Mulheres convocam manifestação nacional “Bolsonaro nunca mais” para 4 de dezembro

 

A lista de locais e horário das cidades confirmadas será divulgada na página @forabolsonaronacional - (FOTO/Jorge Araujo).

 Bolsonaro nunca mais”: com esse mote, mais um chamado nacional é feito para a tomada das ruas pelo impeachment do presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Dessa vez a convocatória do ato, marcado para 4 de dezembro, é feita por mulheres das entidades que compõem a Campanha Nacional Fora Bolsonaro, articulação que organizou seis manifestações ao longo do ano.

“O ataque que as mulheres têm sofrido no governo Bolsonaro é inegável”, diz o chamado para o ato, assinado por 29 organizações. Entre elas, estão a Articulação de Mulheres Brasileiras (AMB), a Marcha Mundial de Mulheres (MMM), o Movimento Negro Unificado (MNU), o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e a União de Negras e Negros pela Igualdade (Unegro).

Assinam também a convocatória os setoriais de mulheres do Partido dos Trabalhadores (PT), do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), do Partido Comunista do Brasil (PCdoB), da Central Única dos Trabalhadores (CUT) e da Central de Trabalhadoras e Trabalhadores do Brasil (CTB).

Inspirada na campanha #EleNão, que realizou massivos atos feministas contra Bolsonaro no período eleitoral em 2018, a mobilização atual realizou, como processo preparatório, uma plenária online no dia 23 de novembro. Houve a participação de 470 pessoas de diferentes partes do país.

De acordo com Sonia Coelho, da Sempreviva Organização Feminista e da MMM, entre as cidades com o ato já confirmado figuram, ao menos, Recife (PE), Natal (RN), Fortaleza (CE), Curitiba (PR), Porto Alegre (RS), Belo Horizonte (MG), São Paulo (SP), Campinas (SP), Santos (SP), Brasília (DF) e Palmas (TO). 

"É importante a gente tirar o Bolsonaro, nem que seja um dia antes dele terminar o governo dele”, afirma Sonia, para quem “é impossível continuar convivendo com um governo que destrói vidas e direitos todos os dias”.

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Com informações do Brasil de Fato.

'Ou ia pra aula ou comia': como insegurança alimentar está prejudicando universitários brasileiros

 

Estudante de fonoaudiologia, Franciele Rodrigues diz que tem dificuldade para comer desde que entrou na universidade, em 2013 — mas situação piorou na pandemia. (FOTO/ Tiago Coelho/ BBC).

Ao sair com sua bicicleta para fazer entregas de comida a serviço de um aplicativo, a universitária Franciele Rodrigues, 29 anos, "reza" para receber algum pagamento em dinheiro — e, com isso, ter ela mesma alguma quantia em mãos para garantir sua alimentação para os próximos dias.

Ela concilia a graduação em fonoaudiologia na Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA) com bicos de entregadora na capital gaúcha porque, desde que deixou de viver com sua família na periferia de Porto Alegre e se tornou universitária, "o bicho pegou" na tentativa de atender sozinha suas demandas de estudo, moradia e sustento.

Tudo isso se reflete em uma situação que ela conta já durar anos: ela vem comendo pouco e mal, o que já gerou consequências para sua saúde.

"Entrar na faculdade representou deixar de trabalhar e deixar de ter cuidado com minha saúde. Quando saí da casa dos meus pais e entrei na universidade, foi a primeira vez que precisei racionar comida para ter por mais tempo e diminuir a qualidade da minha dieta para ter o que comer no dia seguinte", contou Franciele por telefone à BBC News Brasil, dizendo já ter passado alguns dias sem comer nada nessa trajetória, além de ter tido anemia.

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As informações são da BBC News Brasil. Clique aqui e leia a íntegra do artigo.

Uma história Afirmativa. As cotas raciais 20 anos depois

 

(FOTO/ Joshua Mcknight)

No ano de 2001 vivíamos o limiar de transformações sociais importantes por conta da entrada em vigor de uma lei que instituiu o sistema de cotas raciais nas universidades estaduais do Rio de Janeiro. Há, nesta história, muitos significados, mas destacamos alguns. Com as cotas, pela primeira vez estudantes negros ingressariam de forma significativa no ensino superior, mormente em cursos mais elitistas como Direito, Medicina, Engenharia, etc. Além de tornarem mais democrático o acesso às instituições, as cotas também começariam a trazer um novo desafio para as políticas públicas brasileiras.

