Dilma Rousseff
Em
nenhum momento, o governo Dilma Rousseff abandonou as políticas sociais. Pelo
contrário, aprofundou-as com o Brasil Sorridente, a manutenção da política de
reajustes do salário mínimo e isenções da folha que permitiram a ampliação do
mercado de trabalho formal.
Seu
problema é a postura política em relação aos movimentos sociais (e não só em
relação a eles) e aos sindicatos. Sempre os viu de cima para baixo, ela como um
poder concedente, não como uma igual, lembrando muito mais a postura de um
Getúlio Vargas do que de um Lula.
Dilma
sempre se viu como a defensora dos excluídos, dos setores não organizados – o
que é uma característica positiva extraordinária.
Os
desassistidos não têm quem os defenda, por vulneráveis são pouco exigentes e,
também, extremamente reconhecidos a quem os ajuda.
Já
os movimentos organizados são petulantes.
Experimente
quebrar lanças em favor de determinado movimento social – ou sindical. Ao final
do processo, as lideranças dirão que tudo foi possível devido à sua própria
pressão política. Políticos sensíveis à causa jamais concedem; são “obrigados a
ceder” graças ao espírito de luta das lideranças do movimento.
É
irritante, sim, mas essa petulância é um importante sinal de autoafirmação,
daqueles recém chegados ao jogo político. É necessário paciência e maturidade
para tratar com eles e acompanha-los em seu processo de amadurecimento,
entender e aceitar o jogo político das lideranças.
Dilma
não parece ter paciência para esse jogo.
Esse
é o busílis da questão, o ponto central de desgaste do estilo Dilma em relação
a quase todos os setores organizados da sociedade, de movimentos sociais a
empresariais.
No
atual estágio de desenvolvimento social brasileiro, há pouco espaço para o
estilo concedente de Getúlio. O governante tem que se comportar como o líder
articulando forças, tratando as lideranças da sociedade como iguais, sem impor
soluções.
Em
seu período de governo, Dilma procurou a aliança com os chamados setores
produtivos da economia, geradores de emprego e desenvolvimento. Mesmo com todas
as políticas em relação ao setor, com a ampliação do crédito público, das
compras governamentais, das isenções tributárias, Dilma perdeu a batalha tanto
junto ao mercado financeiro como ao empresarial em geral– devido ao seu estilo
centralizador.
Com
seu discurso de ontem, jogou a toalha em relação à conquista do público
empresarial e passou a apostar as fichas nos segmentos populares.
Mas
atuou com o mesmo estilo com que contemplou setores industriais: do alto do seu
poder de presidente, concedeu aos trabalhadores e miseráveis a correção da
tabela do Imposto de Renda, o reajuste do Bolsa Família e a manutenção da
política de reajustes do salario mínimo. E tudo isso acompanhado de mudanças
radicais na retórica.
Essas
mudanças de retórica exigem uma estratégia cautelosa de transição que não foi
seguida, para não passar a ideia de oportunismo em um momento crítico da sua
candidatura
O
discurso tem a vantagem de mostrar que Dilma não está inerte. Rompido o
imobilismo, é possível que corrija as vulnerabilidades centrais, a teimosia
encruada. Mas, para isso, terá que avançar muito além da retórica e cortar na
própria carne –na parte central de seu temperamento e estilo de governar.
A
reconstrução da credibilidade passa por mudanças ministeriais, para um Ministério
de primeira grandeza, por mudanças no estilo autocrático de gestão, pela
criação de instâncias de participação da sociedade dotadas de capacidade
efetiva de influir em políticas públicas. E pela capacidade de tratar a chamada
sociedade civil organizada – de movimentos sociais a empresariais – como um
igual.
Eduardo Campos
Já
Eduardo Campos está preso a dilemas complexos.
Sua
estratégia inicial era se apresentar como um continuador melhorado do governo
Lula. Para ganhar massa eleitoral, no entanto, teve que juntar seus ideólogos
nacionalistas aos formuladores mercadistas e antidesenvolvimentistas de Marina
Silva.
O
discurso popular ficou comprometido e ele passou a dedicar todos os esforços
para conquistar o público empresarial.
Não
avançou muito. A esta altura, parece claro que os grupos de mídia e os maiores
grupos empresariais paulistas fecharam com Aécio Neves.
Campos
tem o apoio da ala influente, mas restrita, ligada ao Banco Itaú, e dos
apreciadores de seu estilo de gestão, nada muito além disso. Sua última cartada
será a mudança física para São Paulo, para um corpo a corpo com o mundo
empresarial.
Para
conquistar espaço junto a esse público, cometeu a impropriedade, ontem, de
prometer uma meta de inflação de 3%, que, se fosse viabilizada, jogaria o país
em uma recessão considerável e acabaria com a conquista do pleno emprego.
