Grunec e Negrer apoiam Livia Sant’Anna para ministra do STF

 

Livia Sant'Anna. (FOTO | Reprodução).

Por Nicolau Neto, editor

O Grupo de Valorização Negra do Cariri (GRUNEC) e o Núcleo de Estudos em Educação, Gênero e Relações Étnico-Raciais (Negrer), aderiram na tarde desta segunda-feira, 24, à Carta do MIPAD (Most Influential People of African Descent) em apoio ao nome da jurista Lívia Sant’Anna Vaz para uma das vagas do Supremo Tribunal Federal.

Em nota lançada em suas redes, destacam a biografia da promotora que tem atuado de forma constante e consistente contra o racismo. Ela autua no Ministério Público da Bahia (MP-BA) desde 2004, sendo uma jurista referência nacional e internacional na defesa dos direitos humanos, sobretudo no combate ao racismo e promoção da igualdade racial, proteção das mulheres em situação de violência e da população LGBTTQIAP+.

Livia tem doutorado em Ciências Jurídico-Políticas. Chegou escrever dois livros: “AJustiça é uma mulher negra” e “Cotas raciais”. No currículo, Lívia ainda carrega o título de ser a única brasileira
a ser reconhecida como uma das 100 Pessoas de Descendência Africana mais Influentes do Mundo, na edição Lei & Justiça.

Segundo o Grunec, "além de preencher todos os requisitos constitucionais para ser nomeada Ministra do STF - em especial notório saber jurídico -, a promotora de justiça demonstra competência, capacidade de diálogo com os movimentos sociais e total alinhamento com o projeto político de redemocratização do país".

Então, se você defende um sistema de justiça com diversidade de gênero, raça e regional, assine a carta de apoio


Dia Mundial do Livro: que obra indicar hoje?

 

Livro "Como o racismo construiu o Brasil". (FOTO | Acervo pessoal | Nicolau Neto).

Por Nicolau Neto, editor

Hoje, 23 de abril, é o dia mundial do livro. Para homenagear a tod@s que acreditam que é por meio da leitura que conseguimos escrever bem e melhorar nosso vocabulário e nosso poder de argumentação, deixo aqui trecho do livro do sociólogo brasileiro Jessé Souza:

...Na estratégia do branqueamento, o decisivo é que a ascensão de negros e mestiços seja individual, daqueles que aceitam as regras do sistema dominante, e nunca coletiva, o que poderia pôr o sistema como um todo em xeque. O que o progressismo neoliberal hoje faz é, sem tirar nem pôr, o que as elites racistas brasileiras sempre fizeram para enfraquecer a resistência popular, cooptando e "comprando" suas melhores cabeças. (SOUZA, Jesse. Como o racismo construiu o Brasil. 1° ed. Rio de Janeiro: Estação Brasil, 2021. Pg. 38).

Sobre o autor

Jessé Souza é um sociólogo, pesquisador e professor brasileiro. Possui graduação em Direito pela Universidade de Brasília (1981), mestrado e doutorado em Sociologia, pela Universidade de Brasília (1986) e pela Karl Ruprecht Universität Heidelberg, Alemanha (1991), respectivamente. Seu pós doutorado é em filosofia e psicanálise na New School for Social research de Nova Iorque, EUA (1994-1995), e teve livre docência em sociologia pela Universität Flensburg, na Alemanha em 2006.

Como autor e organizador, chegou a escrever 27 livros além de mais de 100 artigos e capítulos de livros em diversas línguas, sobre teoria social, pensamento social brasileiro e estudos teórico/empíricos sobre desigualdade e classes sociais no Brasil contemporâneo. Atualmente é professor titular da Universidade Federal do ABC (UFABC).

Entre suas obras, além da creferenciada nesse texto, está “A tolice da inteligência brasileira” (2015); “A radiografia do golpe” (2016); “Inequality in capitalist Soceties”, em co-autoria com Boike Rehbein e Surinder Jodkha (2017); “A elite do atraso: da escravidão a lava jato” (2017) e “A classe média no espelho”(2018).

22 de abril de 1500: o opressor ainda é glorificado

 

( Card |@desenhosdonando).

