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Mãe de uma das professoras feridas deixa a escola após o crime – Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil. |
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Mãe de uma das professoras feridas deixa a escola após o crime – Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil. |
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Elisabete Tenreiro, 71. Professora morreu em ataque na E.E. Thomazia Montoro, na Vila Sônia. — Foto: Arquivo Pessoal. |
Elisabete Tenreiro, de 71 anos, professora da Escola Estadual Thomázia Montoro, morreu nesta segunda-feira (27) após ser esfaqueada por um aluno dentro da sala de aula. Outras três educadoras e um aluno ficaram feridos. Eles não correm risco de vida, de acordo com a secretaria de de educação de São Paulo.
De acordo com o relato de um dos alunos que se escondeu para escapar do ataque, há alguns dias, o agressor xingou outro aluno de “macaco”, o que ocasionou uma briga.
Ainda de acordo com o estudante, a professora que foi atacada pelo aluno foi a responsável por ter apartado a confusão e, após isso, aluno jurou vingança. A Polícia Civil apura essa versão.
Durante coletiva de imprensa, o secretário da Segurança Pública, Guilherme Derrite, disse que a diretora confirmou a versão do aluno e que conversou com o estudante agredido na sexta e que conversaria com o agressor nesta segunda.
Ainda de acordo com o relato de Gabriel, o aluno xingado de “macaco” não estava na escola nesta segunda-feira, somente a professora que foi atacada com golpes de faca.
“Foi assim: chamou o menino de preto e macaco. O outro menino (vítima de racismo) não gostou e partiu para cima dele. A professora “‘Beth’ separou. Aí hoje esse menino que chamou o outro de macaco veio com com uma faca e esfaqueou várias vezes a professora aqui e aqui. Ele já falou que iria fazer isso, mas ninguém acreditava. Ele estava atrás de mim tentando me matar. Na hora, eu corri e me escondi ali atrás e fiquei cerca de uns 40 ou 60 minutos esperando a polícia chegar”, contou Gabriel, aluno que estuda na mesma sala do autor adolescente, autor das agressões.
Violência dentro das escolas
Em setembro de 2019, um estudante de 14 anos esfaqueou um professor no Centro Educacional Unificado (CEU), em Aricanduva, zona leste de São Paulo.
Também em 2019, no dia 13 de março, dois ex-alunos invadiram e dispararam em direção a um grupo de alunos. A coordenadora pedagógica Marilena Ferreira Umezu foi uma das vítimas.
Uma pesquisa feita pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) contabilizou 23 registros de ataques com violência extrema em escolas no Brasil nos últimos 20 anos. Entre 2002 e 2023, 24 estudantes morreram, além de quatro professores e dois profissionais de educação, como a professora da escola estadual de São Paulo de 71 anos morta a facadas nesta segunda-feira (27) por um aluno.
O mapeamento ainda está em andamento e os dados são inéditos, obtidos em primeira mão pelo Estúdio i, da Globonews.
Para a pesquisadora Telma Vinha, da Faculdade de Educação e Coordenadora do Grupo “Ética, Diversidade e Democracia na Escola Pública” do Instituto de Estudos Avançados da Unicamp, os ataques podem ser evitados se houve um trabalho que acompanhe alunos e o comportamento deles não só na escola, mas também no seu dia a dia.
Ataques (2002 – 2023):
Escolas estaduais: 12
Escolas municipais: 7
Escolas particulares: 4
Vítimas fatais (2002 – 2023):
Estudantes: 24
Professores: 4
Profissionais de educação: 2
Motivação:
Vingança, raiva
Usuários de cultura extremista
Fonte: Instituto de Estudos Avançados da Unicamp.
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Com informações do G1 e Mídia Nígia.
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(FOTO/ Alan Santos/ PR). |
O
Instituto Socioambiental (ISA) lançou na última semana o livro Povos Indígenas
no Brasil 2017-2022. A publicação debruça sobre “o período mais cruel pós-ditadura para indígenas no Brasil”, de
acordo com o instituto. São relatos e dados sobre o contexto dos povos
originários no país no período após o golpe parlamentar contra a presidenta
Dilma Rousseff (PT), em 2016. Desde então, o cenário se agravou com a política
de extrema direita do ex-presidente Jair Bolsonaro.
