(FOTO | Reprodução | Instagram). |
Por Nicolau Neto, editor
Na última segunda-feira,12, Ticiane Pereira da Silva relatou a TV News Cariri um caso de racismo ocorrido em um restaurante no município de Crato.
Representantes do GRUNEC e do Terceiro das Pretas na Comunidade Quilombola Sítio Arruda. (FOTO |Reprodução | Instagram). |
Após 10 anos com processo parado, duas terras quilombolas do Ceará foram as primeiras a receber a titulação de posse definitiva, conforme o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). Ao todo, 101 famílias com autodeclaração de ancestralidade negra foram beneficiadas pela iniciativa.
Comunidade quilombola do Sítio Arruda, em Araripe, tem imissão de posse de terra concedida pelo INCRA. (FOTO | Reprodução | Instagram). |
Por Nicolau Neto, editor
A comunidade
quilombola Sítio Arruda, no município de Araripe, na região do cariri cearense,
teve a imissão de posse de uma fazenda localizada em seu território. O
documento foi concedido pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma
Agrária (Incra).
A
solenidade de assinatura contou diversas apresentações culturais locais, além
de ter tido a representação de lideranças quilombolas da comunidade, visto que
essa etapa é crucial para culminar na titulação da terra.
Em suas redes sociais, a Secretária Executiva da Igualdade Racial do Ceará, a professora Martir Silva destacou o momento como “histórico para a comunidade quilombola do Sítio Arruda” e que a conquista “reflete de um lado a luta e resistência e de outro o compromisso do governo Lula”.
A
posse definitiva da terra a esta comunidade quilombola simboliza um processo de
luta intensa e representa uma garantia jurídica, além de permitir o acesso aos
programas sociais, principalmente da agricultura familiar.
O evento de assinatura contou com a participação de movimentos sociais, como a Cáritas Diocesana de Crato e o Grupo de Valorização Negra do Cariri (GRUNEC).
(FOTO | Alê Cardoso). |
As denúncias podem ser feitas por meio de três canais:
-Através de ligação telefônica, em caso de flagrante ou ameaça, pelo número 190. A ligação será encaminhada para a Polícia Civil ou Militar.
– Através do site da Prefeitura: www.juazeirodonorte.ce.gov.br, no ícone disposto na aba “Serviços Online”, escrito NEPIR, onde será direcionado para um link. A vítima poderá preencher seus dados, relatar o ocorrido, e escolher a finalidade de uso dessas informações. Além dessa função, a vítima poderá, por exemplo, optar por uma mediação com o agressor, ou ação judicial, ação local, orientações, ou acolhimento.
– O link também ficará disponível no endereço eletrônico: Instagram.com/nepirjn, para fácil acesso.
O atendimento à vítima também disponibilizará acolhimento psicológico do NEPIR e as devidas orientações para prosseguimento.
O caso será encaminhado ao Centro de Referência Especializado da Assistência Social – CREAS, ao Centro de Referência da Assistência Social – CRAS que atender o território informado e, se necessário, à equipe de Saúde da Família responsável pela região.
A depender do caso, ainda pode ser repassado a um Núcleo de Prática Jurídica – NPJ, a Defensoria Pública ou Ministério Público.
Isto, com a possibilidade da vítima ser acompanhada por algum profissional do NPJ ou da Comissão de Promoção de Igualdade Racial da OAB de Juazeiro do Norte para a oficialização do registro de Boletim de Ocorrência.
Havendo a necessidade de ação no local do ocorrido, esta será articulada com o apoio do Conselho Municipal de Igualdade Racial – COMIRA, do Grupo de Valorização Negra do Cariri – GRUNEC, e da Comissão de Promoção da Igualdade Racial da OAB de Juazeiro.
O momento do lançamento contou com a presença de representantes da SEDEST, do NEPIR, da Casa da Mulher Cearense, do CREAS, além da Articulação Nacional de Psicólogas(os) Negras(os) e Pesquisadoras(es)- ANPSINEP e do Ministério Público.
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Com informações do Portal Badalo.
Lívia Nascimento. (FOTO | Nívea Uchoa). |
Por Nicolau Neto, editor
No último dia 21 de julho, em Crato, a advogada e presidente do Grupo de Valorização Negra do Cariri (GRUNEC), Lívia Nascimento, lançou seu primeiro livro intitulado livro “JUSTIÇA SOCIAL AFRODIASPÓRICA: pensando alternativas à lógica desenvolvimentista a partir da atuação do Grupo de Valorização Negra do Cariri”.
O evento de lançamento reuniu professores, professoras, integrantes de movimentos sociais negros da região e familiares e ocorreu dentro da programação oficial do Julho das Pretas 2023 junto da 1ª Sexta Preta do Cariri que, no Ceará, tem a organização da Rede de Mulheres Negras do Ceará e do próprio Grunec.
A autora, Livia Maria Nascimento Silva, é uma jovem mulher negra, mãe e nascida no Cariri cearense. Mestra em Direitos Humanos, Cidadania e Políticas Públicas pela Universidade Federal da Paraíba (PPGDH/UFPB), bacharela em Direito pela Universidade Regional do Cariri (URCA), especialista em Direito Constitucional pela mesma instituição e em Direito Público pela Faculdade Legale. É advogada, assessora jurídica e presidente do GRUNEC (mandato 2022-2024), membra da Comissão de Promoção da Igualdade Racial da Ordem dos/as advogados/as do Brasil, secção do Ceará (OAB-CE) e da Coletiva Abayomi Juristas Negras.
Segunda ela, o livro “é resultado da sua dissertação de mestrado e reúne um aporte teórico acerca dos movimentos negros no Brasil, Ceará e região do Cariri, destacando o quanto a agência negra brasileira propõe uma significativa ruptura com a cosmovisão ocidental eurocêntrica, trazendo paradigmas para uma cosmopercepção de direitos humanos e justiça social afrodiaspórica”.
A produção conta com o prefácio da professora da Universidade Regional do Cariri (URCA) e Coordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Educação, Gênero e Relações Étnico-Raciais (NEGRER), Drª Cícera Nunes. Nunes destaca que o livro traz denúncias do racismo estrutural a luz das organizações dos movimentos negros, antigos na história do Brasil e que estes têm “apontado novos modelos sociais de inclusão em defesa das diversidades e da recriação da vida com justiça e direitos. Essas trajetórias de luta também marcam o território cearense, questionando as narrativas oficiais que invisibilizaram essas existências e que ainda encontram dificuldades no avanço das políticas antirracistas”.
E continua:
“O Cariri
cearense é território negro e indígena, profundamente marcado pela presença da
luta antirracista. O Grupo de Valorização Negra do Cariri é parte importante
desse processo de construção de novas formas de viver, denunciando o racismo em
todas as suas dimensões e propondo uma outra concepção de educação e de relação
com o mundo que rompa com a lógica racista, capitalista, patriarcal, sexista e
de negação dos conhecimentos tradicionais.