A construção de políticas públicas antirracistas no Brasil se insere num contexto de lutas que paulatinamente fazem com que as desigualdades raciais se tornem um desafio para o Estado Brasileiro. Neste contexto, nas últimas décadas, leis foram produzidas, políticas de promoção da igualdade foram criadas e o Supremo Tribunal Federal legitimou esse processo garantindo a constitucionalidade das políticas de cotas. Mas vinte anos depois de todas aquelas tensões que embalaram o início deste período de inclusão racial nas universidades do Rio de Janeiro, o que nos cabe dizer?

Ganhamos todos! É num contexto de avanços democráticos antirracistas que devemos assentar os desdobramentos trazidos pelas políticas de cotas. Os opositores, de um modo geral, foram silenciados pelo próprio caráter de inclusão, redistributivo e democrático que estas políticas trouxeram.

Há problemas? Sim. Fraudes, falta de recursos, um monitoramento mais preciso dos impactos das políticas por todo país, além de uma articulação entre as instituições e as empresas para se otimizar a promoção de talentos ávidos por mais oportunidades. Como em toda política contra hegemônica que para se consolidar está sujeita aos mais variados tipos de desafios institucionais, o sistema de cotas precisa e pode ser sempre aprimorado.

Os dados que chegam demonstram avanços significativos no que tange ao aumento de afrobrasileiros nas universidades. As pesquisas apontam que a população negra, de um modo geral, goza de melhores índices educacionais, mas ainda se mantém atrás das pessoas brancas. Neste sentido, a experiencia bem sucedida das cotas revelou a necessidade de construir um sistema de ações afirmativas que contemple um feixe de medidas que vão desde estimular estudantes pobres e negros a ingressarem na graduação, até a pós-graduação e inclusão no mercado de trabalho. Mas quem frequentou as universidades antes das ações afirmativas e volta por lá hoje, se surpreende com o alunado que anda pelo campus. O corpo discente está cada vez mais em sintonia com a diversidade que encontramos na sociedade brasileira.

Podemos dizer que as políticas de ação afirmativa deram certo e se estabilizaram de modo inexorável. Esse fato nos convida a refletir sobre muitos dos seus desdobramentos positivos. As cotas para as pessoas negras, em especial, marcam o fim da democracia racial na educação, democratizam um dos espaços mais importantes para a reprodução do poder e do saber, estimulam nossa juventude a vencer na vida por meio do acesso ao conhecimento crítico, contribuem para diversificar nossas elites e ajudam a transformar a vidas de milhares de pessoas.

Esse processo, ainda em curso, não está mais relacionado somente à graduação. As cotas são medidas poderosas e foram adotadas em mestrados, doutorados, concursos públicos federais, em muitos estaduais e municipais. Em relação ao mercado de trabalho, elas estão desafiando o silêncio corporativo dos que ainda, equivocadamente, pensam que pode haver compatibilidade entre democracia e desigualdade racial.  

Com as cotas, a democratização que o antirracismo promove criou instituições mais justas, uma verdadeira transformação social vem se consolidando, apesar de todo retrocesso dos últimos anos.

O Brasil precisa cada vez mais, reconhecer para libertar. Consignar o consenso de que estudantes negros e pobres a partir das cotas estão mudando a universidade pra melhor, e por elas transformando o país. As ações afirmativas são uma realidade, um fato social potente e democrático, que se desenvolvem em diversas áreas, fomentando a cidadania e tornando possível o que antes delas era impensável.

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Com informações do Notícia Preta.

Dos pasquins à internet: jornalismo negro atravessou séculos em luta contra o racismo

 

Imprensa negra sempre debateu desigualdade, violência e racismo no Brasil - WikiCommons

Não é exagero dizer que a imprensa brasileira deve boa parte de sua evolução ao movimento negro. Poucas décadas após o início da prática jornalística no país, a partir da chegada da coroa portuguesa, em 1808, a luta contra o racismo esteve presente e, muitas vezes, chegou a ter papel central no desenvolvimento crítico do setor.

Essa importância, no entanto, não se traduziu em espaço, apoio ou fortalecimento. Embora tenha sido essencial para a construção da comunicação no Brasil, a luta do povo preto foi marginalizada, o que é traduzido na abordagem ainda tímida do racismo e na presença pequena de pessoas negras nas redações e agências.

