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Calado, por Alexandre Lucas

 

Alexandre Lucas. (FOTO/ Arquivo Pessoal).


O homem não disse nada. Ficou em silêncio enquanto a vida passava. Escutou as histórias que atravessaram os seus caminhos como um figurante, sem fala e nome. A porta da sua vida era trancada com fechadura enferrujada, a chave apartada em pedaços irreconciliáveis.

O homem parado seguia. Se segue parado. Sentou na praça, ergueu um chiclete, mascou até perder a sensibilidade. Enquanto mascava, a banda tocou. As crianças brincaram com milhos e pombos. A polícia bateu nos estudantes, tingiu a praça de sangue.  A chuva veio repentinamente forte e estralando os céus.  O homem continuava mascando chiclete. O homem não disse nada.

Quando perguntaram sobre o seu silêncio, o homem não disse nada. Já era tarde, assim como os livros que são queimados antes de serem lidos.

A marcha para Jesus se veste de Bolsonaro

 

Bolsonaro discursa no palco do evento Marcha para Jesus. (FOTO |Thiago Gadelha).


Por Alexandre Lucas, Colunista 

Esse ano a “Marcha para Jesus” completa 30 anos, organizada pelas Igrejas evangélicas, o evento que acontece em vários estados brasileiros  está se transformando em palanques eleitorais para o bolsonarismo. As programações misturam pregações, músicas gospel, atividades infantis, trios elétricos e a presença de Bolsonaro, motociata, réplicas de arma de fogo, uso  intenso do   verde e amarelo, cores de  demarcação política dos apoiadores do presidente da república.         

Nas eleições de 2018, os evangélicos tiveram papel predominante na vitória eleitoral de Bolsonaro, a memória recente ainda guarda a lembrança das mãos fazendo alusão as “arminhas”. Os pastores de forma organizada se transformaram  em cabos eleitorais do bolsonarismo. De acordo com o Observatório do Legislativo Brasileiro (OLB), do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da UERJ, a Frente Evangélica no congresso nacional representa   quase 30% da população e 24% do eleitorado brasileiro e a maioria apoia o governo Bolsonaro.

A marcha evangeliza para eleger o Messias que não segue os ensinamentos de Jesus. O discurso armamentista, odioso e de retirada de direitos de Bolsonaro coloca em risco a democracia,  esquarteja as conquistas sociais, gera instabilidade econômica e promove a agenda da carestia e do desemprego.

O movimento evangélico sabe do seu poderio eleitoral. Conforme aumenta  as igrejas e os seus fiéis ampliasse  a sua participação no cenário político nacional. Os evangélicos estão preparados para a disputa das eleições de 2022, isso é fato.

Se não existe espaço vazio na política, os evangélicos conseguiram acertar na sua força social e política para obter um bom desempenho na matemática eleitoral.  

É preciso desconstruir  esses palanques eleitorais de sapata fascista que esconde  o seu intento ideológico e eleitoral.

Entretanto, outras marcham se movem no país em defesa do evangelho de Jesus Cristo e pela derrota de Bolsonaro. Os evangélicos se dividem,  não são uma unanimidade, diversos grupos se manifestam contrários ao atual presidente e desmascaram a trindade “Deus, Pátria e Família”, lema de inspiração fascista já pronunciado por Bolsonaro.

É hora de unir as forças, de colocar a bíblia na mesa ( e reler), juntar os pastores e as pastoras  que acreditam na divisão e multiplicação do pão, na defesa vida e que estejam dispostos  a luta ao lado dos oprimidos e dos explorados numa marcha verdadeira para Jesus. Marcharemos com evangélicos, com os patriotas e as famílias no sentido oposto do fascismo, da ditadura e da retirada de direitos da classe trabalhadora.  

A quem interessa separar partidos e movimentos sociais?

 

Alexandre Lucas. (FOTO/ Reprodução/Redes Sociais).

Por Alexandre Lucas, Colunista

A história tem demonstrado uma falsa dicotomia entre movimentos sociais e filiação partidária. Essa apartação faz parte de um discurso ideológico disseminado pelas elites econômicas a partir de suas estruturas de poder e comunicação, o que incluir  as ONGs de caridade, órgãos públicos, instituições religiosas e os mais diversos movimentos sociais de direita, entretanto, esse discurso também reverbera no seio das organizações de esquerda.   

Na historiografia republicana brasileira, os comunistas, são provas incontestes desse discurso perverso da classe dominante. A disseminação do ódio, mentira e perseguição aos comunistas ocorre desde 1922, quando foi criado no Brasil, o Partido Comunista. Apresentados como terroristas, inimigos da família, anticristos e bagunceiros, dentre outros adjetivos, foi alicerçado o preconceito e a violência (mundialmente) contra os comunistas.

O que esconde esse discurso de aversão às organizações partidárias, em especial, aos comunistas? Afastar a influência política dos partidos nos movimentos sociais ligados à classe trabalhadora, criando uma falsa ideia de que movimentos sociais e os partidos políticos  são questões distintas e antagônicas.

Os partidos políticos ligados à classe trabalhadora são uma constante ameaça aos interesses de dominação e manutenção do poder da classe dominante. Esse é o princípio que alimenta a o discurso anticomunista  e de enfraquecimento das organizações de luta do proletariado.

Os partido políticos de esquerda tem uma historicidade de se organizar nos movimentos sociais que aglutinam a classe trabalhadora, como é o caso das associações de moradores, sindicatos, movimentos identitários, pontos de cultura,  entidades juvenis e estudantis,  com o propósito de contribuir para o processo de fortalecimento da luta pela emancipação humana e transformação social. Eis o que motiva a preocupação e o combate da classe dominante ao alinhamento dos movimentos sociais e aos partidos políticos.

