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A geração que não sonha e nem sabe o que é sonhar por Mônica Francisco*



Mais uma semana, e um turbilhão de acontecimentos ainda em fase de digestão. É assim nesses dias acelerados, em que tudo parece acontecer ao mesmo tempo e nos faz pensar ainda mais na nossa necessidade de buscar, na medida do possível, um ponto de equilíbrio.

A visita do papa e sua conversa com os movimentos sociais na Bolívia, a visita de Dilma à Rússia, o Brics, a mandioca, o vídeo do Emicida e o linchamento de Cleidenilson no Maranhão.

É assim que as notícias que deveriam nos fazer corar ou, nas atuais circunstâncias, enfiar a cabeça em buraco e nunca mais sair de lá, como o linchamento de Cleidenilson, suspeito de ter realizado um roubo, passam, como tudo.

O linchamento de Cleidenilson nos humilha, nos atravessa como lança. Até onde podemos ir em nosso grau de desumanização e aniquilação total do outro? É isso que queremos?

É assim que caminharemos, relativizando que se a polícia ou o Estado agissem, não precisaríamos chegar a tal ponto. Hoje, pela manhã, bem cedo, vi um menino na rua, em uma caçamba, catando material reciclável.

Suas pequenas mãos, àquela hora, ainda bem friozinho (ele estava sem casaco) catavam com a precisão de quem desde cedo já lida com o traçado. Não aguentei. Parei, peguntei nome e idade, porque não estava na escola, enfim, que era bom pensar na escola, no futuro. Fiquei pensando nos meus filhos, bem mais velhos, ainda curtindo o quentinho da cama, e agradeci à Deus.

Seu nome, Lucas, idade, 13 anos, vindo há pouco da roça, engrossa as fileiras da família na catação ou garimpagem, como queiram. Falei que ele deveria estudar, e ele disse que a família já estava procurando escola para ele.

Perguntei em que parte do Borel ele vivia e me armei para a pergunta final.

Inquiri-o sobre pensamentos de futuro, falei rápido, porque já havia me detido um tempinho ali com ele. O que você quer ser, quais seus sonhos para o futuro?

Ele parou (o único momento em que parou de catar durante a conversa), olhou para um ponto imaginário, demorou alguns segundos e disse que queria ser empresário.

Saí, as lágrimas desobedientes apareceram, e fui, rumo ao meu destino e pensando na miséria de nossos dias, nos homens de terno escuro e religiosos, que nunca pensarão em promover a possibilidade de um futuro para Lucas.

Ao fazer a pergunta, queria provocar Lucas à pensar que é possível sonhar. Sua demora em falar do seu desejo de futuro é o espelho do que fizeram a essa geração e a constatação do nosso fracasso como sociedade, geração que não sonha, nem sabe o que é sonhar.

A nossa luta é todo dia. Favela é cidade. Não aos Autos de Resistência, à GENTRIFICAÇÃO, à REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL, ao RACISMO, ao RACISMO INSTITUCIONAL, ao VOTO OBRIGATÓRIO, ao MACHISMO, À VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER e à REMOÇÃO!”

*Membro da Rede de Instituições do Borel, coordenadora do Grupo Arteiras e Consultora na ONG ASPLANDE. (Twitter/@ MncaSFrancisco).