O que 2018 trouxe de bom para os negros?


Foto: UNEAFRO.

O ano de 2018 foi muito intenso. Seja nos aspectos culturais, sociais ou, principalmente, políticos, foi possível observar acontecimentos de grandes impactos para o Brasil e o mundo. A Intervenção Federal no Rio de Janeiro, os documentos da CIA sobre a ditadura brasileira, o assassinato de Marielle Franco, o incêndio no Museu Nacional, o atentado no Irã, a eleição de Jair Bolsonaro (PSL) à presidência e tantos outros episódios marcantes tornaram-se lembranças dolorosas.

Contudo, as lutas pedem espaço. É preciso encarar tais acontecimentos, construir resiliências e novas narrativas. É necessário relembrar também os incontáveis momentos bons que 2018 trouxe e observá-los sob uma perspectiva esperançosa. Por isso, relembre agora algumas dessas conquistas.

Jean-Michel Basquiat no Centro Cultural Banco do Brasil

Aberta no dia 25 de janeiro, a exposição “Jean-Michel Basquiat — Obras da Coleção Mugrabi”, no Centro Cultural Banco do Brasil, fez uma retrospectiva das obras e trajetória de vida de Basquiat, reunindo mais de 80 quadros e gravuras. O público teve contato com a emblemática personalidade artística do nova-iorquino que viveu durante as décadas de 70 e 80.
A mostra ficará disponível até o dia 07 no Rio de Janeiro.

Pantera Negra lota as salas de cinema

Com seu elenco completamente negro, o filme Pantera Negra, lançado em 15 de fevereiro, conquistou uma série de prêmios e indicações em diversas celebrações importantes no mundo do Cinema, chegando a tornar-se o primeiro filme de super-herói a concorrer na categoria “Melhor Filme” no Globo de Ouro. Além de explorar elementos da Fantasia, Aventura e Ação, o longa-metragem retrata consequências da colonização europeia na África e diversos aspectos históricos, mitológicos, políticos e culturais do continente.
Jamaica, Jamaica

Contrariando o forte esteriótipo em que a cultura jamaicana está submetida, a exposição “Jamaica, Jamaica”, inaugurada em 15 de março no Sesc 21 de Maio, quebrou preconceitos retratando a pluralidade e diversidade do país, sobretudo no âmbito musical. Fotos, áudios, documentos, instrumentos musicais e outros importantes materiais da história da música jamaicana foram expostos, acompanhados de uma vasta programação que incluía cursos, palestras, encontros e oficinas.

1º Prêmio Marielle Franco

Um mês após o assassinato da quinta vereadora mais votada nas eleições municipais de 2016 do Rio de Janeiro, a rede de núcleos estudantis UNEAFRO realizou o 1º Prêmio Marielle Franco, prestigiando pessoas, instituições e organizações que lutam pelos Direitos Humanos. O evento foi realizado em 14 de abril, no auditório de Geografia da Universidade de São Paulo e premiou nomes como Regina Militão, Milton Barbosa, Maria José Menezes, Jupiara Castros, Núcleo de Consciência Negra, e Sueli Carneiro.

Seydou Keïta

A exposição “Seydou Keïta” foi inaugurada em 17 de abril, no Instituto Moreira Salles (IMS), para apresentar 130 obras do fotógrafo que é considerado um dos precursores dos retratos de estúdio na África. A mostra ainda estará disponível no Rio de Janeiro até o dia 27 do próximo mês.

Memorial sobre escravidão é inaugurado nos Estados Unidos

O Memorial Nacional pela Paz e Justiça, inaugurado dia 26 de abril, no Alabama, foi projetado para homenagear os negros estadunidenses que foram linchados pela supremacia racial branca nos Estados Unidos durante e após a chamada “Era Jim Crow”, período em que a segregação étnica no sul do país foi institucionalizada. Entre 1877 e 1950 mais de 4 mil negros foram enforcados, queimados vivos, abatidos, afogados e espancados até a morte por multidões brancas, sob uma campanha de terror apoiada pelo Estado.


Escola Professora Fausta Venâncio, em Altaneira, promove formatura do ABC


EMEI Professora Fausta Venâncio promove formatura do ABC. (Foto: Divulgação).

O Ginásio Poliesportivo Antônio Robério Carneiro, em Altaneira, foi sede na noite desta quinta-feira, 20, da solenidade de formatura do ABC da Escola de Educação Infantil Professora Fausta Venâncio.

Informações colhidas junto ao portal oficial do município dão conta de que a professora Socorro Lino, diretora da instituição, fez um discurso cheio de emoção, vindo a ressaltar a importância das professoras nesse processo e a dedicação da gestão à educação. “Esse é o início de uma nova etapa na vida dessas crianças, isso mexe com o nosso emocional. E essa gestão tem aplicado muito carinho e dedicação, então, para nós, é muita emoção. É muito bom saber que você está participando de um sonho e incentivando o aluno para que ele continue sua vida escolar”, teria declarado.

