|
O
Sítio Santa é o mais importante da região, pela
raridade dos grafismos achados
no local. Apesar da
importância, há um processo de degradação
FOTO: HÉLIO FILHO
|
Arqueóloga
alerta para a união de forças, envolvendo para o setor público e privado, para
a preservação das áreas.
Nova Olinda.
Uma área ainda pouco estudada na região e que já exibem os seus diversos
espaços ameaçados pela ação natural e também do homem, em virtude do
desconhecimento da importância desse material e dos locais como objeto de
estudo e pesquisas. Assim está a realidade dos sítios arqueológicos da região
do Cariri. Todos eles, inseridos em áreas particulares.
São
cerca de 50 entre os já identificados, tanto líticos como os rupestres, que
abrigam material raro, com gravuras únicas de conhecimento dos estudiosos, já
vistas no Brasil.
Mesmo
com um trabalho de duas décadas realizado, por meio de estudos desenvolvidos
pela arqueóloga Rosiane Limaverde, por meio da Fundação Casa Grande - Memorial
do Homem Kariri, ela faz o alerta para a efetiva união de forças institucionais
para a garantia futura desses espaços destinados às descobertas no campo da ciência.
Os
sítios arqueológicos do Cariri estão localizados nos abrigos da Chapada do
Araripe, em que são guardados vestígios de bandos humanos, quando o homem
habitava cavernas. Esses locais estão em áreas de até 800 metros de altitude e
que podem identificar a presença de vida humana há mais de 9 mil anos na
região. O homem chegou ao Cariri pela rota das águas.
Depois
de concluir o mestrado com abordagem para os principais sítios arqueológicos, a
arqueóloga Rosiane Limaverde, agora lança mão de um estudo voltado para a
educação patrimonial e o trabalho social em torno do projeto de duas décadas
desenvolvido pela fundação. Essa segunda parte está inserida em sua tese de
doutorado na Universidade de Coimbra, em Portugal, também parceira da Casa
Grande. Na instituição, em Nova Olinda, há um núcleo de trabalho voltado para
as pesquisas no âmbito da arqueologia, com um laboratório destinado às
pesquisas.
O
intuito da pesquisadora, no momento, é poder contribuir para uma abertura maior
desse campo de estudo na região. E espera que instituições como a Universidade
Regional do Cariri (Urca), e o próprio Geopark Araripe, encampem junto com a
Casa Grande, a construção de um novo cenário de estudo e preservação, além da
formação de novos estudiosos da área. O processo passa, também, pela
conscientização dos proprietários desses espaços onde estão localizados os
sítios.
Interdisciplinar
O
mais recente trabalho coordenado pela arqueóloga foi no sítio Lagoa Encantada,
na cidade de Crato. O trabalho interdisciplinar, que visa também a formação e a
educação patrimonial, em parceria com instituições como a Universidade Federal
de Pernambuco (UFPE), foi responsável pela coleta de um farto material cerâmico
que, nos próximos dias, terá amostras encaminhadas para Miami, nos Estados
Unidos, para estudos de datação, através do carbono 14. Além desse material, os
vestígios de uma fogueira, encontrada no sítio Olho D´água, no município de
Nova Olinda.
A
pesquisadora vem acompanhando todo o processo de degradação desses espaços ao longo
de duas décadas, mesmo com o trabalho de conservação das áreas que tem feito, à
medida das possibilidades dos estudiosos, levando a orientação aos moradores
dos locais incidentes.
Conscientização
Geralmente
se encontra em áreas particulares, e esse tem sido o grande problema, já que
são poucos os proprietários que entendem realmente a necessidade de
preservação. "É importante fortalecer mesmo esse trabalho junto às comunidades",
enfatiza a arqueóloga.
A
ação do homem pode ser vista em sítios como o Anauá, na cidade de Mauriti. Em
cima de uma inscrição de milhares de anos, há pichações. No Santa Fé, há uma
das mais raras gravuras com uma pintura, diferenciando-a das demais, dando
maior profundidade ao registro, e Rosiane destaca principalmente a ação do
tempo nessa área ao longo dos anos, como a chuva e erosão, além das
infiltrações, que aos poucos está desgastando o sítio. "E nesse local,
pelo menos, contamos com a compreensão dos proprietários que reconhecem a
importância do que ali está", diz ela.
São
gravuras de tuiuiús, pássaros mais comuns em área da Amazônia, mas que em
determinado momento havia um manancial aquífero maior na região, e essas aves
abrigaram-se nas matas do Araripe. "É um registro que causa uma ilusão de
ótica, de perspectiva e profundidade, dentro da sua elaboração técnica",
explica. Os grafismos têm uma característica importante para um grupo
pré-histórico, conforme a pesquisadora, com técnica singular aos povos que
habitaram a área da Chapada do Araripe. É também o sítio mais alto da região,
com 800 metros de altitude, num abrigo sobre rocha e com características únicas
no Brasil.
