Conheça 15 autores negras da literatura brasileira


Mosaico com 14 das 15 autores negras da literatura brasileira. Mosaico montado por este blogueiro. Fotos: reprodução.

Aposto que não muitas, mas elas existem! E são feministas, mães, da periferia, trabalhadoras e pesquisadoras que sabem colocar em palavras o ponto de vista da mulher negra que sente tudo na pele. Tratam de diversos temas de uma maneira emocionante, mas, infelizmente, são pouco divulgadas e publicadas – é quase impossível encontrar obras em livrarias.

Publicado originalmente no Tão Feminino

Conversamos com Bianca Gonçalves, pesquisadora da USP e idealizadora do projeto Leia Mulheres Negras , e juntas, selecionarmos 15 escritoras negras brasileiras que você precisa conhecer. Afinal, como diria Alzira Rufino: o possível, estamos fazendo agora; o impossível demora um pouco mais!

Maria Firmina dos Reis

Ninguém mais, ninguém menos que a primeira romancista brasileira. Maria Firmina nasceu no Maranhão em 1825. Ao longo dos seus 92 anos de vida, teve diversas publicações, a primeira foi o romance Úrsula, considerado um dos primeiros escritos produzidos por uma mulher no Brasil. Durante a campanha abolicionista, o livro A Escrava reforçou a postura antiescravista de Maria, que é compositora do hino da abolição da Escravatura. Fundadora da primeira escola mista e gratuita do estado, a escritora sempre lutou pela educação, igualdade racial e de gênero.

Carolina Maria de Jesus

Quando questionada sobre o motivo de escrever, Carolina respondeu: “Quando eu não tinha nada o que comer, em vez de xingar eu escrevia. Tem pessoas que, quando estão nervosas, xingam ou pensam na morte como solução. Eu escrevia o meu diário”. A moradora da antiga favela do Canindé, zona norte de São Paulo, trabalhava como catadora e registrava seu cotidiano em páginas amareladas encontradas no lixo. A escritora foi descoberta por um jornalista, e assim teve publicado seu livro Quarto de Despejo – Diário de uma favelada que trata do dia a dia repleto de discriminação de uma mulher negra, mãe, pobre e favelada. Além disso, o livro é referência para os estudos socioculturais brasileiros e apesar de ter sido publicado em 1960, narra uma realidade que infelizmente ainda é a de muita gente.

Depois dessas publicações, foram lançados os livros Casa de Alvenaria, Pedaços de fome e Provérbios. Mas há também trabalhos póstumos, o mais recente é de 2014 Onde Estaes Felicidade.

Elizandra Souza

A escritora e jornalista também luta para dar voz à periferia na Zona Sul de São Paulo. Elisandra Souza publicou o livro de poesias Águas da Cabaça em 2012 e tem participação em revistas e antologias literárias como Negrafias e Cadernos Negros (publicação importante que se mantém há mais de trinta anos divulgando nomes da literatura negra, vale muito a pena conhecer). Ela é editora da Agenda Cultural da Periferia na Ação Educativa e fundadora do coletivo Mjiba (Mjiba significa mulher revolucionária <3).

Jenyffer Nascimento

O conjunto da obra de Jenyffer é intenso e aborda aqueles temas empoderadores superimportantes que nós adoramos: amor, identidade, negritude, machismo e racismo. A pernambucana é mais uma das vozes feministas negras que gritam na periferia por meio da poesia. Alguns de seus poemas foram publicados no livro Pretextos de Mulheres Negras, obra de poemas que contou com a participação de 22 mulheres negras. A escritora lançou seu primeiro livro Terra Fértil pelo coletivo Mjiba (aquele fundado pela Elizandra, lembram?).

Jarid Arraes

Jarid mostra sua indignação com versos fortes e diretos por meio de cordéis engajados. Entre os mais de 40 títulos publicados, o mais popular, Não Me Chame de Mulata, rendeu muitas discussões nas redes sociais. Em seu livro de contos As Lendas de Dandara, a cearense aborda o tráfico humano e a escravidão contando a história da guerrilheira quilombola Dandara dos Palmares (Esposa do Zumbi) de um jeito leve com um toque de ficção fantasiosa. A cordelista é comprometida com projetos de direitos humanos e tem uma coluna semanal na revista fórum chamada Questão de Gênero.

Ana Maria Gonçalves

Nascida em minas, Ana Maria Gonçalves foi publicitária em São Paulo, mas foi para a Ilha de Itaparica escrever seu primeiro romance, Ao Lado e à Margem do que Sentes por Mim. O livro, escrito durante seis meses, foi publicado de forma independente. Mais tarde, Ana Maria passou a morar em Nova Orleans. Seu segundo romance, Um Defeito de Cor, de 2006, conquistou o Prêmio Casa de las Américas na categoria literatura brasileira, a obra é inspirada na história (linda) de Luísa Mahin.

Conceição Evaristo

Doutora em literatura, publicou seu primeiro poema em 1990 no décimo terceiro volume dos Cadernos Negros. Desde então, publicou poemas e contos em diversas antologias. Conceição Nasceu em uma favela na cidade de Belo Horizonte e milita dentro e fora do mundo acadêmico. Além do recente livro de contos Olhos d’Água, ela escreveu o romance Ponciá Vicêncio, publicado em 2003 e o Becos da Memória em 2006, Poemas da Recordação e Outros Movimentos, em 2008.

