22 de março de 2023

Educação antirracista é tema da edição de 2023 do Escola Espaço de Reflexão

 

Professor Nicolau Neto durante "Colóquio 9 - Cosmopercepção dos Povos Originários", nesta quarta, 22 pelo Google Meet.

A Secretaria da Educação (Seduc) deu início, nesta terça-feira (21), a mais uma edição do “Escola Espaço de Reflexão”, iniciativa criada em 2017 com o objetivo de mobilizar as unidades de ensino da rede estadual em torno do debate sobre a formação crítica e reflexiva dos estudantes. Nesta ocasião, o tema escolhido foi “o letramento racial e os desafios para uma escola antirracista”. O evento está sendo realizado de maneira virtual, por meio do canal no Youtube da Coordenadoria Estadual de Formação Docente e Educação a Distância (Coded/CED), e segue até esta quarta-feira (22).

A webinar de abertura contou com a participação da secretária da Educação, Eliana Estrela; da procuradora de Justiça Elizabeth Almeida, coordenadora do Centro de Apoio Operacional da Educação do Ministério Público do Estado (Caoeduc/MPCE); e da coordenadora executiva do Fórum Permanente de Educação e Diversidade Étnico-racial do Estado do Ceará, Glória Bernardino.

Eliana Estrela aponta que o Seminário é uma oportunidade para refletir sobre o processo de ensino e aprendizagem, levando em conta a realidade vivenciada nas unidades de ensino. A partir disso, segundo a gestora, pode-se criar estratégias com o intuito de fazer da escola uma instituição mais equânime e plural.

Temos desafios e sabemos que precisamos avançar. Seguimos na defesa de uma educação de qualidade e, por isso, criamos a Secretaria Executiva da Equidade, Direitos Humanos, Educação Complementar e Protagonismo Estudantil. Queremos fortalecer a pauta da diversidade e do respeito mútuo. Já tínhamos uma caminhada nesta direção, com formações de professores, compartilhamento de boas práticas nas escolas e disponibilização de material didático. Mas, buscamos meios para estar mais próximos das temáticas que precisam de um olhar sensível”, enfatiza a secretária.

Consciência de todos

Elizabeth Almeida considera o seminário como de grande relevância, por propiciar debates sobre temas essenciais para o desenvolvimento da educação, reconhecendo o ambiente escolar como local de promoção da cidadania.

O momento de hoje reflete os esforços para a realização de uma educação antirracista e de uma sociedade que consiga, efetivamente, promover o bem de todos, conforme previsto na nossa constituição federal. A luta pela superação do racismo é tarefa de todos e de qualquer educador, independentemente do seu pertencimento étnico-racial, crença religiosa ou posição política”, ressalta a procuradora.

Glória Bernardino defende a necessidade de que o currículo se aproxime da realidade dos estudantes. “Queremos construir uma educação que leve o estudante em conta como ele realmente é. A educação do Ceará é feita por negros, brancos, surdos, cegos, autistas, entre muitos outros. E todos nós queremos ter o prazer de nos ver na escola, de forma inclusiva, cultivando valores. É possível educar para a prática da liberdade. O racismo afeta a cada um de nós. A cor da pele, muitas vezes, ainda determina o nosso destino nesse país. Temos que acabar com esse processo. Racismo é opressão”, aponta.

Após a abertura, foi apresentada a conferência “20 anos da Lei 10.639: por uma educação antirracista e equânime”, ministrada pela pesquisadora Zuleide Fernandes, membro do Fórum Permanente de Educação das Relações Étnico-raciais do Ceará, que atua na área de educação, gênero, negritude e violência. O debate também contou com a exposição da professora Lorena Francisco de Souza, coordenadora do Núcleo de Estudos Africanos e Afrodiaspóricos na Universidade Estadual de Goiás (UEG). O diálogo foi mediado pelo secretário executivo da Equidade, Direitos Humanos, Educação Complementar e Protagonismo Estudantil da Seduc, Helder Nogueira.

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Com informações da Seduc Ce.

Beata Maria de Araújo ganha estátua em Juazeiro, reflexo da luta popular por reconhecimento

 

Colocar essa estátua num dos principais locais da cidade de Juazeiro do Norte é um importante passo na reconstrução de nossa memória coletiva. - Foto: Lívio Pereira.


