Olavo de Carvalho “é a cabeça mais insana já produzida nesse país”, diz teólogo Leonardo Boff


Leonardo Boff criticou a influência  do “filósofo autodidata” Olavo de Carvalho na formação da equipe ministerial do presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL). (Foto: Reprodução/Revista Fórum).


Professor emérito de Ética, Filosofia da Religião e Ecologia na Universidade do Estado do Rio de Janeiro, o teólogo Leonardo Boff criticou a influência do “filósofo autodidata” Olavo de Carvalho na formação da equipe ministerial do presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL).

Podemos medir a cabeça do novo presidente pelas nomeações que fez a pedido de Olavo de Carvalho: o ministro das relações exteriores e o da educação. Olavo é a cabeça mais insana já produzida nesse país. Não possui formação séria nenhuma. Diz os piores palavrões como o c. de sua mãe”, tuitou Boff, sobre as indicações de Ernesto Araújo, para Relações Exteriores, e do colombiano Ricardo Vélez Rodriguez, para Educação, feitas pelo guru intelectual da família Bolsonaro.

Em entrevista ao jornal O Estado de S.Paulo, Olavo disse que não tem mais nenhum ministro “no bolso” para indicar. O pseudo filósofo também já afirmou que o único cargo que aceitaria seria o de embaixador nos Estados Unidos – apesar de, segundo ele, Bolsonaro já ter oferecido os ministérios da Cultura e da Educação.

Eduardo Bolsonaro, deputado reeleito pelo PSL, disse, após as eleições, que quer levar os parlamentares do PSL para os Estados Unidos para terem aulas com Olavo. “É nossa base filosófica”, disse o filho do presidente eleito. (Com informações da Revista Fórum).

Trajetória de Dandara dos Palmares impulsiona identificação, diz Zuleide Queiroz


Zuleide Queiroz, do Grupo de Valorização Negra do Cariri, afirma que a trajetória de Dandara dos Palmares impulsiona identificação / Foto: Natinho Rodrigues - (Reprodução - Diário do Nordeste).

Figura emblemática na luta pela liberdade junto a Zumbi e Ganga Zumba, Dandara faz parte da história de outras mulheres e movimentos negros no Ceará.

Quantas histórias adormecem sob o jugo da cegueira social? De quantos personagens e fatos não falamos simplesmente porque nunca foram apresentados a nós? Mais especificamente, quantas mulheres nossa memória negligencia quando a pauta do dia é resistência, bravura, luta? Sobrevivência.

Elas são inúmeras, filhas de várias partes do Brasil e do mundo. Personagens concretas de realidades opressoras, com força capaz de transgredir o decurso do tempo e inspirar uma fortuna de atividades. Não à toa, neste Dia da Consciência Negra - data criada em 2003 e instituída, por lei, em 2011 - o Verso dá destaque à figura de Dandara dos Palmares, símbolo-mor de coragem, protagonista quase apagada do registro oficial do Brasil Colonial. Não nestas linhas.

Nesse movimento, a travessia que propomos é de imersão no ofício de mulheres cujo sangue transborda energia e cuja melanina é pigmento de obstinação. Influenciadas pela irrefreável figura de Dandara, revitalizam trabalhos e conferem fôlego novo a expressões diversas. São ícones a levantar bandeiras que partilham semelhante apelo: desafiar lacunas antigas e promover reconhecimento ao lugar do negro, ao lugar da negra. Avante à luta!

No sangue, na memória

Se de geração em geração herdam-se traços, Dandara é mãe da resistência. No dia em que Zumbi teve a cabeça degolada num golpe, um ano e nove meses já teriam passado desde a morte da força feminina do Quilombo dos Palmares. A história da figura apontada como mulher do herói palmarino permanece cercada de incertezas e poucos registros, mas justifica e empodera o confronto das mulheres negras com tudo que as subjugam até hoje.

Relatos afirmam que Dandara teria se jogado de uma pedreira ao abismo, em fevereiro de 1694. A decisão extrema transparece a recusa da mulher de se entregar às forças militares que cercaram o famoso quilombo, onde viviam cerca de 30 mil pessoas distribuídas em aldeias. Não há registros do local onde a matriarca nasceu, nem da sua ascendência africana. Estudos levam a crer, contudo, que sua origem é brasileira e que ela se estabeleceu no Quilombo dos Palmares ainda quando criança. Além dos serviços domésticos, ela defendia como podia o seu povo e os três filhos que teve com Zumbi.