Ainda de acordo com as informações, o prefeito Dariomar Rodrigues (PT) também falou no evento. Ele disse se sentir feliz e orgulhoso, ao tempo que externou os parabéns a toda a equipe da educação pelo trabalho desenvolvido. “Fico orgulhoso em ver uma festa assim acontecer. Parabenizo toda a equipe da educação pelo trabalho que vem fazendo. Se hoje temos uma educação de boa qualidade é porque temos o melhor quadro de funcionários e toda a dedicação voltada para nossa população”, destacou ele.

Cerca de 90(noventa) crianças receberam na solenidade de ontem o diploma de “doutores” do ABC.




Centro de Educação Básica de Nova Olinda conquista cinco medalhas na Olimpíada de Astronomia


Centro de Educação Básica de Nova Olinda conquista cinco medalhas na Olimpíada de Astronomia.
(Foto: Reprodução/Frame Produções).

A participação na Olimpíada Brasileira de Astronomia e Astronáutica (OBA) rendeu a estudantes do Centro de Educação Básica (CEB), do município de Nova Olinda, na região do cariri cearense, cinco medalhas.

A provas que são compostas por sete questões de Astronomia e outras três de Astronáutica, rendeu ao CEB três medalhas de ouro e duas de pratas. Ana Larissa, Rávilla Soares e Davi Nogueira, todos do sexto ano, ganharam o ouro. A prata ficou com Monique Evelin e Gustavo Ruan, do sexto e do nono ano, respectivamente.

A professora Wiliane Lopes, coordenadora pedagógica, afirmou que recebeu a informação com entusiasmo e que os resultados são frutos de um trabalho desenvolvido ao longo do ano, uma vez que uma das estratégias da instituição é incentivar o interesse dos alunos pela área.

O mesmo sentimento foi compartilhado pela professora de Geografia Jaqueline Diniz, a quem atribuiu o mérito ao esforço e dedicação dos estudantes.

Afrânio Jardim, um dos maiores juristas do Brasil, anuncia abandono do Direito após decisão de Tofolli



O jurista Afrânio Silva Jardim, considerado um dos maiores processualistas do Brasil, anunciou nesta quinta-feira (20), em sua conta no Facebook que está se retirando “deste ‘mundo’ falso e hipócrita” do Direito. O jurista diz ainda que a sua decepção e muito grande e pergunta: “Como lecionar direito com um Supremo Tribunal Federal como este???”.

Afrânio Jardim. (Foto: Reprodução/Revista Fórum).
A decisão do jurista foi tomada após o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Tofolli, vetar, na noite desta quarta-feira (19), a liminar expedida por seu colega, Marco Aurélio Mello, que libertaria presos condenados em segunda instância, inclusive o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Afrânio aponta em dez tópicos as razões para a sua drástica medida, após quase 39 anos lecionando direito processual penal e 31 anos atuando no Ministério Público. Apesar do tom cáustico e pessimista, o jurista avisa que vai “procurar outra ‘trincheira’ para uma luta mais eficaz em prol de um outro modelo de sociedade. A luta por vida digna para todos é perene, pelo menos para mim”, disse.

A minha decepção e desgosto é muito grande. Como lecionar direito com um Supremo Tribunal Federal como este??? Estou me retirando deste “mundo” falso e hipócrita.

Após quase 39 anos lecionando direito processual penal e 31 anos atuando no Ministério Público do E.R.J., diante da notória perseguição do nosso sistema de justiça contra o ex-presidente lula, confesso e decido:

1). Não mais acredito no Direito como forma de regulação justa das relações sociais.

2). Não mais acredito em nosso Poder Judiciário e em nosso Ministério Público, instituições corporativas e dominadas por membros conservadores e reacionários.

3). Não vejo mais sentido em continuar ensinando Direito, quando os nossos tribunais fazem o que querem, decidem como gostariam que a regra jurídica dissesse e não como ela efetivamente diz.

4). Não consigo conviver em um ambiente tão falso e hipócrita. Odeio o ambiente que reina no Fórum e nos tribunais. Muitos são homens excessivamente vaidosos e que não se interessam pelo sofrimento alheio. O “carreirismo” talvez seja a regra. Não é difícil encontrar, neste meio judicial, muito individualismo e mediocridades.

5). Desta forma, devo me retirar do “mundo jurídico”, motivo pelo qual tomei a decisão de requerer a minha aposentadoria como professor associado da Uerj. Tal aposentadoria deve se consumar em meados do ano que se avizinha, pois temos de ultrapassar a necessária burocracia.