Essa semana fui a Juazeiro do Norte para uma reunião de trabalho e ao passar pela praça Padre Cícero me deparo com três novas estátuas que compõe a paisagem sociocultural e geopolítica da cidade – Beata Maria de Araújo, Monsenhor Murilo e Padre Cícero. Não é que eu não soubesse delas, já havia visto nas redes de uma amiga e tinha lido algo a respeito no portal da prefeitura. Mas o encontro, a experiência estética de estar com as estátuas é única.

Primeiro elas fazem parte dessa linha de estátuas que estão no chão, logo podemos chegar perto, contorná-las, tocá-las, tomar várias perspectivas de algo que está ao nosso alcance. Diferente daquelas que ficam em cima de grandes torres de concreto, criando um distanciamento entre nós reles mortais e os imortalizados em bronze ou outro material em seus pedestais de poder, mesmo depois de mortos e transformados em terra.

Até onde sei, vale deixar aqui explicitado, essa é a primeira estátua em homenagem a Beata Maria de Araújo, que é a personagem principal do milagre em Juazeiro. Fora o Museu de Cera na Colina do Horto, claro. Até imagens em gesso, material clássico na produção santeira da cidade, são bem raras. Não gente, não foi Cícero quem fez o milagre, foi Maria, ele apenas estava no momento. Claro, para quem acredita que houve milagre. Não venho aqui defender fé nenhuma, mas tratar do que representa essa imagem ser colocada na principal praça da cidade, onde toda romeira e todo romeiro ou mesmo turistas não ligados a religião passam, assim como a população em geral.

Para mais elementos sobre a parte religiosa existem várias biografias do padre Cícero que tratam da história dele, do milagre e mesmo sobre Juazeiro, que sempre vem como cenário para Cícero e nunca como protagonista, mas sugiro fortemente a leitura do livro da historiadora Dia Nobre – O Teatro de Deus: as beatas do Padre Cícero e o espaço sagrado de Juazeiro, que foi um dos livros lançados no centenário da cidade.

Segundo, historicamente as estátuas colocadas em praças e outros espaços públicos, foram para homenagear os protagonistas da narrativa oficial, então vemos imperadores, marechais, duques, bispos, presidentes, militares… Logo, homens brancos cis e com poder econômico, que são os sujeitos políticos que dominam a história oficial, seja protagonizando seus marcos seja escrevendo sobre eles. Mulheres e pessoas negras, principalmente mulheres negras, são personagens muito raros nessa construção simbólica da memória em espaços públicos, assim como pessoas LGBTQIAPN+, sobretudo pessoas trans. Não esqueçam, as estátuas representam símbolos nacionais, logo, pessoas negras, mulheres, dissidentes de gênero e pobres não podem ser protagonistas de uma narrativa que segue sendo supremacista branca, cisheteropatriarcal e colonial capitalista.

Um elemento para se pensar sobre essas figuras é que a Beata uma mulher negra cis pobre analfabeta e leiga (pessoa religiosa que não é padre) não foi colocada sozinha ou com outras beatas da época, mas ladeada por dois homens brancos cis padres letrados e com posses. Por que ela não merece uma estátua em sua homenagem em que ela seja a protagonista de fato? Ao colocar o monsenhor Murilo e Cícero ao lado, este que além de uma estátua imensa no Horto tem estátuas em materiais diversos espalhados por toda cidade, inclusive tem outra bem antiga em bronze na mesma praça; reduz-se sua importância. Mas reitero que foi um marco importante para a cidade.

A Igreja Católica durante muito tempo agiu para o silenciamento do suposto milagre, mas ao não conseguir silenciar a história optou por embranquecê-la e institucionalizá-la ao transferir o protagonismo para Cícero. Na época, a Igreja censurou trechos de músicas do cancioneiro católico popular que faziam referência a Beata Maria de Araújo, recolheu escapulários e outros artigos religiosos que tinham sua foto, proibiu confecção de imagens. Se alguém dúvida basta ler a forma como os enviados de Roma para analisar o caso se referiam a Beata, está aí na rede para quem quiser ver. Eu prefiro não reproduzir nenhum trecho aqui, pois as palavras selecionadas por eles é de uma violência absurda. Vale lembrar ainda que os restos mortais de Maria de Araújo sumiram do local onde ela foi enterrada, o que é no mínimo estranho, e dizer que uma das formas de definir se uma pessoa é santa ou não para Igreja envolve a análise de seus restos mortais, então fica a pergunta – quem sumiu com os restos mortais da Beata Maria de Araújo?