Foi
uma mudança de retórica tão radical quanto a de Dilma. E, por radical, deverá
provocar mais desconfianças do que adesões.
Aécio Neves
Conseguiu
fechar acordo com a mídia. Tem apoio do mercado financeiro, dos grupos
empresariais paulistas e conseguiu a adesão do ainda influente grupo de
financistas de Fernando Henrique Cardoso.
Isolou
José Serra trazendo para sua campanha alguns dos principais serristas, como
Aloysio Nunes, Alberto Goldmann e o inacreditável Andréa Matarazzo – para
cuidar das finanças (!).
Serra
tentou uma rabeira no bonde através de balão de ensaio empinado pela colunista
Sonia Racy – de que FHC estaria bancando sua candidatura para vice de Aécio. É
mais fácil a torcida do Atlético torcer para o Cruzeiro do que consumar-se essa
dobradinha.
Nos
próximos meses, os grupos de mídia concederão a Aécio algo que sempre foi
sonegado quando era adversário de Serra: visibilidade para o modelo mineiro de
gestão.
Em
2010, os jornais preferiam falar dos problemas de contabilização de gastos de
saúde do que nos avanços ocorridos em alguns setores. Hoje em dia, tecem loas
aos avanços na educação.
Aécio
terá que enfrentar desafios muito maiores.
Não
dispõe de nenhuma proposta efetivamente popular e de nenhum plano para o
futuro. Mostra o futuro acenando com o passado do governo Fernando Henrique
Cardoso.
No
plano econômico, limita-se ao financismo estéril da política monetária – que,
em qualquer plano de governo, deveria ser apenas um apêndice, não o ponto
central.
Na
sua luta com Campos – para passar para o segundo turno – irá aprofundar os
ataques a Dilma e a levantar a bandeira do moralismo, auxiliado pela onda
denuncista dos grupos de mídia.
Serão
as eleições mais vazias de ideias das últimas décadas.
Não
haverá nem o tempero de José Serra. Com Serra na parada, pelo menos havia uma
bandeira civilizatória em jogo: a soma das mentes democráticas contra aquele
que passou a simbolizar as forças mais obscurantistas, totalitárias e
inescrupulosas do país.
O nebuloso 2015
Os
próximos anos não serão de bonança. Não há mais espaço fiscal para benesses, há
o aprofundamento dos déficits externos e a necessidade de corrigir preços
represados.
Mais
que isso. Por obra dos grupos de mídia, mas muito como consequência dos tempos
atuais, se aprofundará o descrédito nas instituições e a sensação de que tudo é
corrupção.
Os
três candidatos inspiram muito mais desconfianças do que certezas na maneira de
administrar esse novo cenário.
No
caso de Dilma, há o desafio de recuperação da credibilidade perdida junto aos
agentes econômicos, que certamente piorou com o discurso de ontem. Ganham-se
eleições sem seu apoio; mas dificilmente se governa com a credibilidade baixa
junto a eles.
Os
desafios de Aécio e Campos são maiores.
Ambos
conseguiram montar alianças políticas e impor-se em seus respectivos estados em
cima de acordos de cúpula. Praticamente liquidaram com a oposição, enquadraram
as respectivas Assembleias Legislativas e a mídia estadual.
Governar
um estado – mesmo um estado complexo como São Paulo – é tarefa facílima para um
governador. Até Geraldo Alckmin consegue.
Já
o jogo político nacional é muitíssimo mais complexo.
A
eleição de qualquer um deles significaria um pesado desafio de montagem das
novas alianças, de preenchimento dos cargos na máquina pública e,
principalmente, de administração política dos conflitos sociais. E, qualquer um
que seja eleito, terá de carregar o pesadíssimo fardo da subordinação ao poder reconstituído
dos grupos de mídia em um momento em que as redes sociais atrapalharão o
atendimento das demandas midiáticas e de aliados.
Aécio
acumulou mais experiência nacional com a presidência da Câmara e do PSDB, mas
restrita aos acordos de cúpula. Campos restringiu-se ao nordeste.
Lula,
com mais facilidade, Dilma com menos, conseguiram estabelecer diálogos com
movimentos sociais e permitiram avanços em várias áreas ligadas à inclusão. A
panela de pressão não explodiu – inclusive porque as condições da economia
facilitaram.
Seja
qual for o resultado das eleições, 2015 será ano de muitas emoções.
Até
agora, nenhum dos três candidatos conseguiu construir sua utopia para
apresentar em forma de plano de governo.
A
análise é do Luis Nassif e foi publicado originalmente no Pragmatismo Político