6). Vou procurar outra “trincheira” para uma luta mais eficaz em prol de um outro modelo de sociedade. A luta por vida digna para todos é perene, pelo menos para mim.

7). Confesso que esta minha decisão decorre muito do que se tornou o Supremo Tribunal Federal e o “meu” Ministério Público, todos contaminados pelo equivocado e ingênuo punitivismo, incentivado por uma mídia empresarial, despreparada e vingativa.
Com tristeza, tenho de reconhecer que nada mais me encanta nesta área.

8). Acho que está faltando honradez, altivez, cultura, coragem e honestidade intelectual em nosso sistema de justiça criminal.

9). Casa vez menos acredito no ser humano e não desejo conviver com certas “molecagens” que estão ocorrendo em nosso cenário político e jurídico.

10). Pretendo passar o resto de meus dias, curtir a minha velhice em um local mais sadio… (Com informações da Revista Fórum).

Casarões históricos e fachadas dos municípios do cariri oeste serão reconhecidos pela ALB/Araripe



Casarões e fachadas do centro histórico presentes nos dez municípios que compõem o cariri oeste do Estado do Ceará serão reconhecidos e valorizados pela Academia de Letras do Brasil/Seccional Araripe.

Casa histórica localizada na Rua Dep. Furtado Leite,
no centro de Altaneira-Ce. (Foto: Nicolau Neto).
Esta ação está contemplada em um decreto presidencial da seccional da ALB, Adriano Sousa, datada do último dia 16 de dezembro, dispondo sobre “o reconhecimento histórico de Casarões Centenários e Fachadas do Centro Histórico dos municípios”. A ideia é condecorar por meio de diplomas e placa de mérito de conservação históricos para estes patrimônios culturais e históricos.

Pelo decreto, podem ser condecorados “os casarões construídos, em qualquer parte do território municipal, em data anterior ou igual a cem anos”, como as residências do Centro Histórico destes municípios que mantiverem a fachada original.

Ainda de acordo com o decreto, ficam criados os símbolos das homenagens, assim disposto:

Diploma Mérito de Conservação Histórica a ser entregue a família residente no prédio condecorado e Placa de Conservação, sendo esta fixada na fachada do prédio condecorado. 



Conheça Dona Baiá, a mulher que abasteceu por anos a cidade de Altaneira


Ainda hoje sem torneira em casa (Foto: Alana Maria).

Natural do sítio Caboclo, em Crato, a senhora Maria Joana da Conceição, 98, mora desde a década de 1960 em Altaneira. Talvez você a conheça melhor como Dona Baiá, a dona do poço de água sem fim.

Sabendo da origem de água no chão, Baiá pediu para a filha cavar no quintal de casa um poço d'água. Na época, água era difícil de se encontrar e ter a facilidade da água encanada era um sonho.

De tanto querer, o chão deu a Baiá água tão cristalina que toda a cidade buscava ali, em baldes e garrafas, o que beber.

Ela lembra que a escavação não foi de agrado de todos, mas todos gostaram depois.

Um dia, enquanto a filha cavava, o prefeito mandou parar a obra por temer que alguém "fizesse uma arte" no poço. "Se alguém cair e fizer uma arte tá feito. Todo mundo tá vendo que ela tá cavando", teria dito Baiá. E ainda mais: "O único homem que tenho é a mulher, minha filha, e a mulher é esperta".

O poço em seu quintal (Fotos: Alana Soares)

Até a data de hoje, 2019, Dona Baiá desfruta da água sem fim do poço. Tão confiante é em seu poço encantado que a senhora e família não se preocuparam em instalar rede de água em casa. Muito menos torneira na pia. Já baldes e baldes de água do poço não faltam próximo à cozinha.

Ela conta que nunca faltou água no poço porque ele deveria servir para todos que precisassem. Baiá não tem casarão ou fortuna. Rica de vida e espírito, talvez seja a água e o espírito de cidadania que mantenham a senhora de 98 anos com tamanha vitalidade.

Texto de Alana Maria e publicado originalmente no site Miséria com o título "Por anos ela forneceu água de beber para toda uma cidade". O Blog de Altaneira também reproduziu o texto.

Seu Ivan é entrevistado na passagem dos 60 anos de emancipação política de Altaneira


João Ivan mantem um gabinete em sua casa onde atende o povo. (Foto: Alana Maria).

Em João Ivan Alcântara foi uma das figuras políticas mais notáveis da História de Altaneira. Prefeito por quatro mandatos nas décadas de 70, 80 90 e no início do século XXI.

Natural de Assaré, iniciou sua carreira política com o Coronel Manoel Pinheiro de Almeida, o Né de Almeida e foram, junto com outras personalidades, responsáveis por elevar o distrito de Altaneira a condição de município. Seu Ivan também foi por um curto período de tempo vice-prefeito. Nas eleições de 1973 concorreu na chapa de Oliveira, vindo a exercer o mandato de vice-prefeito por seis meses.