Líder das falanges femininas do exército negro palmarino, Dandara é descrita como uma verdadeira heroína. Ela dominava técnicas da capoeira e teria lutado ao lado de homens e mulheres em inúmeras batalhas e consequentes ataques à sua comunidade quilombola, situada na Serra da Barriga, atual região de Alagoas. De acordo com Zuleide Queiroz, professora da Universidade Regional do Cariri (Urca) e integrante do Grupo de Valorização Negra do Cariri (Grunec), a personagem é referência, homenageada por grupos feministas pelo instinto de coragem e maternidade.

A história da figura apontada como mulher do herói palmarino permanece cercada de incertezas e poucos registros, mas justifica e empodera o confronto das mulheres negras com tudo que as subjugam até hoje. 
(Reprodução/Diário do Nordeste).
"A decisão dela foi marcar a história. Foi uma atitude claramente pensada, não em função da força, do medo ou da violência, características facilmente atreladas ao machismo. Foi no sentido de educar as próximas gerações. Tudo ou nada!", partilha, emocionada.



A trajetória de Dandara dos Palmares também impulsiona identificação. Com divergências do ativismo relacionado às mulheres brancas, o feminismo negro levanta pautas específicas. Enquanto as mulheres brancas buscavam equiparar direitos civis com os homens brancos, mulheres negras carregavam nas costas o peso da escravatura, ainda relegadas à posição de subordinadas; isso, porém, não se limitava apenas à figura masculina, pois a mulher negra também estava em posição servil perante a mulher branca.

Segundo Zuleide, a partir dessa percepção, o exemplo da líder de Palmares, assim como o de outras heroínas com pele de cor forte, é a base para a autonomia feminina negra. "Se antes víamos a luta das mulheres brancas pelos direitos, hoje nos reconhecemos na reconstituição da história de Dandara. É a nossa ancestralidade".

É com o intuito de resgatar e reverberar essa posição de luta que o Grupo de Valorização Negra do Cariri (GRUNEC), entidade sem fins lucrativos, promove no interior do Estado a busca pela igualdade étnica/racial e a autoestima da população de cor negra na região caririense, onde foram encontradas, atualmente, 26 comunidades quilombolas, a maioria lideradas por mulheres. Zuleide afirma que Dandara está presente, sim, no coração e no sangue, de toda mulher negra, filhas das mulheres que se jogaram no precipício no decorrer da história.

Batuque para Dandara

Em 2016, durante cortejo no carnaval de rua, o Maracatu Nação Fortaleza homenageou Dandara dos Palmares ao levar a bravura histórica da guerreira para os olhos e ouvidos do público. Com loa reverenciando a personagem, os brincantes entoaram em alta voz: “Ê Ê Ê Dandara/ O tambor já tocou, Calunga mandou chamar/ Vai ter gira no terreiro, iaiá/ Batuque para Dandara/ Luz que alumiou a força dessa nação”.

Ao conferir destaque à mulher, o grupo buscou acrescentar novos elementos ao desfile carnavalesco por meio de uma contribuição cultural e artística focada no respeito à luta feminina, trazendo à tona a trajetória de um ícone ausente nos livros de História e consolidando um ponto de referência para todas aquelas identificadas com a estrada de resistência de Dandara.

Conforme registrado no site oficial do bloco, “‘Salve a Guerreira Dandara’ nos remete a um Brasil do período colonial e da resistência do Quilombo dos Palmares, enriquecendo a proposta do Maracatu Nação Fortaleza ao trazer as cores vivas da cultura afro-brasileira para as vestimentas e adereços; o toque ancestral dos tambores saudando uma rainha negra e sua luta pela liberdade; a presença do simbolismo incorporado na Calunga; e os elementos do universo Brasil-África como referência na montagem do desfile”.

           


Coletivos de mulheres negras no Ceará refletem força revolucionária de Dandara dos Palmares

Feminista, anti-racista e anticapitalista: assim é definido o Instituto Negra do Ceará - Inegra por Margarida Marques, uma das integrantes do projeto. A organização não-governamental tem como projeto político a luta contra o preconceito e a discriminação racial, sexista e de classe. Munida desse objetivo, a empreitada busca fortalecer a construção afirmativa da identidade feminina negra e propor políticas públicas que contribuam para a promoção da igualdade de gênero, raça e classe.


Zuleide Queiroz: "Reconstituir a história de mulheres negras é entender de onde vem a nossa força interior para diante de todas as diversidades". (Reprodução/ Diário do Nordeste).

Os negros e negras vivem em condições de exclusão social como consequência do processo de escravização e de uma abolição que nunca se concretizou. Assim, eles são aqueles que vivem em piores condições de vida, ganham menores salários e são as maiores vítimas da violência”, situa Margarida.