Colocar essa estátua num dos principais locais da cidade de Juazeiro do Norte é um importante passo na reconstrução de nossa memória coletiva, na forma como entendemos que os fatos ocorreram, mas para isso cabe a nós cidadãos juazeirenses disputar a narrativa, pois a estátua por si só não afetará a forma como as pessoas leem a história. Precisamos nos apropriar do que foi que aconteceu de fato, entender os interesses por trás e assumir uma posição.

O Movimento pela Reabilitação da Memória da Beata Maria de Araújo propôs junto a Câmara Municipal uma Lei que torna obrigatório no âmbito do município a presença da foto da Beata Maria de Araújo, em moldura e dimensões idênticas as fotografias já existentes do Padre Cícero, projeto aprovado e sancionado em 2021. Outras propostas do Movimento são a escavação do Cemitério do Socorro no intuito de descobrir onde estão os restos mortais de Maria e a construção do Memorial Maria de Araújo.

Por fim, dizer que Ranilson Viana, escultor da obra, acertou na construção da imagem de Maria de Araújo, pois não embranqueceu ela, pelo contrário, me parece muito bem inspirado em como acreditamos que Maria se parecia. Digo como acreditamos que ela era, pois temos acesso a pouquíssimos registros dela. Se vocês jogarem em qualquer buscador de imagens na internet para testar verão o que estou falando.

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Artigo de Lívio Pereira, originalmente no Brasil de Fato CE.

"O mundo dos afrodescendentes se sentiu sozinho sem o Brasil", diz Epsy Barr

 

FOTO | Victor Correia/CB/D.A Press).

A presidente do Fórum Permanente dos Afrodescendentes da Organização das Nações Unidas (ONU), Epsy Campbell Barr, declarou nesta quarta-feira (22/3) que a saída do Brasil da posição de liderança que ocupava no debate internacional sobre o tema foi sentida. Segundo ela, o atual governo brasileiro representa uma oportunidade para recolocar o Brasil no centro da discussão racial.

"O mundo dos afrodescendentes se sentiu muito sozinho com a saída do Brasil da liderança que tinha por muitos anos", disse Epsy em discurso no evento "Mecanismos sobre Raça no Sistema Universal de Direitos Humanos: Estratégias e Próximos Passos no Brasil", organizado pelo Instituto Internacional sobre Raça, Igualdade e Direitos Humanos, em Brasília.

"Há uma decisão do governo brasileiro, do presidente e dos seus ministros, de convidar o Fórum Permanente para fazer uma atividade importante no final deste ano, unindo diversos atores. Essa é uma grande oportunidade para colocar o Brasil no centro do debate da questão racial a nível internacional", enfatizou ainda Epsy.

"Precisamos de reparações reais"

O convite foi feito ontem pela presidente do Fórum ao ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, Silvio Almeida, durante reunião na sede da pasta. Ao Correio, Epsy declarou que o evento deve ocorrer em novembro.

"Espero que possamos avançar com o Brasil no projeto da segunda década [dos Afrodescendentes, da ONU]", afirmou a presidente do Fórum. O período foi estabelecido pelas Nações Unidas em 2015 e se encerra em 31 de dezembro de 2024.

Para Epsy, que foi a primeira mulher negra a ocupar a vice-presidência da Costa Ricao, o debate sobre os direitos das pessoas negras já ocorre há tempos em muitos países, mas a organização internacional pelo tema é recente. "Precisamos de reparações reais. Porque com o racismo, como nos lembrava o ex-chanceler Celso Amorim, não há democracia. Não há. Não é que é mais ou menos, não há. Porque está sempre excluindo e negando direitos a uma parte da população", frisou.

O evento também conta com a participação da ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, da secretária de Articulação dos Povos Indígenas, e é organizado também pelas ONG Criola, Geledés - Instituto da Mulher Negra, Selo Juristas Negras, Grupo Conexão G de Cidadania LGBT de Favelas, Renafro Saúde e Ilê Omolu e Oxum, Instituto Iepé e Hutukara Associação Yanomami.