O alinhamento entre movimentos sociais e partidos políticos incide diretamente na disputa dos espaços de poder. A representação parlamentar no Brasil tem evidenciado a distância entre as pautas dos movimentos sociais e a baixa representatividade dos seus representantes nos parlamentos e ao mesmo tempo aponta que hegemonicamente os eleitos são chancelados pelo poder do capital.

No Brasil recente, onde o discurso anticomunista  volta a torna novamente, a fala  antipartido ganha força, inclusive na esquerda de caráter identitária e liberal, mesmo sem perceber reproduzem um discurso que historicamente é professado pelo integralismo, a feição brasileira do fascismo no país. Foi o que ocorreu nas manifestações de 2013 que deu impulso ao golpe em 2016 e o movimento “Ele Não” em 2018, que mesmo com a sua importância no combate ao Bolsonarismo, demonstrou força o caráter discursivo do “movimento independente e pluripartidário”, em outras palavras, o antipartidarismo foi algo presente neste movimento.

Ideologicamente a elite econômica apresenta para a classe trabalhadora que ter partido é um atestado de crime. Entretanto, essa mesma elite fortalece os seus partidos e suas organizações de disputa de poder.

A classe dominante falseia inclusive as palavras para afastar o povo dos processos de organização  e compreensão de relações de opressão e exploração.  Política e político são apresentados por outro nome: cidadania e cidadão, não por acaso, é como se tratasse de outra coisa, é como querer separar a língua da boca. Constantemente somos bombardeados de ideias que subvertem a realidade e a verdade e isso não é natural.

Separar os movimentos sociais e os  partidos políticos é favorecer a divisão da classe trabalhadora e contribuir com o processo de manutenção e o revezamento de poder das forças políticas que dão sustentação à ditadura do capital.   

Eleições: A defesa de um novo marco legal para financiamento da cultura

 

(FOTO/ Reprodução/ Sesc CE).

Por Alexandre Lucas, Colunista

Precisamos aprofundar o debate sobre o financiamento da cultura no sentido de ampliar, simplificar e desburocratizar o seu acesso e ao mesmo adequar  os recursos financeiros às reais necessidades e particularidades dos segmentos culturais.

O setor cultural do país tem características marcadas por uma profunda diversidade de fazeres e de situações ímpares, que vai desde o que se  produz e aos níveis de escolaridade da nossa população, passando por  contrastes socioespaciais à perspectiva política.    

Três questões devem nortear o financiamento público da cultura, ao meu ver, enquanto política de estado: Primeiro, a garantia de aplicação de um percentual mínimo de recursos nos três níveis (União, estados e municípios), vinculados ao Sistema Nacional de Cultura. Como já funciona no Sistema Único de Saúde – SUS. Segundo, é preciso aliar o financiamento à transversalidade da cultura e a contrapartida social. Em terceiro lugar,  o acesso deve ser simplificado, a  aplicação de recursos deve ser ditada pelas necessidades reais dos grupos para evitar a  invenção de gastos desnecessários,  os prazos para execução dos recursos devem ser ampliados e as prestações  de contas devem ser norteadas pela devolução social, o caráter de transversalidade e a democratização do acesso da produção simbólica para as camadas populares devem ser  critérios para  aprovação das prestações de conta com o estado brasileiro. 

A distância entre os que precisam de recursos para manter as suas atividades de fomento e a própria manutenção dos seus espaços conflitam com uma estrutura cada vez mais complexa e sofisticada que concentra os recursos públicos nas mãos de especialistas. Em alguns casos o financiamento público serve para financiar  os interesses privados de grupos.

Equalizar os recursos públicos é facilitar que um número maior  de grupos possa  acessar. Considerando as diferenças populacionais, a qual  incide na distribuição mais equilibrada para o país. O Índice de Desenvolvimento Humano – IDH também deve ser um dos critérios para pautar o financiamento público da cultura.

As leis de Incentivo devem ter uma outra roupagem. É inadmissível que apenas grandes empresas possam reverter impostos para financiamento da cultura, e mais do que isso,  definir  o que é financiado ou não com recursos públicos.  As leis de incentivo devem  estabelecer critérios de interesse público para o setor privado e não o contrário,  como funciona atualidade e ao mesmo tempo esse processo de acréscimo de financiamento a partir das leis de incentivo deve incluir as empresas de pequeno e médio porte para que o comerciante do bairro por ser um incentivador da cultura na sua localidade.  

Esse debate é urgente e necessário para estabelecer uma política de estado, comprometida com o desenvolvimento econômico e  social do país. Essa discussão é parte do maior marco legal da cultura do Brasil,  que precisa ser consolidado: O Sistema Nacional da Cultura.

As eleições são um momento oportuno para comprometer as candidaturas com essa pauta que precisa ser amadurecida e protagonizada pelos movimentos sociais da cultura.

O momento exige mobilização para eleger as candidaturas comprometidas com a democracia, com o desenvolvimento nacional e a emancipação humana, as candidaturas do campo popular, democrático  e de esquerda.

O financiamento da Cultura  hoje passa pela reconstrução do Ministério da Cultura e do replanejamento de uma política nacional com controle e participação social e para isso vamos precisar de aliados no congresso nacional,  assembleias legislativas e nos governos federal e estaduais.   

Comitê será lançado neste domingo no Crato

  

(FOTO |Reprodução| WhatsApp). 

Por Alexandre Lucas, Colunista

Neste domingo a partir das 16 horas, na comunidade do Mutirão, no Crato, será lançado mais um Comitê Popular de Luta. O lançamento contará com a presença do ex-senandor Inácio Arruda, do Partido Comunista do Brasil- PCdoB.

Os Comitês é uma iniciativa dos movimentos sociais e dos partidos políticos do campo democrático e popular que visa fortalecer a luta contra a onda fascista no país e derrubada do Governo de Bolsonaro.