Através da
atuação do Grupo de Valorização Negra do Cariri a luta antirracista insurge no
Cariri cearense, em especial a partir do início do século XXI, ocupando
espaços, articulando redes, dialogando com outros movimentos sociais,
tensionando o campo das políticas públicas, tendo como princípios o
reconhecimento do legado ancestral e a solidariedade coletiva, ao tempo em que
dialoga com a agenda histórica dos movimentos negros no contexto nacional.
Livia
Maria Nascimento Silva é uma pesquisadora engajada e inserida no contexto da
luta antirracista no Cariri cearense, que reconhece na existência do GRUNEC a
centralidade de uma agenda que positiva a existência negra na luta por cidadania
e construção de alternativas de um novo modelo societário. São visões de mundo
contra hegemônicas e que na sua amplitude envolve historicamente os povos
tradicionais, os movimentos indígenas e as populações negras na sua
diversidade.
No campo
das reflexões sobre epistemologias negras e enquanto um debate necessário à
todas as áreas do conhecimento, temos nesta produção um importante aporte
teórico para compreensão das lutas antirracistas no Brasil e no contexto
cearense. A autora contextualiza a trajetória do GRUNEC contribuindo para
visibilizar um debate que cada vez mais se torna necessário no campo da disputa
pela produção do conhecimento como parte do compromisso político com a
transformação da sociedade.
Temos,
nesta obra, uma outra narrativa sobre o Cariri cearense, contada a partir de
dentro e de múltiplas vozes, que encontra na atuação política e formação
intelectual da autora os fios que nos conectam às lutas políticas do movimento
negro caririense. Apresentamos-lhes à uma produção que nos ajuda a refletir a
partir de uma nova concepção de mundo e de estratégias de emancipação, que vêm
sendo tecida por mulheres, homens, jovens e crianças negros (as) na luta por
dignidade em toda a sua plenitude”.
A autora afirma que quem tiver interesse em adquirir o livro, pode entrar em contato por meio do correio eletrônico advlivianascimento@gmail.com ou Whatsapp (88) 99751-8055. A obra também está disponível nas bibliotecas do IFCE-Crato, NEGRER e GRUNEC.
Por Nicolau Neto, editor
1,3 milhão de habitantes no Brasil são considerados quilombolas é o que revelou um mapeamento inédito do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), realizado por meio do Censo Demográfico de 2022 e divulgado nesta quinta-feira, 27 de julho.
Essa é a primeira vez que o IBGE registra oficialmente a população quilombola no país e os dados demostram ainda que o Estado do Ceará está entre os 10 (23,9 mil quilombolas) que apresentam o maior número dessa população, estando ela presente em 67 dos 184 municípios. E Altaneira, no cariri, figura nessa lista com 171 quilombolas, o que representa em termos proporcionais a 2,5% do total de habitantes do município (6.782). Nos outros levantamentos, o município não aparecia.
É importante lembrar que o critério adotado pelo IBGE para a identificação da população quilombola, conforme estabelecido pela legislação vigente no país, foi a autodeclaração no momento da coleta de dados pelo recenseador ou recenseadora. Dessa forma, logo após pergunta sobre a “cor ou raça”, independentemente da resposta, a próxima pergunta foi “você se considera quilombola?”. Se a resposta fosse positiva, havia outra pergunta, a saber: “qual o nome da sua comunidade?”. Era possível inserir nomes que não estavam gravados.
No entanto, o aparecimento de Altaneira entre os municípios com presença quilombola não é uma surpresa, mesmo não aparecendo em nenhum levantamento organizado por outros órgãos e entidades. Devo lembrar que em 2021 escrevi artigo sobre o fato após o município ter ficado impedido de receber novas doses da vacina anticovid-19 por não ter cumprido a meta, que era vacinar a população Quilombola localizada na Bananeira, zona rural.
Destaquei que o município havia encaminhado nota ao blog, onde desconhecia a existência de comunidade no município como quilombola, mas que havia entrado em contato via e-mail com o estado visando adquirir mapeamento e a lista dos membros já que foi estipulado uma meta de 1250 pessoas a serem vacinadas.
Naquela oportunidade, afirmei ainda que dados do próprio Governo do Ceará ao citar as 70 comunidades quilombolas - incluindo as que não dispõem de certificação junto a Fundação Palmares -, não constava a referida comunidade de Altaneira. Mapeamento das Comunidades Quilombolas do Ceará iniciado em 2018 e finalizado em março de 2019, conforme publicação no Blog do Quilombo do Cumbe (Cumbe é uma comunidade quilombola de Aracati) também não havia menção desta em Altaneira.
Por último, citei que o Grupo de Valorização Negra do Cariri (GRUNEC) e a Cáritas Diocesana de Crato – CE realizaram um importante trabalho com comunidades rurais de algumas cidades da Região do Cariri, Estado do Ceará. O material refere-se ao Mapeamento das Comunidades Rurais Negras e Quilombolas do Cariri. O trabalho que foi publicado neste Blog ocorreu em 2010 e visitou 25 comunidades em 15 municípios e também não constava Altaneira.
No entanto, trouxe a lume dados que apontavam a existência dela no Sitio Bananeira. O mapeamento foi realizado pela Comissão Estadual dos Quilombolas Rurais do Ceará (CEQUIRCE), conforme informações repassadas pela equipe do governo municipal ao blog em 2021.
O que os dados revelam?
Após a Constituição de 1988 (CF/88) é que o termo “remanescentes de quilombolas” aparece pela primeira vez em um contexto marcado pela memória de mais de três séculos de escravidão, mas também por mais 21 anos de recessão, de ausência de liberdade e de torturas trazidas pela Ditadura Civil-Militar. O corpo e a mente do povo negro sofre mais uma vez.
O “remanescente de quilombolas” surge dentro desse contexto, mas também marcado pela redemocratização e o Art. 68 da CF/88, no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias traz:
Aos remanescentes das comunidades dos quilombos que estejam ocupando suas terras é reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhes os títulos respectivos.
Quilombos e comunidades remanescentes destes são símbolos de resistência ao poder estabelecido que segregou e segrega, que escravizou e de luta por direitos básicos como liberdade, terra e moradia e inserção social. O próprio artigo trazido a lume é um exemplo de que as poucas conquistas da população negra são frutos do poder da organização e da mobilização tendo como referência os movimentos negros. Muitas das conquistas estão apenas nos papeis, infelizmente. Outras, estão incompletas.