Ela conta que o Inegra atua no Estado desde 2003 como desdobramento de um coletivo de 13 mulheres negras. Hoje, integra o Fórum Cearense de Mulheres (FCM), a Articulação de Mulheres Negras Brasileiras (AMNB) e a Articulação de Mulheres Brasileiras (AMB). Entre suas principais realizações, está a Jornada pela Saúde da População Negra; o projeto Fulô do Mandacaru; e atuação no tema do encarceramento feminino, com apoio do Fundo Brasil de Direitos Humanos.

De acordo com Margarida, “superar uma realidade de opressão significa entender um outro projeto social e econômico, de inclusão, tolerância, justiça e reparação social e histórica dos que construíram a riqueza desse país através da mão de obra escravizada e foram deixados às margens do direito e da cidadania”.

Em semelhante engajamento, o Movimento Negro Unificado (MNU) atua no País há mais tempo, gestado em plena ditadura militar, em junho de 1978. Porém, foi apenas em 7 de julho do mesmo ano que a organização foi lançada publicamente, num ato realizado nas escadarias do Teatro Municipal de São Paulo, lançando as bases para a luta em todo o Brasil, inclusive no Ceará.

Dentro desse recorte, o destaque recai também sobre o Grupo de Valorização Negra do Cariri (Grunec), entidade sem fins lucrativos que conta com a participação de Zuleide Queiroz. O projeto foi formado em 2001 com o objetivo de promover a autoestima da população negra na região caririense, propagando também a consciência sobre afrodescendência ao valorizar a história e cultura do povo.

Encontro

Nesse sentido, em tempos onde a união é cada vez mais necessária para mudar panoramas de opressão, é que vai ser realizado, nos dias 23 e 24 deste mês, o I Encontro de Mulheres Negras do Ceará, no Centro Cultural Banco do Nordeste (CCBNB). A reunião tem caráter duplo: tanto comemora os 30 anos do primeiro Encontro Nacional das Mulheres Negras, realizado em Valença, no Rio de Janeiro, quanto prepara o terreno para a edição nacional de 2018, marcado para acontecer em Goiânia, de 6 a 9 de dezembro.

A inscrição para a etapa local pode ser feita online a partir de link disponibilizado no facebook, na página do evento. A participação custa um valor simbólico de R$ 5 e deve reservar aos interessados um encorpado debate sobre a atual conjuntura cearense no que toca ao movimento negro, imprimindo força e maior alcance aos projetos no segmento.

Tanto Dandara como todas as mulheres negras de ontem e hoje que lutam e resistem contra o racismo,  as injustiças sociais e o machismo, nos inspiram e nos fortalecem. Resgatar as memórias delas e tornar conhecida suas lutas é importante em especial às novas gerações, pois é uma maneira de recontar nossa história, escrita de maneira a invisibilizar a luta do povo negro”, reitera Margarida Marques.
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Texto publicado originalmente no Diário do Nordeste com o título “A grande influência de Dandara dos Palmares”.


Golpe de 1964 deve ser comemorado, disse o novo ministro da Educação


(Eduardo Bolsonaro/Divulgação/ Reprodução/ Portal Gauchazh).

Anunciado como nome à frente do Ministério da Educação no governo de Jair Bolsonaro, Ricardo Vélez Rodríguez, já defendeu o golpe de 1964 em um dos textos publicados em seu blog em abril 2017. Intitulado de "31 de março de 1964: é patriótico e necessário recordar essa data", o texto destaca que "esta é uma data para lembrar e comemorar. A esquerda pretende negá-la. Mas não pode".

Em outro trecho, o futuro ministro escreveu: "64, vale sim afirmá-lo, nos livrou do comunismo. Nos poupou os rios de sangue causados pelas guerrilhas totalitárias que, na Colômbia, por exemplo, no conflito que ora se encerra, ceifou mais de 300 mil vidas e obrigou a sair do país a mais de 5 milhões de colombianos, no longo período que vai de 1948 até os dias atuais. Não tivessem os militares brasileiros agido com força para desmantelar a "República do Araguaia", teríamos tido o nosso "Caguán" (o território "livre" do tamanho do Estado do Rio de Janeiro, situado no coração da Colômbia e a partir do qual as Farc chegaram quase a balcanizar o país vizinho)". 

E completou: “Nos treze anos de desgoverno lulopetista os militantes e líderes do PT e coligados tentaram, por todos os meios, desmoralizar a memória dos nossos militares e do governo por eles instaurado em 64 (...) Felizmente a opinião pública, incluindo as Forças Armadas, reagiu em tempo e os petralhas não conseguiram implantar esse embuste marxista, que tinha como única finalidade fortalecer o PT de forma a que se tornasse o "novo príncipe" hegemônico apregoado por Gramsci, a fim de garantir a definitiva instalação de Lula e a sua caterva no poder. Sabemos hoje que a "revolução" pretendida pelo PT consistia em roubar sem nenhuma oposição". (Com informações do portal Gauchazh).