Na região do Cariri já foram montados outros comitês. No Mutirão, o Comitê reuni militantes da Associação Mensageiras da Paz, Coletivo de Mulheres do Mutirão, União Brasileira de Mulheres - UBM, União da Juventude Socialista - UJS, Coletivo Camaradas e do PCdoB.

A expectativa do lançamento é reunir pontos de cultura, coletivos artísticos, movimentos identitarios, organizações juvenis, associações de moradores e partidos políticos.

Lei Aldir Blanc 2, para além da emergência

 

(FOTO | Reprodução |Internet).

Por Alexandre Lucas, Colunista 

Qual o significado da aprovação da Lei Aldir Blanc 2 para o Brasil? Se a lei Aldir Blanc 1 teve caráter emergencial, reoxigenou a economia da cultura, num momento crise sanitária, econômica e política, ela também apontou caminhos para uma política estruturante para o país. Uma política de estado para cultura.

Fruto da luta ampla dos diversos segmentos da cultura, gestores e parlamentares, a Lei Aldir Blanc 1, impôs a contragosto do governo brasileiro, a descentralização de recursos da União para estados e municípios, possibilitando pela primeira vez na história, que o Sistema Nacional de Cultura injetasse dinheiro para maioria das cidades brasileiras e ao mesmo tempo provocou que minimamente os entes federados organizasse os seus  sistemas municipais e estaduais de cultura.  

Os comunistas tiveram papel destacado na engenharia de escuta, mobilização e de articulação ampla para aprovação das Lei Aldir Blanc 1 e 2. Isso é incontestável, a bancada comunista foi “propositora”/relatora (Jandira Feghali),  da Aldir Blanc 1, a qual foi apresentada por Benedita da Silva – PT-RJ e subscrita por 23 deputados federais. O PCdoB foi   propositor  da Aldir Blanc 2  de autoria de Jandira Feghali - PCdoB/RJ, Renildo Calheiros - PCdoB/PEAlice Portugal - PCdoB/BA e tem a co-autoria de Luizianne Lins - PT/CEAlexandre Frota - PSDB/SP e Fernanda Melchionna - PSOL/RS, foi a partir de um leque para além dos nossos pares que foi possível aprovar, as leis Aldir Blanc.   

Ainda em 2022, será possível a aplicação de 3,8 bilhões de reais com a aprovação da Lei Aldir Blanc 2 e  Paulo Gustavo ( de caráter emergencial). A partir de 2023 serão aplicados anualmente 3 bilhões por meio da Aldir Blanc 2. Calcula-se que os segmentos da cultura e da arte no país geram em torno de 6 milhões de empregos diretos, o que corresponde aproximadamente a 4% do Produto Interno Bruto e 5% dos empregos gerados no Brasil. Esses valores impactam de forma direta na economia da cultura e movimenta diversas  cadeias produtivas nos municípios e estados.

Os dados da aplicação de recursos da Lei Aldir Blanc pelos estados demonstram números significativos de projetos aprovados. O Nordeste por exemplo teve 20.813 projetos aprovados, seguido do Sudeste com 20.248, o Norte 10,279, Centro-Oeste 5.682 e o Sul 4.343 projetos aprovados. O que representa mais de 60.000 projetos beneficiados somente pelos estados brasileiros. Quando os recursos de 3 bilhões foram fatiados pelas regiões brasileiras vamos ter os seguintes percentuais de investimentos: Nordeste 31,7%, Sudeste, 35,6%, Norte 12,4%, Sul 12,4% e Centro-Oeste 7,4%.

De acordo com dados fornecidos pelo movimento da Lei Emergência Cultural,  63% dos projetos beneficiados pela Lei Aldir Blanc 1 não haviam sido beneficiados com recursos públicos nos últimos 5 anos.  Esse percentual demonstra a fragilidade do setor cultural e a carência de uma política nacional de fomento consorciada com os entes federados.    

A Lei Aldir Blanc 2, tem caráter permanente e possibilita uma política nacional de fomento à cultura, ou seja, os R$ 3 bilhões são exclusivos para o fomento! São recursos complementares para a política pública para a cultura no país. Ao mesmo tempo fiquemos esperto para que os estados e municípios não se excluam de injetar mais recursos na política de fomento.

Essa Lei terá vigência de 5 anos, contribuirá para o processo de reconstrução do Ministério da Cultura, caso as forças progressistas e democráticas derrotem o governo Bolsonaro.

Esse é o canal para ir constituindo um sistema federativo de cultura, ainda é cedo,  mas já estamos no caminho  para erguer o Sistema Nacional de Cultura  que se entrelaça com estados e municípios para estabelecer planejamentos da política pública para cultura, mecanismos de controle e participação social e garantia de recursos públicos. A Lei Aldir Blanc 2 é estruturante para o país e  poderá extinguir a escassez da política cultural, ampliar horizontes, alimentar sonhos e bocas.

Movimentos sociais: Eleger os nossos e derrotar Bolsonaro

 

(FOTO |Reprodução | poder 360).


Por Alexandre Lucas, Colunista

A representação parlamentar, ainda, continua sendo estranha a diversidade e pluralidade do nosso povo. As eleições de 2018, atestam um perfil que vem se reproduzindo historicamente nas câmaras municipais, assembleias legislativas, Câmara Federal e Senado , que é de exclusão das vozes oriundas de uma perspectiva emancipatória para a classe trabalhadora. A Câmara Federal reflete essa realidade, dos 513 deputados eleitos, em 2018, 107 deputados são empresários, 78 advogados, 34 médicos, 16 pastores, 30 professores, 24 administradores, 21 engenheiros, 19 agropecuaristas, 11 economistas,  9  bacharel em direito, 8 delegados de polícia, 7 militares, 6 estudantes, 6 bancários, dentre outras profissões. 75% dos eleitos são brancos, 20,27% se declaram pardos, apenas 4,09% são pretos, 0,88% amarelos  e 0,19% indígena. 436 são homens e 77 são mulheres. Desses, 240 dos eleitos têm acima de 50 anos.