A entrevista foi cedida a Jornalista Alana Maria para o Blog de Altaneira. Alana também escreve para o site Miséria. Na conversa seu Ivan fala de sua longa trajetória política, sua participação na luta pela emancipação do município, mas também discorre sobre a recente “desavença” com seu sobrinho Dorival, a qual demonstrou está decepcionada. Quanto a líderes políticos na atualidade, ele foi descrente. “Tu olha assim nossa juventude e parece que não tem ninguém preparado para o tamanho da coisa. Essa é a verdade. Geralmente o perfil é aquele jovem social, abrasivo, que está no meio de tudo, prestativo, ativo, trabalhador”. Para ele, “essa pessoa jovem está faltando em Altaneira”, pois, é “necessário habilidade para ser líder”.

A entrevista rendeu comentários elogiosos, mas também controvérsias quanto aos fatos narrados.

Na rede social facebook, José Rufino Filho endereçou mensagem no perfil de Raimundo Soares Filho, administrador do Blog de Altaneira:

A entrevista de sua filha com o ex prefeito faltou relatos de um passado nada digno e não tão distante para não ser lembrado por ocasião do inicio político do entrevistado, foi vice prefeito de quem? Traiu alguém? Agora seus feitos são contados com certo heroísmo o que não condiz com a história. Nas ultimas eleições não elegeu ninguém para a câmara, ou a sua sobrinha não consta? Suas administrações foram marcadas por inúmeros escândalos, descasos no âmbito que perpassa a sua gestão. Este rapaz não pode falar de traição, pois é algo inerente de sua casta”.

Em resposta, Soares escreveu “nosso blog é um espaço de construção coletiva, escreva sobre seu pai, conte-nos a sua versão dos fatos, com certeza muitos de nossos leitores irão gostar”.

Confira abaixo a entrevista completa.

BA - Quando surgiu o interesse pela vida política ativa?
Em 1955, me tornei vocacionado para a política. Nessa época, Altaneira era distrito pertencente a Farias Brito, tendo o Coronel Manoel Pinheiro de Almeida como prefeito. Ele, que tinha o governo, a câmara e sendo quase filho de Altaneira, teve a atitude de tentar aproveitar a política em sua mão e inserir Altaneira no meio dos distritos que tentavam se provar município.

Ele procurava uma pessoa alfabetizada para um trabalho e, na cidade, somente eu e Socorro Carneiro éramos. Como era um serviço de andar a pé, a cavalo, no sol o dia todo, ele me fez o convite. O ano era 1957. Quando cheguei em Farias Brito ele tava com a portaria feita, com minha nomeação pronta e eu ainda sem saber o que seria. Ele me nomeou como fiscal de arrecadação do distrito, mas praticamente não era isso que ele queria comigo. Depois de assinar, ele me levou até o IBGE para aprender como seria o preenchimento de formulários, requisitos e boletins para criar a cidade de Altaneira.

BA - Como foi este trabalho?
Foi uma espécie de censo. Ele me disse “você vai me elevar o número de eleitores, de casas e toda a parte econômica para mandar para Fortaleza”. Eram 90 dias para ver se Altaneira entrava com os demais distritos, como Antonina, Catarina, Potengi. Ele ficou com medo de lançar a ideia e não dar certo, afinal política é política e precisou dos dados antes. Então fiz esse trabalho de “crescer” o eleitor. Existe até uma piada. Eu disse “Seu Né, tem muita gente que fisicamente aparentam 18 anos e se ele não tiver os 18 completos, o que faço?” E ele me respondia “Se ele não tem registro, eu empresto os meus até formular os 18”. E assim o fiz. Como os rapazes eram corpulentos, não dava para o juiz desconfiar que ele era “de menor”. Se fazia o pedido do registro alterando os 2 anos para o rapaz tirar o título de eleitor.

BA - Aumentou muito?
Uns 30%, mais ou menos (Risos). Teve que aumentar. A lei só aceitava ser município com 6 mil habitantes. Somente agora passamos disso. O grande negócio era o deputado segurar na oratória o candidato dele. Nosso deputado estadual Cicinato Furtado Leite era muito temido na época, então foi uma negociada: “assine aqui, que eu assino ali”. Essa foi a sorte de Altaneira.

