira, que circulou entre as décadas de 1920 e 1930, em São Paulo. O Clarim d’Alvorada publicava informações sobre a comunidade negra nos EUA em uma coluna criada especificamente para esse fim, chamada de O mundo negro – que inclusive acabou sendo escolhida para dar o título de meu livro. Da mesma forma, o Chicago Defender publicava informações sobre as lutas da população negra no Brasil. Pesquisando nos arquivos do Chicago Defender encontrei 114 matérias, entre 1914 e 1978, não somente comparando as relações raciais no Brasil e nos Estados Unidos, mas também exaltando as formas pelas quais os brasileiros tratavam a questão racial, principalmente na década de 1930.

Clarim d’Alvorada, 14 de julho de 1929. Fonte: Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional.

Aqui preciso falar um pouco sobre a importância da imprensa negra nos EUA da primeira metade do século XX. Segundo o historiador James Meriwhether, a imprensa negra norte-americana chegou ao “seu auge de poder e influência” durante as décadas de 1930 e 1940. Já Gunnar Myrdal afirmava em 1944, em seu livro An American Dilemma, que esses jornais passavam de família para família e poderiam ser encontrados em barbearias, igrejas, lojas. Seus conteúdos eram transmitidos pelo “boca a boca” entre aqueles que não podiam ler. Para Myrdal, “a importância da imprensa negra para a formação de opinião entre os negros, para o funcionamento de todas as outras instituições negras, para as lideranças negras e para as ações geralmente conjuntas é enorme”. Já W.E.B. Du Bois (1868-1963), primeiro negro a receber o título de doutor (Ph.D. em História) na Universidade Harvard, em 1895, e uma das principais lideranças negras norte-americanas no início do século XX, em matéria publicada no dia 20 de fevereiro de 1943 no Chicago Defender dizia que “houve um tempo, mesmo antes da Reconstrução” (1865-1877), em que “só um negro aqui e outro lá lia um jornal da imprensa negra, e mesmo assim pedia desculpas por isso”. E terminava dizendo: “Hoje provavelmente é verdade que raramente há um negro nos Estados Unidos que sabe ler e escrever e que não lê a imprensa negra. Ela tornou-se uma parte vital da sua vida”. Nas palavras de Hayward Farrar, “a imprensa negra tem mostrado o mundo para a comunidade negra, a comunidade para si mesmo, e a comunidade para o mundo”.

Justamente durante o período considerado o ápice da imprensa negra nos EUA, há no arquivo do Chicago Defender 41 reportagens sobre a questão racial no Brasil entre 1934 e 1937. Um ótimo exemplo é a reportagem publicada no Chicago Defender em 26/10/1935 sobre uma manifestação realizada pela Frente Negra Brasileira (FNB) no Rio de Janeiro e que, segundo o jornal, teria mobilizado dez mil pessoas: “Esta organização, composta exclusivamente por brasileiros negros, tem direcionado suas energias contra a invasão dos direitos civis e constitucionais. Batendo na tecla da solidariedade nacional, ela tem conseguido eminentemente derrotar as forças do preconceito que, por pouco, ameaçaram minar o tradicional espírito de jogo limpo e igualdade pelo qual o Brasil foi conhecido antes do advento da insidiosa propaganda norte-americana”.

Reportagem sobre a Frente Negra Brasileira. The Chicago Defender, 26 de outubro de 1935. 

É interessante perceber a referência à luta por “direitos civis” levada a cabo pela FNB no Brasil. Segundo o jornal, lutava-se no Brasil pela manutenção de direitos civis e constitucionais, direitos ainda negados à população negra nos EUA. O texto seguia apresentando a FNB para o leitor negro norte-americano: “A Frente Negra é hoje a organização mais poderosa em todo o Brasil, exercendo uma influência política que mantém afastados todos aqueles que poderiam negar as garantias específicas da Constituição nacional”. Somente entre 1935 e 1937 a Frente Negra Brasileira esteve presente em nada menos do que 20 reportagens do Chicago Defender, em matérias como: “Brazilian politics seeking support of the Black Front” [Políticos brasileiros buscam apoio da Frente Negra] (20 de março de 1937), que, ao referir-se às vindouras eleições, afirmava que “os associados à Frente Negra, de acordo com fontes autênticas, vão muito além dos 40 mil, com novos membros se associando diariamente”, e que “com sua solidez, esta organização representa hoje uma das forças mais poderosas a serem consideradas no Brasil”. Essa e outras reportagens foram publicadas sempre em sua edição semanal com circulação nacional.

“Políticos brasileiros buscam apoio da Frente Negra”. The Chicago Defender, 20 de março de 1937.