Essa caracterização sintetiza, reflete as relações de poder e aponta a classe dominante que decide os rumos do país, que é predominantemente representada por homens brancos e por um conservadorismo geracional.

Se considerarmos a bancada ligada à esquerda e o campo democrático composta pelo PT, PSB, PDT, PSOL, PV, REDE e PCdoB somaram em 2018, apenas 138 parlamentares.  O que demonstra a necessidade de ganhar musculatura política e alinhamento com os movimentos sociais.

Entretanto, as condições objetivas apresentam um cenário eleitoral decidido pelo poderio econômico, ou seja, uma base eleitoral que é resultado da compra indireta e direta de votos. Um exemplo clássico e legal da compra de votos na contemporaneidade é a chamada  contratação de “ativistas”. Quanto maior é a capacidade de contratação  desses “ativistas” maior a probabilidade de votos.

Neste panorama é evidente que não são as “boas ideias” que trazem bons resultados, mas o poder econômico que provoca a manutenção e o revezamento das elites do dinheiro.  Para se contrapor a essa conjuntura é preciso ganhar  capilaridade e base social, identidade e articulação política ampla.

Precisamos falar para além dos nossos pares e caminhar lado-a-lado nas frentes de lutas. Faz-se necessário romper com o isolamento e com a guetização. A batalha eleitoral deve ser percebida como parte da luta política da classe trabalhadora, não é um fim, mas uma extensão do processo de acumulação de forças para o processo de transformação social.       

É no cotidiano da luta política, na dimensão e compreensão do local e global que nossa força pode tomar outros contornos. Em momento algum podemos desprezar a necessidade das condições materiais para constituir as nossas frentes de confronto, tanto nos movimentos sociais como na disputa eleitoral.

É preciso conciliar norte político para emancipação da classe trabalhadora e tática que possibilite ocupação dos espaços políticos de poder como instrumentos estratégicos para a democratização da sociedade e construção de uma nova ordem política, econômica e social.

A disputa eleitoral deste ano se dará numa atmosfera polarizada entre a esquerda e a direita.  A chamada terceira via é um pavio curto que pode favorecer tanto a direita como a esquerda.

O que está em jogo neste momento para a classe trabalhadora é a derrota de Bolsonaro e do bolsonarismo. Além de destituir esse governo, temos um desafio maior que é ampliar a presença da esquerda e do campo democrático nas assembleias legislativas, governos estaduais, câmara e senado federal. Essa é uma matemática espinhosa e de difícil resolução.

Dois fatores apresentam um cenário desvantajoso para a esquerda e que devem estar no centro das análises políticas,  um que vem se configurando nos resultados eleitorais da história do Brasil que é o poderio econômico e o outro que é novo, a capilaridade popular da direita capitaneada pelos movimentos neopentecostais do país. Elemento definidor e impulsionador da vitória de Bolsonaro e do bolsonarismo nas eleições de 2018.

O tempo é curto, a situação não é favorável, a esquerda isolada e guetizada é um  pré-anúncio de derrota. Amplitude é uma bandeira ultra necessária para o momento,  por mais indesejável e desconfortável que seja, é o caminho para frear a marcha conservadora, reacionária e aniquiladora das conquistas da classe trabalhadora. A eleição se ganha com votos e não com discursos,  essa é uma condição objetiva e isso exige ampliar as forças e dividir o campo oposto.  Cuidemos para não cairmos no puritanismo ideológico ou no entusiasmo com a falsa ideia de mudança de lado da direita.  Essas eleições devem fazer parte da luta dos movimentos sociais, devemos eleger as candidaturas comprometidas com um projeto de nação para classe trabalhadora.  

Encarcerados pelo privilégio

 

(FOTO |Reprodução |Livros e Fuxicos).

Por Alexandre Lucas, Colunista 

Os livros continuarão na estante. Desistir de presentear. Já não me servem, estão apenas preenchendo os espaços, li algumas páginas e abandonei junto a outras leituras iniciadas. Poderia me desfazer a qualquer momento, ainda posso, mas prefiro deixá-los encalhados, sem nenhuma serventia, são meus. Assim se esboça as cercas que separam a propriedade e a solidariedade.

Livros são para serem lidos.    Maldade encalhar mundos de palavras. Mas às vezes é preciso deixar as leituras encobertas, adormecer os momentos. A subjetividade é um labirinto cheio de textos sem respostas. Existem livros presos, encarcerados pelo privilégio.   

Espalhar livros é um perigo. Eles podem nos deixar com cegueira, além de apagar até mesmo a imaginação. Tem outros que nos fazem sentir o gosto do beijo e enxergar a fábrica de fazer miséria.  Sim, existe fábrica para tudo, inclusive de fazer miséria.

Na estante, os livros vão decompondo as páginas brancas, aglutinando traças e aprisionando as palavras.   Acomodando a privatização dos sonhos e dos questionamentos.

Do outro lado, as folhas   vão amolecendo de mão em mão, as palavras vão sendo grifadas, alguns amassados e remendos. Os livros vão sendo bulidos e o povo vai descobrindo novas formas de remexer o olhar e a estante aos poucos vai sendo nossa.       

 

Rio quente

 

(Imagem meramente ilustrativa/ Reprodução/ internet)

Por Alexandre Lucas, Colunista

Estava sentado naquele banco de madeira, feito antes que minhas pernas.  O banco para sentir o tempo apalpar o corpo nu dos pensamentos. Bandeiras esvoaçavam, no palco da cama, um véu branco, escondia a gramática do corpo. Festejo de sagrada profanidade.

