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Encontro na URCA discute os 20 anos da Lei que obriga o ensino de história e cultura afro-brasileira

 

Túlio Pereira, Nicolau Neto e Maria Telvira. (FOTO | Montagem | Blog Negro Nicolau).

 

Projetos da Universidade Regional do Cariri (URCA) promovem encontro nesta segunda-feira, 27, com o tema "Consciência negra o ano inteiro". A ação vai falar sobre a Lei 10.639/03 que torna obrigatório o ensino de história e cultura afro-brasileira nas escolas. O evento começa às 14h, na URCA, Campus Crajubar, e propõe incentivar ações que efetivem o cumprimento da lei nas escolas do Cariri.

Petronilha Gonçalves: brasileiro ainda quer ser visto como herdeiro dos europeus

 

(FOTO | Reprodução | YouTube | UFPR TV).


Passados 20 anos desde que lei tornou obrigatório o ensino sobre história e cultura afro-brasileira, houve avanços, mas implementação ainda enfrenta entraves, avalia a Profa. Doutora, Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva.

Sancionada há 20 anos, a lei 10.639 estabelece a obrigatoriedade do ensino sobre história e cultura afro-brasileira nas escolas do país. Celebrada como forma de apresentar aos estudantes novos aspectos do passado do Brasil, a legislação ainda enfrenta entraves quanto à sua aplicação.

A avaliação é da professora Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva, doutora em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), pós-doutora em Ciências Humanas pela University Of South Africa (Unisa) e atualmente professora da Universidade Federal de São Carlos (Ufscar).

Petronilha foi relatora da comissão que regulamentou a lei, estabelecendo as Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana. De acordo com a professora, 20 anos após a lei ser sancionada, ainda falta um acompanhamento mais estruturado sobre esse ensino nos níveis federal, estadual e municipal.

Caberia ao Ministério da Educação, às secretárias de educação estadual e municipal estabelecer um programa sistemático de avaliação. Não há uma ação que cubra todo o país. [Falta dizer] ‘vamos agora avaliar o que está sendo feito no Brasil sobre a lei 10.639’, identificar o que as escolas têm feito na prática, os planos de ensino dos professores, o projeto político-pedagógico”, afirma.

Apesar dos avanços e da maior disseminação da cultura afro-brasileira nas escolas e na sociedade de maneira geral, Petronilha acredita que o sucesso da lei nos próximos anos depende de um projeto de país. “O brasileiro ainda tem o anseio de ser visto como se fosse herdeiro unicamente dos europeus. Nós avançamos, mas ainda há um longo caminho pela frente. E tudo vai depender do projeto de nação.”

Passados 20 anos desde que a lei 10.639 foi sancionada, o Brasil conhece bem a cultura afro-brasileira?

Essa é uma avaliação particular a partir do que tenho visto nos projetos com que tive contato desde que a lei foi implementada. Essa avaliação recai sobre o poder que o texto legal tem para influir em um processo de educação e de sociedade. E o que nós temos visto é que há uma construção conjunta para o estudo da história dos povos africanos, afro-brasileiros e da própria cultura do país. No meio disso tudo, há uma disputa sobre distintos tipos de sociedade. Há uma construção conjunta, mas que nem sempre é colaborativa. E há um grupo que ainda se baseia no Brasil do século 16, onde uma parcela da população devia ser tratada de maneira distinta a partir da sua origem étnica-racial. O brasileiro ainda tem o anseio de ser visto como se fosse herdeiro unicamente dos europeus. Nós avançamos, mas ainda há um longo caminho pela frente. E tudo vai depender do projeto de nação.

A lei tem cumprido o papel de aplacar o racismo no Brasil?

Digo que sim e não. Muitas pessoas não negras passam a se dar conta do tipo de sociedade em que vivem e das relações que elas mantêm, por exemplo, no ambiente de trabalho, no transporte público, no supermercado, no bairro e nas igrejas. As pessoas passam a identificar o lugar do outro na construção da nação, nesse caso, das populações africanas e indígenas. A lei, portanto, visa também atuar nesse microcosmo das relações individuais sociais, na organização de uma sociedade ampla e na compreensão de que, assim como pertencemos a uma família, a um determinado grupo étnico-racial, nós também estamos em contato com outros núcleos com outros tipos de humanidade. É um salto difícil de dar, mas não é por isso que nós vamos desistir.

Há como medir se a aplicação da lei de fato tem acontecido nas escolas?