BA - E como se portaram os políticos de Altaneira nesta época?
Tivemos uma política ruim como distrito. Se você olhar a história de Altaneira, nós fomos de Santana do Cariri, de Assaré, de Farias Brito, voltamos para Assaré e depois para Farias Brito. Ninguém nos quis. Ficamos de mão em mão, até que essa lei nos salvou. Sendo cidade ou distrito, a política é algo que existe em toda sociedade. Já existiam candidatos aqui. O primeiro a conseguir se eleger como vereador foi Chico Fenelon. Lançaram Joaquim Bitu pelo PSD e Chico pela UDN, sendo este o candidato do Manoel de Almeida, e o eleito. O período de Manoel de Almeida foi muito bom para nós, porque tínhamos tudo. Ele tinha (parceria com) o Governo do Estado, a Câmara de deputados, a Câmara Municipal.

BA - O que queriam estes políticos? Houve quem fosse contra a criação do município?
Muitos queriam a emancipação e outros não queriam. Foi uma briga política. Você sabe como é. Um lado e o outro pula fora. Alguém não quer porque não é do seu interesse, do seu entendimento. Nesta época, em agosto 1958, eu viajei para Goiás. Todo o trabalho que fiz com os dados, o pleito sobre Altaneira foi contemplado em dezembro, justamente no 18 de dezembro de 1958.

BA - Foram poucos dias para um longo trabalho. E ali já se resolveu a questão do município?
Ainda não. Só a lei não faculta o município. O que assegura o poder ao município é a administração, a instalação com independência. E só se é independente com Câmara e Prefeitura, os dois poderes.

BA - E este trabalho de pesquisa lhe inseriu na vida política de vez?
Sim, nesse período. Dava-se o nome grosseiro de “cabo eleitoral”, que era aquele que visitava, que conversava com o eleitor, que convencia ele que as coisas poderiam melhorar. Era a pessoa que preparava o eleitor. “Não, mas não tenho registro”. Eu faço o registro. “Não, mas quero casar civil”. Eu faço o casamento. Quer dizer, pronto para fazer o eleitor.
Já fazíamos as coisas por eles (os eleitores) de muito tempo. Era para ele ir no cartório, fazer seu registro, tirar a segunda via, fazer o requerimento para título e votar em quem quiser, mas essa subordinação (do político com o povo) já vem de muito tempo.

BA - Então o trabalho também seria para registrar oficialmente cidadãos e eleitores altaneirense, não apenas um levantamento quantitativo.
Veja, o registro público era muito difícil naquela época. Era preciso ir em Santana do Cariri… A pessoa podia até achar que não teria sentido ter um registro, um título. Eram tão desinteressados que até você dando o documento, a fotografia, levar no lugar, pagar almoço, eles ainda botavam banca. Eles achavam que tudo aquilo era para a gente (políticos), que não beneficiaria em nada para eles. Quer dizer, naquela época você chegava na casa das pessoas e eles não tinham nem documento de certidão de nascimento, imagine saber que votar era um dever cívico, um direito, uma obrigação.   

BA - Aprendeu assim a política na prática?
Na época que comecei política era assim. O cabo eleitoral é esta pessoa, sendo político ou não. Era o professor do eleitor, votando na gente ou não. Eu não devo nenhuma eleição a cabo eleitoral. Quer dizer, eu sabia fazer, então eu mesmo fiz minhas campanhas. Qualifiquei o povo. Conheci. Fui na casa de um por um para fazer o eleitor. Eu fui um prefeito que sabia onde estavam as pessoas. Não pedi nada a ninguém para fazer aquilo que eu sabia fazer. Ou melhor: que eu já havia feito para os outros. Parece que teve só eu de político que fez esse trabalho por si mesmo. É tanto que nas minhas apurações eu sabia com quanto eu ganhava. Era capaz de fazer minha eleição sem o juiz apurar. Isso porque eram pessoas que estavam no meu dia a dia e os números estavam no meu fichário.

BA - Depois disso disputou eleição?
O primeiro interesse era a criação do município de Altaneira. Todos os dados para esta criação passaram por minhas mãos. Com isso, teve a eleição. Eu sabia que íamos perder a eleição porque em 1958 teve uma seca muito grande e a SUDENE (Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste) jogou tudo nos candidatos do PSD. Eles faziam negociata do voto com dinheiro da SUDENE. Não havia quem escapasse. Quem deu eleição não foi o povo, foram as cadernetas de auxílio. Em 25 de março fui exonerado. Era assim. Quando a UDN ganhava, tirava os pessedistas, quando o PSD ganhava, tirava os udenistas. Então viajei. Precisava de trabalho. Nessa o Coronel Manoel de Almeida ainda fez um vereador em Altaneira, que foi o Fenelon. Em 1959 matam o Né de Almeida quando ele era candidato a prefeito de Altaneira e eu não estava aqui. Quando voltei em 1960, Fenelon era prefeito.