Representatividade negra na literatura é instrumento de afirmação política


É a partir de escrevivências que Conceição Evaristo demarca o lugar da cultura afro no Brasil, projetando sentimentos do povo com foco no feminismo / Foto: Reprodução - Diário do Nordeste.

Há um termo simultaneamente poético e forte para designar a escrita gestada a partir do cotidiano, das lembranças e da experiência de vida pessoal e de todo um povo: escrevivências. Quem o trouxe à vista foi a escritora mineira Conceição Evaristo - um dos nomes mais importantes e necessários da literatura brasileira contemporânea - exatamente para dar destaque aos sentimentos de toda ordem que atravessam a condição de ser afrodescendente no País que dividimos morada.

Ao singrar pelas páginas a costurar alegrias, emoções, gritos e sussurros de uma camada da sociedade ainda tão fortemente marginalizada, excluída e silenciada, a autora faz da arte um poderoso instrumento de luta contra o racismo e o machismo instalados no alicerce da população.

Um triste panorama a se considerar num território em que negras e negros são a maioria, conforme pesquisa divulgada em novembro do ano passado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Nela, se constatou que o número de brasileiros que se autodeclararam pretos aumentou 14,9% entre os períodos de 2012 e 2016, resultando em uma nação de maior parte afro. Neste Dia da Consciência Negra, conferir relevo a iniciativas que prezam pelo respeito e afirmação da identidade de matriz africana neste solo, se faz, portanto, bastante imperativo.

De Cruz e Sousa (1861-1898) a Joel Rufino dos Santos, passando por Maria Firmina dos Reis (1825-1917) e Elisa Lucinda, a literatura que contempla o segmento é ampla e bebe de diferentes matrizes para alavancar significativas reflexões. Em comum entre elas: um cuidadoso trabalho com as palavras de modo a fazer com que o que foi escrito possa gerar engajamento. Configure-se, enfim, como afirmação política.

Inspirado por essa realidade, o Verso traz um apanhado de algumas das principais vozes no âmbito das letras nacionais e internacionais que fazem valer esse intento e injetam alta voltagem crítica nos textos que assinam. Carolina Maria de Jesus (1914-1977) integra esse time. Moradora da antiga favela do Canindé, em São Paulo, é conhecida pelos relatos em seu diário, reveladores de uma rotina miserável, de total degradação da mulher negra, pobre, mãe, escritora e favelada que era.

Descoberta pelo jornalista Audálio Dantas - que, encarregado de fazer uma matéria na favela onde ela morava, acabou a conhecendo e percebeu o quanto Carolina tinha a dizer - é autora do livro "Quarto de despejo", obra-referência para compreensão do Brasil indigesto em que vivemos, além de várias outras de semelhante amplitude e importância.

Militância

Outras potentes vozes se somam a Carolina Maria de Jesus e a inicialmente citada Conceição Evaristo para bradar força e ativismo afro. Figura que tem ganhado cada vez mais repercussão no País devido à publicação do livro "Quem tem medo do feminismo negro?", Djamila Ribeiro é mestre em Filosofia Política pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e coordena a coleção Feminismos Plurais, da Editora Letramento, pela qual lançou "O que é lugar de fala" (2017).

Feminista, filósofa e acadêmica paulistana, Djamila Ribeiro é referência no estudo sobre o ativismo negro. FOTO: ALEX BATISTA / REVISTA GOL

Na principal obra sob sua assinatura, ela se utiliza de nomes do porte de Sueli Carneiro, Alice Walker, Chaimamanda Ngozi Adichie e Bell Hooks para abordar temáticas como os limites da mobilização nas redes sociais, as políticas de cotas raciais e as origens do feminismo negro no Brasil e nos Estados Unidos. Um recorte bastante amplo do que acomete os tempos atuais, feito destacado pela pesquisadora Simone Ricco em artigo escrito por Vagner Amaro, fundador da Editora Malê - voltada para publicação de autores e autoras negros.

Segundo a estudiosa, "a gente quer falar de literatura brasileira, mas de um recorte dela, o que está sendo produzido na literatura nacional contemporânea e destacando a produção negra. E muitos não sabem o que está acontecendo, não conhecem os autores, não têm ideia de como é o texto e ficam presos, muitas vezes, associando a literatura negra a um texto mais panfletário e muitas vezes não é o que acontece. A militância ocorre de uma forma bem mais literária".