A
13ª edição da publicação da ISA reúne mais de 100 artigos sobre o tema. Além
dos ataques diretos aos povos originários por, entre outros, garimpeiros
apoiados pelo ex-presidente, pesou no período o desmatamento recorde na
Floresta Amazônica. “A natureza está
falando há muito tempo. E nós, povos indígenas, também estamos falando há muito
tempo. Destruir a floresta leva às consequências que estamos vendo hoje”,
disse a liderança Txai Suruí, durante lançamento, na segunda-feira (21), em São
Paulo.
Logo
no início do livro, a jornalista Tainá Aragão e a antropóloga Fany Ricardo
descrevem o cenário. “Ao longo dos seis
últimos anos, quatro deles governados por Bolsonaro e dois sobrepostos a uma
crise pandêmica, os povos indígenas resistiram sistematicamente ao método
genocida aplicado por um governo anti-indígena. Ou seja, o aparelho do Estado
foi utilizado contra os territórios e os corpos originários em nome de uma ordem
e um progresso assassinos”.
O
trabalho está disponível para download gratuito no site do acervo do ISA.
Protagonismo e resistência de povos
indígenas
A
obra dá voz a lideranças indígenas de diferentes povos originários do Brasil. “Os anos que passaram foram muito
desafiadores para cada um de nós, principalmente para o Alto do Rio Negro”,
diz Francy Baniwa. “Para meu povo Baniwa,
território significa um lugar sagrado, porque o povo Baniwa se originou de um
lugar sagrado chamado ripana, que é o umbido do mundo”, define sobre a
ligação dessas culturas com a floresta.
O
desrespeito a essas populações está intrínseco à devastação da floresta. “Terra
é atemporal, espiritual, cultural e tradicional. A terra é tradicional dos
povos indígenas, a gente surgiu da terra e a gente está na terra, assim como a
terra está para nós. Há esse processo de cuidado com a terra, de defesa pela
terra. A terra é nossa mãe. A gente não bate na nossa mãe. Então a gente luta
defendendo essa nossa mãe”, resume João Victor Pankararu.
Adeus, Bruno
A
publicação também faz homenagem aos mortos, indígenas e ativistas desses povos
no Brasil, em defesa da floresta. Entre eles, o indigenista Bruno Pereira,
assassinado em junho de 2022 em razão de seu trabalho de preservação dos povos
e do território. Ele morreu ao lago do amigo, o jornalista inglês Dom Phillips,
do The Guardian. Agora, o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT)
tenta preservar seu legado.
“Enterramos Bruno, nosso irmão mais velho.
Hoje, a terra onde ele nasceu o recebe, seu corpo reencontra o barro, as raízes
das plantas, a água e o calor do solo. Seu corpo carrega o perfume salgado do
mar e o aroma denso da mata que ele defendeu até que os destruidores da
floresta o mataram de forma traiçoeira. Nossos olhos misturam lágrimas de
tristeza profunda e de revolta intensa”, afirma texto do Observatório dos
Direitos Humanos dos Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato (OPI).
“Bruno era grande e forte de corpo e de alma,
sua voz era firme para estar junto na defesa da terra e suave para encantar-se
com a beleza dos povos da floresta. Era incapaz de permanecer em silêncio
quando a avidez e a violência do Estado e dos predadores da mata arrancavam a
vida das Terras Indígenas. Ao mesmo tempo, ouvia calado a voz dos mais velhos
nas aldeias, e aprendia deles outras maneiras de resistir no mundo”,
completa.
Esperança
Pontuadas
as tragédias ambientais do governo Bolsonaro, a publicação destaca, em
contrapartida, a esperança em dias melhores. Em especial, pela participação
mais ativa de povos indígenas na política do Brasil. Desse modo, um dos
exemplos mais marcantes é a ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara.
“Sonia Guajajara, que já presidiu a Apib,
tomou posse como ministra dos Povos Indígenas. A Funai agora integra o novo
ministério e passa a ser chefiada por uma mulher indígena, a ex-deputada
federal Joenia Wapichana. O Ministério da Saúde também ganha representação
indígena pela primeira vez. A Secretaria de Saúde Indígena (Sesai) agora é
dirigida pelo advogado Weibe Tapeba. A participação cada vez mais marcante das
mulheres indígenas na luta pelos seus direitos e na construção de um Brasil
mais inclusivo é tema de destaque desta edição”, destaca o ISA.