Ritual. Corpo suado, se fazia tambor, a boca flácida, pronunciava gritos da passagem do calor.

A coloração avermelhada da carne, denunciava a sede. A chuva acompanhava o tambor da pele e dava ritmo à dança ancestral que se entoava de cheiros e ruídos.

A terra se amolecia, no amassado, salgado do instante. Os caminhos se abriam. O abraço quente pronunciava o rio quente que se despedia.  

O banco firme, continuava segurando os últimos instantes de fuga.

Quando o bolo acabou

 

Alexandre Lucas. (FOTO |Acervo pessoal).

Por Alexandre Lucas, Colunista

Vá se lascar! Essas foram suas últimas palavras, bateu forte o portão e entrou movida pela ira do momento. As esperanças parecem que se findaram naquele instante. Todos os momentos carregados do era para sempre se despedaçaram, se lascaram mesmo.

Depois daquele dia não fez mais bolo de cenoura com cobertura de chocolate, uma delícia para apaixonar os corações mais amargos. O café de fim de tarde aos sábados, os curtos passeios de bicicleta e as pinturas das subjetividades da vida com têmpera sobre papel foram encaixotadas para as profundezas do vá se lascar.

O tempo passou e o vá se lascar ganhava mais sentido, a respiração recebia o contorno de tranquilidade e o ar parecia pintado de liberdade com as cores mais fortes. Tudo indicava que foi libertador, aquela ação intempestiva.  

Como todas as cartas de amor são ridículas, com atesta Campos, de Pessoa, vá se lascar, são como todas as cartas de amor.

Nos dias mais cinzentos, em que o coração pede socorro e a saudade bate, a vagareza se instala,  é possível notar a roseira encarnada e ponteada de espinhos, os olhos se fazem cacimba e ela sempre esquece do vá se lascar.

Expocrato: Não é sobre os ingressos

 

Expocrato:  Não é sobre os ingressos. (FOTO |UP Movies). 
 

Por Alexandre Lucas, Colunista 

 

Surgida em 1944, como Exposição Agropecuária do Crato, atualmente Exposição Centro-Nordestina de Animais e Produtos Derivados, se caracteriza como um dos maiores eventos agropecuários do Norte-Nordeste, dentro do seu complexo de atividades se destaca o festival de shows musicais (Expocrato). Esse evento precisa ser rediscutido do ponto de vista de gestão e de função socioeconômica, por ser uma concessão pública.     

A “Exposição do Crato”, como ficou conhecida ao longos dos anos, tem uma forte ligação com a cidade e a economia local, possui um fervor afetivo com a região e suas identidades culturais, local de reencontros de gerações, mas desde o seu nascedouro mostra a cara perversa da desigualdade social e da estratificação socioespacial. A “exposição” é um espaço de mistura segregado.

A festa popular, vai dando lugar a festa de quem pode pagar.  É preciso estudar a movimentação econômica da Expocrato para compreender o seu fluxo, os investimentos públicos e o retorno para as cadeias produtivas regionais. É possível esse evento gerar desenvolvimento econômico para a região numa escala de ampliação para os setores mais populares da região metropolitana do Cariri? Possivelmente essa questão merece estudo e tomada de posição política.   A sensação que temos é que somos um Brasil de Portugal dentro desta festa. Somos tratados como colônia e daqui retiram as nossas economias.

Essa festa não pode ser só visitada pela sua população, mas deve ser também consumida de forma acessível, não podemos permitir que a Expocrato tenha tabela de aeroporto, preços exorbitantes.    

A Exprocrato não pode ser tratada como espaço público de interesse privado.  Se faz necessário estabelecer critérios que orientem para princípios de desenvolvimento econômico regional, que reduzam impactos ambientais e que promovam a diversidade e a pluralidade estética, artística e cultural da região num parâmetro de equidade, sem ser gueto e sem ser colônia.

As universidades públicas da região metropolitana do Cariri devem ser incluídas no processo de gestão da Expocrato, pelo papel político que cabem em contribuir com o desenvolvimento regional, como é o caso da URCA e da UFCA. A Agricultura Familiar e os movimentos agroecológicos devem também compor essa arquitetura gestacional.

As empresas devem se submeter a lógica do Estado e não o contrário, na parte dos shows por exemplo, o norte  deve ser o Sistema Estadual de Cultura (SEC), principal marco legal das políticas públicas para Cultura no Ceará. Vale lembrar que SEC não é uma política da Secretaria de Cultura, mas antes de tudo uma política de estado para cultura.   

A Expocrato não é uma festa apenas, ela alimenta várias cadeias produtivas, tem uma dimensão empreendedora imensa, conecta o Cariri a várias partes do país, essa capacidade de negócios é estratégica para a região. É primordial defender a descentralização de recursos gerados pela Expocrato e que esses recursos sirvam de aterro econômico para o Cariri.    

Comunidade do Gesso: Urbanização para o encontro

 

Comunidade do Gesso, em Crato. (FOTO/ Reprodução/ Whatsapp).

Por Alexandre Lucas, Colunista

O largo do Gesso (Crato-CE), onde fica localizada sua quadra, funciona como epicentro da comunidade, a partir de seus condicionadores históricos e sociais. O Largo abrigou por anos um depósito de gipsita (Gesso), nas margens da linha férrea, onde eram transportadas nos vagões de trem para serem beneficiadas na capital cearense. O que deu origem ao nome da comunidade. O depósito e a linha férrea são elementos importantes para compreensão dos processos de organização e estratificação socioespacial.

O largo do Gesso, tinha um triangulação inscrita pela linha férrea que serviu como divisor de pessoas e demarcação de uma das maiores zonas de prostituição da região Sul do Estado do Ceará, o “Cabaré do Gesso”, composto por cerca de 4 quadras preenchidas por bares, boates e quartos que serviam como residências para as profissionais do sexo. A Zona de prostituição teve início na década de 50 do século passado por ordem judicial, uma juíza da época determinou que todas as casas de prostituição localizadas no centro da cidade deveriam se instalarem na localidade e estipulou um prazo de alguns dias.