É impressionante como os editores do Chicago Defender olhavam para o Brasil até meados dos anos 1930 e viam muitos exemplos a seguir, tanto na possibilidade de viver num contexto de “harmonia racial” quanto em algumas formas de luta implementadas por negros brasileiros. Havia uma admiração declarada pela Frente Negra Brasileira nas reportagens do periódico norte-americano.

Um bom exemplo, nesse sentido, é a edição do dia 11 de janeiro de 1936, que trazia no topo da primeira página, em letras garrafais, a seguinte manchete: “Grupo de negros americanos segue exemplo do Brasil; Mapeia campanha para livrar-se dos grilhões em 1936”, que apresentava para seus leitores os planos da “North American Fronte Negra” para o ano de 1936! Ainda na mesma edição, na página 24, havia outra matéria interessante: “Puerto Ricans organize Black Militant Front”, na qual o jornal afirmava que a criação da nova organização em Porto Rico também “foi inspirada no sucesso alcançado pela Frente Negra no Brasil”.

“Grupo de negros Americanos segue exemplo do Brasil; Mapeia campanha para livrar-se dos grilhões em 1936”. The Chicago Defender, 11 de janeiro de 1936.

Veículos como os jornais O Clarim d’Alvorada e o Chicago Defender tiveram um papel fundamental para a circulação de informações, ideias e referenciais para a luta antirracista no Brasil, nos EUA e em outras partes do globo. Se levarmos em consideração a importância da imprensa negra para a formação do movimento negro politicamente organizado nos Estados Unidos, principalmente nas décadas de 1930 e 1940, e a cobertura dada às relações raciais e ao movimento negro no Brasil no Chicago Defender, é possível perceber que o movimento negro brasileiro não foi apenas receptor, mas que também contribuiu para essa circulação de referenciais e até mesmo serviu como exemplo ou inspiração para outros negros em suas lutas na diáspora africana. Precisamos conhecer mais e melhor as Nossas Histórias!

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Por Amilcar Pereira, originalmente no Geledés.

Assista ao vídeo do historiador Amilcar Araujo Pereira no Acervo Cultne sobre este artigo:

https://youtu.be/rk6ZYE7WQ3w

Nossas Histórias na Sala de Aula

O conteúdo desse texto atende ao previsto na Base Nacional Comum Curricular (BNCC):

Ensino Fundamental: EF09HI03 (9º ano: Identificar os mecanismos de inserção dos negros na sociedade brasileira pós-abolição e avaliar os seus resultados); e EF09HI04 (9° ano: Discutir a importância da participação da população negra na formação econômica, política e social do Brasil.)

Ensino Médio: EM13CHS101 (Identificar, analisar e comparar diferentes fontes e narrativas expressas em diversas linguagens, com vistas à compreensão de ideias filosóficas e de processos e eventos históricos, geográficos, políticos, econômicos, sociais, ambientais e culturais).

Amilcar A. Pereira Doutor em História (UFF), com pós-doutorado em História e Educação na Columbia University (EUA). Professor da Licenciatura em História e dos programas de pós-graduação em Educação e em Ensino de História na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Coordenador do Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação Antirracista (Gepear-UFRJ); E-mail: amilcarpereira@fe.ufrj.br.

Descolonizar escola, nova batalha de Bell Hooks

 

(FOTO/ The Badger Heald)

Este texto é o prefácio de Ensinando comunidade: uma pedagogia da esperança, de Bell Hooks, recém-lançado pela Elefante, parceira editorial de Outras Palavras. Título original: “Reaprendendo a esperançar.

Começar por sempre pensar no amor como uma ação, em vez de um sentimento, é uma forma de fazer com que qualquer um que use a palavra dessa maneira automaticamente assuma responsabilidade e comprometimento.

Bell Hooks, Tudo sobre o amor

A obra de bell hooks ocupa especialíssimo espaço na formação ativista de muitas brasileiras, sobretudo as pretas, que, como eu, afetuosamente acessaram seus textos a partir das traduções e da circulação entre pares, décadas antes de sua aguardada publicação no país. Suas reflexões e seus estudos sobre raça, gênero e educação sacudiram ambientes acadêmicos e de militância negra e feminista, incitando diálogos potentes com o pensamento de intelectuais ativistas, como Lélia Gonzalez, Sueli Carneiro, Luiza Bairros, Beatriz Nascimento, entre tantas outras que, em suas trajetórias, confrontaram a especificidade das experiências de racismo e sexismo vivenciadas pelas mulheres negras brasileiras com o alcance do ideal de justiça social tão central na face pública dos movimentos feminista e negro.