Em voga

Já em outro âmbito, dos escritores estrangeiros outrora ofuscados que ganharam maior destaque no Brasil com a recente publicação de obras, James Baldwin (1924-1987) é um dos que merecem maior atenção. Personagem de renome da literatura americana do século XX, nasceu em Nova York e é autor de uma vasta e relevante obra de ficção e não-ficção.

Entre os assuntos abarcados pelo seu guarda-chuva, estão a luta racial e questões de sexualidade e identidade. "O quarto de Giovanni" e "Terra estranha" são as obras editadas recentemente em solo nacional, pela Companhia das Letras.

Já Toni Morrison nunca perde o pique de ser bem-vinda e comentada ao redor do globo por deixar como legado a vivência das negras norte-americanas ao longo dos séculos XIX e XX. Ela já venceu o Pulitzer e foi a primeira escritora negra a receber o Prêmio Nobel de Literatura, em 1993, atestando o quão longe pode ir um tratamento esmerado sobre o genuinamente ser negro. (Com informações do Diário do Nordeste).

Professores Nicolau Neto e Maria Telvira debatem Lei 10.639/2003 durante semana de filosofia da UFCA


Mesa debate avanços e desafios da Lei 10.639/2003 durante IX Semana de Filosofia da UFCA. (Foto: Wellia Felipe).


A Universidade Federal do Cariri, campus Juazeiro do Norte – CE, vem promovendo desde o dia 19 a Semana de Filosofia. O evento anual é organizado pelo Centro Acadêmico de Filosofia tendo em 2018 como tema “O Lado Negro da Filosofia: Africanidades, Educação e Resistência”, visando proporcionar o compartilhamento de experiências e conhecimentos entre estudantes, pesquisadores, docentes e demais membros da comunidade.

Segundo informações da coordenação do evento, as ações deste ano contará com mesas redondas, rodas de conversa, oficinas, minicursos, vivências e apresentação de produções acadêmicas e não-acadêmicas e a escolha da temática partiu da necessidade de “fazer afrontamento à ausência de estudos e pesquisas sobre africanidades e filosofia africana na UFCA e na academia de modo geral”, além de pretender “afrontar a problemática da construção e perpetuação de um espaço hegemonicamente branco, assim como a importância de reafirmar a necessidade da política de cotas raciais e sua efetivação na prática”. “Outro aspecto fundamental é pensar a permanência das pessoas negras nas instituições de ensino superior que são estruturalmente racistas”, argumentou-se.

A Semana está sendo norteada a partir de três eixos centrais inter-relacionados - africanidades, educação e resistência -, objetivando, dentre outros, refletir e fazer enfrentamento aos longos anos de injustiça e invisibilização epistemológica para com as produções de autores e correntes filosóficas de pensamento não-eurocêntricas, nesse caso específico, as de origem africana e afrodescendente. Para tanto, vem desenvolvendo uma ampla e diversificada programação.

Professora Maria Telvira fala sobre os projetos antirracistas no Brasil e o papel da escola. (Foto: Wellia Felipe).

Na quarta-feira, 21, a professora doutora do Departamento de História da URCA, Maria Telvira e o professor especialista e ativista do GRUNEC, Nicolau Neto, participaram de uma mesa redonda que tinha como proposta discutir "Os Avanços e Desafios da Lei 10.638/2003: História e Cultura Afro-brasileira na Educação Básica”.

Telvira versou sobre a trajetória da educação e a luta do povo negro pela libertação com enfoque sobre “os projetos antirracista no Brasil e o papel da escola”. Ela trouxe a luz diversas iniciativas, coletivas e individual, de pessoas negras em educar crianças e jovens de pela negra. Ela citou como exemplo a iniciativa do professor “preto” Pretextato dos Passos e Silva que, no século XIX (ainda no período escravocrata) criou uma escola específica para esta parcela da população.

A professora relata que no Brasil as elites Brancas sempre fizeram de tudo para não se “misturar” com o povo negro, se valendo do próprio caso de Pretextato para referendar sua posição. Segundo ela, o próprio professor relatou na época que “em algumas escolas os pais dos estudantes de pele branca não queriam que seus filhos e filhas “ombreiassem” com os de pele negra. Ele discorreu ainda que o pais carrega traços de um sistema escravista implementado em mais de três séculos e que a falsa ideia de igualdade é o principal obstáculo para a construção de um projeto de escola antirracista. E concluiu afirmando que antes de 2003 nada de concreto se tinha nas escolas sobre a história e cultura afro-brasileira, africana e indígena e ressaltou que o que se vem discutindo é sobre desigualdades raciais que gera uma desigualdade de oportunidades. O que acaba confrontando a igualdade formal expressa na Constituição de 1988 e a igualdade real inexistente na sociedade brasileira.