Esses dois fatores, a triangulação férrea e a zona de prostituição são elementos estruturantes para refletir sobre ocupação do lugar, as relações identidades e organização comunitária e o perverso processo histórico de estigmatização social e exclusão das políticas de urbanização e planejamento urbano.

Quando tomamos como objeto de estudo, o largo do Gesso e o colamos como epicentro da comunidade, podemos perceber que suas ramificações de circulação de  transportes são interrompidas e a as vias de acessibilidade são caracterizadas por obstáculos, o que demonstra de forma nítida o significado das intervenções urbanas como ações indissociáveis das relações humanas.

Outro fator que deve ser considerado neste aspecto é a localização  geográfica da comunidade que tem no seu entorno cinco bairros da cidade do Crato (Palmeiral, São Miguel, Santa Luzia, Pinto Madeira e Centro), o qual denominamos desde Território Criativo do Gesso desde 2015. A criação e animação do conceito desse Território, é uma estratégia politica de articulação em rede das organizações da sociedade civil e do poder público visando contribuir para integração territorial, no sentido de aproximação ações e de reduzir as distâncias entre Lugar e Território.

O Território Criativo do Gesso, surge em 2015, por iniciativa do Coletivo Camaradas pela necessidade de tentar entender como a lugar (comunidade do Gesso) se relacionava como o seu entorno, bem como o inverso.

Quando é realizada a somatória de organizações da sociedade civil e do poder público no Território Criativo do Gesso fica evidente a sua potência a partir da cultura, tendo em vista, o conjunto de iniciativas no campo da educação  e da cultura que atuam de forma direta e indireta no Território (escolas, universidade, ONGs, coletivos, grupos da tradição, igrejas, centros espiritas, terreiros, pousadas, hotéis, bibliotecas, espaços de memória, etc.).

O Território Criativo do Gesso fortalece a ideia de retirar as linhas divisórias que separam as pessoas e os seus espaços e aponta como caminho de urbanização a reparação histórica, a criação de linhas de encontros entre as gerações, redução de impactos ambientais e reconhecimento da sua potência criativa.

Uma urbanização para encontro neste caso especifico, pressupõe ter o largo do Gesso, como centro de gravitação da mistura de crianças, adolescentes, jovens, adultos e idosos. Possibilitar a criação de um espaço com condições envolver as diversas gerações é essencial para combater a estigmatização social e as zonas de conflito. Uma urbanização que contemple a segurança e o bem estar social das crianças, mulheres e idosos é essencial para promover uma lógica que se afaste da dureza dos planejamentos urbanos construído na frieza e na distância da realidade de quem constrói as paisagens sociais e culturais locais.

Nesta perspectiva,  a linha férrea, é algo que essencialmente deve desaparecer para constituir um novo fluxo de circulação na comunidade que possibilite condições de acessibilidade, iluminação e mobiliários urbanos, o que incluir também abertura de novas vias de acesso.

A política urbana do improviso, populista e a ausência do planejamento urbano tem gerado consequências diretas como: alagamentos, redução de ruas, pavimentações inconsistentes e o desenfreado asfaltamento.

No quesito asfaltamento é preciso reconhecer que o largo do Gesso recebe um volume significativo de água provindas de diversas ruas asfaltadas das áreas mais altas gerando uma situação temerosa e de dificuldade de trânsito.      

A urbanização deve considerar a sua área verde, impulsionando um paisagismo que potencialize o Sítio Urbano do Gesso, uma imensa conquista comunitária reconhecida por lei municipal que prevê plantio de árvores frutíferas e plantas medicinais nas margens da linha férrea.

A iluminação pública é uma questão primária para promover o encontro e a circulação de pessoas, o largo do Gesso, precisa ter um sol artificial durante a noite, como forma de tornar uma rota segura para população.

A comunidade do Gesso precisa se integrar espacialmente ao seu território para não ser uma espacialidade isolada e excluída da cidade como vem se caracterizando ao longo dos anos. 

Entretanto, qualquer processo de urbanização na comunidade exige escuta, percepção das histórias e das afetividades comunitárias o que pressupõe um planejamento urbano participativo e norteado por uma perspectiva estruturante e civilizatória que se paute na redução dos impactos ambientais e na promoção da qualidade de vida da presente e das futuras gerações. O improviso, o tapa buraco e o ouvido de mercador atrofiam o direito à cidade. Uma outra urbanidade exige soluções para resolver o quebra-cabeça esfacelado por longos anos  exclusão socioespacial, logicamente, isso exige ciência e a uma gestão democrática e participativa, o que não acontece com receitas, muito menos do dia para noite.     

As ilhas da sala.    

 

Alexandre Lucas. (FOTO  | Acervo pessoal).


Por Alexandre Lucas, Colunista 

As fitas de cetim dançam lentamente, até parecem corpos se seduzindo, um blues de pé de ouvido entoa o enredo. O trabalho segue entre batidas de teclados e silêncios agitados. Os olhos vasculham cada canto da sala, tentando encontrar recheio para a escrita, tudo pode fazer parte do texto.

A sala parece ser um território, em que cada lugar é uma ilha desconhecida. As fitas continuam lentamente dançando. As luzes acesas apenas clareiam os rostos, as ideias estão embaçadas. O espaço é partilhado com os gatos que passeiam pelas calçadas, os sentimentos se pintam de mudos. Os desejos   ficam no fundo de um baú profundo.

Nós seguimos calados, o sol parece desapontado, desde cedo seu brilho e calor estão distantes. Enquanto isso tento escrever uma história que me caiba por completo, mas todas as histórias são incompletas. Os livros estão cheios de partes de um todo que não se completam, as fitas continuam dançando.      