BA - O senhor ainda seria eleito prefeito outras cinco vezes. Como isso se deu?
Em 1965, teve o concurso e vou trabalhar na Secretaria de Fazenda. Em 1972, todos me apoiavam a candidato - a Câmara, os deputados, o prefeito. Nessa época existia isso de eleição única, candidato único. Não existia democracia. Se eu quisesse poderia ter sido prefeito ali, mas eu sentia que o povo não queria mais aquilo, que o povo estava rompendo esta amarra para ir a uma eleição dividida, com dois candidatos. Depois que recusei, lançamos dois candidatos, sendo Fenelon e Oliveira. Eu fui o vice de Oliveira e nos elegemos em 1973.

BA - Em 1977 começa seu primeiro mandato como líder da chapa, como prefeito. Como foi essa primeira gestão?
Não foi melhor por falta de recurso. Fui vítima de mandatos com pouco dinheiro, mas havia despesa. Houve tanta boa vontade e garra para trabalhar. Era como se Altaneira fosse meu patrimônio, algo da minha família. Mesmo sem recurso ainda fiz um bocado de obras. Comigo foi criado colégio de primeiro e segundo grau, saneamento, rede de água. Eu tinha visão e não gastava à toa. De fato, só a partir de 1986 começaram a chegar recursos federais em Altaneira. Foi difícil começar o ano e só ter algum recurso no final daquele ano. Havia algo errado nessa estrutura. Eu sofri porque não tinha como fazer nada. Nessa época não tinha tanta briga por prefeitura como se tem hoje, porque não havia dinheiro. Nem o salário era bom. Não se entrava em uma prefeitura pensando em dinheiro, como hoje. Era diferente. Antes você tinha que ser praticamente um benfeitor, trabalhar de graça. Meu último orçamento em Altaneira, em 2004, foi em torno de 3 milhões e 900 mil reais, coisa que não consegui arrecadar totalmente. Hoje temos em torno de 20 e tantos milhões de reais. Então às vezes não se vê o trabalho, mas vê muito bem o dinheiro.

BA - Como Altaneira era na visão do senhor?
Altaneira era pobre. Era pouco dinheiro para muita coisa a ser feita. A urbanização precisava ser feita porque nossas ruas muito arenosas ficavam acidentadas. Cada rua era um rio que ia dar na lagoa. Educação foi o foco. Se não investisse em educação não havia começo de nada. Hoje os prefeitos não sofrem com nada. Sofreram fomos nós. Eu tive que buscar professor em fábrica de tijolo do Crato. Por que? Era diplomada, mas não tinha condições de trabalhar porque os contratos eram pra filhos de fulano. Eu dei essa oportunidade. Naquele tempo tínhamos que ir atrás. Ainda bem que hoje temos muito para exportar.

BA - Como o senhor conseguia manter o apoio político?
Era diplomacia. Sempre fui passivo com minhas coisas na política. Sempre respeitei a liderança. Nunca perdi uma sucessão. Meu trabalho foi de porta aberta. Nunca briguei com a Câmara de Vereadores. Era questão de relações públicas. Precisei aprender a diplomacia quando trabalhei na SEFAZ. Se você consegue dominar um cara embriagado, rebitado, num posto fiscal que chega para a briga sem querer pagar o imposto e você faz com que ele pague, é porque você é bom naquilo.

BA - Mas como lidar com os interesses opostos?
A primeira coisa que você tem que ter como administrador é a confiança nos seus colegas. É preciso lealdade. Não me consta, não me lembro, se fiz deslealdade que provocasse um sentimento a pessoa. Acho que minha permanência na política de Altaneira foi por este objetivo de ser leal. Por que hoje vemos a degradação da política? Porque não há fidelidade: você coloca alguém em um cargo de confiança e quando dá fé ele está te traindo, está te roubando.

BA - Houve traição com o senhor?
Eu lidei com esse tipo de gente. Mas era algo a parte, um cargo isolado. Não penetrou no coração da administração. Tentei fazer minhas administrações isolando a parte principal. “Você pode mexer em outras veias, mas no coração, não”.

BA - Vamos dar nome aos bois. O senhor ficou decepcionado com Dorival Arraes?
Demais, demais. Foi inesperadamente aquilo ali. Em política, realmente, existem várias coisas que podem te levar a esta situação, mas existe o peso que você suporta. Só vai até ali. Mas no caso de Dorival, mesmo se você colocasse o maior filósofo, intelectual, para estudar ele, essa pessoa erraria também. Ali foi um caso inédito.

BA - O senhor apostava muito nele, seu sobrinho e pupilo.
Eu já tinha alguma análise sobre a pessoa dele, mas não tinha suspeita. Aquilo que você nunca imaginou que poderia acontecer é o que acontece. Foi violento. Aquele menino eu criei dentro da prefeitura. Fiz quatro eleições do pai dele, fiz a eleição da mulher, fiz a dele para vereador, fiz de Dorivan, fiz de Zé Arraes. É muita coisa. É o peso de um trem. De santo ele virou o satanás. Eu não conhecia o íntimo dele.