Já Nicolau falou especificamente dos avanços e dos desafios da lei. Ele destacou que ali estava de discutindo sobre uma lei federal que completou 15 anos e que ela é importante porque “já deu uma grande contribuição para nós, enquanto país, uma vez que que trata-se de um documento a nível federal e que com peso legal”. “Por ela e a partir dela”, disse, “construiu-se ferramentas pedagógicas legalizada que pode garantir, de bem utilizada, que todos nós tenhamos acessos a conteúdos antes silenciados que corroborem para a formação humana/cidadã baseado na nacionalidade, na identidade e na diversidade do povo negro e indígena”.

Professor Nicolau Neto versou sobre os avanços e desafios da lei 10.639/200 durante a IX Semana de Filosofia da UFCA. (Foto: Wellia Felipe).

Ao se debruçar nos 15 anos da lei que tornou obrigatório o ensino da história e cultura afro-brasileira e africana na educação básica, Nicolau arguiu que a própria obrigatoriedade permite que ela (lei) se torne uma realidade, pois de alguma maneira se aborda nas salas de aula. O que, segundo ele, faz com que “fiquemos vigilantes para a forma com que se aborda”. “Muitas vezes são discussões fora de propósito e que podem levar a perpetuação do racismo e das desigualdades”.

Para Nicolau há em algumas escolas um histórico de professores e professoras que decidem trabalhar os conteúdos – muitas vezes com fortes ligações com os movimentos sociais negros -, e que ainda colaboram e incentivam os demais companheiros de jornada de outras disciplinas a trabalharem nesse sentido. “Isso é um desafio que foi colocado a partir da lei e vem se tornado um forte e bom desafio pedagógico”, ressaltou.

Por isso a lei já e uma realidade nas escolas, embora ainda não tenha sido efetivada plenamente. É uma realidade quando vemos que atinge alguns profissionais. É uma realidade quando ela nos impõe a enfrentar cotidianamente as adversidades, muitas vezes impostas no próprio ambiente de trabalho”.

Na parte final, o professor destacou os principais desafios no que pese a aplicabilidade da lei. Para Nicolau, a maior dificuldade em implementar essa discussão vem dos próprios ambientes de ensino. Seja pela ausência de formação na área, seja por tendo, se recusam a efetivá-la. “Por que isso ocorre? ”, indagou. “Ocorre”, em virtude do imaginário do povo brasileiro que desvaloriza as nossas raízes; que não reconhece a história do povo negro no que pese as vivências e as identidades. É um imaginário que se arvora em dizer que todos somos iguais e que não há racismo no pais e que por isso abordar essas questões leva a um “racismo reverso”, o que segundo o professor, “é descabido”.  Tudo isso acaba por contribuir ainda mais na resistência nas escolas em aplicar a lei.

Universitários e professores fizerem intervenções após as falas de Telvira e de Nicolau. (Foto: Rodrigo Manfredine).
Para Nicolau, outro grande desafio é fazer com que as pessoas envolvidas diretamente no processo de ensino-aprendizagem nos estabelecimentos oficias entendam “que nós precisamos educar para as relações étnico-raciais”.  

Por fim, disse:

"se há resistência em aplicar a lei haverá também por nossa parte resistência, pois essa é a nossa marca. A nossa história nos credencia a ter esperança de que as futuras gerações possam ter um ensino sem a necessidade de leis para destacar o óbvio. Que essas futuras gerações possam ter acesso a esses conteúdos a serem estudados”.

Após as falas, universitários/as e professores/as fizeram intervenções. O evento segue hoje e amanhã com minicursos, rodas de conversas. A Mesa de encerramento debaterá o tema “A carne mais barata do mercado...: a racialidade em tempos de fascismo” com os professores Me. Maria Yasmim (UECE) e Edson Xavier (URCA).




12 autoras negras para ler e lembrar que o Dia da Consciência Negra é o ano inteiro


Conceição Evaristo fala durante "Latinidades - Festival da Mulher Afro Latina Americana e Caribenha 2013".
(Foto: Reprodução/Hypeness)
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Quantas autoras negras você já leu? Provavelmente, poucas. Quem fez o Enem este ano teve até um gostinho da obra de Conceição Evaristo, autora mineira nascida em 1946 que podia se tornar a primeira mulher negra a ocupar uma cadeira na ABL, mas perdeu o posto para o cineasta Cacá Diegues.