Em uma pesquisa realizada por iniciativa dos Jornalistas&Cia, Portal dos Jornalistas, Instituto Corda e I’MAX, dados mostram que, entre jornalistas que se declaram pretos, pretas, pardos e pardas, 98% relatam dificuldades para se desenvolver na carreira.

Ainda de acordo com o estudo, a sub-representação é expressiva. Apenas 10% dos e das profissionais de imprensa se autodeclararam negros ou negras. A maior parte dos cargos de coordenação e chefia é ocupado por pessoas brancas, que estão em mais de 60% dessas posições. O cenário se inverte na realidade de trabalhadores e trabalhadoras pretos e pretas, mais de 60% estão na linha de frente da produção de notícias, são repórteres, editoras, editores, produtoras e produtores.

Há disparidade também nos salários. Pouco mais de 20% das pessoas brancas estão na faixa de remuneração mais baixa, entre as pretas, esse percentual ultrapassa 40%. O cenário é resultado de uma realidade que tem suas estruturas baseadas no racismo e que pouco avançou na reparação por séculos de desumanização e escravidão.

No cotidiano de profissionais, esses números viram experiências dolorosas e esforços multiplicados para o crescimento profissional, "tem microagressões que a gente não sabe nem como nomear. É tão sofisticado, que parece que está na nossa cabeça", relata a jornalista Yasmin Santos, pesquisadora em direitos humanos e em questões raciais.

Ela percebe uma melhora gradual na representatividade nas redações, mas lembra que os cargos de chefia e as funções com autonomia para tomada de decisões seguem ocupados predominantemente por homens brancos.

"Existe a sensação de que está melhorando, mas isso não quer dizer que a gente não tem muito a caminhar. Se a gente pega quem são os chefes dessas empresas, a porcentagem de profissionais negros e que cargos eles ocupam, a gente vê ainda uma desigualdade muito grande".

A pesquisadora ressalta que o cenário ideal também passa por remunerações mais justas, "Se a gente vê, por essa pesquisa, que profissionais negros têm dificuldade de crescer dentro da carreira, temos que construir um ambiente de trabalho em que profissionais possam crescer por seus próprios méritos. Que não precisem trabalhar duas, três, quatro, cinco vezes mais, para conseguir o primeiro aumento da carreira cinco anos depois".

A reação

Tentativas de contraponto a essa dinâmica crescem com a internet, espaço que hoje abriga boa parte das experiências de jornalismo negro no país. O Brasil de Fato conversou com jornalistas responsáveis por veículos online que tratam exclusivamente das pautas negras. As mudanças e avanços são celebrados, mas ainda há obstáculos econômicos e políticos.

Uma dessas profissionais, Tânia Regina Pinto, criou o site Primeiros Negros, que nasceu de “um blog sobre o pioneirismo do povo negro” e, hoje, se dedica à promoção do antirracismo, da igualdade e do desenvolvimento das potencialidades de pretos e pretas. Por mais de dez anos, ela escreveu sobre “como é existir”.

No início da pandemia, em conversas com o filho Pedro Otávio sobre os impactos que a crise sanitária causaria ao povo preto, ela decidiu transformar o projeto em um site. De início, Tania e o filho, que é designer e DJ, definiram que a iniciativa operaria com uma equipe totalmente preta.

Eu tenho mais de 40 anos de jornalismo e é a primeira vez que eu trabalho com uma redação totalmente preta. Isso nunca aconteceu. Eu sempre fui a única. Essa meninada que está chegando hoje traz um olhar novo”, celebra.

Pedro Borges, co-fundador e editor-chefe do site Alma Preta, agência de jornalismo especializada na temática racial, também destaca a coletividade preta como ponto fundamental para existência e manutenção do projeto.

O site nasceu a partir de um coletivo de estudantes pretos da Unesp, que se juntou impulsionado pelas discussões sobre cotas raciais em 2014. O nome da página surgiu como um contraponto à expressão racista “preto de alma branca”.

As coisas que estão acontecendo hoje, são coisas que a gente sonhava no começo. Que era a gente, de alguma maneira, criar um espaço para produzir sobre o tema. Mais do que isso, trazer um pouco da centralidade da questão racial e olhar como pano de fundo das desigualdades do país”.

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Com informações do Brasil de Fato. Clique aqui e leia o texto na íntegra.

“Vamos romper a conciliação com os opressores”, diz Léo Péricles, pré-candidato à presidência

 

Léo Péricles. (FOTO/ Motoca/UP).