BA - O senhor também esteve presente na campanha de Dariomar e hoje está afastado.
Ajudei, fiz campanha. Não era meu candidato, mas era da coligação. Vejo gestores de hoje, que a gente trabalhou, ajudamos a eleger e quando chega lá, a gente já é falecido há muito tempo. Às vezes ficamos com vontade de ajudar aquilo que vemos se desmantelando, mas sente também, por outro lado, que aquela pessoa não precisa de você, porque não te procurou.
Mas a facada de Dorival foi dez vezes mais forte, até porque eu não tinha capital político suficiente para aguentar aquilo. Houve traições, mas nada semelhante a briga que teve com a família Arraes. Lembro que no dia de tirar o nome dele como candidato. Chorou a mãe, o irmão, chorou tanta gente que não tinha como aquilo dar certo mesmo. Ia terminar dando em lágrimas. Parece o verso da Salve Rainha: “chorando e gemendo neste vale de lágrimas”. Foi o que aconteceu.

BA - Mesmo depois disso o senhor continuou ativo politicamente.
Política não é para ser assim. Se você for ver, política é algo bonito. Só deixo a política quando morrer. Hoje faço política de observações, silenciosa. A política é um desenho da sociedade. Não é feito para traição. Eu não desejava mais ser mandatário. Existia um desejo da juventude em passar pelo poder e era meu dever guiar isto. Mas infelizmente não tivemos sucesso. Três jovens que foram e falharam.

BA - E agora, qual futuro terá a política de Altaneira? Há um novo pupilo?
Infelizmente não vejo nada. Estou aguardando. Tu olha assim nossa juventude e parece que não tem ninguém preparado para o tamanho da coisa. Essa é a verdade. Geralmente o perfil é aquele jovem social, abrasivo, que está no meio de tudo, prestativo, ativo, trabalhador. Essa pessoa jovem está faltando em Altaneira. É necessário habilidade para ser líder. Altaneira me transformou em líder, mas comecei em 1957 e para me tornar líder em 2004. Na mesma profissão, realizando o mesmo trabalho. Sem traições. Claro que a política tem sua didática, mas é necessário lá na frente fazer um consórcio.


#Altaneira60Anos. João Zuba: da construção de cacimba a símbolo da banda cabaçal


João Zuba é patrono do acadêmico Nicolau Neto. (FOTO/ Heloisa Bitu).

João Sabino Dantas foi um homem simples. Agricultor por profissão, mestre da cultura por paixão. Foi um exímio exemplo de esposo e pai. Passou boa parte de sua vida construindo cacimbas, quando as águas do açude pajéu ainda não eram realidade nas residências dos munícipes. É o que contou sua esposa e seus dois filhos em entrevista a este blogueiro.

#Altaneira60Anos. A força do movimento negro


A força do movimento negro, por Nicolau Neto. (Foto: Cláudio Gonçalves).

Comecemos essa discussão com o poema de Jorge Posada:

" Um negro sempre será um negro,
Chame-se pardo, crioulo, preto, cafuzo, mulato ou moreno-claro
Um negro sempre será um negro:
Na luta que assume pelo direito ao emprego
E contra a discriminação no trabalho
Um negro sempre será um negro:
Afirmando-se como ser humano
Na luta pela vida".

Tem-se aqui uma nítida ideia de que é preciso um senso crítico quanto ao tema em questão. Faz-se necessário então a desconstrução do mito da igualdade racial.

O Brasil é o país que tem a maior população de negros fora da África. Os negros foram trazidos do continente africano para cá, escravizados e, não se contentando com isso, as elites político-econômicas da época, através de diversas práticas, cuja escravização foi uma delas, fizeram com que negros e negras deixassem de praticar suas linguagens, religiões e costumes adotando práticas europeias.

No dia 20 de novembro, data dedicada à consciência negra, é importante destacar que o movimento negro tem por objetivo não deixar esmorecer e resgatar essa cultura afro- brasileira, rebatendo a desigualdade e a separação racial que insiste em permanecer sobre o povo negro. Ressaltemos ainda que ele (o movimento) é uma batalha travada contra o senso comum. Numa sociedade onde se assume que existe preconceito racial é contraditória a afirmação que não há discriminação e racismo pessoal.

Não é novidade que o racismo está presente no cotidiano. As questões aqui são: onde o racismo atrapalha, rouba, diminui, fere, interfere, omite, engana, diferencia a população negra que constitui toda uma nação de outra raça? Aí está a chave. É entra o movimento negro, numa armadura e resistência coletiva de uma raça presente e atuante.