Em Ensinando comunidade: uma pedagogia da esperança, bell hooks narra seu processo de formação acadêmica e identifica como epicentro de sua brilhante carreira a vivência como estudante de escola segregada onde professoras e professores alicerçaram o processo de ensino no fortalecimento da autoestima e na crença absoluta na capacidade de estudantes negros e negras construírem trajetórias acadêmicas com a excelência necessária para sustentá-los no confronto com o poder e com os efeitos do pensamento supremacista branco que enfrentariam ao longo de suas carreiras futuras.

Diante disso, a transformação da sala de aula em ambiente de afirmação da autoestima de jovens e crianças negras é central em sua experiência como educadora do ensino básico e superior e no desenvolvimento dos pilares de sua pedagogia engajada.

O exercício de transposição desse ponto de partida defendido por bell hooks para a realidade do Brasil encontra desafios similares e outros bastante específicos das relações raciais por aqui: de similar, destaco a necessária atenção à autoestima, à saúde mental e emocional de estudantes e profissionais da educação, em especial negras e negros cotidianamente submetidos à descrença de suas capacidades e ao descrédito em relação a seus conhecimentos e sua cultura ancestral. De específico, destaco a disseminação do mito da democracia racial que atua direta e fortemente no silenciamento dos efeitos do racismo institucional no estabelecimento de processos educativos qualificados em todos os níveis e para a totalidade dos estudantes.

Para nós, o reconhecimento das desigualdades raciais implica, sobretudo, a necessidade de ampliação de ações afirmativas que explicitem o comprometimento dos sistemas de ensino com a aprendizagem e o sucesso escolar e acadêmico de todos os estudantes. Esse processo de ampliação das políticas de Estado em prol das reparações históricas conta com um ator imprescindível, o Movimento Negro brasileiro.

É Nilma Lino Gomes quem define o Movimento Negro como “importante ator político, que constrói, sistematiza, articula saberes emancipatórios produzidos pela população negra ao longo da história social, política, cultural e educacional brasileira em prol da superação do racismo” 1.

Apropriar-se da interpretação histórica das relações raciais desenvolvida pelo Movimento Negro brasileiro é essencial para a construção de uma proposta político-pedagógica comprometida com o direito de alunos e alunas vivenciarem trajetórias escolares ou acadêmicas de excelência.

Esse fundamento indica a educadores, educadoras e sistemas de ensino a urgência da disseminação de uma narrativa crítica da história do país que situe, na resistência negra e indígena às opressões, a concretização do ideal de nação cidadã e equitativa.

Em obras anteriores2, bell hooks orienta a construção de um ambiente educacional onde estudantes e professores, por meio da alegria, do amor, da cumplicidade e da autorrealização, articulam conhecimentos de diferentes procedências e nesse processo constroem aprendizagens significativas e transformadoras com repercussões ao longo de toda a vida. Essa defesa do ambiente escolar como espaço de inovação, descolonização de mentes e zelo pela integridade emocional de estudantes e professores se aprofunda nos dezesseis ensinamentos presentes em Ensinando comunidade: uma pedagogia da esperança, no qual bell hooks confronta duas visões de qualidade nas relações estabelecidas na sala de aula.

Por um lado, a autora apresenta a perspectiva que situa positivamente a representação das regras de dominação características do pensamento supremacista branco, capitalista e patriarcal. Essa sala de aula que se apresenta como um “microcosmo da cultura do dominador” concede ao professor ou à professora o poder autocrático de decisão quanto à relevância ou à insignificância de experiências de um conhecimento ou outro.

Diametralmente oposta a essa proposição, bell hooks situa e defende a educação como prática da liberdade e a sala de aula como ambiente de intensos questionamentos direcionados à formação do pensamento crítico e ao enfrentamento direto da naturalização da subordinação e da humilhação em relações baseadas na manutenção do poder. Essa sala de aula que se configura em espaço de pertença, cuidado mútuo e valorização das diferenças também possibilita a conexão da educação com um território que extrapola a formação acadêmica para encontrar na humanização e no amor a Pedagogia da esperança de Paulo Freire e nela assentar os fundamentos das comunidades educativas e de resistência: “A luta pela esperança significa a denúncia franca, sem meias-palavras, dos desmandos, das falcatruas, das omissões.Denunciando-os, despertamos nos outros e em nós a necessidade, mas o gosto também, da esperança” 3.