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Com informações do Correio Braziliense.

Crato investe menos de 1% na Cultura nos últimos sete anos

 

(FOTO | Coletivo Camaradas).


A Prefeitura do Crato investiu menos de 1% no setor cultural nos últimos sete anos. Em 2022, o município destinou apenas 0,67% do orçamento para o setor cultural. Agentes culturais, artistas, produtores e mais membros do movimento cultural da cidade reivindicam que seja investido 2%. Atualmente existe uma articulação entre os Pontos de Cultura da cidade para que este percentual seja garantido por lei, como já é previsto em outras áreas, a exemplo da saúde e da educação.

De acordo com informações da Secretaria de Finanças do Município, a maior parte dos gastos é destinada para pagamento de pessoal. Do percentual de 0,67% investidos em 2022, a folha de pagamento e os encargos sociais chegam a quase 85%, ficando menos de 16% para todas as demais despesas, incluindo os recursos para fomento artístico e cultural.

Regiopidio Lacerda, membro do Ponto de Cultura da Academia de Cordelistas do Crato, frisa que a luta é importante “para a sociedade estar na possibilidade, a partir dela, de garantir que os equipamentos de cultura do município se transformem, de fato, em elementos de transformação social através das mais diversas ações culturais e das mais diversas manifestações de cultura do povo cratense”. Além disso, ele afirma que a garantia dos 2% do orçamento para cultura é garantir “através da manutenção aos equipamentos e do fomento cultural, o acesso da população ao mundo das artes e dos saberes mais profundos que podem ser usados como instrumentos de luta, de conhecimento e de libertação social”.

Outro Ponto de Cultura que fala sobre a importância da pauta para a sociedade em geral é a ONG Beatos. Davi Oliveira, presidente do Ponto de Cultura, traz em sua fala o benefício dos 2% para todos, trazendo a discussão de forma democrática e com finalidade abrangente: “quando nós como coletivos implicados com o fomento dessas tradições e preservação da memória identitária local reivindicamos uma distribuição adequada do orçamento para a Cultura, não estamos lutando para a realização de atividades em nossos Pontos de Cultura para benefício próprio, mas sim, para beneficiar a arte local, o fazer patrimonial de nossa cidade, difundir e preservar nossa memória identitária e oportunizar que o fazer artístico afete o cotidiano das pessoas, sensibilizando a população e realizando intervenções cotidianas que preservem o que de fato somos quanto Cultura cratense”.

Esta questão deverá ser discutida na III Conferência Municipal de Cultura do Crato, que tem como tema ‘Uma Política Pública para o Crato: Implementação do Plano Municipal de Cultura’ que acontecerá neste final de semana, nos dias 24 e 25, na Universidade Regional do Cariri- URCA. A conferência visa elaborar o Plano Municipal de Cultura que deverá nortear as políticas públicas para o setor para os próximos anos.

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Texto encaminhado a redação do blog por Paulo Rossi, Bolsista de comunicação do Coletivo Camaradas.

21 de março de 2023

Hoje na História | Dia Internacional Contra a Discriminação Racial

 

Por Nicolau Neto, editor

A data foi proposta pela Organização das Nações Unidas (ONU) e foi motivado em face do “Massacre de Shaperville”, ocorrido em 21 de março de 1960.

É importante lembrar que neste dia mais de 20 mil pessoas foram às ruas de Joanesburgo, na África do Sul, protestar contra a "Lei do Passe". Por esta lei, negros e negras eram obrigados a andarem com identificação que limitavam os locais por onde deveriam ir dentro da cidade. O regime do Apartheid do período fez com que militares atacassem os manifestantes. O ato resultou em 69 pessoas mortas e cerca de outras 100 ficaram feridas.

Desta forma, em em memória dessas pessoas, a ONU instituiu o dia 21 de março como o Dia Internacional contra a Discriminação Racial.

19 de março de 2023

Ana Flávia Magalhães é empossada como diretora do Arquivo Nacional

 

(FOTO | Natália Carneiro).


A historiadora Ana Flávia Magalhães Pinto foi empossada como diretora geral do AN (Arquivo Nacional), nesta sexta-feira (18). A cerimônia, que ocorreu no Palácio da Fazenda, no Rio de Janeiro, contou com a presença da ministra da Igualdade Racial Anielle Franco e representantes de movimentos sociais.