Por Nicolau Neto, editor

22 de abril de 1500. Esta é, como muitas outras datas históricas, cheia de significados. E como todo fato histórico, é preciso que o levemos para a sala de aula de forma que o resinifiquemos sem, no entanto, negá-lo.  Pois fato histórico é fato histórico.

O 22 de abril de 1500 ainda é tratado nos materiais didáticos pela visão dos vencedores, dos colonizadores. Por isso, a questão do "descobrimento" é tão presente. A ideia que predomina é a dos opressores e dos escravizadores.

A ressignificação do ensino passa necessariamente pela contestação desse modelo europeu que percebe o explorador como herói e que, portanto, há a necessidade de glorifica-lo em troca do apagamento da história dos oprimidos e escravizados. Falar desse processo histórico é colocar em pauta a luta e a resistência dos povos originários que já habitava esse território que depois recebeu o nome "Brasil".

Não houve "descobrimento". Ninguém descobre território onde já há pessoas ocupando. Onde já existem povos com relações sociais, culturais, religiosas e políticas estabelecidas. O que houve foi uma invasão de território e as consequências dessa invasão ainda hoje são sentidas. O que houve foi a destituição de territórios dos povos originários e ao mesmo tempo, a tentativa de aculturação e destruição dos modos de vida dos indígenas.

GRUNEC celebra 22 anos e relembra seu legado

 

Professor Nicolau Neto ao lado de Valéria e Verônica, duas das fundadoras do GRUNEC. (FOTO | Acervo Pessoal).


Por Nicolau Neto, editor

Neste sexta-feira, 21 de abril, o coletivo vanguarda na luta antirracista na região caririense celebra 22 anos. O Grupo de Valorização Negra do Cariri (GRUNEC) foi, sem dúvida, um dos pioneiros enquanto força coletiva na luta contra o racismo nesta região e em nota divulgada na rede social Instagram, conta que embora a data é formal, mas que a gestação é de meses antes.

Nessa longa trajetória de mais de duas décadas temos o orgulho de dizer que resistimos, multiplicamos, transformamos, lutamos, crescemos”, destaca trecho da nota que traz para o público mais jovem as mais diversas ações encampadas pelo grupo, como a edição do 1° jornal de imprensa negra do Cariri, intitulado "Afrocariri" e a “incidência em questões ligadas à educação, saúde, mulheres negras, convivência com o semiárido, juventudes negras, acolhimento e integração de imigrantes, cotas, segurança pública, cultura, entre muitas outras…”.

Foi frisado ainda as honrarias recebidas, como por exemplo, o “Prêmio Frei Tito de Alencar de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Estado do Ceará e Comissão de Direitos Humanos e Cidadania”, o “ Prêmio Fórum Justiça de Direitos Humanos Maria Amélia Leite”, além da “Comenda de mérito defensorial da Defensoria Pública do Ceará, entre outros”.

Foram muitas realizações! E serão quantas mais forem necessárias e nossos braços conseguirem construir para continuar a transformar a realidade em que vivemos. Queremos Bem Viver! Vida longa ao GRUNEC. (Nota do GRUNEC).

Quando da passagem das duas décadas, o blog trouxe a cena um pequeno histórico da luta negra por direitos e pelo bem viver ancorado pelo GRUNEC.

Abaixo você confere:

O ano era 2001. Um grupo constituído por cerca de cinco pessoas se reuniram depois de uma aula de natação na garagem da casa de uma delas e passaram a dialogar sobre as mazelas que afligiam a sociedade brasileira e,  de forma mais especifica, aqueles grupos que sempre estiveram e ainda estão a margem – negros e negras.

Destes diálogos sobre desigualdades surgiu a ideia de transformar discursos individuais em ação coletiva e em luta organizada visando, sobretudo, promover a igualdade étnica/racial e a autoestima da população negra do cariri e difundir a consciência quanto a afrodescendência. O que caminha no sentido de valorizar a nossa história. Com esse ideal nascia o Grupo de Valorização Negra do Cariri (GRUNEC) que oficialmente (com registro) está com 19 anos, mas de atuação já possui duas décadas.