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Com informações da RBA.
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Ailton Krenak em entrevista ao projeto Produção Cultural no Brasil. Foto tirada em 24/06/2010 pelo Garapa - Coletivo Multimídia. |
A Amazon Brasil disponibilizou para download gratuito o livro “O amanhã não está à venda”, do líder indígena, escritor e jornalista, Ailton Krenak (foto). A obra, publicada pela editora Companhia das Letras, foi elaborada em 2020, a partir de 3 entrevistas concedidas por Krenak aos jornais Estado de Minas, O Globo e Expresso, de Lisboa.
O autor concedeu as entrevistas após ter retornado ao território do povo Krenak, no vale do Rio Doce, para o isolamento social provocado pela pandemia do novo coronavírus. Nas breves nove páginas que compõem a narrativa principal do livro, Krenak destaca elementos da filosofia de seu povo que contribuem para a interpretação e enfrentamento dos desafios que assolam o Brasil durante a pandemia do novo coronavírus.
Segundo Krenak, os povos indígenas e outras populações minorizadas, no Brasil e no mundo, têm enfrentado o isolamento social há bastante tempo. O autor sugere que vale a lembrança permanente de que os seres humanos são natureza e que simplesmente esperar a volta da “normalidade” da época pré-pandemia, sem exercer uma reflexão atenta dos recados da natureza à humanidade, seria uma forma de colocar o amanhã à venda.
Em reflexões críticas, que localizam as responsabilidades de líderes políticos e de empregadores que menosprezaram a letalidade do vírus em preferência aos lucros, Krenak afirma que a natureza nos convida a silenciar. Para o autor, perceber que a natureza seguirá seu curso independente dos seres humanos, mas que o contrário não se confirma, é uma das chaves para repensarmos o presente e darmos início à construção de novos amanhãs, a começar hoje.
Para ter acesso à obra e realizar o download gratuitamente, basta possuir uma conta Kindle e clicar aqui, para o acessar o livro. Boa leitura!
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Com informações do Café História.
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(FOTO | Nelson Junior/STF). |
Se olharmos as instituições do executivo, legislativo e judiciário no Brasil, nós vamos ver, sem muito esforço, que os cargos de poder destas instituições tem como retrato, quase que na sua totalidade, um homem branco, de meia idade, de família com tradição ou dinheiro, talvez as duas coisas. Chega a ser escandaloso, num país com 56% de população negra, a completa ausência de negras e negros nos cargos de poder das instituições brasileiras.
A luta do movimento negro, os avanços das discussões, das conquistas, das pautas caras a população negra ainda não se refletiram numa maior diversidade na composição destas instituições.
A população negra precisa que as instituições brasileiras tenham um mínimo de letramento racial, sensibilidade e empatia para que a leitura das suas necessidades sejam feitas com cuidado. Para que isso aconteça, precisamos enegrecer estas instituições. A diversidade racial coloca olhares de sujeitos de formações diferenciadas e isto enriquece nossa realidade.
Em breve, o STF passará por uma renovação [devido à aposentadoria do ministro Ricardo Lewandowski] e é 8*agora a hora. Nós podemos ter uma mulher negra, trazendo novos elementos sociais para a suprema corte, o que daria provas de que estamos caminhando para novos tempos de verdade.
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Texto de Regina Lúcia dos Santos e Milton Barbosa, coordenadora estadual do MNU-SP e um dos fundadores e coordenador nacional de honra do MNU, respectivamente. Publicado originalmente no Alma Preta.
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Grêmio Estudantil da EEMTI Menezes Pimentel, de Potengi -CE. (FOTO | Prof. Nicolau Neto). |
A Secretaria da Educação (Seduc) disponibiliza a cartilha “Grêmio Estudantil: protagonismo e cidadania na escola”, com o objetivo de orientar os alunos da rede pública estadual de ensino acerca do funcionamento das entidades representativas de estudantes junto à gestão das escolas. O lançamento da publicação ocorre no período que antecede as eleições dos grêmios, que devem se realizar entre os dias 10 e 24 de abril próximo.