Essa é a primeira vez que uma mulher negra assume o cargo de direção do órgão em 185 anos. Um passo importante para a gestão de documentos e democratização no acesso ao conhecimento.

Em discurso, Ana Flávia destacou que ao receber o convite da ministra Esther Dweck para o cargo se sentiu preparada para seguir neste espaço, dando continuidade ao exercício de cidadania, antirracismo e contribuindo para fortalecer o Arquivo Nacional. A diretora também destacou que terá historiadores, arquivistas e usuários como prioridade de sua gestão.

Sueli Carneiro, diretora executiva de Geledés-Instituto da Mulher Negra, enfatizou em seu discurso que a trajetória de Ana Flávia “será fundamental para que a gestão documental do Arquivo Nacional seja valorizada e ampliada, sem abrir mão da responsabilidade da instituição nesta fase de investimento público na memória como fundamento da reconstrução do País”.

A presença da historiadora no Arquivo Nacional também abre a perspectiva de se “testemunhar a preservação e amplificação da história brasileira democrática, aberta, plural e ativa no enfrentamento ao racismo, às desigualdades de gênero, à colonialidade e ao epistemicídio.”, segundo Sueli.

Sobre Ana Flávia Magalhães Pinto

Doutora em História pela Unicamp (Universidade de Campinas), mestre na mesma área pela UnB (Universidade de Brasília) e bacharel em Jornalismo pelo UniCEUB (Centro Universitário de Brasília), Ana Flávia Magalhães Pinto foi a primeira docente negra do Departamento de História da UnB. Atuou como coordenadora da Regional Centro-Oeste do Grupo de Trabalho de Emancipações e Pós-Abolição, da Associação Nacional de História, integra a Rede de Historiadoras Negras e Historiadores Negros (RHN) e a Coalizão Negra por Direitos.

Leia a íntegra do discurso de Ana Flávia

Boa noite a todas, todes e todos!

Venham preparados ou não venham de jeito nenhum”.

Há quase dez anos, num discurso em que defendia formas inovadoras e efetivas de enfretamento às desigualdades no Brasil, Luiza Bairros, então ministra da Seppir, mobilizou essa passagem da obra da escritora afro-estadunidense Toni Morrison para provocar a ação do governo e da sociedade brasileira.

Na ocasião, a despeito da comoção de boa parte da audiência, que prontamente começou a bradar “Estamos preparados!”, as reações diante de uma frase tão categórica foram diversas. Houve quem não visse sentido algum no que fora dito. Teve também gente assustada. Afinal, o que fariam as pessoas que tinham a vontade de agir, mas se sentiam inseguras para dar conta da missão? Teve ainda gente que fez daquelas palavras oportunidade para elaborar silenciosamente uma avalição sobre si e se dar conta do que poderia significar estar preparada para o desafio que estava posto. E de fato seguir agindo.

Enquanto vivia a organização desta cerimônia, em meio a uma infinidade de demandas e contratempos da nova rotina, a movimentação das pessoas comprometidas em fazer isso aqui acontecer me levava frequentemente a lembrar daquela frase dita por Luiza uma década atrás.

O Brasil de 2023, para quem se manteve na luta por justiça e dignidade, parece estampar no ar: “Venham preparados ou não venham de jeito nenhum”. Na verdade, estando nós mais conscientes do que sempre esteve em disputa, é Tempo até mesmo de ajustar a frase: “Venham preparadas, preparades e preparados ou não venham de jeito nenhum!”.

Quando recebi o convite da ministra Esther Dweck para assumir a Direção-Geral do Arquivo Nacional, eu me sentia absolutamente preparada para seguir nas lutas por um Brasil para todas, todes e todos a partir dos espaços de exercício de cidadania em que já estava. Estar no departamento de história da Universidade de Brasília não mais como a única professora negra, graças à chegada da malunga Mariléa de Almeida, aumentava a gana para seguir na defesa da educação pública, gratuita e de qualidade a serviço do povo brasileiro.