As folhas voam, nada disso, são empurradas pelo vento. Aproveito para colocar palavras nas folhas em branco, tentando tecer mais um conjunto de frases. Os livros estão nas estantes preenchidos de gente, mas nunca achei que os livros tinham palavras.

Indefinida a narrativa, enquanto passavam as coisas e os pensamentos, as frases foram se fragmentando, como as histórias, que se recontam do olho para boca no terreiro da vida, das incontáveis vidas. A sala parece cheia, o silêncio permanece, enquanto, fico olhando as fitas dançando como se estivessem se seduzindo.

 

Revisão do Plano Diretor do Crato: Um momento oportuno para cultura

 

Crato. (FOTO  | Reprodução).


Por Alexandre Lucas, Colunista 

A revisão do Plano Diretor do Crato/CE, fruto de uma exigência legal prevista no Estatuto da Cidades é um momento oportuno de juntar olhares, evidenciar as feridas urbanas, fraturas de acessibilidade social,  perceber o crescimento desigual do capital e o desordenamento urbano, redescobrir  e planejar cidade a partir de quem ocupa o seu solo. É um momento oportuno também para colocar a cultura na centralidade do seu aspecto transversal e como parte inseparável do acesso a uma cidade com redução de impactos ambientais, promotora da saúde preventiva e impulsionadora da antropofagia cultural na sua dimensão plural, diversificada, universal e civilizatória.

O Plano Diretor do Crato é de 2009, conforme ordena o Estatuto da Cidade, os planos diretores devem ser revistos a cada dez anos, ou seja, no Crato a revisão deveria ter acontecido em 2019. Precisamos discutir de forma sincera e distante da publicidade os “caminhos do Crato” para que ele não se assente no asfalto e distante dos movimentos sociais e das demandas de acessibilidade à cidade.

Os Planos de Diretores são espaços de disputa do capital, o setor imobiliário tem interesse na discussão para ampliar a sua rentabilidade, muitas vezes agindo de forma predatória ampliando o desequilíbrio ambiental.

Esse é um bom momento para refletir sobre  o propagado e fakeado  conceito de “capital da cultura” que não se sustenta quando mostramos o conjunto arquitetônico e urbanístico da cidade, a partir dos equipamentos públicos municipais: Museus, teatros, bibliotecas, escolas e praças, os quais apresentam estruturas inadequadas e concentradas e a ausência de outros espaços  como galerias, salas para exibições de filmes e espaços de memórias. 

Neste sentido, é importante no processo de revisão do Plano Diretor atentar para os dois marcos legais da cultura do Município que são o Sistema Municipal de Cultura, no qual a o atual Governo Municipal não tem dado a devida atenção em suas duas gestões, o que fica evidente quando se observa as condições e o uso dos equipamentos culturais. O outro é a Lei Municipal do Cultura Viva ( Pontos de Cultura), uma política pública revolucionária no campo da cultura de base comunitária que é experienciada em 17 países da América Latina e que tem uma íntima ligação com o Direito à Cidade e a redescoberta da pluralidade e  diversidade estética, artística, literária e cultural da urbe. A aprovação da Lei do Cultura Viva no Crato é um avanço, mas para funcionar precisa de recursos públicos de forma sistematizada. O Município certificou já 31 Pontos de Cultura que somados aos certificados pelo Estado do Ceará, totalizam 37 Pontos, o que é um número bastante significativo.  O Cultura Viva vem avançando no aspecto jurídico e pode ser a principal referência para reconfigurar espacialmente o “Crato das Culturas”.  Apontando novos rumos para integração comunitário e territorial da cidades a partir de aspectos da memória afetiva e do reconhecimento das estruturas urbanas e arquitetônicas que tem significado para o patrimônio material e imaterial e o desenvolvimento social.      

É preciso colocar a cultura na centralidade do Plano Diretor, a partir do seu caráter transversal. Os Pontos de Cultura, as organizações e ações de cultura de base comunitária, talvez sejam um caminho possível e necessário para fazer uma escuta mais apurada e perceber os movimentos e as paisagens culturais e sociais que não aparecem no olhar da excludente “capital da cultura”.

É evidente que existe no Crato, lugares e territórios em que são negados o direito à cidade. O que não é uma particularidade para usarmos a expressão tão nossa: “Só no Crato mesmo”, pelo contrário é uma característica trivial da fabricação das cidades sob a ordem do capital.           

Possivelmente, se pensamos a cidade, também a partir da escuta da cultura de base comunitária e dos Pontos de Cultura teremos uma dimensão de desenvolvimento e planejamento urbano estruturante e transversal, pavimentado pela permeabilidade de uma nova cultura política capaz de reduzir os danos da inacessibilidade da cidade.     

Procura-se a padaria    

 

Imagem puramente ilustrativa | Divulgação 

 

Por Alexandre Lucas, Colunista

Manhã de sol escondido, dois dedos de café quente, feito com muito pó e pouco açúcar. Algumas linhas escritas no bloco de rascunho que carecia de folhas em branco, no horizonte uma carga imensa de perguntas depositadas.  As rosas se espreguiçavam, era o tempo delas.  

Enquanto tomava os dois dedos de café, visitava cada incômodo da casa de sua cabeça. Olhou demoradamente para o quarto, a cama bagunçada com histórias incompletas e a luz apagada, que faziam os pensamentos tropeçarem.

Xícara com café tomada até a última partícula do grão. Mais dois dedos para tomar, antes de sair para comprar o pão. Olhou os espinhos da roseira, apertou forte, sangrou, limpou com as pétalas de rosa, tão macias. Saiu, deixou, um dedo de café, talvez esperando, o pão.   