Agora, com os dados inéditos do IBGE que apontam oficialmente que em Altaneira há presença de quilombolas, é preciso reiterar o que disse outrora. É fundamental um diálogo profundo e urgente entre o poder público municipal e esta comunidade no sentido de criar estratégias visando garantir direitos básicos, e o principal deles é a regulação do território, passando, pois, pela regularização de toda a documentação e efetivação da titulação junto aos órgãos competentes.
Antes da divulgação dos dados pelo IBGE, no último domingo (23) o blog Negro Nicolau entrou em contato com um dos integrantes da comunidade visando saber dos passos trilhados para o reconhecimento enquanto comunidade remanescente de quilombo. Uma das indagações do blog foi sobre a ata de reunião. Segundo Clécio Sousa, a comunidade está em fase de conclusão de toda a documentação para entrar com processo de reconhecimento. O blog também indagou sobre se foi promovida alguma formação referente a história dos quilombos. A resposta foi negativa.
Dona Neusa na calçada. (FOTO | Nicolau Neto). |
Por Nicolau Neto, editor
O
dia 25 de julho é uma data para ser celebrada. Isso porque internacionalmente
desde 1992 em Santo Domingo, na República Dominicana, quando um encontro foi organizado por mulheres negras, latino-americanas
e caribenhas objetivando debater temas que os uniam - como a luta contra o
racismo -, que a ONU reconhece a data como Dia Internacional da Mulher Negra, Latina e Caribenha.
Já
no Brasil, em 2014, durante o mandato da presidenta Dilma Rousseff, foi instituída
a Lei 12.987, definindo na mesma data o Dia
Nacional de Tereza de Benguela e da Mulher Negra, em referência à memória
da Rainha Tereza, mulher que ao conseguir a libertação, liderou o Quilombo do
Quariterê, no Mato Grosso.
No
ensejo em que várias homenagens irão ser feitas as mulheres negras espalhadas
pelo país, como em Crato e em Juazeiro do Norte, por exemplo, onde a professora
Drª Cícera Nunes (URCA) e a educadora popular Valéria Carvalho (GRUNEC) receberão
a comenda Maria do Espírito Santo,
aproveito para apresentar de forma sucinta a trajetória de Neusa Lourenço,
minha mãe.
Neusa Lourenço, símbolo de resistência
Neusa
Lourenço da Silva, ou simplesmente Dona Neusa, nasceu no distrito de
Cajazeiras, em Assaré, no ano de 1948. Filha de Joana Tibúrcio do Amarante,
mulher branca, e Antônio Lourenço da Silva, homem negro, compartilhou com seus
oito irmãos - Armando, Aldino, Raimundo, José, Edilsa, Lieta, Zélia e Maronilde
-, as dificuldades que a vida lhes impunham. Trabalharam desde cedo na roça e
como era comum na época tiveram pouquíssimas oportunidades de estudarem.
Nos
fins de tarde ela sempre gostava de sentar na calçada e logo ganhava a
companhia dos filhos e filhas. Era nesse ínterim que as rodas de conversas de
davam e as suas memórias ganhavam força nas palavras. De histórias de conflitos
que ela se envolvia para livrar seu pai de enrascadas quando bebia a aventuras
para matar a fome dos 10 filhos , estão entre aquelas mais contadas. “Teve um dia que pai bebeu muito e demorou a
chegar. Fui a sua procura e me deparei com ele sendo maltratado. Nessa hora não
contei conversa. Peguei nas partes baixas dele” (se referindo ao homem
que estava maltratando o pai), diz ela entusiasmada toda vez que lembra do
episódio “e só larguei quando ele pediu
desculpas a papai”.
Dona Neusa. (FOTO | Nicolau Neto). |
Ao
se casar com João Nicolau da Silva, de quem é prima distante, não tinha onde
morar e tiveram que viver de aluguel. Essa situação durou boa parte da vida. A
mudança de casa e de cidade foi uma constante na vida do casal que acabou
chegando em Altaneira no ano de 1990. Alguns anos depois o casal sofre o pior
momento da vida, a morte do filho caçula Edson.
Em
Altaneira, ela junto ao esposo enfrentam as maiores dificuldades para alimentar
os filhos e filhas. Decide trabalhar como empregada doméstica no município de
Crato. Enfrentou por mais de duas décadas a distância de 56 km entre as duas
cidades andando no ônibus de seu Zé Lopes. Lá trabalhava lavando e passando
roupa. A maior parte desse tempo foi na casa do casal Ednaldo Farias Solto
(Mago), ex-prefeito de Altaneira, e Roberci Vânia Oliveira, hoje com assento de
vereadora na Câmara de Altaneira.
Ela
conta que só aguentava o trajeto porque sabia que era a única forma de ajudar
na alimentação da família. Ela passava a semana no Crato e quando era no sábado
meu irmão Neto e eu íamos espera-la na saída da cidade. A ansiedade era tamanha
a espera dela. Toda vez que ouvíamos o barulho de um motor a esperança de um
prato na mesa se renovava. As vezes passava de duas semanas no Crato e voltávamos
para casa com um tristeza sem fim.
Com
o dinheiro que ela trazia dava para comprar também bilas e piões. Junto com o futebol,
essas eram as brincadeiras que mais gostávamos. Mas a alegria maior mesmo era
revê-la.
Dona
Neusa é uma mulher forte, persistente e que não desiste do que quer. Sempre fez
de tudo para se defender e defender os filhos e filhas. “Nessa negra aqui ninguém pisa não”, dizia ela toda vez que era
confrontada pelo racismo estrutural e institucional. “Aqui é uma negra que tem vergonha. Não se curva a ninguém”, contava
ela cheia de orgulho quando tinha enfrentado situações que toda mulher negra
enfrenta. Dizia olhando bem nos nossos olhos de forma a verbalizar: façam o
mesmo.
A
vida toda trabalhou também como agricultora. Tanto em Cajazeiras e Arassás, em
Assaré, quanto em Altaneira. Com a idade já avançada e a proximidade da
aposentadoria como agricultora, deixa o trabalho como empregada doméstica e se
dedica exclusivamente aos afazeres de sua própria casa.
Dona Neusa Fazendo Crochê ao lado de sua mãe. (FOTO | Nicolau Neto). |
Para
uma mulher que viveu do trabalho e para o trabalho era difícil passar a maior
parte do tempo sem fazer nada. Não contente com isso passou a usar o restante
do tempo para costurar, cortar cabelo (os nossos) e fazer crochê.
A
vitalidade dela era tamanha que durante anos, inclusive depois da casa do 60 (hoje ela
tem 75), a levava de moto até o município de Potengi, também na região do cariri,
para visitar a mãe (que já faleceu) e as irmãs e irmãos. Eram 116 km de ida e
volta. Aliado a tudo isso gostava de cantar e dançar, principalmente forró e
frequentou por vários anos as reuniões Centro de Apoio ao Idoso em Altaneira.