O partido político Unidade Popular (UP) decidiu concorrer com um candidato próprio para a eleição presidencial em 2022. O escolhido foi o mineiro Leonardo Péricles Vieira Roque, 40 anos, conhecido como Leo Péricles.

Fundada em junho de 2016 e com o registro oficializado no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em 2019, a legenda Unidade Popular é um partido socialista. Entre outubro de 2016 e setembro de 2018, os militantes da UP conseguiram coletar 1,2 milhão de assinaturas de eleitores para a criação da legenda.

O lançamento da pré-candidatura aconteceu no dia 14 de novembro, durante o 2º congresso nacional do partido, realizado em São Paulo com 200 delegados, que representavam 20 estados. “Somos de uma posição de esquerda que, consequentemente, não abre mão dos interesses da classe trabalhadora e do nosso povo pobre, negro e das periferias”, diz Péricles.

Filho da dona de casa Lurdes Rosário e do pintor de carros Chico Preto, ele nasceu em Belo Horizonte (MG), mas cresceu na periferia de Contagem (MG). Péricles começou a militância no movimento estudantil, em 2000. A partir de 2012, passou a atuar nos movimentos populares de periferia e ocupação urbana e é coordenador do Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB), além de presidente da UP.

Entre as principais diretrizes de governo da UP, estão: a reforma agrária, a reforma urbana, a identificação dos torturadores desde a ditadura até os dias atuais, a retomada das estatais privatizadas, a auditoria da dívida pública, a promoção da educação antirracista e a revogação das reformas previdenciária e trabalhista.

Queremos cotas em todos os âmbitos do governo federal e combater o racismo nas estruturas institucionais, em especial no Poder Executivo, será uma tarefa central. As portas estarão permanentemente abertas para o povo negro e originário, vamos fazer a demarcação e a posse das terras quilombolas e indígenas”, promete Péricles, que pretende também apresentar um projeto de reversão do encarceramento em massa, a partir de um processo de transição de justiça no Brasil, desde os crimes cometidos na ditadura militar.

A impunidade dos crimes cometidos no passado leva à impunidade no presente. Hoje, a violência do Estado se dá contra a juventude pobre e negra”, afirma o pré-candidato, que em 2005, iniciou o curso de biblioteconomia, pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), mas não concluiu.

Em 2019, Péricles compôs a chapa coligada com o PCB e PSOL para a prefeitura de Belo Horizonte e conseguiram 100 mil votos, ficando em 4º lugar. Ele concorreu como vice da Áurea Carolina (PSOL) contra outras 14 candidaturas.

O pré-candidato da UP resume o programa do partido para a corrida eleitoral do ano que vem em três frentes: antirracista, antifascista e anticapitalista. A campanha será focada na mobilização popular, em sindicatos, nas lutas sociais, nas manifestações e ocupações, para divulgar as ideias de reformas estruturais.

Precisamos reverter a atual política econômica, que é neoliberal, e iniciar uma economia popular. Vamos taxar as grandes fortunas e gerar soluções para chagas sociais nas áreas da saúde e da educação. Queremos também a redução da jornada de trabalho sem redução de salários. Vamos romper com a conciliação com os opressores”, defende Péricles.

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Com informações do Alma Preta.

Para encontrar Oliveira Silveira: O Poeta da Consciência Negra

 

Oliveira Silveira. (FOTO/ Divulgação/ LiteraturaRS).

 encontrei minhas origens

no leste

no mar em imundos tumbeiros

encontrei

em doces palavras

……..cantos

em furiosos tambores

………ritos

encontrei minhas origens

na cor da minha pele

nos lanhos de minha alma

em mim

em minha gente escura

em meus heróis altivos

encontrei

encontrei-as enfim

me encontrei

Esta escrita surge a partir das nossas vidas e se constrói com o objetivo de realizar um registro histórico que ao mesmo tempo em que é singular expressa uma vivência coletiva. Por isto, ela também é o encontro de nós mesmas, por um ideal comum – a luta pela consciência negra e a preservação das memórias de todos aqueles que vieram antes de nós e que brigaram muito para que chegássemos até aqui.

Nossa infância deu-se na década de 70. Foi naquele tempo que pela primeira vez pessoas negras reuniram-se em uma casa no bairro Bonfim, Porto Alegre, pretendendo dar início a estudos com o objetivo de encontrar uma data mais significativa ao povo negro, fugindo da narrativa de que sua liberdade teve por protagonistas pessoas brancas que defenderam o fim da escravização no Brasil.