O documento servirá para nortear o procedimento dos jovens com relação a aspectos como legislação, organização de pleitos, plano de ação e material para inspirar novas iniciativas. Atualmente, a rede pública estadual do Ceará tem 522 grêmios estudantis ativos.
Acesse a cartilha
A Seduc, ao longo dos anos, promove ações de fortalecimento das agremiações escolares, procurando firmar parcerias com instituições que possam contribuir para o processo. Um dos parceiros é o Tribunal Regional Eleitoral (TRE-CE), que por meio de um Termo de Cooperação desenvolve o Projeto Eleitor do Futuro. A medida promove palestras e seminários nas unidades de ensino, como também cede urnas eletrônicas, desde 2018, para o processo eleitoral dos grêmios. Em 2023, 87 escolas da rede farão uso das urnas eletrônicas no processo eleitoral, após terem aderido à proposta.
Atribuições
O grêmio estudantil é uma entidade autônoma, criada e dirigida por estudantes de uma mesma escola, que exercem papel importante na implementação da gestão escolar democrática. É da competência do grêmio construir espaços de debate, contribuir para a melhoria da qualidade do ensino e da aprendizagem e zelar pela tomada de decisões coletivas, garantindo o exercício da cidadania.
Como representação dos estudantes dentro e fora da escola, o grêmio tem o papel de representar o corpo discente; defender os interesses individuais e coletivos dos alunos; incentivar a cultura literária, artística e desportiva; promover cooperação entre estudantes, gestão e comunidade escolar; entre outras funções.
A eleição do grêmio estudantil deve ser realizada por meio de voto direto e secreto do corpo discente. Quando a escola não tiver grêmio instituído, deve-se convocar assembleia geral para aprovar a fundação da entidade representativa.
As chapas candidatas poderão divulgar suas propostas durante o período de campanha previsto no edital; participar do debate expondo suas ideias para toda a comunidade discente; tornar pública a campanha nas redes sociais, em cartazes e grupos de Whatsapp.
Visando à consolidação das ações dos grêmios na rede, mediante a proposição de reflexões e o oferecimento de insumos, a Seduc realiza duas grandes ações anuais: os Fóruns Regionais e o Fórum Estadual dos Grêmios Estudantil. Este último contou com 2.500 participantes em 2022.
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Com informações da Seduc Ce.
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Professor Nicolau Neto durante "Colóquio 9 - Cosmopercepção dos Povos Originários", nesta quarta, 22 pelo Google Meet. |
A Secretaria da Educação (Seduc) deu início, nesta terça-feira (21), a mais uma edição do “Escola Espaço de Reflexão”, iniciativa criada em 2017 com o objetivo de mobilizar as unidades de ensino da rede estadual em torno do debate sobre a formação crítica e reflexiva dos estudantes. Nesta ocasião, o tema escolhido foi “o letramento racial e os desafios para uma escola antirracista”. O evento está sendo realizado de maneira virtual, por meio do canal no Youtube da Coordenadoria Estadual de Formação Docente e Educação a Distância (Coded/CED), e segue até esta quarta-feira (22).
A webinar de abertura contou com a participação da secretária da Educação, Eliana Estrela; da procuradora de Justiça Elizabeth Almeida, coordenadora do Centro de Apoio Operacional da Educação do Ministério Público do Estado (Caoeduc/MPCE); e da coordenadora executiva do Fórum Permanente de Educação e Diversidade Étnico-racial do Estado do Ceará, Glória Bernardino.
Eliana Estrela aponta que o Seminário é uma oportunidade para refletir sobre o processo de ensino e aprendizagem, levando em conta a realidade vivenciada nas unidades de ensino. A partir disso, segundo a gestora, pode-se criar estratégias com o intuito de fazer da escola uma instituição mais equânime e plural.