O GRUNEC se constituiu ao longo desses 20 anos como um coletivo que escolheu o caminho da luta, da resistência e da persistência ao trabalhar de forma comunitária e saindo da zona de conforto para visitar as comunidades de base, as comunidades tradicionais, como o povo indígena e os grupos remanescentes de quilombolas.

Enquanto entidade organizativa, de combate a toda forma de discriminação, preconceito e de racismo, tem atuado na proporção em que essas injustiças ocorrem. Como exemplo, seja tendo sua organização, colaboração ou idealização, pode-se citar a Caminhada contra a Intolerância Religiosa realizada anualmente em Juazeiro do Norte, a Marcha Regional de Mulheres Negras do Cariri que visa denunciar formas de discriminação, opressão e aniquilamento, além do Congresso Artefatos da Cultura Negra que em 2019 chegou a sua décima edição e que tem se consagrado como o maior evento de pesquisa sobre a população negra do país.

Nesta ambiência de atuação, não se pode esquecer também de um dos trabalhos mais colaborativos em que pese a educação voltada para as relações étnico-raciais: o Mapeamento das Comunidades Rurais Negras e Quilombolas do Cariri feito junto a Cáritas Diocesana de Crato – CE, tendo como resultado o  lançamento da “Cartilha  Caminhos, Mapeamento das Comunidades Negras e Quilombolas do Cariri Cearense”. Este trabalho contou com a participação de cerca de 25 comunidades. Seis delas se autoreconheceram remanescentes de quilombolas. Note-se ainda que comunidades como as de Arruda (Araripe), Sousa (Porteiras) e Serra dos Chagas (Salitre) já contam com certificado de remanescentes de quilombolas adquirido junto da Fundação Cultural Palmares.

Outras atuações colocam este coletivo negro como protagonista. Cita-se aqui a 1ª Audiência Pública Federal no ano de 2007, onde discutiram a implementação da Lei nº 10.639/03 ao reunirem representantes de 42 municípios da Região do Cariri, o 1º Seminário no Crato em 2005, para discutir a Igualdade Racial e a realização anualmente da Semana da Consciência Negra.

O Grunec reúne sem seus quadros professores e professoras universitários/as, docentes da educação básica, estudantes, pesquisadores/as, líderes religiosos/as e ativistas sociais, dentre outros e continua firme e forte, principalmente agora em tempos de cortes de direitos, legitimação desenfreada do racismo, do machismo e de ofensas sem barreiras a comunidades LGBTs. Por isso, os lemas mais apregoados do grupo são “Aquilombar é Preciso” e “Pelo Bem Viver”.

Dia dos Povos Indígenas: dia para celebrar e refletir

 

Rebeca Damasceno, estudante do 3º B da EEMTI Pe. Luís Filgueiras. (FOTO | Daniel Rodrigues).


No dia 19 de abril comemora-se no Brasil o “Dia dos Povos Indígenas”. Até o ano passado esta data era tradicionalmente conhecida como o “Dia do Índio”, mas a partir da Lei 14.402/2022 seu nome oficial foi modificado com o objetivo de dar relevância à diversidade das distintas e ricas culturas existentes entre os Povos Originários.

Não restam dúvidas de que a relevância do Dia dos Povos Indígenas se mostra mais premente do que nunca face à profunda tragédia experimentada pelo povo Yanomami em solo brasileiro. A situação do povo Yanomami ganhou a atenção da mídia mainstream, nos últimos meses, quando as imagens absolutamente chocantes da triste realidade vivida por essas pessoas passaram a ser maciçamente veiculadas em todos os telejornais do país.

Os dados1 que ilustram o que é considerado por muitos a maior crise humanitária ocorrida no Brasil no presente século expressa por si só a dimensão dessa tragédia. Entre 2019 e 2022, o aumento das mortes por desnutrição na população Yanonami foi de 331%. Apenas em 2022, mais de 70% desta população contraiu malária.

É evidente que esses acontecimentos tornam imperativo uma reflexão profunda e honesta acerca das causas e consequências das dificuldades que assolam continuamente a população indígena. Dentre elas, é possível destacar: racismo, violência física e simbólica, violação de direitos fundamentais, carência de acesso à saúde e insegurança alimentar.

Rebeca Damasceno. (FOTO | Daniel Rodrigues).