Alzira Rufino

A profissional na área de enfermagem é engajada no apoio às vítimas de violência racial, doméstica e sexual. Alzira foi a primeira escritora negra a ter seu depoimento gravado no Museu de Literatura Mário de Andrade, em São Paulo/SP. Pioneira em sua região ao escrever para a imprensa com recorte de gênero, raça e sobre violência contra a mulher, Alzira também é responsável pelo crescente envolvimento dessas questões na mídia, no poder público e em debates cotidianos, além de dar visibilidade política às mulheres negras da Baixada Santista.

Geni Guimarães

Geni também faz parte do time de autoras divulgadas nos Cadernos Negros. Em 1979, lançou seu primeiro livro de poemas, Terceiro Filho. A Fundação Nestlé publicou seu volume de contos Leite do Peito. Seu livro A cor da Ternura, recebeu os prestigiados prêmios Jabuti e Adolfo Aisen. Nascida no interior do estado de São Paulo, a escritora iniciou a carreira literária publicando poemas em jornais da cidade de Barra Bonita.

Miriam Alves

Miriam ministrou os cursos de Literatura e Cultura Afro-brasileira na Escola de Português de Middlebury College em 2010, nos Estados Unidos. Fez parte do Quilombohoje (grupo paulistano de escritores), pelo qual publicou diversos textos em prosa e poesias. Tem os seguintes livros de poemas publicados: Momentos de Busca, Estrelas nos Dedos, a peça teatral Terramara, ensaios em Brasilafro Autorrevelado, Bará - na Trilha do Vento e o livro de contos Mulher Mat(r)iz. Além, claro, dos poemas publicados nos Cadernos Negros e em diversas antologias nacionais e internacionais.

Lia Vieira

Nosso papel é resgatar com criatividade o vasto patrimônio afro. A cultura negra é muito mais do que capoeira e cuscuz” lembra Lia, ao falar do papel das escritoras afrodescendentes. Autora do livro de contos Só As Mulheres Sangram (esse você pode encontrar em livrarias físicas e virtuais, ed. Record), ela é formada em economia, turismo, letras, doutora em Educação, pesquisadora, artista plástica, dirigente da Associação de Pesquisa da Cultura Afro-brasileira e militante. Muito ocupada, não?

Cristiane Sobral

A autora tem três obras: Não Vou Mais Lavar os Pratos, de poesias; contos em Espelhos, Miradouros, Dialéticas da Percepção; e seu último livro de poemas publicado em 2014 “Em Só por Hoje Vou Deixar Meu Cabelo em Paz temos poemas engajados contra o racismo, a partir, sobretudo, da reconstrução da feminilidade da mulher negra. Boa parte dos poemas fazem do cabelo crespo o ponto de partida lírica para a denúncia, firmando ao final seu empoderamento”, conta Bianca Gonçalves. Cristiane afirma que escreve como um grito de liberdade. A carioca moradora de Brasília é mãe e Diretora de Gestão e Produção Cultural no Sindicato dos Escritores do Distrito Federal. 

Cidinha da Silva

Você também pode conhecer essa escritora pelo blog. Sobre o seu livro Sobre-viventes! Que será lançado no dia 23 de maio, a mineira explica “Ultrapassa o dito com o dizer. Para mim, isso é literatura. Dizer para além do dito. Intencionalmente ocultar para revelar. Revelar ocultando. Nesse jogo, deslinda-se o humano. Mas, humano, é ainda genérico: nesse livro desnudam-se os sobreviventes e os viventes”.

Cidinha se tornou uma ótima escritora depois de começou a publicar artigos acadêmicos sobre relações sociais e de gênero na faculdade de História. Foi a partir daí que desenvolveu um senso crítico aguçado para falar do racismo do dia a dia. Seu primeiro livro Cada Tridente em Seu Lugar, abordou o tema polêmico do acesso e permanência dos negros nas universidades. A mineirinha já escreveu romances, literatura infanto-juvenil e crônicas.

Esmeralda Ribeiro

Escritora, jornalista e coordenadora do grupo Quilombhoje, Esmeralda participa de palestras e seminários abordando sua experiência como escritora. Além de poemas em coletâneas nacionais e internacionais, Malungos e Milongas é um livro de contos publicado pela autora. Sobre como iniciou sua carreira literária, Esmeralda diz “A morte, a dor, o amor e a saudade foram sentimentos que deram outro ritmo a minha vida; foi em 1978 com o falecimento do meu pai que escrevi um poema em prosa intitulado Sábado, com esse poema andei por caminhos até acabar com a minha solidão literária. Meus temas preferidos são suspense, magia, surrealismo, policial”.

Mel Duarte

Mel Duarte tem até poesia inspirada em Jair Bolsonaro. A escritora paulista é ativista e produtora cultural. Lançou recentemente o livro Negra, Nua e Crua. Segundo Mel, seu último trabalho é um compilado de experiências e sensações. “Ali não tem só a Mel falando. Pelo retorno que recebo de outras mulheres, percebo que tem muito de nós e isso é o que me dá gás para continuar”. Em 2013, a poeta publicou o livro Fragmentos Dispersos.


A Escola que desejo



Vou contar um segredo para você. Mas ao contrário de todos que já lhe falei, esse eu quero que você espalhe por aí. Conte para sua mãe, seu pai, seus irmãos e irmãs. Conte também para seu vizinho, sua vizinha e para quem mais você encontrar pelas ruas. 