Ao mesmo tempo, a criação de novas e potentes possibilidades de exercer o ativismo antirracista e antissexista a partir das fileiras da Rede de Historiadoras Negras e Historiadores Negros e da Coalizão Negra por Direitos, mesmo num cenário tão adverso, me fazia querer ousar mais. Afinal, nunca antes na história deste país, historiadoras negras e negros alcançaram tantos espaços e da maneira como temos feito.

Numa conversa com Sueli Carneiro nos primeiros dias do ano, falávamos da legitimidade e da importância desses lugares de construção política.

Era certo que, tal como fizemos com Luiza, estaríamos prontas para fortalecer a ação daquelas e daqueles que, estando no novo governo, assumiam o desafio de combater o racismo, o sexismo, a LGBTfobia, a destruição ambiental neste país, entre outras barreiras. Mas, no meu caso, não poderia me afastar dos combates pela História. Foi para isso que fui formada acadêmica e politicamente. Sendo assim, pouca coisa poderia fazer mudar o que já estava planejado.

Atuar no Arquivo Nacional, portanto, era uma das reduzidíssimas possibilidades que poderiam me fazer cogitar mudar de rota e atuar diretamente no governo. Quando o convite chegou, na noite em que saía da formatura de historiadoras e historiadores da UnB pela quinta vez em cinco anos, eu não consegui dizer não de pronto.

Confesso que procurei apoios para recusar, mas não obtive. Em vez disso, ouvi de diferentes pessoas que me são referências, mulheres e homens negros, indígenas, cis e transgênero, com diferentes orientações sexuais e origem regional, pessoas brancas com compromisso antirracista também. O que ouvi foi: Esse é um espaço que nos é estratégico e criamos condições para que a nossa chegada nele pudesse acontecer. Estaremos contigo como sempre foi.

O aceite ao convite demandou ainda um exercício de avalição do cenário considerando outras dimensões e questões sensíveis. Disse sim sabendo que teria desafios maiores do que aqueles que eram percebidos da porta para fora. Mas, de fato, tanto individual quanto coletivamente, estivemos nos preparando para não recuar neste momento.

E é assim que “Estamos chegando do chão da oficina, estamos chegando do som e das formas, da arte negada que somos, viemos criar”. Criar e fortalecer meios para evidenciar que o Arquivo Nacional é uma instituição viva por força da ação de servidoras e servidores, usuárias e usuários, que serão prioridade desta gestão.

Assumimos o compromisso de trabalhar muito para que a realização da missão institucional do Arquivo Nacional seja compreendida como imprescindível para a preservação de um valiosíssimo patrimônio nacional, a nossa memória, singular, mas mobilizada no plural. Estaremos a serviço da promoção da cidadania e direitos humanos neste país.

A propósito, aproveito a oportunidade para dizer que, além do fundamental corpo de servidoras e servidores já atuantes no Arquivo Nacional, passaremos a contar com:

Leandro Bulhões: Chefe de Gabinete. Doutor em História, professor da Universidade Federal do Ceará, integrante da Rede de Historiadoras Negras e Historiadores Negros.

Mônica Lima: Coordenadora Geral de Articulação de Projetos e Internacionalização. Doutora em História e professora de História da África da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Jader Moraes: Coordenador Geral de Comunicação. Mestre em Comunicação e jornalista com experiência em comunicação corporativa, institucional e popular.

Eric Brasil: Diretor de Processamento Técnico, Preservação e Acesso ao Acervo. Doutor em História e professor na Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-brasileira.

Gecilda Esteves: Diretora de Gestão Interna. Servidora do TCE Rio de Janeiro, Mestra em Administração Pública (FGV-RJ), Mestra em Ciências Contábeis (UFRJ), Especialista em Controle Externo, com ênfase em Auditoria Governamental (FGV-RJ).

Maria Aparecida Moura: Diretora de Gestão de Documentos e Arquivos. Professora Titular da Escola de Ciência da Informação da Universidade Federal de Minas Gerais.

Fábio Costa de Souza: Assessor de Articulação Institucional. Analista Técnico de Políticas Sociais. Psicólogo de formação, Mestre em Assuntos Avançados em Seguridade Social e MBA em Gestão Estratégica da Administração Pública.

Diana Santos Souza: Coordenadora de Processamento Técnico e Preservação. Mestra em História, Técnica em Digitalização e Documentação, integra a Rede de Historiadoras Negras e Historiadores Negros e o Wiki Movimento Brasil.