Nunca é demais lembrar, já que ele insiste, apesar dos avanços que já foi efetivado, que o Estado é o personagem responsável em garantir a igualdade. Porém, se o estado age de forma ativamente contrária ou de forma omissa em seus serviços de policiamento, saúde pública, geração de renda e trabalho, educação, o que leva a discriminação racial, então temos algo além de problemas sociais. O Estado passa a alimentar um atraso e constrói um apartheid.

No entanto, o país é composto de edifícios, a saber, as instituições de ensino, Ongs, empresas, templos religiosos e famílias. Porém, muitas dessas organizações não estão afastadas de conceitos errados, uma vez que não romperam com seus dogmas racistas, não tendo em seus quadros representantes de diversas raças e etnias. Isso leva ao fato de que o racismo tem efeito letal e em massa.

Diante desse quadro movimento negro assume seu papel de destaque, não se baseando apenas em probabilidades e teorias, mas em fatos comprovados nos diversos espaços de poder na sociedade. As ações do movimento estão diretamente ligadas às lutas não só contra o racismo e a discriminação racial, mas também ao machismo e intolerâncias religiosas e culturais.

No Brasil, as referências para essas lutas continuarem são muitas, como por exemplo, Zumbi, Dandara, Beatriz Nascimento, Tia Simoa, Abdias Nascimento, Revolta dos Malês, Grupo de Valorização Negra do Cariri (GRUNEC), Grupo de Mulheres Negras Pretas Simoa e tantas representações de luta e resistência do povo negro. Assim, o movimento negro é resultado de uma série de manifestações decorrentes de um processo histórico. A amplitude do movimento negro é um conjunto de manifestações que surgem de inquietações individuais e coletivas.

Conclui-se que o movimento negro precisa expandir suas ações e chegar em outras localidades.



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Nicolau Neto é professor; palestrante na área da Educação com temas relacionados a história e cultura africana e afrodescendente, desigualdades raciais, preconceito racial, diversidade e relações étnico-raciais; ativista dos direitos civis e humanos das populações negras; membro do Grupo de Valorização Negra do Cariri (Grunec); membro da Academia de Letras do Brasil/Seccional Araripe (ALB/Araripe); servidor público no município de Altaneira, diretor vice-presidente da Rádio Comunitária Altaneira FM e administrador/editor do Blog Negro Nicolau (BNN).

Quem tem medo dos direitos humanos?


(Foto: Reprodução/CartaCapital).

O que são os direitos humanos? O que os sujeitos desses direitos pensam sobre eles? No ideário popular, as noções de cidadania e a moral se misturam e se confundem quando a pergunta aparentemente simples surge. Perguntar (e refletir) é preciso.

No Brasil, o principal instrumento para a garantia dos direitos humanos é a Constituição de 1988. Elaborada em um dos momentos mais prósperos para as liberdades individuais no País – na derrocada da ditadura civil-militar -, o documento consagra em seu primeiro artigo o princípio da cidadania, dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho.

Nela está previsto o direito à vida, à privacidade, à igualdade, à liberdade, além de outros, conhecidos como direitos humanos. Engana-se quem vê na Constituição apenas simbolismo. É ela que deve dirigir as ações dos governos, do judiciário, e de todo a sociedade de maneira mais ampla.

O coração dos direitos humanos é a compreensão comum de que todos os cidadãos, independentemente da cor, etnia, credo religioso, sexo ou nacionalidade, devem ter condições para uma vida digna e livre. Sem eles não é possível participar plenamente da vida em sociedade e preservar a paz.

Ainda durante a campanha, o agora presidente eleito Jair Bolsonaro reativou como capital político o lema ultraconservador “direitos humanos para humanos direitos”, reforçando a ideia de que existem sujeitos dignos de direitos, e outros não. Nessa visão, aqueles que não se enquadram em um determinado padrão moral pré-estabelecido, estarão, portanto, à margem dos direitos fundamentais.

Ao nomear a evangélica fundamentalista Damares Alves para a nova pasta das Mulheres, da Família e dos Direitos Humanos, “Bolsonaro transforma em política pública a ideia pregada durante as eleições de que os direitos sociais serão direcionados a uma parcela da população, e os dogmas religiosos os princípios dessa política. Isso é inadmissível, especialmente em um estado laico, como é o nosso”, explica o ex-ministro dos Direitos Humanos no governo Lula, Paulo Vannuchi.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU – elaborada em 1945 (no pós-guerra) por diversas nações – é um marco da tradição humanista em todo o mundo. No momento em que o documento completou 70 anos, a CartaCapital foi às ruas de São Paulo ouvir o que a população entende por direitos humanos e o que pensa sobre eles.

Se por um lado a reação a sentença “bandido bom é bandido morto” se manifeste mais como constrangimento do que como repúdio, a tradição da assistência pública aos direitos sociais no Brasil – mantidos e fomentados inclusive nos períodos de exceção – sobrevivem e resistem. (Com informações de CartaCapital).