Eu sempre gostei de ir à escola. Gostava de acordar cedinho, tomar banho, escovar os dentes, colocar a roupa da farda com aquele símbolo da escola no peito e o nome atrás, merendar e sair para ver meus amigos de sala e aqueles que não eram da mesma turma, meus professores e os demais funcionários da escola.

Como era bom. Mas, sempre senti que faltava algo. Não sabia dizer bem o que, mas faltava. Falta, porque era uma espécie de vazio que sentia todos os dias ao chegar em casa e ligava o rádio e a tv – pois nesse tempo eu nem tinha acesso à internet.  Muitas informações e eu ficava a ver navios. Não sabia o que se passava. Não sabia me posicionar diante de tantos fatos. Sequer me questionava se aquilo que ouvia no rádio e assistia na tv era de fato verdade.

Às vezes. Às vezes não, quase sempre desligava os aparelhos porque não sabia os significados de muitas palavras e o impacto que elas geravam em nossas vidas. Quando retornava para escola no dia seguinte era como se vivesse outra realidade totalmente distante da que vivia em casa, na rua..... Percebia dois mundos tão diferentes. O professor e a professora falavam da importância de saber regras de três, raiz quadrada. Diziam o quanto era necessário saber distinguir as palavras. Se é adjetivo ou substantivo, etc. Eles/as nos faziam decorar os fatos da revolução francesa, da colonização portuguesa no Brasil, os fatos religiosos de Grécia e Roma.

No entanto, quando eu chegava em casa me via sozinho mais uma vez e sem saber conectar o que vi na escola com a realidade nua e crua. E para piorar eu nem sabia a história da minha cidade, do meu bairro. Ainda assim, continuava a estudar e decorar algumas lições para ter boas notas. E tirava, mas instantes depois das avaliações não sabia mais. Decorava, memorizava a matéria toda, mas não entendia. Eu me sentia uma ameba. E eles e elas me faziam sentir tal qual.

Mesmo assim, eu sabia que o estudo era algo bom. Meus pais repetiam isso todos os dias. Ia muitas vezes à escola por insistência deles. Hoje sei que de fato, a escola é a porta de entrada para uma vida melhor. Hoje eu tenho parcialmente algumas respostas para aquele vazio que sentia quando retornava da sala de aula para casa. Muitas delas estavam no método de ensino. Os tempos mudaram. As escolas mudaram. Os professores mudaram, mas algo permaneceu. O sistema educacional e o método de ensino permanecem fiéis ao tempo.

Não se ensina de fato para a cidadania. Não há preocupação com a politização dos estudantes, ou seja, a escola não está preocupada em ver os alunos questionando e participando da vida política da sua cidade. Não quer nem saber de discutir as causas e consequências de seguir sem questionar determinada religião. Aliás, religião e política são os assuntos tabus. Ninguém quer ou ousa discutir essas temáticas com os alunos. Eu pouco ou nada sabia das minhas origens em sala, porque, de certo modo, conteúdos referentes à África só aparecia no período colonial brasileiro e os negros e negras sendo vistos como escravos. Eu não tinha uma história contada pelos negros e pelas negras.

Hoje eu sei explicar o que antes só imaginava. Temos uma educação que vale mais os números, do que os alunos propriamente ditos. Temos uma educação que ainda é racista, machista e homofóbica. Temos uma educação onde os avanços são muito menos sentidos do que as permanências. Por fim, quero dizer que hoje eu sei e desejo uma escola onde o que se aprenda na sala possa de fato ser aplicado em casa, na rua... Onde o que se passa lá fora possa ser trabalhado a exaustão na escola, para que meus filhos não possam se sentir estrangeiros na sua própria terra. Desejo ainda uma escola que eduque para as relações étnico-raciais e pontue o ano inteiro a história e cultura africana e afro-brasileira. 

Por fim ainda, desejo uma escola que tenha pluralidade de ideias e onde  se incite os alunos e alunas a partir do debate com textos  diferentes, permitindo que eles/as formem opinião se tornando cidadãos críticos e atuantes do meio que o cerca e não o que ora se quer para a educação - uma "escola sem partido". Quero, outrossim, uma escola de muitos partidos. 

Ah e antes que eu esqueça. Desejo uma escola onde os professores, professoras e demais companheiros/as de jornada que se preocupam com essa educação desejada, sejam maioria.

Imagem meramente ilustrativa/Divulgação.




Professor de História diz que “Escola sem Partido” é uma proposta de intimidação ideológica



O site do Senado Federal abriu nesta segunda-feira (18) uma consulta pública relativa ao programa “Escola Sem Partido”, estampado no Projeto de Lei 193/2016. De autoria do senador Magno Malta (PR-ES), o PL objetiva a proibição de manifestações ideológicas e político-partidárias por parte de professores em sala de aula.

Publicado originalmente no Brasil de Fato

Fabiano Godinho Faria, professor de História e coordenador-geral do Sindicato Nacional dos Servidores Federais da Educação Básica e Profissional (Sinasefe), ressalta que a iniciativa de proposição do referido projeto de lei se conecta a uma postura ideológica conservadora surgida no período pré-1964, antes da instauração da ditadura militar no Brasil.

Naquela época, havia uma noção de um inimigo interno que precisava ser combatido em defesa da família e de uma noção distorcida de democracia. Eles falavam em uma democracia adaptada aos tempos modernos, que era justamente a ditadura”, explica.