Felizmente, algumas iniciativas já buscam oferecer mais espaço a mulheres negras na literatura, como esta livraria especializada em escritoras negras ou esta editora que buscava uma autora negra com um livro inédito para publicação. Acontece que, mais do que publicar, essas mulheres precisam ser lidas – e nossa seleção promete te ajudar a selecionar algumas obras incríveis para começar.

Maria Firmina dos Reis

Primeira romancista brasileira, essa moça nascida em 1825 no Maranhão é autora de livros como Úrsula e A Escrava. Além de escrever, era professora e fundou uma aula mista e gratuita para alunos que não podiam pagar pela educação.

Pintura de Maria Firmina dos Reis, de autoria de Tony Romerson Alves.
(Foto: Wimimedia Commons).

Chimamanda Ngozi Adichie

Chimamanda é um dos nomes queridinhos da atualidade. A nigeriana autora de Americanah, Hibisco Roxo, No Seu Pescoço, Sejamos Todos Feministas, Meio Sol Amarelo e Para educar crianças feministas (ufa!) ficou conhecida por um poderoso TED em que relata os perigos de se contar uma história única sobre a África – vai por mim, você merece ver.

Chimamanda Ngozi Adichie.
Carolina Maria de Jesus


Se você ainda não ouviu, pode ter certeza de que vai ouvir falar muito sobre ela. Carolina Maria de Jesus trabalhava como catadora de lixo e escrevia nas páginas que encontrava nas ruas. Seu livro mais famoso é Quarto de Despejo – Diário de uma favelada, mas ela também assina obras como Casa de Alvenaria, Pedaços de fome e Provérbios.

Carolina Maria de Jesus autografando o livro Quarto de Despejo, em 1960.
(Foto: Arquivo Nacional).


Alice Walker

Em seu livro Rompendo o Silêncio, Alice Walker relata suas passagens por Ruanda, Congo, Palestina e Israel, quando foi convidada por organizações feministas e de direitos humanos. Seus comentários em tom poético lhe renderam duas premiações: um Pulitzer e um National Book Award. Outra obra da autora, A Cor Púrpura, foi adaptada para o cinema e indicada a 11 Oscars.

Alice Walker. (Foto: CC BY-SA 2.0 Virginia De Bolt - Wikimedia Commons).

Elizandra Souza

Natural da zona sul paulista, Elizandra é jornalista, mas também poetisa. Seu livro Águas de Cabaça aborda temáticas relacionadas ao candomblé. Se não bastasse, ela é também criadora do fanzine Mjiba que hoje se tornou um projeto maravilhoso, com direito a lançamento de livros de outras mulheres porretas como ela.




NoViolet Bulawayo

Natural do Zimbábue, NoViolet é autora do impactante Precisamos de Novos Nomes, que relata sob a ótica de uma criança temas sérios que vão de assassinatos políticos a estupros. É quando a protagonista Darling vai estudar nos Estados Unidos que as reflexões sobre a vida na África se transformam em uma forma de entender suas origens.


NoViolet Bulawayo / Foto: Paul Kariuki Munene.

Djamila Ribeiro

Esse mulherão dá uma aula sobre racismo, sexismo e, de quebra, sobre a sociedade como um todo. Em O que é lugar de fala? ela reflete sobre esse termo que já se tornou quase clichê e parte daí para debater sobre desigualdades. Seu segundo livro, Quem tem medo de feminismo negro, virou um dos ícones sobre o assunto no Brasil – e muita gente fez questão de levá-lo às urnas para deixar aquele recado nas últimas eleições.


Djamila Ribeiro /Foto:CC BY 3.0 Agência PT - Wikimedia Commons.


Jenyffer Nascimento

Pernambucana, Jenyffer é poeta que lançou recentemente seu primeiro livro solo: Terra Fértil. O lançamento foi feito através do coletivo Mjiba e retrata temas como amor, identidade, racismo e machismo.


Jenyffer Nascimento / Foto: Elaine Campos - Reprodução - Facebook.


Toni Morrison

Com um retrato cru da experiência da mulher negra, Toni Morrison já entrou para o seleto grupo de escritores que podem se gabar de ter levado para casa um Prêmio Nobel de Literatura. Vale ler Jazz, um romance que evidencia as consequências do assassinato de uma jovem no Harlem.


Toni Morrison. Foto: CC BY-SA 2.0 Angela Radulescu - Wikimedia Commons.


Cristiane Sobral

Misturando prosa com poesia, Cristiane Sobral é autora de três livros: Não Vou Mais Lavar os Pratos; Espelhos, Miradouros, Dialéticas da Percepção; e Só por Hoje Vou Deixar Meu Cabelo em Paz. Sua obra retrata os desafios da mulher negra de forma leve, mas sem nunca deixar de lado a postura engajada.