No geral, as experiências [bem-sucedidas] que nós conhecemos estão relacionadas a pessoas engajadas, com projetos de sociedade em que todos sejam respeitados, negros e não negros. Mas são ações quase sempre individuais. Caberia ao Ministério da Educação, às secretárias de educação estadual e municipal estabelecer um programa sistemático de avaliação. Não há uma ação que cubra todo o país. [Falta dizer] ‘vamos agora avaliar o que está sendo feito no Brasil sobre a lei 10.639’, identificar o que as escolas têm feito na prática, os planos de ensino dos professores, o projeto político-pedagógico. Não apenas dizer se a lei está sendo implementada. Mas como está sendo implementada, o que precisamos fazer agora e aonde queremos chegar. Talvez nos falte ainda uma linguagem comum, inclusive com o Ministério da Educação, para fazer uma grande avaliação com os estados para definir novos e diferentes rumos para a aplicação da lei. A política educacional não pode ser de um professor ou de uma instituição.

Diante dessas dificuldades, como avançar?

Penso que as escolas e os professores precisam discutir um projeto de sociedade. Qual projeto nós queremos para o Brasil. Essa é uma discussão que acontece de maneira reservada em alguns ambientes, em iniciativas específicas, mas que precisa alcançar um outro nível de amplitude. Profundidade e frequência. A convivência na escola, entre alunos, professores e servidores nos indica para qual caminho enquanto país? Se não dialogarmos em busca de um caminho comum, que abarque nossa sociedade de maneira mais igualitária, não vamos avançar. E é importante dizer que isso não deve ser restrito apenas aos profissionais negros. Professores não negros têm a responsabilidade de levar para a sala de aula a temática da lei.

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Com informações do Instituto Búzios.

Educação antirracista é tema da edição de 2023 do Escola Espaço de Reflexão

 

Professor Nicolau Neto durante "Colóquio 9 - Cosmopercepção dos Povos Originários", nesta quarta, 22 pelo Google Meet.

A Secretaria da Educação (Seduc) deu início, nesta terça-feira (21), a mais uma edição do “Escola Espaço de Reflexão”, iniciativa criada em 2017 com o objetivo de mobilizar as unidades de ensino da rede estadual em torno do debate sobre a formação crítica e reflexiva dos estudantes. Nesta ocasião, o tema escolhido foi “o letramento racial e os desafios para uma escola antirracista”. O evento está sendo realizado de maneira virtual, por meio do canal no Youtube da Coordenadoria Estadual de Formação Docente e Educação a Distância (Coded/CED), e segue até esta quarta-feira (22).

A webinar de abertura contou com a participação da secretária da Educação, Eliana Estrela; da procuradora de Justiça Elizabeth Almeida, coordenadora do Centro de Apoio Operacional da Educação do Ministério Público do Estado (Caoeduc/MPCE); e da coordenadora executiva do Fórum Permanente de Educação e Diversidade Étnico-racial do Estado do Ceará, Glória Bernardino.

Eliana Estrela aponta que o Seminário é uma oportunidade para refletir sobre o processo de ensino e aprendizagem, levando em conta a realidade vivenciada nas unidades de ensino. A partir disso, segundo a gestora, pode-se criar estratégias com o intuito de fazer da escola uma instituição mais equânime e plural.

Temos desafios e sabemos que precisamos avançar. Seguimos na defesa de uma educação de qualidade e, por isso, criamos a Secretaria Executiva da Equidade, Direitos Humanos, Educação Complementar e Protagonismo Estudantil. Queremos fortalecer a pauta da diversidade e do respeito mútuo. Já tínhamos uma caminhada nesta direção, com formações de professores, compartilhamento de boas práticas nas escolas e disponibilização de material didático. Mas, buscamos meios para estar mais próximos das temáticas que precisam de um olhar sensível”, enfatiza a secretária.

Consciência de todos

Elizabeth Almeida considera o seminário como de grande relevância, por propiciar debates sobre temas essenciais para o desenvolvimento da educação, reconhecendo o ambiente escolar como local de promoção da cidadania.

O momento de hoje reflete os esforços para a realização de uma educação antirracista e de uma sociedade que consiga, efetivamente, promover o bem de todos, conforme previsto na nossa constituição federal. A luta pela superação do racismo é tarefa de todos e de qualquer educador, independentemente do seu pertencimento étnico-racial, crença religiosa ou posição política”, ressalta a procuradora.