Para o docente, ao reviver conceitos de intimidação ideológica, a proposta legislativa segue na mesma linha. “É algo típico do período da Guerra Fria. O objetivo explícito é perseguir, demitir e até prender os docentes que defendam uma visão de mundo contrária ao status quo. Colocar a educação a serviço da manutenção de uma visão de mundo dessas é um retrocesso, porque afronta avanços que tivemos nas últimas décadas. Nós chegamos ao ponto de tratar o racismo como crime, de aceitar a união homoafetiva, e o projeto tenta criminalizar esse tipo de discussão. É uma ode ao atraso”, avalia.

"Coisa da ditadura"

A proposta, que foi apelidada de “Lei da Mordaça”, vem suscitando a reação de diversos segmentos da sociedade, que criaram na última quarta (13) a Frente Nacional Contra o Projeto Escola Sem Partido, composta por mais de 100 entidades, entre elas o Sinasefe.

Não existe liberdade de expressão no exercício estrito da atividade docente, sob pena de ser anulada a liberdade de consciência e de crença dos estudantes, que formam, em sala de aula, uma audiência cativa”, diz o texto do PL. Ainda segundo o projeto, a referida liberdade de consciência dos estudantes estaria “violada” caso o professor se utilizasse do espaço escolar para promover suas concepções políticas, ideológicas e morais.

A medida tem sido interpretada por educadores e diversos formadores de opinião como sendo uma ofensiva conservadora voltada ao sufocamento de ideologias divergentes no universo da formação educacional.

É a institucionalização de uma visão reacionária da sociedade e das relações sociais que é tida como o ideal e que pretende enquadrar o pensamento crítico nas escolas, tomando como padrão a leitura conservadora do mundo. (…) É um projeto direitista”, disse Faria.

Polêmico, o PL tramita atualmente na Comissão de Educação do Senado e aguarda parecer do relator, o senador Cristovam Buarque (PPS-DF). Atualmente em viagem ao exterior, o parlamentar não pôde conversar com o Brasil de Fato.

Anteriormente, ele já havia se manifestado contrário a um projeto semelhante que foi apresentado na Câmara Legislativa do Distrito Federal. “Tolher um professor é coisa da ditadura”, disse na ocasião.

A reportagem procurou ouvir o senador Magno Malta, autor do PL, mas não obteve retorno da assessoria de imprensa do parlamentar até o fechamento desta matéria.

No mesmo fluxo de raciocínio, o professor da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília (UnB) Luiz Araújo relembra que o movimento que atualmente defende o PL do programa Escola Sem Partido deu sinais na história recente do Brasil.

Em 2014, quando estava sendo discutido o Plano Nacional de Educação, houve uma cruzada contra qualquer referência às questões de gênero no Plano. A bancada evangélica fez uma pressão muito grande. Depois, em 2015, quando foram elaborar os planos municipais, eles fizeram uma articulação para alterar a parte que tratava desse tema e interditar a discussão de gênero. (…) É uma tentativa de impedir que a escola dispute conceitos progressistas, humanitários, dos quais os segmentos conservadores discordam”, analisa.

Propostas regionais

Além do Senado, a Câmara Federal e diversas casas legislativas, como as de Alagoas, do Rio Grande do Sul e do Distrito Federal, têm propostas semelhantes em andamento. Para o deputado federal Jean Wyllys (PSOL-RJ), as iniciativas vão na contramão do que a escola deveria trabalhar na condição de instituição educadora.

"A escola e a universidade devem falar sobre gênero, sexualidade, política, filosofia, sobre história, ideias, ideologias e doutrinas de todo tipo, e isso precisa ser visto como algo positivo, não como um perigo. É preciso que isso seja feito apresentando diversas opiniões e educando os alunos para que possam fazer uma leitura crítica de todas as ideias que lhe são apresentadas. Precisamos ter uma escola com todos os partidos, com democracia, com diversidade, com curiosidade pelo saber, pela informação, pela pesquisa, pelo debate, pela leitura crítica do mundo — e, sobretudo, uma escola com muita liberdade”, considera o parlamentar, um dos críticos ferrenhos da proposta.

Nos últimos dias, o Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica (Conif) se manifestou publicamente contra esse tipo de iniciativa legislativa.

“[A proposta] fere a emancipação das instituições públicas de ensino e dos docentes e impõe a mordaça aos currículos promotores do crescimento da consciência das novas gerações”, disse em nota a entidade, que representa 41 instituições pelo país.

O professor e reitor do Instituto Federal do Maranhão (IF-MA), um dos diretores do Conif, ressalta que a proposta fere os ditames da Constituição Federal. “Se a liberdade de expressão é garantida por ela, essa proposta é algo que vai na linha da censura”, disse.

Articulação e resistência

Para o deputado federal Glauber Braga (PSOL-RJ), que é membro titular da Comissão de Educação da Câmara e já foi presidente do colegiado, a sociedade precisa se mobilizar contrariamente às propostas do programa Escola Sem Partido.

Ele está colhendo assinaturas para a criação de uma frente parlamentar que possa aglutinar deputados interessados em se opor a projetos que restrinjam direitos. “Nós temos que ampliar esse movimento dentro da Câmara, mas estou certo também de que precisamos de iniciativas que extrapolem os muros da Casa, para poder dar resultado. Precisamos lutar contra essa política de restrição de direitos que estão querendo implementar”, disse. 