Mas
nem sempre se pode ter a compreensão dos moradores em relação aos achados. No
recente local onde foram feitas escavações, ano passado, foram encontrados
artefatos cerâmicos e possivelmente vestígios de uma urna funerária,
pertencente aos índios, que se alojavam às margens do rio. Uma espécie de prato
de barro, com desenhos indígenas, foi levado por um motorista que trabalhava no
carregamento de areia.
Até
hoje não se tem notícia do paradeiro do material, que deveria ser objeto de
estudo. Técnicos do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
(Iphan) vieram ao sítio e interditaram o espaço, para que fosse feito um
trabalho de pesquisa e análise arqueológica. A área é toda possuidora desses artefatos,
segundo a arqueóloga.
O
grande problema tem sido a conscientização da população em relatar a existência
dessas áreas e chegam a destruir muito material encontrado. Alguns por medo de
ter áreas de terra interditadas e outros por total desconhecimento do que
representa o achado. Para isso, segundo Rosiane Limaverde, torna-se de grande
importância a atuação do Iphan, não apenas para interditar áreas, mas como
agente nesse processo de educação patrimonial. A Casa Grande é o único espaço
no Interior do Estado, de salvaguarda do órgão, com reconhecimento nacional e
internacional.
Pesquisadora defende ação
educacional
Nova Olinda.
Um trabalho de educação patrimonial da Fundação Casa Grande, que abriga peças
indígenas e todo um material coletado em anos de atividade na área da
arqueologia, tem sido desenvolvido desde que a instituição foi criada, por
Alemberg Quindins e Rosiane Limaverde. De lá para cá, são muitos os
interessados em ter uma formação na área e que têm como principal referencial a
fundação para realizarem pesquisas.
|
Com
o objetivo de contribuir para a preservação dos espaços
históricos, a
arqueóloga Rosiane Limaverde lança agora
mão de um estudo voltado para a
educação patrimonial
e o trabalho social em torno do projeto realizado
há cerca
de duas décadas.
|
A
pretensão é que haja um fortalecimento dessa atividade, com a presença de
grandes pesquisadores do Brasil e até de outros países, de forma mais frequente
no Cariri.
A
perspectiva empreendida pela fundação, com apoio de outros órgãos de fomento de
estudos na área, é que haja um reconhecimento maior de todo o trabalho
desenvolvido até o momento, para que novos cursos possam ser criados, nas áreas
de graduação e pós-graduação.
E
mais do que isso, segundo Rosiane Limaverde, que o Cariri não perca a
oportunidade de criar na região o primeiro curso de arqueologia do Estado do
Ceará. O trabalho de conservação dos espaços identificados poderá avançar com a
atuação de profissionais unicamente com a conservação. Conforme a pesquisadora,
no caso do sítio Santa Fé, pode ser feita uma consolidação do painel, de forma
que as gravuras não sejam afetadas e não exista um impacto visual que danifique
o espaço. "Com isso, há condições de consolidar a área para que dure mais
anos, com disponibilidade para estudos", afirma.
A
proposta de conservação, por meio de uma ação conjunta, chegou a ser
apresentada há alguns anos junto ao Iphan, mas não houve resposta relacionada a
um possível trabalho na área.
Mesmo
com o desaparecimento do painel, principalmente pela ação do tempo, a fundação
realizou registros minuciosos do sítio Santa Fé, o que poderá facilitar estudos
futuros.
As
principais cidades onde ocorrem os achados, não por acaso, estão dentro da área
do Geopark Araripe, e é dentro dos grandes sítios cerâmicos onde tem ocorrido o
extravio da maioria das peças que poderiam estar sendo destinadas a estudos da
presença pré-histórica do homem na região do Cariri. "São grandes sítios
cerâmicos que estão sendo destruídos, nesse caso pela degradação", diz.
Legado
A
pesquisadora ressalta a importância da ação mais ativa de instituições quanto
ao patrimônio arqueológico existente na região. "É um grande legado que
pode se perder por falta de estudo", afirma. A Casa Grande, segundo ela,
surgiu no intuito de reunir esse material que existia espalhado na região e a
instituição iniciou uma luta de preservação desses sítios.
A
formação patrimonial acontece desde os pequenos recepcionistas do memorial.
Eles estudam o que é arqueologia além de manter contato com o laboratório,
acervo, e as análises que são feitas em material cerâmico e lítico. No
laboratório é feita a catalogação e registros rupestres. Mas, Rosiane alerta
para uma educação patrimonial mais intensa, com apoio do Iphan e da
universidade. A fundação, conforme ela, pode ser interlocutora nesse sentido,
com todos os agentes envolvidos no processo.
"Só
um processo contínuo desse trabalho educacional é capaz de conter ações de
degradação desse patrimônio", enfatiza.
Identificação
50
sítios rupestres e cerâmicos já foram catalogados em áreas da Chapada do
Araripe. Todos são de propriedade particular, e parte deles está sendo
degradada
Mais informações:
Memorial
do Homem Kariri
Rua
Ratisbona, 564
Centro
- Crato/ CE
Telefone:
(88) 3521.8133
ELIZÂNGELA
SANTOS
REPÓRTER
Fonte: Diário do Nordeste