O anfitrião era o Professor José Maria, sobre quem todos falavam como um amante do magistério, que cultivava a negritude. Ele abriu as portas de sua casa para que o genro, Oliveira Silveira,reunisse o Grupo Palmares, que fazia uma oposição ao dia 13 de maio, com o olhar crítico para a abolição da escravidão no Brasil.

Dali surgiu o primeiro ato evocativo do Grupo Palmares, no Clube Marcílio Dias, o qual apenas se realizou após obterem a licença da Censura (Afinal: o que um grupo de negros pretendia em reunião?).

 Firmou-se ali, em 1971, o primeiro 20 de novembro!

A data da morte de Zumbi dos Palmares emerge como referência de luta e o quilombo é reverenciado como espaço coletivo de fortalecimento e resistência em oposição a um sistema que não reconhecia identidade e subjetividade a negras e negros em nosso país.

Assim era Oliveira Silveira, também professor, poeta gaúcho, natural de Rosário do Sul, que sempre viu nos espaços coletivos uma possibilidade de fortalecimento:

— Ele sempre trabalhou com grupos! Terminava um grupo ele já formava outro e formava outro, mais outro!

Nossa ancestralidade e nosso presente são produtos de muitos grupos, pois somados talentos, experiências, habilidades, diferentes modos de pensar e agir, potencializam-se forças e a história é preservada!

Oliveira percebeu nas diversas tribos em África: grupos; nas pessoas em sofrimento nos navios negreiros: grupos; nos privados de liberdade das senzalas: grupos; nosquilombos:nossos mais valiosos grupos!

Depois da lei de Isabel, nas reuniões de família e amigos: grupos!Nos clubes sociais Marcilio Dias, Associação Satélite Prontidão, Floresta Aurora, formados apenas por pessoas negras: grupos!

Nas escolas de samba, Bambas da Orgia, Imperadores do Samba, União da Vila do IAPI: grupos.Sempre estivemos reunidos em grupos! 

E foram esses grupos – lugares existenciais de sociabilidade, refúgio e luta contra o racismo- que não permitiram e não permitem que sejamos eliminados, pois é no coletivo que encontramos sentido para nossas existências. Pela oralidade transmitimos, de uma geração para outra nossos conhecimentos, nossa sabedoria, hábitos alimentares, as curas, a fé. Pensamos em coletivo, pensamos em grupo, para resistirmos ao dia a dia, para fortalecermos nossas subjetividades, para construirmos identidades próprias.

Na verdade, Oliveira Silveira vivia de construir quilombos: espaços em que negras e negros pretendiam fugir da nova escravidão e viver em liberdade.

Surgiram Palmares, Semba, Associação Negra de Cultura, dentre tantos outros, todos viabilizando encontros com nós mesmos. Como diz a poesia, pessoas de pele escura, buscando umas pelas outras para enfim poderem encontrar a si próprias.

Encontre negros e negras unidos e resistindo e estará diante de um grupo, lugar onde Oliveira Silveira se encontrou! Lugar onde sua memória permanece viva!

Por isto, para encontrar Oliveira Silveira, o poeta da Consciência Negra, procure um grupo de pessoas negras que buscam por identidade e compreendem a liberdade como um processo de luta, e não como algo que foi entregue pelo opressor.

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Por Karen Luise Souza e Naiara Rodrigues da Silveira Lacerda, originalmente no Justificando.

"A novidade para esse país são os negros no poder", diz Douglas Belchior

 

Convidado desta semana no BDF Entrevista, Belchior fala sobre o casos de racimo no Carrefour e sobre a política brasileira . (FOTO/Arquivo Pessoal).

As mortes da vereadora Marielle Franco (PSOL-RJ) e do estadunidense George Floyd, dois dos mais trágicos casos de violência da história recente, foram divisores temporais na luta do movimento negro no Brasil e no mundo. A pauta ganhou força e não recuará frente às ameaças que sofre constantemente.

Desde então, as câmaras e assembleias lesgilativas do país foram ocupadas por candidaturas negras e LGBTQIA+, em paralelo ao aumento do conservadorismo dessas casas. Para Douglas Belchior, fundador da Uneafro, rede de cursos populares para negras e negros, e membro da Coalizão Negra por Direitos, a novidade para o Brasil “são os negros no poder”.

Convidado desta semana no BDF Entrevista, Belchior estuda uma filiação ao Partido dos Trabalhadores, onde já militou durante a juventude, para concorrer a uma vaga no Congresso Nacional. Esta seria sua terceira tentativa de integrar o legislativo brasileiro.

