No
dia em que completa duas semanas, a consulta pública sobre o projeto de lei que
institui o programa Escola sem Partido entre as diretrizes e bases da educação
ultrapassou nesta segunda-feira as 360 mil votações no portal e-Cidadania, do
Senado Federal. Até as 14h30, quase 368 mil pessoas haviam se manifestado
contrárias ou favoráveis à proposta – que defende a "neutralidade do
ensino" por meio da proibição de suposta "doutrinação
ideológica" nas escolas. Desse total, a maioria, com uma diferença de
cerca de 10 mil votos, era contrária ao projeto.
Publicado
originalmente no Uol
A
consulta bateu o recorde de votações na história do e-Cidadania -- a segunda
proposta com mais participação, 183.597 manifestações, é a do projeto que
propõe a reformulação da lei do Ato Médico.
A inspiração para o projeto de lei sobre o Escola sem Partido no Senado – a qual embasa outros quatro projetos do tipo, na Câmara dos Deputados, e além de sete Assembleias Legislativas e 12 Câmaras municipais – é a proposta idealizada em 2004 pelo advogado Miguel Nagib, procurador paulista.
No
Senado, o autor da matéria é o senador Magno Malta (PR-ES), que justifica ser
"fato notório que professores e
autores de materiais didáticos vêm se utilizando de suas aulas e de suas obras
para tentar obter a adesão dos estudantes à determinadas correntes políticas e
ideológicas para fazer com que eles adotem padrões de julgamento e de conduta
moral – especialmente moral sexual – incompatíveis com os que lhes são
ensinados por seus pais ou responsáveis."
Além
de opinar sobre o projeto, os participantes da consulta também podem enviar
comentários e sugestões de mudança de cada item previsto no texto, além de
acompanhar a tramitação dele na Casa. O relator é o senador Cristovam Buarque
(PPS-DF).
MPF diz que projeto sobre ESP é "inconstitucional"
No último dia 22, a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, do MPF (Ministério Público Federal), encaminhou ao Congresso Nacional uma nota técnica em que aponta a inconstitucionalidade do projeto de lei 867/2015, que inclui o programa Escola sem Partido entre as diretrizes e bases da educação nacional. O projeto de lei tramita na Câmara, com autoria do deputado Izalci Lucas (PSDB-DF), mas, segundo o MPF, a nota valerá também "para todas as proposições legislativas correlatas".
Na
nota técnica, a procuradora federal dos Direitos do Cidadão, Deborah Duprat,
afirma que o projeto "nasce marcado
pela inconstitucionalidade". A justificativa é que o artigo 205 da
Constituição Federal traz como objetivo primeiro da educação o pleno desenvolvimento
das pessoas e a sua capacitação para o exercício da cidadania. "Essa ordem de ideias não é fortuita.
Ela se insere na virada paradigmática produzida pela Constituição de 1988, de
que a atuação do Estado pauta-se por uma concepção plural da sociedade
nacional. Apenas uma relação de igualdade permite a autonomia individual, e
esta só é possível se se assegura a cada qual sustentar as suas muitas e
diferentes concepções do sentido e da finalidade da vida", escreveu a
procuradora.
Idealizador do ESP se diz
"surpreso" com reação contrária
Em
entrevista ao UOL, o procurador Miguel Nagib, idealizador do movimento Escola
sem Partido, afirmou ficar surpreso com os posicionamentos contrários à
iniciativa.
"Me pergunto: como alguém pode votar contra esse
projeto? Quem é contra, reivindica os direitos que o programa nega ao professor
– o de se aproveitar da presença obrigatória dos alunos em sala para promover
seus próprios direitos, opiniões, preferencias ideológicas ou políticas. Em
suma, o direito de fazer propaganda política dentro da sala de aula",
disse, para completar: "Quem faz
oposição são professores que não querem e não aceitam os limites colocados pelo
programa -- defendem, portanto, o direito de praticar essas condutas. Não há
outra posição lógica a essa visão. Mesmo discordando do programa, vejo que
alguns professores não querem que seus alunos fiquem sabendo que essas
obrigações existem – porque não querem que a sua autoridade seja confrontada."