“Temos desafios e sabemos que precisamos avançar. Seguimos na defesa de uma educação de qualidade e, por isso, criamos a Secretaria Executiva da Equidade, Direitos Humanos, Educação Complementar e Protagonismo Estudantil. Queremos fortalecer a pauta da diversidade e do respeito mútuo. Já tínhamos uma caminhada nesta direção, com formações de professores, compartilhamento de boas práticas nas escolas e disponibilização de material didático. Mas, buscamos meios para estar mais próximos das temáticas que precisam de um olhar sensível”, enfatiza a secretária.
Consciência de todos
Elizabeth Almeida considera o seminário como de grande relevância, por propiciar debates sobre temas essenciais para o desenvolvimento da educação, reconhecendo o ambiente escolar como local de promoção da cidadania.
“O momento de hoje reflete os esforços para a realização de uma educação antirracista e de uma sociedade que consiga, efetivamente, promover o bem de todos, conforme previsto na nossa constituição federal. A luta pela superação do racismo é tarefa de todos e de qualquer educador, independentemente do seu pertencimento étnico-racial, crença religiosa ou posição política”, ressalta a procuradora.
Glória Bernardino defende a necessidade de que o currículo se aproxime da realidade dos estudantes. “Queremos construir uma educação que leve o estudante em conta como ele realmente é. A educação do Ceará é feita por negros, brancos, surdos, cegos, autistas, entre muitos outros. E todos nós queremos ter o prazer de nos ver na escola, de forma inclusiva, cultivando valores. É possível educar para a prática da liberdade. O racismo afeta a cada um de nós. A cor da pele, muitas vezes, ainda determina o nosso destino nesse país. Temos que acabar com esse processo. Racismo é opressão”, aponta.
Após a abertura, foi apresentada a conferência “20 anos da Lei 10.639: por uma educação antirracista e equânime”, ministrada pela pesquisadora Zuleide Fernandes, membro do Fórum Permanente de Educação das Relações Étnico-raciais do Ceará, que atua na área de educação, gênero, negritude e violência. O debate também contou com a exposição da professora Lorena Francisco de Souza, coordenadora do Núcleo de Estudos Africanos e Afrodiaspóricos na Universidade Estadual de Goiás (UEG). O diálogo foi mediado pelo secretário executivo da Equidade, Direitos Humanos, Educação Complementar e Protagonismo Estudantil da Seduc, Helder Nogueira.
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Com informações da Seduc Ce.
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Colocar essa estátua num dos principais locais da cidade de Juazeiro do Norte é um importante passo na reconstrução de nossa memória coletiva. - Foto: Lívio Pereira. |
Essa semana fui a Juazeiro do Norte para uma reunião de trabalho e ao passar pela praça Padre Cícero me deparo com três novas estátuas que compõe a paisagem sociocultural e geopolítica da cidade – Beata Maria de Araújo, Monsenhor Murilo e Padre Cícero. Não é que eu não soubesse delas, já havia visto nas redes de uma amiga e tinha lido algo a respeito no portal da prefeitura. Mas o encontro, a experiência estética de estar com as estátuas é única.
Primeiro elas fazem parte dessa linha de estátuas que estão no chão, logo podemos chegar perto, contorná-las, tocá-las, tomar várias perspectivas de algo que está ao nosso alcance. Diferente daquelas que ficam em cima de grandes torres de concreto, criando um distanciamento entre nós reles mortais e os imortalizados em bronze ou outro material em seus pedestais de poder, mesmo depois de mortos e transformados em terra.
Até onde sei, vale deixar aqui explicitado, essa é a primeira estátua em homenagem a Beata Maria de Araújo, que é a personagem principal do milagre em Juazeiro. Fora o Museu de Cera na Colina do Horto, claro. Até imagens em gesso, material clássico na produção santeira da cidade, são bem raras. Não gente, não foi Cícero quem fez o milagre, foi Maria, ele apenas estava no momento. Claro, para quem acredita que houve milagre. Não venho aqui defender fé nenhuma, mas tratar do que representa essa imagem ser colocada na principal praça da cidade, onde toda romeira e todo romeiro ou mesmo turistas não ligados a religião passam, assim como a população em geral.
Para mais elementos sobre a parte religiosa existem várias biografias do padre Cícero que tratam da história dele, do milagre e mesmo sobre Juazeiro, que sempre vem como cenário para Cícero e nunca como protagonista, mas sugiro fortemente a leitura do livro da historiadora Dia Nobre – O Teatro de Deus: as beatas do Padre Cícero e o espaço sagrado de Juazeiro, que foi um dos livros lançados no centenário da cidade.