As outras duas foram em 2014 e em 2018. Ambas colocaram Belchior como suplente de deputados do PSOL, partido do qual se desfiliou neste ano, denunciando casuísmo com a pauta racial pela sigla, ao tratar o tema como um “compromisso absolutamente superficial e utilitário”.

Há uma conversa com o PT sobre uma filiação, mas isso também significa ter, da parte do PT, sinais de que a agenda é importante para eles. O PT precisa perceber isso e reivindicar esse ativo político, que é reconhecer que o racismo estrutura as relações de desigualdade e a desgraça brasileira, mas que também é no povo negro que nós temos a solução”, afirma.

Professor e uma das principais vozes do movimento negro brasileiro, Belchior fala ainda sobre o apagamento da representatividade da população negra na política nacional, principalmente na estruturação da esquerda brasileira, e sobre como a rede de supermercados Carrefour e as instituições privadas do país tentam mascarar o racismo.

O Carrefour é uma empresa racista, uma empresa genocida, que promove o racismo. O caso do [João Alberto de Freitas] Beto Freitas é o que mais se aproxima do caso de George Floyd no Brasil, e isso não foi suficiente para mobilizar os sentimentos da nação brasileira, porque a morte negra não comove.”

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Com informações do Brasil de Fato. Clique aqui e confira a entrevista na íntegra.

Se cada pessoa fizer sua parte?

 

Alexandre Lucas. (FOTO/ Reprodução).

Por Alexandre Lucas, Colunista

Uma onda festiva, harmoniosa, individualista, cheia de boas intenções e carregada de muita convicção acredita em uma tal revolução da consciência. Revolução cultural gestada de forma espontânea e a partir da autoconsciência. Baseada nas ideias “eu faço a minha parte” e de que a revolução se dará a partir do momento em que cada pessoa “tome consciência” do seu papel no processo civilizatório. Essas ideias preencheram o pensamento dos socialistas utópicos, mas não é coisa do passado, se faz presente no discurso contemporâneo, tanto do senso comum como de concepções mais elaboradas.

Essa tal revolução da consciência tem aconchego tanto na direita como na esquerda e nos ditos e enganosos movimentos livres e independentes. O que caracteriza a grosso modo esse pensamento é uma concepção que não leva em consideração a perspectiva histórica-social e as condições objetivas da sociedade. De feição idealista, ou seja, se acredita que apenas e unicamente as ideias podem fazer a transformação social. É como definir a vitória de um time de futebol sem considerar o time adversário ou escrever um romance épico sem conhecer a história.  

Essa concepção coloca em disputa para a classe trabalhadora caminhos de emancipação humana, onde o seu percurso e chegada se diferem e se antagonizam.  A esquerda enfrenta no seu seio um processo de alastramento e confusão com essas ideias, que tem ganhado capilaridade nos movimentos sociais e enfraquecido a luta da classe trabalhadora pela sua emancipação, a partir de uma compreensão histórica e social, que considera as condições objetivas da sociedade e a relação capital e trabalho, como fatores estruturantes das relações de exploração, opressão e desigualdade social.

Uma esquerda mística e carregada de idealismo pode atrasar a acumulação de forças da classe trabalhadora, como também uma esquerda sectária que não consegue enxergar para além da dimensão de uma Kombi ou que ainda faz análises conjunturais fora do tempo presente.      

A tal “revolução cultural” se encaixa como uma compressão micro de sociedade, como narrativa de grupos e ações isoladas, como um esquartejamento espacial para acomodação de grupos, pois não consegue dar conta de um projeto macro de sociedade com arquitetura e engenharia social de nação que se processa na vida real permeada de condições objetivas e de suas contradições.

Se cada um fizer sua parte não é suficiente, é paliativo, é ilusório insistir nesta tese. A revolução cultural se faz concomitantemente com a inversão das estruturas de poder. O que nos leva a crer que não se faz uma coisa independente da outra. A mudança de consciência faz parte da mudança das relações econômicas de poder, uma interfere na outra de forma dialética.

Organizar-se com a classe trabalhadora para desestruturar o poder, tomá-lo de assalto e ao mesmo tempo perceber a revolução cultural no curso deste processo é abrir alas para a construção de uma sociedade de novo tipo, onde a felicidade não esteja à venda no shopping center e a esperança de construir mudanças na estrutura social  e econômica estejam sempre vinculadas a realidade concreta.