Segundo o coordenador-geral do Sinasefe, Fabiano Godinho Faria, o movimento vem mobilizando as bases para tentar engrossar o coro contra os PLs que promovem o programa Escola Sem Partido. Esta semana, a Frente Nacional se reúne em Brasília para definir um plano de ações. A ideia é articular comitês regionais e estaduais contra as propostas.


Vamos fazer corpo a corpo com os parlamentares e não descartamos uma paralisação nacional. Vamos responder ao ataque da direita com as nossas armas e com os nossos métodos de mobilização histórica. Se for necessário ocupar as ruas, faremos isso com força total”, garantiu.

Senador Magno Malta (PR - ES) é o autor do Projeto de Lei 193/2016/ Sandro Nascimento ( Alep).


Em Rondônia, pesquisador diz ter encontrado altar de cidade inca


Um pesquisador independente localizou um sítio arqueológico no município de Alta Floresta do Oeste (RO), a 540 quilômetros de Porto Velho, e já relatou a descoberta ao Ministério Público Federal e ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional.

Publicado originalmente no Blog da Amazônia

O farmacêutico Joaquim Cunha da Silva, especialista em citologia clínica e georreferenciamento,  acredita que trata-se de um altar onde eram realizadas cerimônias sagradas na lendária cidade perdida Paititi, que teria sido criada pelos incas em fuga após a colonização espanhola no Peru.

- Existem vários altares similares a esse, que é o primeiro encontrado no Brasil, em países como Argentina, Peru e Colômbia, onde a cultura pré-inca, inca e aruaque se desenvolveu – disse Joaquim Silva ao Blog da Amazônia.

Segundo o pesquisador, no sítio arqueológico existem evidências de assentamento humano e foram recolhidos restos de cerâmica e artefatos líticos como machadinhas e facas de pedra.

Ele disse que existe também área onde supostamente foi desenvolvida agricultura, além de outra área onde foi encontrada urnas funerárias de cerâmica antropomórfica (estátua de barro) com característica aruaque ou inca.

- Nós também já identificamos geoglifos zoomorfos e antropomorfos, ou seja, na forma de animais e pessoas. Existe uma construção em estrutura de pedra e terra no formato de uma pirâmide. No topo dessa pirâmide existem desenhos de animais e de pessoas, feitos com paisagismo vegetal. Nesse local, dois geólogos constataram que a presença de um muro de arrimo, de pedra, é resultante de trabalho humano – afirma o pesquisador.

Joaquim Cunha da Silva disse que já foram identificados 29 "pilões" ou "bacias" feitos na pedra do suposto altar. Ele acredita que correspondem ao calendário lunar. Em outra rocha próxima, existem mais sete "pilões" ou "bacias", que o pesquisador supõe que eram usados para representar as fases da lua e os dias da semana ou o solstício e o equinócio.

- Imagino que o altar poder ter sido usado em rituais para que os indígenas se guiassem com o reflexo dos astros e estrelas. Há evidências no local de que eles se valiam de plantas de poder. No entorno do sítio, por exemplo, encontramos o cipó e a folha usadas na preparação da ayahuasca. Tudo isso podia servir como oráculo, para que pudessem planejar o futuro, fazer previsão de plantações e colheitas.

Joaquim Silva lembra que Bryan, filho do explorador inglês Percy Fawcett, relatou que o pai, entre 1909 e 1911, fez viagens para percorrer uma montanha na região e escreveu sobre a existência da "Grande Paititi".  A montanha mencionada por Fawcett é a Serra do Norte ou Chapada dos Parecis, no Vale do Rio Guaporé.

- O que faço na região desde 2009 é arqueologia de paisagem. Através de pesquisa em campo, tenho observado a ação do homem no meio ambiente com a mudança ocasionada por ele, o enriquecimento da flora e a alteração no relevo. É assim que tenho localizado indicadores florestais, cerâmicas e artefatos líticos sobre a existência desse e de vários outros sítios arqueológicos que sinalizam que outros povos muito avançados viveram na região – acrescenta o pesquisador, autor do blog Eldorado Paititi.


Projeto de Temer reduz salários e aumento de jornada de trabalho



O governo federal vai propor um projeto de lei para permitir que empresas possam reduzir salários e até mesmo aumentar a jornada diária de trabalho dos seus empregados.

O objetivo, segundo o ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira, é “prestigiar” as convenções coletivas, que teriam poder para flexibilizar direitos previstos na Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT). “A CLT virou uma ‘colcha de retalhos’ que permite interpretações subjetivas”, criticou Nogueira em declarações à imprensa, na última quarta-feira (20).

Publicado originalmente no Brasil de Fato

O próprio presidente interino Michel Temer disse essa semana, durante reunião com empresários e ministro da área econômica, que seu governo “vai enfrentar todas as resistências” para aprovar as reformas da Previdência e Trabalhista.

Mesmo se tiver manifestações contra, que são da democracia, vamos enfrentar”, avisou Temer. A fala ocorre pouco mais de uma semana depois de o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson Andrade, após reunião com Temer, ter citado, como exemplo para o Brasil, o caso da França, que passou a permitir jornada semanal de trabalho de até 80 horas.

Após muita repercussão negativa, a declaração de Andrade foi corrigida pela CNI, que afirmou que, na França, o máximo seriam 60 horas e que o presidente se enganou com a citação, mas que, “em nenhum momento”, teria defendido aumento da jornada de trabalho prevista na Constituição, que é de 44 horas semanais.