Hoje
o cansaço de anos e anos de trabalho bateu forte e ela já não tem a mesma força
que tinha antes. Enfrentou recentemente a cirurgia na visão e não tem mais o
hábito de sentar na calçada para as rodas de conversas. Aliás, ela fala pouco
agora.
Dona Neusa é, portanto, símbolo de resistência e de enfrentamento ao racismo. Ao tempo que foi e contiua sendo uma mãe amorosa e que sempre fez questão dos seus estudarem, mesmo tendo feito apenas a antiga quarta série.
Professora Cícera Nunes e Valéria Carvalho. (FOTO | Montagem | blog Negro Nicolau). |
Por Nicolau Neto, editor
A
prefeitura do Crato, na região metropolitana do cariri, promoverá no próximo
dia 25 de julho, Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e
Caribenha, a solenidade de entrega da Comenda Maria do Espírito Santo.
O
evento visa homenagear mulheres que sejam referência no desenvolvimento de
ações de combate as desigualdades de estruturais de raça e de gênero. Este ano
as homenageadas com a medalha serão a professora Drª Cícera Nunes, do
Departamento de Educação da Universidade Regional do Cariri (URCA) e
Coordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Educação, Gênero e Relações
Étnico-Raciais (NEGRER) e a professora aposentada e ativista dos direitos civis
e humanos das populações negras com atuação pelo Grupo de Valorização Negra do
Cariri (GRUNEC), Valéria Carvalho. Além delas, receberá a comenda a líder
religiosa Raimundo dos Santos, a Mãe Kum.
O
evento ocorrerá no auditório da prefeitura a partir das 18h30 e foi divulgada
nas redes sociais tanto do NEGRER quanto do GRUNEC.
Sobre Maria do Espírito Santo
A
comenda leva o nome de Maria do Espírito Santo, conhecida popularmente por
“Madrinha Espírito Santo”, que era mulher negra que pautou sua vida em prol da
defesa e propagação das religiões de matriz africana, sobretudo da Umbanda – da
qual foi líder (mãe de santo) em Crato. Ela foi benzedeira e atuou também como
servidora pública deste município onde viveu por cerca de seis décadas.
Grunec celebra 22 anos. (FOTO | Reprodução | WhatsApp). |
Por Alexandre Lucas, Colunista
O
Grupo de Valorização Negra do Cariri - Grunec, fundado em 21 de
abril de 2001, realizará festa de comemoração dos seus 22 anos, no
dia 05 de maio, a partir das 16h, na sua sede localizada na Rua
Coronel Secundo, 287, no Centro.
A confraternização
deverá ser marcada por ato político em defesa da igualdade racial e
da luta pelos 2% do orçamento do município do Crato para cultura
e deverá reunir além da militância dos movimentos negros da
região, representantes dos Pontos de Cultura, instituições
parceiras, coletivos e voluntários. Está previsto para comemoração
lançamento da nova identidade visual, música, bazar, comes e bebes
e intervenções artísticas.
Atualmente o Grunec conta
com cerca de 30 integrantes e é presidido pela advogada Lívia
Nascimento.
Durante esses 22 anos o Grupo publicou a
edição do 1° jornal de imprensa negro do Cariri, o "Afrocariri";
o assessoramento do primeiro processo judicial sobre injúria racial
do Cariri; organização da 1ª Audiência Pública Federal no
ano de 2007 para discutir a implementação da Lei nº 10.639/03
reunindo representantes de 42 municípios; realização do 1º
Seminário no Crato em 2005 para discutir a Igualdade Racial;
realização da Semana da Consciência Negra; o mapeamento das
comunidades negras e quilombolas do Cariri; construção da
caminhada contra a intolerância religiosa realizada anualmente em
Juazeiro do Norte; realização da Marcha das Mulheres Negras do
Cariri; incidência em questões ligadas à educação, saúde,
mulheres negras, convivência com o semiárido, juventudes negras,
acolhimento e integração de imigrantes, cotas, segurança pública,
cultura, entre muitas outras ações.
Ao longo desta
trajetória recebeu honrarias como: Prêmio Frei Tito de Alencar de
Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Estado do Ceará e
Comissão de Direitos Humanos e Cidadania; Prêmio Fórum Justiça de
Direitos Humanos Maria Amélia Leite; Comenda de mérito defensorial
da Defensoria Pública do Ceará, entre outros.
Livia Sant'Anna. (FOTO | Reprodução). |
Por Nicolau Neto, editor
O
Grupo de Valorização Negra do Cariri (GRUNEC) e o Núcleo de
Estudos em Educação, Gênero e Relações Étnico-Raciais (Negrer),
aderiram na tarde desta segunda-feira, 24, à Carta do MIPAD (Most
Influential People of African Descent) em apoio ao nome da jurista
Lívia Sant’Anna Vaz para uma das vagas do Supremo
Tribunal Federal.
Em nota lançada em suas redes,
destacam a biografia da promotora que tem atuado de forma constante e
consistente contra o racismo. Ela autua no Ministério Público da
Bahia (MP-BA) desde 2004, sendo uma jurista referência nacional e
internacional na defesa dos direitos humanos, sobretudo no combate ao
racismo e promoção da igualdade racial, proteção das mulheres em
situação de violência e da população LGBTTQIAP+.
Livia
tem doutorado em Ciências Jurídico-Políticas. Chegou escrever
dois livros: “AJustiça é uma mulher negra” e
“Cotas raciais”. No currículo, Lívia ainda
carrega o título de ser a única brasileira
a ser reconhecida
como uma das 100 Pessoas de Descendência Africana mais Influentes do
Mundo, na edição Lei & Justiça.
Segundo o Grunec,
"além de preencher todos os requisitos constitucionais para
ser nomeada Ministra do STF - em especial notório saber jurídico -,
a promotora de justiça demonstra competência, capacidade de diálogo
com os movimentos sociais e total alinhamento com o projeto político
de redemocratização do país".
Então, se você
defende um sistema de justiça com diversidade de gênero, raça e
regional, assine a carta de apoio
Professor Nicolau Neto ao lado de Valéria e Verônica, duas das fundadoras do GRUNEC. (FOTO | Acervo Pessoal). |
Por Nicolau Neto, editor
Neste
sexta-feira, 21 de abril, o coletivo vanguarda na luta antirracista na região
caririense celebra 22 anos. O Grupo de Valorização Negra do Cariri (GRUNEC)
foi, sem dúvida, um dos pioneiros enquanto força coletiva na luta contra o
racismo nesta região e em nota divulgada na rede social Instagram, conta que
embora a data é formal, mas que a gestação é de meses antes.