Esperançar, para bell e Freire, é condição para o estabelecimento de comunidades educativas dispostas a reagir à violência das opressões vigentes em ambientes estruturalmente hostis à liberdade de expressão e a questionamentos das relações verticalizadas que as sustentam. É justamente nesse ponto que os ensinamentos encontram o desejo de ser feliz em sala de aula vivenciando a troca e o afeto mútuo: bell hooks não romantiza sua trajetória de professora progressista e intelectual negra; muito pelo contrário, apresenta os desafios contidos na experiência de desenvolver uma prática de ensino fundada no diálogo crítico, no antirracismo e feminismo, concebida em ambientes historicamente favorecidos pelos sistemas de opressão que ela denuncia e combate de maneira sistemática.

No oitavo ensinamento deste Ensinando comunidade, “Superando a vergonha”, bell hooks alerta para os sentimentos e as percepções potencialmente destrutivas da continuidade do sucesso acadêmico de estudantes que apresentavam qualidades evidentes em suas comunidades no ensino médio, mas que se viram invisibilizados ou humilhados no ensino superior:

Tomamos conhecimento de estudantes negros que apresentam desempenho aquém de suas habilidades. Ouvimos dizer que eles são indiferentes, preguiçosos, vítimas que querem usar o sistema para ganhar algo sem precisar retribuir. Mas não tomamos conhecimento das políticas de vergonha e de humilhação. (p. 157)

Nos ensinamentos da autora, o estabelecimento de comunidades de resistência, que por meio do exercício do mutualismo praticam acolhimento e proporcionam pertencimento, é essencial para a sustentação da capacidade de cultivar esperança, afeto e reconhecimento de um sentido comum na experiência de formação acadêmica de estudantes negras, negros e lgbtqia+. Na falta delas, o aumento dos casos de suicídio de estudantes negros nas universidades públicas brasileiras demonstra que o enfrentamento ao racismo, quando solitariamente vivido, configura-se em campo minado para a saúde mental e porta aberta para o risco de humilhação, desonra e finalmente interrupção das possibilidades de autorrealização, desenvolvimento coletivo e sobrevivência.

É possível construir essa comunidade de resistência que aproxima estudantes, professores e gestores dos diferentes sistemas de ensino que constituem a formação acadêmica; porém essa rede é insuficiente para a proteção social e emocional que garante à totalidade de estudantes negras e negros vidas maiores que sobrevidas no cotidiano das exigências da produção acadêmica. É preciso uma comunidade mais conectada que promova a aproximação mais profunda entre estudantes e professores com o mundo além da academia, pois é nesse mundo que reside o sentido de coletividade que sustenta o engajamento como possibilidade para o enfrentamento ao racismo e a disposição para “trocas dialéticas” nas salas de aula.

A rede de sustentação das microrresistências diárias ao racismo e ao sexismo reafirmada em Ensinando comunidade é composta por pessoas e situações que envolvem família, amor, sexualidade, espiritualidade, professoras dedicadas a fortalecer a autoestima e estudantes que desafiam o status quo. Essa rede é convocada também para o acolhimento dos que sucumbem à humilhação e o enfrentamento daqueles e daquelas dedicados à desonra de estudantes negras e negros.

Ainda no oitavo ensinamento, bell hooks nos conta que, no ambiente segregado onde iniciou sua escolarização, era considerada boa escritora, e isso era natural; nos ambientes escolares brancos, conviveu, perplexa, com questionamentos acerca da autoria de seus textos bem escritos. Em vários ensinamentos contidos nesta publicação, me reconheci como educadora, e em muitos outros momentos o fio da memória da estudante preta foi puxado. Nesse caso, especificamente, revivi a surpresa e a irritação de minha primeira professora de literatura ao descobrir que eu já havia lido todos os livros que ela tentara me indicar, logo eu, a estudante preta, filha da servente escolar e do restaurador de livros. Meus conhecimentos nunca foram reconhecidos ou valorizados nas aulas de literatura, mas sorrateiramente participei da formação daquela primeira comunidade de resistência leitora, forjada por meus amigos da quinta série, dialogando sobre personagens e sugerindo novos desfechos para as histórias pouco animadoras impostas e nunca discutidas em sala de aula.

Em Letramentos de reexistência 4, a pesquisadora Ana Lúcia Silva Souza alerta para o necessário reconhecimento dos estudantes como portadores de conhecimentos complexos e importantes para a qualificação dos processos de escolarização que se estabelecem a partir da apropriação, por parte da escola, das práticas de uso da linguagem em circulação nos territórios ativistas e no cotidiano de resistência às várias camadas de exclusão, racismo e discriminação enfrentadas por crianças e jovens pretos e pretas no Brasil.