Carlos Augusto da Silva Junior: Coordenação de Apoio Técnico Administrativo. Bacharel em Ciências da Computação, Especialista em Gestão de Processos Universitários e Servidor Técnico-administrativo da Universidade Federal da Bahia.

Finalizo agradecendo a Ministra Esther Dweck pelo convite, todos e todas as companheiras de Ministério com quem tenho aprendido muito e todas as pessoas presentes hoje e nos próximos momentos desta jornada. Em especial agradeço às minhas famílias, nas pessoas de minha mãe Sara Ramos Magalhães Pinto e de Equede Sinha.

Muito obrigada mesmo! Tendo sobrevivido a tempos difíceis, estejamos preparadas para criar tempos de esperança e felicidade!

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Com informações do Geledés.

18 de março de 2023

Instagram, Geledés, Africanize e Capricho lançam projeto para incentivar a literatura negra entre os jovens

 

(FOTO | Reprodução).


Nesta quinta-feira (16), o Instagram, em parceria com Geledés Instituto da Mulher Negra, Africanize e Capricho, lança o projeto “ReeLeitura: edição autores negros”, uma iniciativa de nove meses que tem o objetivo de debater os temas centrais de obras literárias de autores negros brasileiros por meio de um formato simples e divertido como os Reels do Instagram e do Facebook, com a ideia de que elas alcancem mais pessoas e promovam o interesse de leitura principalmente entre os adolescentes.

Os conteúdos serão publicados nos perfis da @africanizeoficial, @capricho e @portalgeledes no Instagram e Facebook, com a hashtag #ReeLeitura. O primeiro episódio, que estreia hoje em celebração ao mês em que se comemora o “Dia Mundial de Zero Discriminação – 1º de março” e o “Dia Internacional da Luta pela Eliminação da Discriminação Racial – 21 de março”, traz a obra “Sobre-viventes”, da autora Cidinha da Silva (@cidinhadasilvaescritora), comentada pelo professor João Luiz Pedrosa (@joaolpedrosa) e pelo criador de conteúdo Adriel Oliveira (@livrosdodrii).

Mensalmente, até novembro, um novo episódio trará um autor negro e sua obra, uma figura pública e um criador de conteúdo da comunidade negra do Instagram para expor seus pontos de vista sobre o assunto principal do livro em destaque. Além disso, vamos iniciar um movimento a partir de um áudio original inspirador com trecho da obra na voz da figura pública, no formato de mini doc, que é tendência no Instagram. A ideia é que tanto criadores de conteúdo quanto o público participem do movimento usando a ferramenta Modelos e a hashtag #ReeLeitura.

A presença da comunidade literária no Instagram é muito forte e, com o ReeLeitura, queremos nos aproximar ainda mais dela, promovendo conexões por meio da cultura, ao mesmo tempo em que tratamos de temas fundamentais para a formação de nossos jovens e para a sociedade, como racismo, empoderamento negro, inclusão e manifestações afro-brasileiras”, afirma Priscila Pagliuso, gerente de comunicação do Instagram para a América Latina.

Para deixar tudo ainda mais divertido e interativo, e unindo representatividade e inovação, o público também poderá interagir com o efeito de realidade aumentada (AR) “ReeLeitura” que estará disponível por meio do perfil da Capricho no Instagram, desenvolvido exclusivamente para a iniciativa pela Atomcore Studio, que faz parte do programa Realidade Aumentada na Pele (R.A.P), da Meta, oferecendo ao público formas inovadoras de interação com a literatura.

O efeito “ReeLeitura” vai sugerir ao público uma variedade de opções de livros de autores negros, fomentando o acesso à literatura. Algumas das obras são: “Ritmos Negros: Música, Arte e Cultura na Diáspora Negra”, de Amailton Azevedo (@amailtonazevedo); “Mukanda Tiodora”, de Marcelo D’Salete (@marcelo.dsalete); e “Jamais Peço Desculpas por me Derramar”, de Ryane Leão (@ondejazzmeucoracao).

Em breve, a Capricho disponibilizará ainda um chatbot exclusivo no WhatsApp, criado pela plataforma Gupshup, que vai recomendar uma seleção de livros curada especialmente de acordo com os resultados de um rápido teste para descobrir o perfil de leitor de cada pessoa.

