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(FOTO | Zanone Fraissat | Folhapress). |
Não há país democrático quando não há direitos humanos para mais da metade da população.
Nunca
é demais enfatizar o peso, o papel preponderante do racismo na estruturação das
imensas desigualdades existentes neste país, que, aliás, se destaca
mundialmente nesse quesito. Um bom momento para reiterar essa afirmação é o
lançamento, nesta quarta (30), em Brasília, do Pacto Nacional pelo Combate às
Desigualdades no Brasil.
Tendo
em vista a mudança de cenário político e o consequente ressurgimento da
perspectiva de construções coletivas, essa articulação —resultante de uma
iniciativa da Ação Brasileira de Combate às Desigualdades (ABCD)— reúne dezenas
de organizações da sociedade civil, sindicatos de trabalhadores, empresas,
instâncias governamentais do Executivo e do Legislativo federal, estadual e
municipal e o Poder Judiciário, com o objetivo de transformar o combate às
desigualdades em prioridade nacional.
Divulgado
na sexta-feira (25), um novo estudo do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia
e Estatística) avaliou as pessoas com algum grau de pobreza em seis dimensões:
moradia, acesso aos serviços de utilidade pública, saúde e alimentação,
educação, acesso aos serviços financeiros e padrão de vida, e transporte e
lazer. A pesquisa indica uma manutenção das desigualdades estruturais, tanto no
que se refere às comparações entre a população urbana e rural quanto ao recorte
racial, sendo possível verificar que as diferenças entre os grupos pouco se
alteraram.
Não
por acaso, a divulgação desses dados acontece quase simultaneamente ao discurso
feito em Angola pelo presidente Lula, no qual ele afirmou querer convencer a
humanidade a se indignar contra a desigualdade: “Estou assumindo o compromisso
de fazer uma campanha mundial contra a desigualdade”, disse Lula, acrescentando
que ela existe em tantos lugares que muitas vezes não vemos, ressaltando que temos
a desigualdade de raça, de gênero, de idade, na qualidade da educação, na qualidade
da saúde, no salário”.
Como
afirma o manifesto do Pacto divulgado em Brasília: “Acreditamos que essa
situação de desigualdades crônicas, o racismo e a opressão de gênero, só poderá
ser superada por meio de uma ação articulada e solidária de toda a sociedade”.
O texto também explica que a ABCD não é uma nova organização, e sim uma
articulação da sociedade civil para diminuir a fragmentação e a dispersão dos
que lutam para reduzir as desigualdades no Brasil. Também foram lançados o
Observatório Brasileiro de Desigualdades e a Frente Parlamentar de Combate às
Desigualdades, parte de um conjunto de ações que focalizam as políticas
públicas e as ações da sociedade nesse campo.
É
fundamental destacar a necessidade de um tratamento não racista por parte do
Judiciário, das políticas de segurança pública; enfatizar também o direito de
nossos jovens não serem chacinados e o direito à liberdade de crença, que no
Brasil se traduz em um tratamento das religiões de matriz africanas com a mesma
dignidade com que se trata as religiões majoritárias.
Nas
palavras da pesquisadora Giselle dos Anjos Santos, do Ceert, entidade que
participa desde o início dessa articulação, “as mulheres negras são a maioria
entre as mais impactadas pelos mais diversos indicadores de desigualdades
sociais. (…) Casos como os assassinatos de Marielle Franco e de Mãe Bernadete
ilustram de modo enfático como as desigualdades operam na sociedade brasileira,
colocando os grupos mais impactados em condições de maior vulnerabilidade e
tornando-os mais suscetíveis a atos de violência, nas suas mais diferentes
esferas, chegando a execuções sumárias.
Não
existirá um país democrático enquanto mais da metade da população viver
situações de inefetividade de direitos humanos em razão do racismo sistêmico e
de suas intersecções, entre as quais a violência contra mulheres, gerando
violações específicas aos direitos de mulheres negras.
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Publicado originalmente na Folha de São Paulo e replicado no Geledés e CEERT.
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