Glória Bernardino defende a necessidade de que o currículo se aproxime da realidade dos estudantes. “Queremos construir uma educação que leve o estudante em conta como ele realmente é. A educação do Ceará é feita por negros, brancos, surdos, cegos, autistas, entre muitos outros. E todos nós queremos ter o prazer de nos ver na escola, de forma inclusiva, cultivando valores. É possível educar para a prática da liberdade. O racismo afeta a cada um de nós. A cor da pele, muitas vezes, ainda determina o nosso destino nesse país. Temos que acabar com esse processo. Racismo é opressão”, aponta.

Após a abertura, foi apresentada a conferência “20 anos da Lei 10.639: por uma educação antirracista e equânime”, ministrada pela pesquisadora Zuleide Fernandes, membro do Fórum Permanente de Educação das Relações Étnico-raciais do Ceará, que atua na área de educação, gênero, negritude e violência. O debate também contou com a exposição da professora Lorena Francisco de Souza, coordenadora do Núcleo de Estudos Africanos e Afrodiaspóricos na Universidade Estadual de Goiás (UEG). O diálogo foi mediado pelo secretário executivo da Equidade, Direitos Humanos, Educação Complementar e Protagonismo Estudantil da Seduc, Helder Nogueira.

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Com informações da Seduc Ce.

20 anos da Lei 10.639/03: Acervo digital que incentiva educação antirracista é lançado

 

20 anos da Lei 10.639/03. (FOTO/ Reprodução/ Porvir).

Em novembro de 1996, a Lei 9.394 entrou em vigor para estabelecer as diretrizes e bases da educação no Brasil. Composta por 92 artigos, o objetivo era estabelecer os princípios e finalidades da educação nas instituições de ensino. No entanto, a norma pouco abordava tópicos relacionados à questão etnico-racial no combate a uma aprendizagem antirracista nas escolas.

Assim, em 9 de janeiro de 2003, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) promulgou a Lei 10.639/03, que estabelece a obrigatoriedade de inclusão da história e cultura afro-brasileira no currículo das escolas brasileiras. Em seu aniversário de 20 anos, o regimento ganhou mais um reforço: um acervo digital com mais de 50 experiências positivas para a redução das desigualdades étnico-raciais em sala de aula.

Intitulado “Equidade Racial na Educação Básica: Pesquisas e Materiais”, os conteúdos reúnem diversos materiais como teses acadêmicas, artigos, livros, atividades lúdicas, jogos didáticos e outros formatos. Tudo fruto de um edital realizado em 2020 pelo Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades (CEERT), que procura garantir os direitos da população negra apoiando a luta antirracista.

O CEERT tem se dedicado à formação de pesquisadores/as negros/as na área da educação antirracista. Para isso, temos uma linha de ação que é o edital de pesquisas e artigos científicos sobre o cuidado racial na educação básica. Nesta primeira edição, selecionamos 15 projetos de pesquisas de profissionais da educação que ensinam na Educação Básica e Superior em todas as regiões do Brasil”, explica Graça Gonçalves, consultora da área de educação com equidade racial do CEERT.

Cada pesquisa selecionada pelo edital recebeu um financiamento para que fosse colocado em prática. Com isso, o resultado terminou virando livros, levantamentos, mapeamentos, manuais, aplicativos, jogos, brincadeiras que passam a compor, a partir deste ano, o acervo inédito lançado pela ONG. Segundo Graça, a ideia é que a plataforma seja não apenas um ambiente de aprendizagem, mas também um espaço de interação onde os profissionais da educação e toda a sociedade possam trocar vivências.

Ao acessar o acervo, o internauta tem contato com produtos das diferentes pesquisas realizadas. Jogos e brincadeiras para as crianças, feminismo negro, representatividade na literatura infantil e diversas pesquisas sobre como o racismo está enraizado nas salas de aula são alguns dos temas abordados. Além do CEERT, a iniciativa é do Itaú Social, realizada em parceria com a Fundação Tide Setubal, Instituto Unibanco e Unicef.

Professora da Universidade Regional do Cariri (URCA), Cícera é uma das pesquisadoras que teve seu projeto selecionado pelo edital. Intitulado “O Currículo e os Processos de Formação Docente no Campo das Relações Etnico-Racais na Educação Básica numa Perspectiva Inter e Transdisciplinar”, seu estudo tem como foco no processo de implementação do ensino da história e cultura africana e afro-brasileira no Ensino Fundamental 2 da educação básica. O trabalho também aborda a formação de professores.