O pão já estava pronto, há horas. A padaria da esquina abre cedo para alimentar parte da classe trabalhadora. Seguiu como era de costume, mas os costumes não duram a vida toda. O café continua no mesmo lugar, um dedo, frio, forte e amargo, talvez tenha mudado um pouco, ou qualquer outra coisa tenha acontecido. O pão não chegou. Dizem que até hoje o caminho da padaria continua mudando. 

Franquia da ditadura da aparência

 

Alexandre Lucas. (FOTO |Acervo pessoal).

Por Alexandre Lucas, Colunista

As estrelas estão bem distantes. As noites mesmo não sendo as mesmas constantemente anunciam os pontos de luzes no céu. Aparentemente nada muda, mas nunca estamos parados. A felicidade por exemplo é como a lua, tem seu tempo e intensidade. Das estrelas e da lua, sem a profundidade necessária para entender os seus comportamentos ficamos apenas detidos nas suas aparências.  

Do tempo da lua e das estrelas, pouco sabemos. Das noites e dos dias podem surgir as tempestades, os destroços, esses só explicam a aparência. Talvez seja necessário compreender da tempestade para evitar a sua fúria.

Faltou luz na terra e os caminhos estão incertos. Só sabemos das suas aparências, às vezes, até elas nós desconhecemos. Nas ruas, os rostos nunca foram códigos abertos, os olhos verdes nunca descreveram sobre os esconderijos e as armadilhas da vida.  A forma não diz quase nada do processo e assim os rostos ocultam trajetórias, portas fechadas, feridas abertas e incógnitas.             

Sei que as estrelas estão bem distantes, um dia pensamos em tocá-la, de chegar perto e observar os seus detalhes, mas parece que as estrelas são delírios ou um encaixe para o poema, mas as estrelas existem, bem distantes da palma mão e dos nossos olhos. Talvez essa distância seja para que possamos especular, criar uma espécie de semideusa, de pêndulo celeste.

Os espaços estão preenchidos por pontos humanos: gritos, cantos e corpos agitados de felicidade transbordam nas vielas e palácio da cidade, as estrelas piscam nos olhos e as outras ainda continuam distantes.  

É possível ver os detalhes das bocas. Às máscaras vão desaparecendo, é difícil ver o povo desmascarado. É tudo tão estranho, nada é imutável, cada mudança é uma nova realidade, cravada com espinhos e a maciez das pétalas. Hoje, estamos maquiados para franquia da ditadura da aparência, enquanto disfarçamos as estrelas e a lua que carregamos.

Debaixo para cima:  O que nos ensina o Cultura Viva  

 

Por Alexandre Lucas, Colunista.

O Cultura Viva é a mais revolucionária e ousada experiência brasileira de políticas públicas para cultura, iniciada como política de governo em 2004 e dez anos depois (2014) tornou-se política de estado e neste processo serviu de inspiração nos mais diversos formatos para ser experimentada em 17 países da América Latina, a partir da nomenclatura de “Cultura Viva Comunitária”. O Cultura Viva sofreu um retrocesso, foi aleijado pelos governos Temer e Bolsonaro, mas continua pulsante, enquanto perspectiva de movimento social e norte para uma política pública intersetorial. 

O Cultura Viva é resultado de um percurso de recortes dos movimentos brasileiros que se interligam ao campo democrático, vanguardista e ao mesmo tempo popular, como é o caso do modernismo brasileiro, os Centros Populares de Cultura da União Nacional dos Estudantes -CPCs da UNE, O tropicalismo  e as movimentos contemporâneos de inovação e democratização midiática. O Cultura Viva é um conceito em formação para os movimentos sociais que se coloca como anticapitalista, antirracista, antipatriacal, decolonial e ligado também ao conceito do bem viver.

No Brasil, ele aponta para um novo redescobrimento do país a partir da profundidade que é a diversidade e pluralidade simbólica do nosso povo que se entremeia e que dialeticamente se tempera de hibridismo.

É a partir do redescobrimento que se reposiciona o olhar e as argumentações para novas realidades. É neste processo onde vão sendo evidenciadas as contradições, as desigualdades e as lutas de classes.  É com o carro andando que as mudanças ocorrem dentro da dinâmica social.  

O Cultura Viva evidencia de forma contundente para além dos saberes e fazeres estéticos e artísticos, mas se embrenha em colocar na ordem dia, o fracasso do processo de produção, acumulação e distribuição da economia que engendra  espacialidades e apropriações da cultura de forma  desigual e conflitante.

Perceber a cultura a partir de uma olhar de classe é desconstruir o legado excludente e elitista da políticas públicas no país, na sua essência o Cultura Viva é um terremoto para o assentos antidemocráticos, tanto aqueles declaradamente fascistas, como aqueles que fazem fake news  da compreensão de gestão democrática e participativa e ostentam uma concepção romantizada de democracia, esses estão no nosso campo de luta e devem ter suas teses desmascaradas.

O Cultura Viva no campo institucional demonstra que é possível arquitetar uma política pública para cultura de baixo para cima, a partir do alinhamento de reconhecimento, protagonismo e decisão dos movimentos sociais, descentralização de recursos públicos e tentativas de desburocratização  do Estado, conexão dos saberes tradicionais e as inovações midiáticas e tecnológicas, florescimento de redes de articulações da sociedade civil autônomas e o caráter de transversalidade da cultura como norte da política pública. 

O Cultura Viva vai continuar sendo terremoto, veio para fazer tremer as estruturas do poder, é uma política pública que não esconde que tem lado. Só é revolucionária porque é pensada de baixo para cima.

Mas o Cultura Viva no campo institucional não basta está na lei, é preciso ampla mobilização social, convivência com os conflitos e obrigatoriamente inclusão de recursos públicos. Afinal, de boa vontade não se faz revolução, é preciso criar as condições materiais. Ousemos.