“Nessa longa trajetória de mais de duas
décadas temos o orgulho de dizer que resistimos, multiplicamos, transformamos,
lutamos, crescemos”, destaca trecho da nota que traz para o público mais
jovem as mais diversas ações encampadas pelo grupo, como a edição do 1° jornal
de imprensa negra do Cariri, intitulado "Afrocariri" e a “incidência
em questões ligadas à educação, saúde, mulheres negras, convivência com o
semiárido, juventudes negras, acolhimento e integração de imigrantes, cotas,
segurança pública, cultura, entre muitas outras…”.
Foi
frisado ainda as honrarias recebidas, como por exemplo, o “Prêmio Frei Tito de Alencar de Direitos Humanos da Assembleia
Legislativa do Estado do Ceará e Comissão de Direitos Humanos e Cidadania”,
o “ Prêmio Fórum Justiça de Direitos
Humanos Maria Amélia Leite”, além da “Comenda
de mérito defensorial da Defensoria Pública do Ceará, entre outros”.
Foram muitas realizações! E serão quantas mais forem necessárias e nossos braços conseguirem construir para continuar a transformar a realidade em que vivemos. Queremos Bem Viver! Vida longa ao GRUNEC. (Nota do GRUNEC).
Quando
da passagem das duas décadas, o blog trouxe a cena um pequeno histórico da luta
negra por direitos e pelo bem viver ancorado pelo GRUNEC.
Abaixo você confere:
O
ano era 2001. Um grupo constituído por cerca de cinco pessoas se reuniram
depois de uma aula de natação na garagem da casa de uma delas e passaram a
dialogar sobre as mazelas que afligiam a sociedade brasileira e, de forma mais especifica, aqueles grupos que
sempre estiveram e ainda estão a margem – negros e negras.
Destes
diálogos sobre desigualdades surgiu a ideia de transformar discursos
individuais em ação coletiva e em luta organizada visando, sobretudo, promover
a igualdade étnica/racial e a autoestima da população negra do cariri e
difundir a consciência quanto a afrodescendência. O que caminha no sentido de
valorizar a nossa história. Com esse ideal nascia o Grupo de Valorização Negra
do Cariri (GRUNEC) que oficialmente (com registro) está com 19 anos, mas de atuação
já possui duas décadas.
O
GRUNEC se constituiu ao longo desses 20 anos como um coletivo que escolheu o
caminho da luta, da resistência e da persistência ao trabalhar de forma
comunitária e saindo da zona de conforto para visitar as comunidades de base,
as comunidades tradicionais, como o povo indígena e os grupos remanescentes de
quilombolas.
Enquanto
entidade organizativa, de combate a toda forma de discriminação, preconceito e
de racismo, tem atuado na proporção em que essas injustiças ocorrem. Como
exemplo, seja tendo sua organização, colaboração ou idealização, pode-se citar
a Caminhada contra a Intolerância Religiosa realizada anualmente em Juazeiro do
Norte, a Marcha Regional de Mulheres Negras do Cariri que visa denunciar formas
de discriminação, opressão e aniquilamento, além do Congresso Artefatos da
Cultura Negra que em 2019 chegou a sua décima edição e que tem se consagrado
como o maior evento de pesquisa sobre a população negra do país.
Nesta
ambiência de atuação, não se pode esquecer também de um dos trabalhos mais
colaborativos em que pese a educação voltada para as relações étnico-raciais: o
Mapeamento das Comunidades Rurais Negras e Quilombolas do Cariri feito junto a
Cáritas Diocesana de Crato – CE, tendo como resultado o lançamento da “Cartilha Caminhos, Mapeamento
das Comunidades Negras e Quilombolas do Cariri Cearense”. Este trabalho
contou com a participação de cerca de 25 comunidades. Seis delas se
autoreconheceram remanescentes de quilombolas. Note-se ainda que comunidades
como as de Arruda (Araripe), Sousa (Porteiras) e Serra dos Chagas (Salitre) já
contam com certificado de remanescentes de quilombolas adquirido junto da
Fundação Cultural Palmares.
Outras
atuações colocam este coletivo negro como protagonista. Cita-se aqui a 1ª
Audiência Pública Federal no ano de 2007, onde discutiram a implementação da
Lei nº 10.639/03 ao reunirem representantes de 42 municípios da Região do
Cariri, o 1º Seminário no Crato em 2005, para discutir a Igualdade Racial e a
realização anualmente da Semana da Consciência Negra.
O
Grunec reúne sem seus quadros professores e professoras universitários/as, docentes
da educação básica, estudantes, pesquisadores/as, líderes religiosos/as e
ativistas sociais, dentre outros e continua firme e forte, principalmente agora
em tempos de cortes de direitos, legitimação desenfreada do racismo, do
machismo e de ofensas sem barreiras a comunidades LGBTs. Por isso, os lemas
mais apregoados do grupo são “Aquilombar
é Preciso” e “Pelo Bem Viver”.
Seu Sebastião. (FOTO | Nicolau Neto). |
Por Nicolau Neto, editor
Em 30 de julho deste ano o Sítio Carcará, no município de Potengi, na região do cariri cearense, completará 10 anos de reconhecimento pela Fundação Cultural Palmares que a certificou como comunidade remanescente de quilombo.
Desde da publicação da Portaria N° 109/2013, de 30 de julho do ano supracitado, que o Sítio Carcará passou a receber a denominação de Comunidade Quilombola do Sítio Carcará, configurando uma intensa rede de apoio em prol da efetivação de direitos como preceitua os artigos 208, 215 e 2016, da Constituição Federal do Brasil e do Decreto nº 4.887/2003, que visa garantir, além da posse de terras, uma melhor qualidade de vida aos quilombolas. Este documento trata do direito desses povos em ter acesso a serviços essenciais como educação, saúde e saneamento.
Dentre os apoios recebidos pela comunidade quilombola do sítio Carcará está o do Grupo de Valorização Negra do Cariri (GRUNEC) e o da Cáritas Diocesana de Crato que realizaram um importante trabalho com comunidades rurais de algumas cidades da Região do Cariri, Estado do Ceará. O material refere-se ao Mapeamento das Comunidades Rurais Negras e Quilombolas do Cariri.
O presente trabalho constitui-se importante ferramenta de estudo e, claro, de suporte didático para serem utilizados nas aulas de História e Sociologia.
Hoje, com o crescimento acelerado do movimento protestante na região, e especificamente no território outrora chamado de Xique-Xique e Ibitiara, na comunidade Carcará também há forte presença desses grupos. Inclusive entre integrantes do grupo. Resta saber se essa nova configuração afeta o processo de luta que vem pela frente. Seu Sebastião, um das lideranças do Quilombo, quando questionado por este professor sobre o assunto foi bem taxativo: "claro que não". O momento foi fruto de uma roda de conversa com estudantes e professores/as da Escola de Ensino Médio em Tempo Integral Menezes Pimentel, em Potengi.