Mais trabalho, menos salário

A reforma trabalhista que o presidente em exercício Michel Temer pretende enviar ao Congresso Nacional até o fim deste ano vai permitir que as convenções coletivas prevaleçam sobre as normas legais.

De acordo com a CNI, a proposta seria o caminho para “modernizar” as relações de trabalho no Brasil. Em nota, a confederação avaliou que a negociação coletiva é a forma pela qual empresas e trabalhadores, por meio de sindicatos, assumem o “protagonismo” ao formularem condições e rotinas de trabalho, de acordo com a Constituição e com os princípios da Organização Internacional do Trabalho (OIT).

Mas, para a advogada Fernanda Rocha, do escritório Rocha Advogados Associados, em Brasília, o que o governo chama de “prestigiar” a negociação coletiva é uma “falácia” para legalizar o corte de direitos. “Liberdade para que se reduza direitos não é dar liberdade, mas colocar uma faca no pescoço dos sindicatos.

Na prática, como não será mais preciso observar a CLT em relação à jornada e a salário, as empresas poderão condicionar aumentos salariais, por exemplo, ao maior parcelamento de férias, redução de intervalo de almoço ou aumento de jornada diária”, aponta. Ela explica que já existe liberdade nas negociações coletivas. “As convenções, elas servem para ampliar direitos dos trabalhadores já previstos na CLT, mas nunca reduzir esses direitos. O que se está propondo uma autorização para que os sindicatos negociem abaixo do que está na lei e, até mesmo, na Constituição”.

Jornada e banco de horas
Um dos objetivos do setor empresarial, prevê Fernanda Rocha, é mexer “banco de horas”, para torná-lo ilimitado. Aprovado em 1998, durante o governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB), o banco de horas já foi uma flexibilização da legislação trabalhista. Antes, o trabalhador, para fazer hora extra, deveria receber adicional de 50% sobre cada hora trabalhada.

Com o banco de horas, essa hora extra deixou de ser remunerada e passou a ser compensada apenas com folga. Além disso, o banco de horas só pode ser validado por meio de negociação coletiva, com prazo máximo de um ano para compensação, e não pode exceder duas horas extras diárias.

Com o fim dessas restrições, as empresas poderão aprovar, em acordo coletivo, jornadas diárias superiores a 10 horas. “A ideia é que, em época de alta produção, os empregados trabalhem 15, 16 horas e, na época de baixa produção, a empresa possa folgas coletivas”, exemplifica Fernanda Rocha, advogada trabalhista.

À primeira vista, o trabalhador pode até achar interessante a possibilidade de acumular folgas, mas existem orientações tanto da Organização Internacional do Trabalho [OIT] quanto da Organização Mundial da Saúde [OMS] sobre os riscos do excesso de jornadas, principalmente jornadas superiores a 10 horas diárias. O entendimento do TST [Tribunal Superior do Trabalho] também é de que limite de jornada é uma questão de saúde e segurança do trabalhador e não pode ser negociado. O direito do trabalho também existe para proteger o trabalhador dele mesmo”, argumenta Fernanda. 

Na flexibilização pretendida pelo governo Temer, também seria possível reduzir o salário dos empregados por meio de acordo coletivo. “Um ano em que a empresa tiver prejuízo, ela pode reduzir o salário dos empregados sem, necessariamente, reduzir a jornada”, afirma Fernanda.


Todas essas mudanças, se aprovadas, na minha avaliação, são flagrantemente inconstitucionais e serão questionadas no Supremo Tribunal Federal (STF) e no TST”, acrescenta.

Um dos objetivos do setor empresarial é mexer "banco de horas", para torná-lo ilimitado/ Valter Campanato/Agência Brasil.

Movimentos Sociais e entidades se unem contra o “Projeto Escola sem Partido”



 “Estudante na escola tem direito de pensar. Escola sem Partido é ditadura militar”. Puxado por grupos de alunos e militantes de diversas entidades do movimento estudantil, foram vários os momentos do encontro em que o grito tomou conta do ambiente. Eram centenas de pessoas espremidas num auditório lotado. Passavam de cem também as instituições e movimentos sociais representados — entre eles, a Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz). Com enfoques os mais diversos, os discursos convergiam no apelo à unidade em prol de uma causa comum: o combate, nos parlamentos e nas ruas, ao projeto de lei que quer limitar conteúdos e práticas escolares para acabar com uma suposta “doutrinação” na educação brasileira. Batizado de ‘Escola sem Partido’ pelo movimento que o criou, por onde passa o projeto tem recebido outros nomes. Em Alagoas, por exemplo, foi aprovado na Assembleia Legislativa como ‘Escola Livre’. No evento que reuniu educadores, estudantes, sindicalistas e militantes da educação no Rio de Janeiro no último dia 13 de julho, o nome adotado foi um pouco diferente: ‘lei da mordaça’.