Vale ressaltar que a população indígena está longe de ser insignificante no âmbito da demografia nacional. Na realidade, há uma nítida tendência de crescimento do número de pessoas autodeclaradas indígenas, uma vez que desde o Censo Demográfico de 1991 a participação percentual dos indígenas na demografia brasileira tem crescido substancialmente.

No Censo de 2010 o número de pessoas autodeclaradas indígenas já era de 896.717, divididas entre 305 etnias com 274 idiomas. Por seu turno, os dados preliminares já veiculados no âmbito do Censo de 2022 indica uma elevação expressiva do número de pessoas autodeclaradas indígenas, de modo que esse número atualmente pode ultrapassar 1,6 milhão de pessoas.

O fato é que uma das principais justificativas presente no discurso de quem inadvertidamente intenta justificar, implícita ou explicitamente, a dolorosa e ultrajante realidade vivida pelos povos indígenas no país consiste em argumentar que a demarcação de terras indígenas implica fortes custos em termos de crescimento econômico e progresso técnico.

Não raramente, os mesmos defensores desse argumento ensaiam narrativas em que a população indígena aparece como “entrave” para o crescimento econômico nacional. Não restam dúvidas de que tal justificativa é peremptoriamente desmentida pelos fatos.

É uma total falácia que as mazelas experimentadas pelos indígenas advêm, diretamente, da falta de atividades econômicas em seus territórios. Na realidade, o que se observa é que os problemas sociais que assolam esse segmento populacional advêm de fatores como:

• Aumento recente do nível de desmatamento, sendo de 59,5% somente na Floresta Amazônica nos últimos quatro anos;

• Desarticulação dos órgãos ambientais fiscalizadores;

• Relaxamento das leis de proteção ambiental;

• Avanço avassalador das atividades extrativistas de madeiras e minérios, em especial, perpetradas por empresas clandestinas e grileiros ilegais;

Além disso, cumpre ressaltar que também é falso a assertiva de que exista uma dicotomia inescapável entre desenvolvimento econômico e a implementação de medidas, que visem a preservação do meio ambiente e do modo de vida dos Povos Originários com seu rico patrimônio étnico e cultural.

O falso antagonismo supracitado se mostra completamente dissonante da necessidade, apresentada pela economia brasileira, de estabelecer uma estratégia de desenvolvimento econômico pautado numa inserção mais qualificada no âmbito das chamadas cadeias globais de valor. Evidentemente, tal integração perpassa, sim, por avanços tecnológicos, mas também depende de um uso estratégico, racional e sustentável das riquezas naturais e biogenéticas existentes no território brasileiro.

Mais precisamente, um crescimento econômico mais sustentável no tempo exigirá um esforço governamental substantivo, no sentido de introduzir mais qualificadamente a economia brasileira nas cadeias globais de produção. Disso resulta a necessidade de se implementar uma estratégia que vise uma reindustrialização nacional combinada com o uso racional e sustentável das riquezas naturais nos processos produtivos de agregação de valor.

Portanto, o Dia dos Povos Indígenas é uma data que precisa ser forte e efusivamente celebrada, uma vez que comemora o seu incomensurável patrimônio cultural e simbólico, e do qual, vale lembrar, toda a sociedade brasileira é herdeira.

Contudo, é premente também utilizá-la para trazer à memória o tamanho da dívida histórica que o Brasil possui com esse segmento da sua população. Disso resulta a urgência de uma reflexão mais profunda sobre o modelo econômico e social de desenvolvimento adotados no país, uma vez que o modelo escolhido deve priorizar a preservação do seu patrimônio cultural e ser ambientalmente sustentável.

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Com informações do Notícia Preta.

Mais de 70% das cidades nao cumprem lei do ensino afro-brasileiro

 

Estudantes do 3° Ano B da EEMTI Pe. Luis Filgueiras, em Nova Olinda -CE, durante oficina sobre saberes afro-indígenas. (FOTO | Prof. Nicolau Neto).

Sete em cada dez secretarias municipais de educação não realizaram nenhuma ação ou poucas ações para implementação do ensino da história e da cultura afro-brasileira nas escolas, conforme pesquisa divulgada nesta terça-feira (18), em Brasília, pelo Instituto Alana e Geledés Instituto da Mulher Negra.  