Olhamos para as infâncias negras, potencializando a relação que esses adolescentes constroem com as africanidades que fazem parte da sua vida, da comunidade, de suas experiências vividas. [...] Estamos trabalhando a relação com a África e com as trajetórias das populações negras no contexto brasileiro a partir da relação com lugar, que começa a partir da minha história de vida”, detalha a pesquisadora.

Importância de uma educação antirracista

Além do edital que proporcionou aos estudos financiados um olhar mais atento à implantação do ensino da história e cultura afro-brasileira no currículo das escolas brasileiras, o CEERT também investe na formação continuada de professores, especialmente dos profissionais que atuam na aprendizagem de estudantes de 0 a 11 anos de idade.

A formação é desenvolvida através de propostas e metodologias pedagógicas que ajudem os professores a tratarem o assunto durante todo o ano letivo e não apenas em dias de datas comemorativas.

Temos um grande percentual de escolas que só investem no ensino da Lei em datas específicas, como, por exemplo, no mês de novembro [mês da Consciência Negra]. Temos que tornar isso um trabalho cotidiano e não pontual. A luta antirracista no ensino em que ser transversal, dentro de todos os campos do conhecimento que a escola trabalha. Gostaríamos que a lei 10.639/03 fosse menos efemérides. Só assim poderemos erradicar o racismo de todos os setores da vida brasileira”, analisa Graça Gonçalves.

Essa é uma realidade sentida pelo pesquisador e professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Alan Alves-Brito. Também coordenador do Núcleo de Estudos Africanos, Afro-brasileiros e Indígenas (NEABI), ele explica que muitos professores sentem dificuldade para pensar formas didáticas de abordar o ensino da história e cultura afro-brasileira, especialmente no que tange a educação escolar quilombola, seu objeto de estudo.

Para nós, professores universitários, um dos grandes desafios ainda é levar a Lei 10.639/03 para a formação inicial. Como é que a gente articula a formação de professores em todas as áreas do conhecimento, na Pedagogia, no direcionamento das Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Escolar Quilombola, de 2012, mas também a de 2004, que é a Educação para Relações Étnicos-Raciais?”, questiona o acadêmico.

A universidade é muito importante para desarticular o racismo institucional porque é a instituição que forma professores e outros profissionais. Se essas pessoas são formadas sem a perspectiva da lei 10.639, não teremos uma educação antirracista. Vamos ter médicos que não vão saber lidar com os corpos negros nos hospitais, por exemplo. Por isso, a importância das universidades de aplicar a lei. A formação continuada de professores que estão já trabalhando e não tiveram essa formação também é importante”, completa Alan Alves-Brito.

Ele também teve seu projeto selecionado pelo edital realizado pela CEERT. Os resultados que mais se destacaram no projeto proposto sobre a educação quilombola foram o Mapa dos Quilombos de Porto Alegre, um Curso de Formação de Professores na temática da ancestralidade e um artigo com críticas às mudanças no Ensino Médio estabelecidas pelo governo do Rio Grande do Sul.

O projeto que eu coordenei se chama Zumbi Dandara dos Palmares. Reuni diferentes pesquisadores porque sou astrofísico, mas convidei colegas historiadores, geógrafos, pedagogos para que o projeto ficasse mais amplo. Nos dividimos em vários grupos de trabalhos para olhar para o banco de dados e analisar pedagogicamente quais eram os planos políticos. Nosso objetivo é desestimular o racismo na estrutura, pensando sobretudo nas questões institucionais”, finaliza.

Anansi Observatório

Além da formação continuada de professores, do apoio aos projetos de pesquisas que serviram de base para o desenvolvimento do acervo digital, o CEERT também conta com o “Anansi Observatório da Equidade Racial na Educação Básica”. A iniciativa nada mais é do que um fruto colhido a partir dos resultados obtidos com as experiências e conclusões obtidas com os projetos desenvolvidos a partir do edital de 2020.

O Anansi Observatório é um ambiente virtual que se pretende monitorar a aplicação da lei nas escolas através de alguns eixos. Este é um projeto que ainda está em construção, mas a ideia é que ele seja o coração do CEERT através dessa biblioteca dinâmica, que vai criar um repositório gigantesco de todos esses materiais que já falamos”, pontua a consultora do CEERT.

Além disso, esse acervo também deve ser um espaço de interação com outros lugares e professores. Assim, teremos materiais de qualquer professor ou pesquisador que queira receber, deixar disponível ou divulgar seu material”, complementa Graça Gonçalves, fazendo menção também a outros eixos prioritários do Observatório, como o “advoga-se”, que acompanha e denuncia a aplicação da lei nas escolas.

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Com informações do Alma Preta.