Outro ponto dentro dessa coletividade é a divisão territorial em que pese a relação étnico-racial. Uma parte recebe o nome de "branca" e a outra "negra". Agora pense com seus botões: qual das duas recebe o nome de favela? Isso reverbera entre os mais jovens.
Está planejando uma aula de campo para esta comunidade? Não se esqueça de ouvir seu Sebastião, um dos líderes e de testemunhar a Dança do Toré com Antônia Vieira (popularmente conhecida por Dona Bizunga). O Toré é um dos símbolos do patrimônio imaterial da cultura africana e que permanece viva no Carcará.
Maria Raiane. (FOTO/ Acervo Pessoal). |
Por Maria Raiane, Colunista
O
texto foi publicado originalmente no Letras Negras, uma iniciativa do projeto “Enegrecer a Política” com o objetivo de divulgar o pensamento e as ações de pessoas negras do Norte e Nordeste. Segundo
Raiane, foram selecionados 8 textos do norte e do nordeste. Do nordeste, um do
Ceará, o seu.
Maria Raiane Felix Bezerra[1]
Após o feminicídio político de Marielle Franco no ano de
2018, houve um salto positivo de candidaturas negras. Algo surpreendente foi a
quantidade de candidaturas coletivas que se formaram em todo o Brasil,
principalmente, de mulheres negras que se colocaram na disputa para pleitear
uma vaga nas Assembleias Legislativas e nas Câmaras brasileiras, com
destaque para a região Nordeste.
As mulheres negras, peças-chave para a mudança radical
dessa sociedade em que vivemos, nas últimas eleições (2018, 2020 e 2022)
ousaram se candidatar em um cenário em que estávamos quase perdendo os mínimos
direitos sociais conquistados e que muitos foram totalmente extinguidos pelo
governo Bolsonaro. O atual governo representa/ou a forma mais
antidemocrática, anti vida, punitivista, proibicionista, racista, feminicida,
LGBTQIAPN+fóbico, entre outras violências, que o país já viveu desde o processo
de redemocratização.
Acredito que o cenário caótico em que vivemos fez com que
as pessoas negras se colocassem como ponta de lança, pois são elas que estão
nas lutas árduas e cotidianas em prol das ações afirmativas e que finalmente
conseguiu inserir, minimamente, essa população preta, periférica, das classes
mais afetadas nos espaços que foram negados historicamente.
Refletir sobre a sociedade brasileira, me faz querer
debruçar sobre os limites da falsa democracia e do sonho que ela se torne de
fato realidade, pois com racismo não há democracia.
E é sobre isso que eu quero falar. Acredita-se que os
partidos políticos considerados progressistas ou de “esquerda”, possuem
programas partidários que mais se aproximam de um projeto para uma sociedade
mais “igualitária”. Neste ponto, vale lembrar o mito da democracia racial, pois
essa fantasia tem sido uma pedra no caminho da população negra no Brasil, visto
que entrou com muita facilidade nas mentes daqueles/as que assim como a maioria
no país, agem em negação quanto à existência do racismo estrutural.
Trago essa discussão para o debate, para conseguirmos
vislumbrar o quanto esse conceito criado por um sociólogo nordestino[2] atravessou
e fundou os partidos políticos de esquerda. Ter esses fatos em
mente, nos ajuda a diagnosticar e dimensionar o problema gerado pelo mito da
democracia racial.
É preciso denunciar que existe um problema de formato
estrutural que não é solucionado pelos partidos políticos, pois quando se trata
das barreiras enfrentadas por pessoas negras, ou eles tratam subdividindo o
problema em setoriais, ou, sequer fomentam iniciativas em seus programas de
ações partidárias direcionadas à mitigação dessas barreiras, e tais omissões
são classificadas como racismo. Até porque, quando não debatemos ou não
tratamos de certos problemas, é porque negamos a sua existência. Se eles deixam
de falar sobre ou colocam apenas pessoas negras para falarem do assunto,
novamente, eles estão sendo racistas.
E quando se trata de candidaturas de mulheres negras que,
felizmente, estão saindo em candidaturas coletivas ? O que os partidos de
esquerda têm a declarar do apoio que dão ou deixam de dar para essas corpas?
Consegue refletir de onde estou enxergando? Exponho todos estes pontos
para finalmente chegarmos ao conceito de Racismo por Omissão.
O conceito foi criado por Lélia González para
denunciar o Partido dos Trabalhadores (PT) que nos anos 80, quase cem anos após
a falsa abolição, não integrou ao seu programa partidário e nem denunciou em
rede televisiva, a situação em que a população negra se encontrava no país.
Partindo desse conceito, como já busquei desenhar, tento
refletir e expor as candidaturas recentes das mulheres negras no Nordeste.
Principalmente, daquelas que denunciaram de forma aberta em suas redes sociais,
as dificuldades de financiamentos negados ou não distribuídos de forma coerente
pelos partidos de esquerda.
Este é o caso das vereadoras (Pretas Juntas) Elaine
Cristina e Débora Aguiar do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), da cidade de
Recife-PE, que mesmo recebendo mais de 3 mil votos em sua campanha para
vereança, não receberam recursos suficientes do partido (PSOL), mesmo diante da
magnitude da campanha. Percebo isso como uma estratégia de boicote
ao projeto político pensado e conduzido por mulheres negras, pois estamos falando
de partidos políticos que tem um quantitativo que se autodeclara negro
relevante. Mas que ainda segue os princípios branco, masculino, cis, hétero
etc., por isso, para eles, só vale apostar financeiramente naquelas/es que “já
estão ganhos”. Importante lembrar, que isso não é apenas uma situação isolada
em Recife-PE.
Foi por meio dos financiamentos coletivos que várias
campanhas coletivas de mulheres negras se sustentaram. Foi com o
apoio de uma coletividade, que as candidatas tiveram apoio psico-socio-político
dos seus coletivos comprometidos com as pautas para continuarem no
enfrentamento às desigualdades intrapartidárias.
Importante destacar que, os partidos políticos, ainda nos
tratam como pessoas que estão propondo uma candidatura apenas por questões
“identitárias”, algo que quem faz parte dos movimentos negros, de mulheres e
outros escutam com frequeência. Mas vos digo, eles têm medo do que propõem as
mulheres negras, pois estamos falando de atores sociais que pensam a sociedade
como um todo.
Que deixemos bem nítido, não queremos apenas nos
candidatar, queremos ser eleitas e para isso precisamos do compromisso real com
a dívida não paga daqueles que nos devem e que estão alocados nas estruturas
partidárias. Para a “esquerda”, deixo um recado, é preciso reconfigurar esse
padrão que usa nossa imagem para cumprir coeficiente de representação, não
iremos aceitar mais isso.