O estudo ouviu, em 2022, gestores de 1.187 secretarias municipais de educação, o que corresponde a 21% das redes de ensino dos municípios, sobre o cumprimento da Lei 10.639/03, que tornou obrigatório o ensino para o combate ao racismo nas escolas há 20 anos.

Os municípios alegam como principais desafios para implementação da lei a ausência de apoio de outros entes governamentais e a falta de conhecimento de como aplicar a legislação. Há indicação do baixo engajamento ou a resistência de profissionais a esse tema. Temos algumas frentes que a gente pode incidir para implementação da lei”, explica a analista de políticas públicas do Instituto Alana, Beatriz Benedito.  

Para os institutos, os dados mostram a necessidade de compromisso político para a norma ser efetivada, como ocorre nos municípios com ações estruturadas, em que há, por exemplo, regulamentos locais, recursos no orçamento, presença de equipe técnica dedicada ao tema e planejamento anual das atividades.  

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Com informações da Agência Brasil e Alma Preta.

Historiador Boris Fausto morre aos 92 anos

 

Boris Fausto. (FOTO | Site de Memória da TV Câmara).

O campo historiográfico no Brasil perdeu um dos seus grandes nomes nesta terça-feira (18): faleceu em São Paulo, aos 92 anos, o historiador Boris Fausto. O professor aposentado do Departamento de Ciência Política da Universidade de São Paulo estava se recuperando de um acidente vascular cerebral (AVC) que sofreu e junho de 2021. O velório será na Funeral Home, na região da Avenida Paulista, a partir de 8h de quarta-feira (19).

Nascido em São Paulo, no dia 8 de dezembro de 1930, Fausto cursou Direito na Universidade de São Paulo em 1953. Em seguida, em 1966, graduou-se em História pela mesma instituição e obteve seu doutorado em 1969. Ele atuou como professor no Departamento de Ciência Política da USP, fez parte da Academia Brasileira de Ciências, colaborou com diversas revistas acadêmicas e jornais de grande circulação, como a Folha de S.Paulo.

Fausto foi autor de inúmeros livros, dentre eles, “A Revolução de 1930: Historiografia e História”, seu maior sucesso historiográfico, e o didático “História do Brasil”, que fez muito sucesso entre professores e alunos de História do Ensino Básico. Outra obra sua muito popular foi o livro “O crime do restaurante chinês”, no qual ele recorre aos arquivos da história e da memória pessoal para narrar e analisar um dos acontecimentos policiais que mais mobilizaram a opinião pública paulistana. Sua narrativa repleta de detalhes e didática foi uma das chaves de sua popularidade. Ele conseguia alcançar não só os seus colegas acadêmicos, mas também o leitor comum.  

“Em memórias de um historiador de domingo”, Boris ensaia uma escrita autobiográfica, contando histórias sobre seu ofício e sobre sua família:

“Provenho de uma família de imigrantes, cujo esforço para manter-se e progredir na nova terra fora notável, mas que não poderia orientar nenhum de seus jovens descendentes na esfera profissional. Quem meteu uma colher no assunto foi o autodidata Jacques Rousselle — amigo preferido de meu pai, Simon —, apoiando minha escolha: “Borrizinho é muito papudo e deve mesmo virar advogado, mas advogado criminal; para comercial não serve”. Meu pai tratou de conversar com os conhecidos do mundo dos negócios cafeeiros, tentando recolher opiniões sobre a carreira de seu filho, que eles mal conheciam. Tive uma conversa irritante com um senhor húngaro — o dr. Biro —, homem
de boas maneiras, mas peremptório, que mal ouviu as minhas razões e sentenciou numa frase tão telegráfica quanto definitiva: “Direito non, engenheiro técnico, sim, Suíça”.

Ao Café História, o historiador Daniel Carvalho, professor do Departamento de História e do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade de Brasília, lamentou a morte de Fausto. “Para uma geração inteira de professores, a Historia do Brasil de Boris Fausto foi uma das principais referências didáticas na dura hora de buscarmos materiais para preparar aulas.”

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Com informações do Café História.