Publicado originalmente na EPSJV/Fiocruz

O encontro marcou o lançamento de uma Frente Nacional contra o projeto Escola sem Partido, que foi identificado pela maioria dos presentes como uma das maiores ameaças colocadas à educação pública na atual conjuntura brasileira. Destacando a presença cada vez mais visível de discursos conservadores em relação às famílias, associados a uma mercantilização da religião, o professor Gaudêncio Frigotto, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), que fez a fala de abertura do encontro, foi direto: “Não podemos deixar esse projeto ser aprovado porque, com ele, a direita fascista terá não só a persuasão mas também a guilhotina”. Isso porque o texto do projeto de lei — que foi elaborado pelo movimento Escola sem Partido e distribuído a parlamentares nas esferas nacional, estadual e  municipal — prevê que os professores que incorrerem em prática de "doutrinação", descumprindo alguma das proibições que o PL estabelece, devem ser denunciados ao Ministério Público. Entre os seis pontos que o projeto impõe como obrigações ou proibições legais ao trabalho em sala de aula estão questões imprecisas e polêmicas, como a garantia de que o professor não “cooptará” os alunos para correntes políticas ou ideológicas (além de partidárias) e de que ele “respeitará o direito dos pais a que seus filhos recebam a educação moral que esteja de acordo com suas próprias convicções”. Afirmando a importância da reação coletiva e a necessidade de resistir às ameaças institucionalizadas que o projeto representaria, Gaudêncio brincou: “Haja cadeia!”.

Fundamentalismos

Por que não estamos contando boas piadas sobre esse projeto?”. Essa é, na avaliação de Roberto Leher, professor, pesquisador e reitor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), que fez a fala de encerramento do encontro, a pergunta que o campo da educação precisa se fazer neste momento. Isso porque, segundo ele, alguns anos atrás, quando o movimento Escola sem Partido foi criado, ele seria, no máximo, alvo de ridicularização, pelo seu caráter “risível” e “inconstitucional”. “Mas hoje estamos aqui”, ressaltou, destacando o espaço que essa iniciativa ganhou nos parlamentos, o que, no nível federal, se expressa, por exemplo, na presença de vários representantes de setores ultraconservadores na Comissão de Educação da Câmara. O mais “preocupante”, destacou, é que esse projeto agora encontra espaço num governo que carece de “legitimidade e legalidade”. “Ele começa a entrar de forma capilarizada no governo central do país”, alertou, lembrando que o ministro interino da educação, Mendonça Filho, se reuniu com o ator Alexandre Frota e representante do Movimento Revoltados On Line para ouvir sugestões sobre política educacional e que, nesta semana, o mesmo ministro nomeou como seu assessor especial Adolfo Sachsida, um pesquisador que já se declarou defensor do Escola sem Partido e, segundo Leher, já teria se manifestado em redes sociais não só pela criminalização da liberdade de pensamento mas também por iniciativas como a ‘cura gay’. Como outros casos que marcaram a curta trajetória do governo  interino, o assessor foi exonerado menos de 24 horas depois da nomeação.

Para Leher, a peculiaridade deste momento, no Brasil e no mundo, é o fato de — como nem sempre acontece — a “aliança econômica da burguesia” precisar estar associada com a pauta da ultradireita. Segundo ele, essa tem sido a principal saída encontrada para a crise, o que, na sua leitura, significa um caminho para retomar as taxas de lucro do grande empresariado.  “Para isso, foi preciso destituir um governo com o apoio da bancada ultrafundamentalista. Portanto ,a relação do governo com essa bancada é intrínseca, um depende do outro”, disse. E alertou: “Estamos diante do que Walter Benjamin chamou de ‘aviso de incêndio’”.

Gaudêncio também localizou o Escola sem Partido na origem de um “golpismo” que, nas suas palavras, atingiu não apenas ou principalmente o governo Dilma Rousseff, mas sim o que ele chamou de “parca sociedade democrática” brasileira. A gênese mais imediata desse processo estaria, segundo o professor, num certo “estado de exceção” imposto pelo neoliberalismo quando, no Brasil e no mundo, os bancos centrais se tornaram “ad hoc” dos governos, substituindo as decisões do conjunto da sociedade.

Mas, no que diz respeito à escola pública, Gaudêncio identificou o Escola sem Partido como herdeiro também de um processo de “desautorização” e privatização que vem se dando desde a década de 1980. Segundo ele, esse ataque à autonomia da escola começou pela gestão, crescentemente contaminada por uma lógica privada, muitas vezes até com gestores privados. Em seguida, disse, mirou-se nos professores, que passaram a ser alvos de “especialistas que dão as regras do bem ensinar”, processo que culminou com a disseminação de apostilas e sistemas de ensino padronizados produzidos por entidades ligadas a grandes grupos empresariais que são vendidos para as secretarias de educação. Nesse trajeto, destacou Gaudêncio, assistiu-se a um “sequestro paulatino da função do mestre”. “Agora querem tomar a palavra do professor, dizer o que ele pode dizer”, resumiu.

Qual partido?

Seja nas palestras de abertura e encerramento, de Gaudêncio Frigotto e Roberto Leher, seja nas falas das entidades e movimentos sociais, o encontro marcou um consenso em torno da ideia de que o que o projeto de lei visa instituir não é uma escola sem partido, mas uma escola de partido único ou que atenda a interesses de partidos específicos. O primeiro destaque da fala do reitor da UFRJ foi exatamente o fato de o deputado que apresentou o PL na Câmara ser do PSDB, do qual faz parte também o deputado Rogério Marinho, que submeteu projeto de teor semelhante, tipificando o crime de “assédio ideológico”, com foco nos professores.