Cristiane Sobral / Foto: Reprodução - Facebook.


Mel Duarte

Paulista, Mel Duarte é autora de Fragmentos Dispersos e Negra, Nua e Crua, mas sua obra vai muito além das páginas dos livros. Escritora, ativista e produtora cultural, ela possui até poemas inspirados em Jair Bolsonaro.




Conceição Evaristo

Ela abriu esse texto, mas merece também um lugar de destaque aqui no finzinho da lista. Seu primeiro poema data de 1990 e continua escrevendo. Doutora em literatura e nascida em uma favela de Belo Horizonte, Conceição Evaristo é autora de Olhos d’Água, Ponciá Vicêncio, Becos da Memória, Poemas da Recordação e Outros Movimentos. (Com informações do Hypeness).

Brasil concentrou 40% dos feminicídios da América Latina em 2017


Índices latino-americanos de violência contra a mulher motivada por condição feminina sugere atraso dos governos na formulação de políticas públicas de prevenção aos crimes. (Foto: CC 2.0 - Urban Isthmus).


A cada dez feminicídios cometidos em 23 países da América Latina e Caribe em 2017, quatro ocorreram no Brasil. Segundo informações da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal), vinculada à Organização das Nações Unidas (ONU), ao menos 2.795 mulheres foram assassinadas no continente, no ano passado, em crimes motivados pela identidade de gênero. Desse total, 1.133 foram registrados no Brasil.

O levantamento também ranqueia os países a partir de um cálculo de proporção. Nessa perspectiva, quem lidera a lista é El Salvador, que apresenta uma taxa de 10,2 ocorrências a cada 100 mil mulheres, destacada pela Cepal como "sem paralelo" na comparação com o índice dos demais países da região.

Em seguida aparecem Honduras (5,8), Guatemala (2,6) e República Dominicana (2,2) e, nas últimas posições, exibindo as melhores taxas, Panamá (0,9), Venezuela (0,8) e Peru (0,7).

Totalizando um índice de 1,1 feminicídio a cada 100 mil mulheres, o Brasil encontra-se empatado com a Argentina e a Costa Rica.

Colômbia (0,6) e Chile (0,5) também apresentam índices baixos, mas têm uma peculiaridade, que é contabilizarem somente os casos de feminicídio cometidos por parceiros ou ex-parceiros das vítimas – chamado de feminicídio íntimo.

Muitas violências

Veiculado a poucos dias do Dia Internacional pela Eliminação da Violência contra a Mulher – no próximo domingo (25) – o comunicado da Cepal também assinala como um dos principais desafios para se abordar corretamente o tema a compreensão de que todas as formas de violência que afetam as mulheres estão determinadas, para além de sua condição sexual e de gênero, por diferenças econômicas, etárias, raciais, culturais, de religião e de outros tipos.

Na avaliação da comissão, esse discernimento permitiria que as políticas públicas considerassem a diversidade das mulheres e as diversas formas de violência direcionada a essa parcela da população.

Segundo o Instituto Patrícia Galvão, as diretrizes que norteiam as classificações aplicadas na América Latina para se tratar de feminicídio abarcam a diversidade de contextos dessas mortes. Embora distintas, as 13 linhas revelam que o desprezo ou a discriminação da vítima devido à sua "condição de mulher" são componentes constantes em todas ocorrências.

São relacionados, por exemplo, além do feminicídio íntimo, o feminicídio sexual sistêmico, em que a vítima também é sequestrada e estuprada, e o feminicídio lesbofóbico ou bifóbico, configurado quando a vítima é bissexual ou lésbica e é assassinada porque o agressor entende que deve puni-la por sua orientação sexual.

Adequação das leis

Ao divulgar relatório, na quinta-feira (15), a Cepal ressaltou que a gravidade do feminicídio já fez com que 18 países latino-americanos tenham modificado suas leis para que o crime seja assim tipificado, o que implica no agravamento da pena.

Os países que já promoveram essa alteração em sua legislação foram os seguintes: Costa Rica (2007), Guatemala (2008), Chile (2010), El Salvador (2010), Argentina, México (2012), Nicarágua (2012), Bolívia (2013), Honduras (2013), Panamá (2013), Peru (2013), Equador (2014), República Dominicana (2014), Venezuela (2014), Paraguay (2016) e Uruguai (2017).

No Brasil, a caracterização desse tipo de crime foi detalhada em 2015, com a lei 13.104, que classificou o feminicídio como crime hediondo. (Com informações da RBA).