[1] Maria
Raiane, negra jovem de 24 anos, pansexual, licenciada em ciências sociais pela
Universidade Regional do Cariri (URCA), mestranda em Sociologia pela Universidade
Estadual do Ceará (UECE), professora de sociologia e filosofia na educação
básica, escritora independente/marginal, colunista do blog Negro Nicolau,
pesquisadora do NEGRER; compõe a coordenação do Grupo de Valorização Negra do
Cariri (GRUNEC); ativista da Rede Nacional de Feministas Antiproibicionistas
RENFA; nascida e criada em Juazeiro do Norte, região do Cariri, no Estado do
Ceará-Nordeste
[2] O conceito de “Democracia Racial” foi criado por Gilberto Freyre e na obra Casa-Grande e Senzala (1933) foi onde o conceito ganhou relevo e reconhecimento. Esse conceito, nega a existência do racismo no Brasil.
Da esq. para a dir. (Janayna, Valéria, Lívia e Verônica). FOTO | Reprodução | WhatsApp). |
Por Nicolau Neto, editor
Em
reunião realizada no formato híbrido na noite desta terça-feira, 20, o Grupo de
Valorização Negra do Cariri (GRUNEC) promoveu sua Assembleia Geral visando
dentre outras pautas, eleger e empossar a nova diretoria.
Antes
da eleição, diversos integrantes fizeram um balanço da atuação do grupo nessas
mais de duas décadas, como Verônica Carvalho, Maria Raiane, Valéria Carvalho,
Zuleide Queiroz Adriano Almeida, Carlos, Givaldo, este editor e Lívia
Nascimento.
Todos
fizeram questão de lembrar "os
passos que vêm de longe desse grupo que vem fazendo história não só no Cariri e
Ceará, mas nacionalmente, com reconhecimento até internacional”,
principalmente em que pese "a força
motriz para mover e romper com estrutura racista".
Destacaram
também as dificuldades enfrentadas nesses últimos quatro anos. "Lutamos para viver", disseram.
Nova Diretoria
Apenas
uma chapa foi constituída e foi eleita sem ter questionamentos em contrário. A
advogada, educadora e mestre em Direitos Humanos, Lívia Nascimento foi eleita
presidente para o biênio 2023|2024. Completam a diretoria Janayna Leite
(vice-presidente), Carlos (1° Secretário), Maria Raiane (segunda Secretária),
Givaldo (3° Secretário), Valéria Carvalho (primeira tesoureira) e Lourdes
(segunda tesoureira).
Conselho Fiscal
O Conselho Fiscal será composto por Zuleide Queiroz, Adriano Almeida e Gauberto.
Grunec lança nota de repúdio às violações a lei de cotas no Ceará. (FOTO/ Reprodução). |
Por Valéria Rodrigues, Colunista
O Grupo de Valorização Negra do Cariri (GUNEC)
lançou nesta segunda-feira, 19 de dezembro, nota de repúdio as violações sistemáticas à lei de cotas por parte das instituições
públicas do estado do Ceará. Segundo o grupo, mesmo havendo legislações tanto a
nível nacional, como o Estatuto da Igualdade Racial de 2010 e, no âmbito
estadual, como a que preceitua a reserva de vagas nos cursos de graduação das
universidades estaduais e a que estabelece a reserva de vagas nos concursos
públicos de entidades públicas estaduais, de 2017 e 2021, respectivamente, foi
preciso recorrer de forma coletiva ao sistema de justiça para denunciar a
inobservância dessas normas.
A nota endereçada a governadora do Ceará, Izolda Cela (Sem partido)
e ao governador eleito Elmano de Freitas (PT), foi assinada por vários
movimentos.
Confira abaixo o documento:
À Excelentíssima Senhora Governadora do Estado do Ceará
Professora Isolda Cela
Ao Senhor
Elmano de Freitas
Governador Eleito do Estado do Ceará
Fortaleza/CE
REPÚDIO A VIOLAÇÃO
SISTEMÁTICA DA LEI DE COTAS PELO ESTADO DO CEARÁ
O Grupo de Valorização Negra do Cariri
(GRUNEC) vem a público manifestar repúdio as violações sistemáticas à lei de
cotas por parte das instituições públicas do estado do Ceará.
A efetividade das políticas de ações
afirmativas, que resultou da luta histórica dos movimentos negros pela
igualdade, impõe à Administração Pública a observância da sua concretude,
tratando os iguais de forma igual e os desiguais de forma desigual, na medida
da sua desigualdade.
Apesar da existência da Lei nº 12.288/2010,
que instituiu o Estatuto da Igualdade Racial no âmbito nacional, que preza por
políticas em prol da igualdade, no âmbito estadual, a Lei n.º 16.197, de 17 de
janeiro de 2017 estabelece a reserva de vagas nos cursos de graduação das
universidades estaduais e a Lei n° 17.432/2021, que estabelece a reserva de
vagas nos concursos públicos de entidades públicas estaduais, apenas entre 2021
e 2022, diversos processos coletivos foram instaurados perante o sistema de
justiça para denunciar a inobservância dessas normas.
A título de exemplo, cita-se:
1-
Procedimento nº
01.2022.00000958-4, em trâmite no Ministério Público do Estado do Ceará, em
face do Instituto de Desenvolvimento Educacional, Cultural e Assistência
Nacional (Idecan) e o Estado do Ceará para retificação do resultado dos
candidatos autodeclarados negros do concurso público da Polícia Civil do
Ceará (PCCE);
2-
o Procedimento
n° 09.2022.00027444-7, em trâmite no Ministério Público do Estado do Ceará, em
face da Secretaria de Segurança Pública do Estado do Ceará e Perícia Forense do
Estado do Ceará (PEFOCE) para retificação do resultado dos candidatos
autodeclarados negros do concurso público da PEFOCE;
3-
a Ação Civil
Pública n° 0201613-44.2022.8.06.0071 em face da Universidade Regional do Cariri
(URCA) para retificação do edital do concurso público de magistério superior,
visando aplicação do percentual correto de vagas reservadas ao cotistas sem o
método de fracionamento;
4-
Procedimento nº
01.2022.00000969-5, em trâmite no Ministério Público do Estado do Ceará, também em face da URCA para implantação da
comissão de heteroidentificação nas seleções dos vestibulares;
5-
o acordo
extrajudicial entre Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social do Ceará
(SSPDS-CE), a Polícia Militar do Ceará (PMCE), a Secretaria de Planejamento e
Gestão do Estado do Ceará (Seplag), a Defensoria Pública do Estado do Ceará
(DPCE) e Fundação Getúlio Vargas (FGV) para convocação de mais candidatos
cotistas aprovados no concurso para soldado da PMCE.