Ensinando comunidade reensina o esperançar de Paulo Freire e nos convoca a praticar a pedagogia desassossegada que constrói aulas perfeitas, descritas por bell hooks como um improviso de jazz, momentos únicos em que todos estão presentes por inteiro e no agora.

1GOMES, Nilma Lino. O movimento negro educador: saberes construídos nas lutas por emancipação. Petrópolis: Vozes, 2017, p. 24.

2Ensinando a transgredir: a educação como prática da liberdade. 2ª ed. Trad. Marcelo Brandão Cipolla. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2017; Ensinando pensamento crítico: sabedoria prática. Trad. Bhuvi Libanio. São Paulo: Elefante, 2020.

3FREIRE, Paulo. À sombra desta mangueira. 11ª ed. Rio de Janeiro: Paz & Terra, 2015, p. 215.

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4SOUZA, Ana Lúcia Silva. Letramentos de reexistência — poesia, grafite, música: hip-hop. São Paulo: Parábola, 2011.

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Por Ednéia Gonçalves, no Outras Palavras.

Há 52 anos era assassinado o guerrilheiro Mariguella

 

Mariguella. (FOTO/ Reprodução).


No dia 4 de novembro de 1969, exatamente 52 atrás, era brutalmente assassinado o militante, guerrilheiro e intelectual marxista Carlos Marighella. Ele é autor de um lúcido e afiado ensaio da antologia CAMINHOS DA REVOLUÇÃO BRASILEIRA, organizada pelo historiador Luiz Bernardo Pericás. Intitulado “A crise brasileira”, o artigo faz um balanço crítico da derrota dos comunistas diante do golpe de 1964 e conclui discutindo a guerrilha como forma de luta de classes. As ressonâncias com a nossa conjuntura atual são inegáveis:

“A subestimação do perigo de direita no panorama político brasileiro foi fruto do reboquismo e da ilusão no governo. [...] A falta de vigilância e a ilusão de classe subsistem exatamente quando a liderança deixa de lado o estabelecimento de um plano tático marxista e não leva em conta a obrigatoriedade do princípio da retirada. O marxismo leninismo e inteiramente avesso à concepção de que na luta de massas tudo se resume a avançar. Assim, ao acionar a linha política de apoio às reformas propugnadas pelo setor da burguesia no poder, não era suficiente assinalar os êxitos obtidos pelas massas. Tornava se preciso, simultaneamente, alertá las e organizá las para a possibilidade de recuo da burguesia, uma capitulação ante a direita ou o desencadeamento do golpe militar – sempre na ordem do dia, quando o movimento de massas cresce a ponto de ameaçar o poder ou a ponto de levar a democracia a uma mudança de qualidade. O erro que se manifestou foi, portanto, um erro ideológico, que pode ser traduzido como a perda do sentido de classe da luta revolucionária do povo brasileiro.”

– Carlos Marighella, “A crise brasileira”, em: CAMINHOS DA REVOLUÇÃO BRASILEIRA, organizado por Luiz Bernardo Pericás 

📚 Dicas de leitura

◢ CAMINHOS DA REVOLUÇÃO BRASILEIRA, organizado por Luiz Bernado Pericás http://bit.ly/2TiWCSc

◢ O QUE RESTA DA DITADURA: a exceção brasileira, organizado por Edson Teles e Vladimir Pinheiro Safatle

http://bit.ly/2yNyrDn

◢ DITADURA: o que resta da transição, organizado por Milton Pinheiro http://bit.ly/2yUHgLl

◢ MEMÓRIAS, de Gregório Bezerra 

http://bit.ly/2zP1nIS

◢ MARGEM ESQUERDA 22, com dossiê especial sobre os 50 anos do Golpe de 1964 

http://bit.ly/margem-22

◢ MARGEM ESQUERDA 3, com dossiê especial sobre os 40 anos do Golpe de 1964 http://bit.ly/margem-3

◢ OUSAR LUTAR: memórias da guerrilha que vivi, de José Roberto Rezende e Mouzar Benedito 

http://bit.ly/2yNb115

📺 Na TV Boitempo

◢ A legitimidade da violência revolucionária de Marighella aos Panteras Negras, com Jones Manoel e Vladimir Safatle

https://bit.ly/3aJFw9q

📰 No Blog da Boitempo

◢ “Marighella: ecos do chamamento”, por Felipe Catalani

https://bit.ly/3aIGnHu

◢ “Marighella”, por Lincoln Secco

https://bit.ly/3aKX993

◢ “Marighella: o filme e a resistência de ontem e de hoje”, por Flávio Aguiar

https://bit.ly/3AJKJIT

#Marighella #Revolução #Boitempo

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Com informações da Boitempo.