Segundo, historicamente as estátuas colocadas em praças e outros espaços públicos, foram para homenagear os protagonistas da narrativa oficial, então vemos imperadores, marechais, duques, bispos, presidentes, militares… Logo, homens brancos cis e com poder econômico, que são os sujeitos políticos que dominam a história oficial, seja protagonizando seus marcos seja escrevendo sobre eles. Mulheres e pessoas negras, principalmente mulheres negras, são personagens muito raros nessa construção simbólica da memória em espaços públicos, assim como pessoas LGBTQIAPN+, sobretudo pessoas trans. Não esqueçam, as estátuas representam símbolos nacionais, logo, pessoas negras, mulheres, dissidentes de gênero e pobres não podem ser protagonistas de uma narrativa que segue sendo supremacista branca, cisheteropatriarcal e colonial capitalista.
Um elemento para se pensar sobre essas figuras é que a Beata uma mulher negra cis pobre analfabeta e leiga (pessoa religiosa que não é padre) não foi colocada sozinha ou com outras beatas da época, mas ladeada por dois homens brancos cis padres letrados e com posses. Por que ela não merece uma estátua em sua homenagem em que ela seja a protagonista de fato? Ao colocar o monsenhor Murilo e Cícero ao lado, este que além de uma estátua imensa no Horto tem estátuas em materiais diversos espalhados por toda cidade, inclusive tem outra bem antiga em bronze na mesma praça; reduz-se sua importância. Mas reitero que foi um marco importante para a cidade.
A Igreja Católica durante muito tempo agiu para o silenciamento do suposto milagre, mas ao não conseguir silenciar a história optou por embranquecê-la e institucionalizá-la ao transferir o protagonismo para Cícero. Na época, a Igreja censurou trechos de músicas do cancioneiro católico popular que faziam referência a Beata Maria de Araújo, recolheu escapulários e outros artigos religiosos que tinham sua foto, proibiu confecção de imagens. Se alguém dúvida basta ler a forma como os enviados de Roma para analisar o caso se referiam a Beata, está aí na rede para quem quiser ver. Eu prefiro não reproduzir nenhum trecho aqui, pois as palavras selecionadas por eles é de uma violência absurda. Vale lembrar ainda que os restos mortais de Maria de Araújo sumiram do local onde ela foi enterrada, o que é no mínimo estranho, e dizer que uma das formas de definir se uma pessoa é santa ou não para Igreja envolve a análise de seus restos mortais, então fica a pergunta – quem sumiu com os restos mortais da Beata Maria de Araújo?
Colocar essa estátua num dos principais locais da cidade de Juazeiro do Norte é um importante passo na reconstrução de nossa memória coletiva, na forma como entendemos que os fatos ocorreram, mas para isso cabe a nós cidadãos juazeirenses disputar a narrativa, pois a estátua por si só não afetará a forma como as pessoas leem a história. Precisamos nos apropriar do que foi que aconteceu de fato, entender os interesses por trás e assumir uma posição.
O Movimento pela Reabilitação da Memória da Beata Maria de Araújo propôs junto a Câmara Municipal uma Lei que torna obrigatório no âmbito do município a presença da foto da Beata Maria de Araújo, em moldura e dimensões idênticas as fotografias já existentes do Padre Cícero, projeto aprovado e sancionado em 2021. Outras propostas do Movimento são a escavação do Cemitério do Socorro no intuito de descobrir onde estão os restos mortais de Maria e a construção do Memorial Maria de Araújo.
Por fim, dizer que Ranilson Viana, escultor da obra, acertou na construção da imagem de Maria de Araújo, pois não embranqueceu ela, pelo contrário, me parece muito bem inspirado em como acreditamos que Maria se parecia. Digo como acreditamos que ela era, pois temos acesso a pouquíssimos registros dela. Se vocês jogarem em qualquer buscador de imagens na internet para testar verão o que estou falando.
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Artigo de Lívio Pereira, originalmente no Brasil de Fato CE.