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Com informações do Geledés.

Governo federal prepara medidas para combater a desigualdade racial

 

(FOTO | Marcelo Camargo / Agência Brasil).


A ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, adiantou nesta quinta-feira (16) que o governo anunciará novas medidas de combate à desigualdade racial no próximo dia 21 de março, quando a criação da Secretaria de Políticas de Promoção para a Igualdade Racial (Seppir) completará 20 anos. A secretaria foi criada no primeiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula Silva, em 2003, após demanda histórica do movimento negro.

Anielle Franco ministrou aula inaugural do semestre letivo na Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca (ENSP/Fiocruz), na tarde desta quinta-feira, no campus da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), em Manguinhos, na zona norte do Rio de Janeiro.

Segundo a ministra, no próximo dia 21 haverá uma comemoração no Palácio do Planalto em que serão anunciadas medidas para aumentar a presença de mulheres negras no serviço público federal; será instituída uma coordenação de saúde da população negra junto ao Ministério da Saúde e também serão tituladas seis terras de povos quilombolas que aguardam a regularização há mais de 20 anos.

É um processo muito longo a titulação das terras quilombolas. É um processo que vai e volta, e as famílias estão se perdendo. A ancestralidade está lá, mas as terras estão indo embora. A memória dessas mulheres negras e desse povo está indo embora, porque não titula”, disse a ministra.

Além de titulações e indenizações, a ministra prometeu ações de educação e cultura ainda junto a comunidades quilombolas nos primeiros 100 dias do governo, e lembrou que esse é um pedido do presidente Lula.

O ministério também anunciará, em parceria com as pastas do Esporte e da Justiça, a criação de um Grupo de Trabalho de Combate ao Racismo nos Esportes. “É inadmissível o que o Vini Jr. está passando na Espanha, mas o que todo mundo passa aqui também, e a gente sabe como é”.

Marielle

Em discurso a alunos, professores e servidores da ENSP/Fiocruz, a ministra Anielle Franco relembrou os primeiros momentos após o assassinato de sua irmã, a vereadora Marielle Franco, que completou 5 anos na terça-feira (14).

A gente não pode esquecer que a Mari foi vítima de um feminicídio político”, disse a ministra. “Eu jamais vou perdoar. Nunca vou perdoar terem olhado para aquela mulher discursando e não terem nunca pensado em ter uma segurança pra ela. Nunca na minha vida eu vou aceitar isso”.

Anielle Franco afirmou que somente após um crime cruel como esse houve a noção de que mulheres negras na política também deveriam ter segurança. Ela reforçou que essas mulheres são vítimas de violência política há anos, e que estudos conduzidos pelo Instituto Marielle Franco em 2020 e 2021 mostraram que esses casos são recorrentes.

A Marielle precisou morrer, ser assassinada do jeito que foi, cruelmente, para que outras pessoas ganhassem segurança privada, carro blindado e tivessem a noção de que as políticas mulheres negras precisam de segurança também, além dos homens brancos”.

A ministra também lembrou o momento em que foi convidada pelo presidente Lula para estar à frente da pasta da Igualdade Racial e disse que conversou com outras mulheres negras que são referência em sua vida, como a deputada Benedita da Silva e as ativistas Lúcia Xavier e Jurema Werneck, assim que recebeu a proposta.

Eu não quero entregar só simbologia. Eu tenho orgulho de ser irmã dela. Mas eu tenho que entregar trabalho”, disse.

No dia a dia em Brasília, a ministra disse que ainda é atacada, especialmente no Congresso Nacional, onde outras políticas negras também sofrem ofensas.

Nenhuma Câmara, nem em Brasília nem em nenhum lugar, é historicamente desenhada para mulheres. A Talíria [Petroni, deputada federal] foi lá com filho no colo e não tinha um lugar para trocar a fralda do menino. Não é desenhado pra gente. A Erika Hilton [travesti, deputada federal] estava lá, lindíssima, mas o tempo inteiro que ela passa e as pessoas afrontam chamando ela de coisas horrorosas. Se eu entro, porque o Executivo tem que construir com o Legislativo e vice-versa, eu sou atacada. Não vai ser fácil a gente reconstruir”, disse.

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Com informações da RBA e Agência Brasil.