Povos indígenas do Ceará são representados por mais de 14 etnias

 

Movimento Indígena no Ceará sofreu um apagamento histórico e ainda sofrem com a regulação fundiária de suas terras. (Foto: Reprodução). 

A expansão colonialista portuguesa na região Nordeste do Brasil foi um processo sangrento de intensos confrontos entre os invasores portugueses e os diversos povos indígenas que habitavam essa região. Esses conflitos ficaram conhecidos como a Guerra dos Bárbaros, um dos episódios mais violentos de nossa história, como também um dos mais longos, ocorrido de 1651 até 1704. Os interesses dos portugueses na região Nordeste se davam devido à ânsia por conseguir mais terras para as fazendas de gado. A expansão da pecuária foi dificultada devido à resistência dos povos indígenas.

A “solução” encontrada pelos invasores foi um verdadeiro genocídio, iniciado a partir de 1651, com um processo de extermínio da população nativa para “limpar” as terras para a expansão da pecuária, o que resultou na dizimação e na desestruturação de vários povos dessa região.

Porém, a história não acaba aqui. Os indígenas que sobreviveram ao genocídio permanecem firmes e fortes na luta por seus direitos, por suas terras e contra o massacre que, infelizmente, não é apenas um episódio do passado, mas algo que continua ocorrendo nos dias atuais.

No Estado do Ceará são 14 etnias dos povos indígenas, espalhados por 18 municípios. São os povos Anacé, Gavião, Jenipapo-Kanindé, Kalabaça, Kanindé, Kariri, Pitaguary, Potiguara, Tapeba, Tabajara, Tapuia-Kariri, Tremembé, Tubiba-Tapuia e Tupinambá. Eles vivem ao pé da serra, na Região Metropolitana de Fortaleza, e no Sertão. Continuam celebrando a memória dos seus antepassados, educando as crianças por meio de escolas indígenas, organizando-se enquanto etnias sobreviventes e resistindo contra os massacres dos seus povos.

Os indígenas do Ceará vivem uma dura realidade. O cacique Climério, 22 anos, da etnia Anacé, afirma que a maior dificuldade é a regulação fundiária, pois seu território fica às margens das grandes praias e, devido a isso, a especulação imobiliária é muito grande. “Lutamos contra o ramo hoteleiro, o desmatamento, o turismo desenfreado dentro do nosso território por parte das grandes empresas e a maior parte dessas dificuldades vêm por conta do próprio Estado.

O movimento indígena tem adotado várias medidas de resistência, as retomadas de terra, acessar a Defensoria Pública, o Ministério Público, e fazendo o enfrentamento jurídico porque a gente sabe que no governo fascista o enfrentamento corpo a corpo se torna muito pesado. Nosso povo já foi muito massacrado e, por isso, está iniciando a campanha do Acampamento Terra Livre, que é a maior instância de representatividade dos povos indígenas no Brasil, no qual a gente vai traçar estratégias de como nos organizarmos para esse enfrentamento, finaliza.

Essa realidade não é diferente de Isaías, um jovem Jenipapo-Kanindé, de 18 anos. “A nossa dificuldade maior é a nossa resistência. No mundo atual, nós indígenas precisamos falar para nossa própria sobrevivência. Anos atrás, para sobrevivermos tivemos que calar nossa voz, mas agora, para sobrevivermos, precisamos mostrar pro mundo que nós somos indígenas, mesmo com as nossas diferenças: não somos iguais aos índios da Amazônia, mas também enfrentamos nossas próprias dificuldades, como o preconceito das pessoas que têm uma visão estereotipada dos povos indígenas, que quando veem um índio com celular falam ‘é português aquele índio?’. Nós temos que nos adaptar ao mundo atual até para poder enfrentar melhor essa luta pela demarcação das nossas terras. Nós somos guerreiros por nos identificarmos e queremos mostrar para a população do Ceará e do Brasil que ainda que tem índio e que os índios resistem”, declara Isaías.

A batalha continua e a luta dos povos indígenas representa também a luta contra o latifúndio, contra as grandes empresas capitalistas, contra a propriedade privada.

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Texto de Claudiane Lopes e Haroldo Neto, originalmente com o título “A luta dos povos indígenas no Ceará” no A Verdade.