Por
Cidinha da Silva, no DCM
Matias
Melquíades é um garoto lindo, criativo e espoleta. Os pais se dedicam a
realizar o sonho de crianças como ele, e também outras, diferentes de todos os
modos, mas que têm em comum o desejo de brincar. São construtores de brinquedos
e incentivadores de brincadeiras, os pais do garoto.
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Matias Melquíades e Finn, o heroi negro de "Star Wars". |
Eles
mesmos, os pais, dois jovens suburbanos cariocas, devem ter brincado muito. De
bola, futebol e queimada, tênis e peteca nas ruas de terra. Carrinho de rolimã
e patinete. Devem ter experimentado brincadeiras de correr. Damas, jogo da
velha, quem sabe xadrez? Talvez futebol de botão em campinho de madeira e
pregos (os jogadores fixos), como o que meu pai construía para mim e para meus
irmãos.
Se
tiverem tido quintal com árvores frutíferas e não tiverem morado em
caixotinhos, como a maioria de nós, expulsos das áreas melhores pela
gentrificação das cidades, devem ter criado animais com as frutas que caíam das
árvores do pomar de casa, mangas, maracujás, laranjas, limões e chuchu, que não
era fruta, mas também entraria na farra. Devem ter feito patas com palitos de
fósforo. Olhos nariz, boca, rabos e chifres torneados com faca pequena de
cozinha, sem ponta. E mais massinha, brinquedos de montar, lápis de colorir e
quebra-cabeças.
Imagino
que Matias também deva brincar com tudo isso. Ele não tem a mais vaga ideia do
que seja Star Wars, o filme, a série, os desenhos, mas os pais acharam
importante dar-lhe de presente um bonequinho de 30 centímetros do Finn,
personagem negro da edição mais recente nos cinemas.
Ao
contrário do pessoal fanático pela série que deixou o bonequinho negro
encalhado nas prateleiras das lojas de brinquedos no final do ano, os pais, que
nem são grandes fãs do Star Wars, adquiriram um boneco do Finn porque ele é
negro como o Matias. E representatividade é um componente importante para a
formação daquela pessoinha de 5 anos.
Todo
prosa, Matias foi fotografado junto com Finn e postado no Facebook. A foto
viralizou e, para surpresa dos pais-coruja foi denunciada e suspensa por nudez.
Sim, nudez! Olha que povo paranoicamente racista? Do Matias só vemos o peito,
guardadinho numa camiseta e o rosto feliz. E o Finn, coitado, além de vestido
com calça, jaqueta e botas, como saiu da loja, ainda estava dentro da
embalagem.
Não
é mole, não! Se as crianças brancas e seus pais, mesmo considerando Finn, o
segundo personagem mais legal do filme, segundo levantamentos de satisfação de
público, não quiseram comprar o boneco, não gostaram dele a ponto de consumir
um boneco negro, tudo bem. Ninguém pode ser obrigado a comprar um produto ou
punido por não fazê-lo, embora as pessoas possam ser educadas para compreender
essa rejeição, ao invés de jogá-la no limbo da irrelevância. Mas, denunciar a
imagem do garoto e seu brinquedo por nudez, para que o sistema burro de
Zuckerberg a exclua, até que as pessoas que postaram a foto reclamem e consigam
reativá-la depois de “criteriosa análise”, é a mais impura perseguição racista.
E
não se trata de uma atitude inofensiva. A pessoa que fez essa denúncia falsa
deveria ser investigada por quem monitora manifestações racistas na internet,
pois é factível que ela integre algum grupo especializado em ataques racistas
no cyberespaço. Se esse tipo de caso é tomado apenas como algo feito por alguém
ignorante, abre-se uma grande avenida para a institucionalização das práticas racistas
na Web.
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