O GRUNEC denuncia à sociedade que há por
parte dos gestores do Governo e dos órgãos do estado do Ceará um descumprimento
sistemático da efetividade da política de cotas por meio de omissões e práticas
administrativas ilegais, que burlam o microssistema legal que rege a política
afirmativa com o fim de criar obstáculos ou relaxar dolosamente os mecanismos
de controle, diminuindo na prática o quantitativo de pessoas negras com acesso
às vagas definidas em editais para os cotistas.
Importa ressaltar que a Política Afirmativa
de Cotas no Brasil tem respaldo na Constituição Federal, nas leis federais,
estaduais e nas diversas convenções internacionais firmadas junto aos sistemas
globais e regionais, como:
A - Convenção Internacional sobre a
Eliminação de todas as Formas de Discriminação Racial - aprovada pela Resolução
2106 da Assembleia Geral das Nações Unidas, de 21 de dezembro de 1965;
B - Declaração de Durban – adotada em 31 de
agosto de 2001, em Durban (África do Sul), durante a III Conferência Mundial de
Combate ao Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância Correlata;
C - Convenção Interamericana Contra o Racismo
e a Discriminação Racial e Formas Conexas de Intolerância, ingressando no
ordenamento pátrio com status de Emenda Constitucional;
Há de se considerar que o período de
2015-2024 foi estabelecido como a Década Internacional dos Afrodescendentes
proposta pela Organização das Nações Unidas (ONU), cuja proposta é reconhecer a
desigualdade e a discriminação étnico-racial; promover a justiça através de
medidas especiais e desenvolver a comunidade afrodescendente assegurando a
adoção de políticas sociais.
As ações afirmativas são bandeiras históricas
dos movimentos negros brasileiros que reivindicam plena democracia nos espaços
de saber e poder. Na academia, é preciso que as universidades se comprometam
com a construção de uma agenda de enfrentamento ao racismo, o que inclui a
implementação das Leis 10.639/03 e 11.645/08 na estrutura curricular dos cursos
que ofertam e da política de cotas, com garantias de acesso e permanência.
No Ceará, as organizações dos movimentos
negros unem-se ao contexto nacional e, com isso, reivindicam a ampliação, o aperfeiçoamento
e o monitoramento das políticas de ações afirmativas nas instituições públicas do
Estado.
No Cariri cearense, o GRUNEC vem debatendo
essa questão desde a sua criação em 2001, com a realização de audiências
públicas e outras atividades onde essa pauta tem sido central, a entrega à URCA
da Carta de Princípios Institucionais para Políticas Afirmativas da Igualdade
Racial elaborada com a participação de outros coletivos negros como o Pretas
Simoa, as discussões geradas anualmente nos últimos 13 (treze) anos por ocasião
da realização do Artefatos da Cultura Negra que tem oferecido suporte formativo,
além dos encaminhamentos via carta aberta pelos Coletivos que formam esse
importante movimento de combate ao racismo e tem sido pauta das ações
protagonizada pelos movimentos estudantis.
Não obstante, os dados divulgados pelos
estudos do Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará (IPECE)
demonstram que mesmo sendo um dos estados brasileiros com maior número de
população negra (72%), considerando a soma de pretos e pardos, os marcadores
sociais de desigualdades raciais são significativos no que diz respeito ao grau
de escolaridade, taxas de encarceramento, renda e ocupação formal,
evidencializando a precarização histórica da vida da população negra.
É por isso que as medidas legais adotadas
para a reserva de vagas para pessoas negras pressupõem uma reparação histórica
de desigualdades e desvantagens acumuladas, de modo a aumentar a representação
negra nos espaços de poder, saber e de tomadas de decisões, refletindo no seu
acesso a direitos fundamentais com igualdade de oportunidades.
Nesse ínterim, a reserva de vagas para
pessoas negras se justifica em face dos severos obstáculos enfrentados para a
sua inserção nas mais diversas esferas da vida social, fazendo-se necessária,
portanto, a aplicação da igualdade material, a fim de possibilitar o adequado
combate à discriminação racial.
O GRUNEC informa que ante a ausência de uma
retificação nas condutas dos gestores dos órgãos, autarquias e fundações
estaduais para correção, reparo e restauro da máxima eficiência da Política de
Cotas no Estado do Ceará passará a requerer providências perante as instâncias
federais e órgãos internacionais para que esta unidade federativa seja
compelida a repelir as burlas e omissões que afastam o povo negro do acesso às
vagas que lhe são de direito.
Crato/CE, dezembro de 2022.
ASSINAM ESSA NOTA:
Ponto de Cultura Municipal Terreiro das Pretas
CONSELHO MUNICIPAL DE PROMOÇÃO DA
IGUALDADE RACIAL-COMPIR CRATO
Conselho Estadual de Defesa dos
Direitos Humanos (CEDDH) e Conselho Municipal de Direitos Humanos de Sobral
(CMDH-Sobral)
NEDESA (Núcleo de Estudos de
Descolonização do Saber)
Associação Quilombola do
Cumbe/Aracati - CE
Organização Popular - OPA
Teia dos Povos do Ceará
Núcleo de Estudos em Gênero
e Relações Étnico-Raciais (NEGRER)
Instituição Religiosa de matriz
africana. Candomblé Quilombaxé Kwe Sèjá Omi Yponda
MNU (Movimento Negro Unificado)
Rede de Mulheres negras do Ceará
Confederação dos trabalhadores do
serviço público municipal - Confetam/CUT
Conselho Municipal dos Direitos da
Mulher do Crato
Ouvidoria Geral Externa da
Defensoria Pública
Caritas Diocesana de Crato
Fórum Cearense de Mulheres-AMB
De Preto Plataforma de Criação e
Produção Artística
Espaço Arte Africana Campinas
NEPIR- Núcleo de Educação para
Promoção de Igualdade Racial (Juazeiro do Norte)
Neabi - IFCE Juazeiro do
Norte
Coletivo Camaradas
Ponto de Cultura Carrapato
Cultural
CAIC
CARLKISSDANCE- COMPANHIA DE DANÇA
NEGRA CONTEMPORANEA
Associação Abayomi Juristas
Negras
Associação Mensageiras da Paz
Comitê Quilombola
Fórum Permanente de Educação e
Diversidade Ético Racial do Ceará
Comitê impulsionador em defesa da
liberdade religiosa
NOSSO movimento pelo bem estar no
Brasil
NEEHDREM UFCA (Núcleo de Estudos
em Educação, História, Diversidades, Raça, Etnia e Movimentos Sociais)
Frente de Mulheres do Cariri
Instituto Feminista Casa Lilás
Íamis kariris
Trupe dos Pensantes - Artes
Coletivo Florestar