Mas, para as entidades que compõem a recém-criada Frente, a caracterização do ‘partido’ que orientaria o movimento vai além das siglas eleitorais. “É o partido único da xenofobia, da não-controvérsia, da ideologia única do mercado”, descreveu Gaudêncio. “É, na verdade, a escola de um partido só, que reproduz o racismo e o machismo em sala de aula”, classificou a representante da Federação Nacional dos Estudantes de Escolas Técnicas (Fenet). “É a versão acabada do fascismo”, apontou o representante da Intersindical. Mesmo antes do encontro, o manifesto que convocou a construção da Frente resumia: “Defender a escola sem partido é defender a escola com apenas um partido. Partido daqueles que são contra uma educação laica e contra o debate sobre gênero, fortalecendo assim a cultura do estupro e a LGBTTIfobia presente em nosso país. Defendemos a escola crítica sim, a educação libertadora, a pluralidade de ideias e a liberdade de expressão e pensamento”, diz o texto.

Frente de atuação

A iniciativa de construir uma Frente Nacional contra o projeto Escola sem Partido nasceu durante o 2º Encontro Nacional de Educação (ENE), realizado entre 16 e 18 de junho — na mesma data e no mesmo local em que o ENE acontecia, alunos da Universidade de Brasília foram alvo de ataques racistas e homofóbicos de um grupo de manifestantes de ultradireita. O manifesto de convocação é assinado por mais de cem entidades, que envolvem sindicatos e centrais sindicais, partidos políticos e mandatos de parlamentares, entidades estudantis e movimentos sociais em geral, entre outros. Da publicização do manifesto até o lançamento da iniciativa, muitas outras organizações se juntaram para compor a Frente.


Segundo informações do professor Fernando Penna, da Universidade Federal Fluminense, apresentadas em debate realizado na EPSJV/Fiocruz no último dia 8 de julho, o PL do Escola sem Partido tramita hoje em dez estados e vários municípios brasileiros, além do distrito federal e da Câmara dos Deputados. Recentemente, foi aprovado em Alagoas. Alegando que o professor em sala de aula não tem direito à liberdade de expressão, mas apenas à liberdade de cátedra, para o movimento Escola sem Partido a “doutrinação ideológica” pode estar  expressa na ideia de que a escola dever “formar para a cidadania”; no debate de acontecimentos atuais promovido pelo professor em sala de aula; no tratamento de questões ligadas à “moralidade”, que envolvam cultura religiosa ou discussões de gênero, por exemplo; ou na simples leitura de autores considerados “doutrinadores” de esquerda – entre eles, estão Antonio Gramsci e Paulo Freire. Diante dessa amplitude, a ideia da construção de uma Frente, expressa no seu manifesto de convocação, é que, para combater a ofensiva desse projeto, “não são mais suficientes as iniciativas isoladas”.


Foto: Samuel Rosa.

O que os homens têm a ganhar com o feminismo?



O machismo e o patriarcado são, por definição, sistemas que hierarquizam os papéis de homens e mulheres, dando mais valor para tudo que é entendido como masculino. Por sermos nós as mais violentadas nessa configuração é óbvio que vamos lutar para destruí-lo e não pararemos enquanto houver uma mulher sofrendo no mundo. Mas será que só as mulheres saem ganhando com o feminismo?

Publicado originalmente no Ceert

Eu tenho certeza que não. Simplesmente porque o feminismo preza pela igualdade e pela liberdade de cada um ser como quiser, independentemente de seu gênero. E o machismo também impõe uma série de pressões nos meninos e homens.

Não pode chorar, não pode demonstrar fraqueza, não pode explicitar sentimentos, tem que gostar de futebol, de azul e de mulher. Não pode gostar de dança, de rosa e de estudar. Tem que ser o provedor, o responsável por sustentar a família, não pode ganhar menos do que a mulher. Tem que ser uma máquina incontrolável de sexo, tem que ser corajoso, não pode ter medo do perigo, tem que saber trocar pneu.

Simplesmente não há ser humano que consiga viver dessa maneira sem nenhum tipo de conflito. O machismo demanda coisas impossíveis para homens e mulheres e isso geralmente acompanha uma boa carga de tensão e sofrimento. Não há motivo, portanto, para ele continuar hegemônico.

Nunca, jamais, em hipótese alguma insinuo que homens e mulheres são afetados da mesma forma por esse sistema. Nunca, jamais, em hipótese alguma. Os meninos podem ser cerceados em diversos aspectos, sim, podem ter que seguir padrões e estereótipos com os quais não se sentem confortáveis, mas não são violentados sistematicamente em função de seu gênero. Não são abusados, estuprados e assassinados em massa POR CONTA de valores difundidos socialmente para cada um dos gêneros. Não é a vida deles que vale menos.

Mesmo com normas tão rígidas, o machismo nunca destituiu os homens de sua humanidade. Já as mulheres são constantemente objetificadas e, em todas partes do mundo, valem menos. E é por isso que temos tanta raiva, e é por isso que nós protagonizamos o movimento em busca de nossa plena cidadania. É por isso também que entendo a reação feroz que o feminismo causa na maioria dos homens: não é mesmo confortável abrir mão de seus privilégios. Deve ser horrível ver cada vez mais mulheres reivindicando aquilo que é seu por direito – e que inclui tirar a liberdade de oprimir e o conforto da impunidade.

Mas o feminismo traz outras liberdades, eu garanto. Em um mundo onde o patriarcado não dita a nota, todas as relações são mais saudáveis. Ninguém é obrigado a gostar de algo ou alguém só porque é menino ou menina. Todo mundo é livre para ser o que é. É esse o mundo que eu luto para construir e que, mais cedo ou mais tarde, vai bater na sua porta. Não precisa oferecer resistência.

Foto: Divulgação "Tha Mask you live in".