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Vencermos por ser iguais ou por sermos diferentes



Reproduzimos abaixo excelente artigo intitulado “Vencermos por ser iguais ou por sermos diferentes”?. Aqui há uma excelente análise político-econômica do Brasil que perpassa por discussões que, segundo o autor,  só interessa a direita. O texto foi publicado no blog Tijolaço.


Vamos a ele


Ter, por dever de ofício, de ler o noticiário político brasileiro todos os dias é algo que deixa a gente desanimado.

Talvez seja por isso que enfado tanto os leitores e leitoras deste blog com questões econômicas.

Porque, convenhamos, discutir se o prato de peixe que Dilma Rousseff comeu em Lisboa custou 40 ou 70 euros é de doer.

Até porque. todos sabem – inclusive a mídia – que ela é uma pessoa de hábitos pessoais austeros.

Pior ainda é aceitarmos a discussão do “vai ter ou não vai ter Copa”.

Será possível que não se enxergue que isso é uma falsa discussão, que só interessa aos provocadores da direita?

Que tudo o que se tiver, eventualmente, sido gasto em exageros não atinge sequer o que pagaremos por um mísero único dos vários pontos percentuais que se acrescentaram à nossa taxa de juros?

Que, aliás, não gera “indignados” em parte alguma entre estes grupos, não é?

Enquanto isso, vamos deixando de lado qualquer debate sobre os caminhos do Brasil.

A política econômica tornou-se uma administração de varejos da pior qualidade.

O governo, preocupado em adular os “mercados”, como se eles gostassem de adulação, enquanto gostam mesmo é de dinheiro.

A oposição, com um discurso que, em relação a esse mercado, já nem é de adulação, mas de capachismo, mesmo.

Enquanto isso, lá fora, ronca nas entranhas do Federal Reserve uma elevação nas taxas de juros americanas que, só de ameçar, já abala as moedas mundo afora.

Por toda parte sente-se uma ausência que, acreditem, se reflete nas ruas e é extremamente perigosa ao processo eleitoral.

Que só não se complica porque temos uma oposição que, francamente, só é nanica porque a mídia lhe dá alguns centímetros mais de altura para que apareça mais alto que o pó do chão.

Seria muito bom se os líderes do PT e os “gênios da comunicação” do governo, em lugar de ficar pensando em soltar uma pombinha branca nos estádios para promover a paz, como sugeriu a D. Helena Chagas outro dia, entendessem que este projeto político iniciado em 2002, venceu duas eleições, em 2006 e 2010, porque soube apontar um projeto, um caminho para o país.

Em 2006, o que significava não retroceder aos tempos da alienação de nossas riquezas e empresas públicas.

Em 2010, o de avançar ao desenvolvimento e a um Brasil do tamanho que ele pode ter e terá.

Em 2014, certamente não será por sermos bonzinhos, fazermos “tudo o que o seu mestre mercado mandar” que eles nos deixão ficar mais um pouquinho “na pracinha”.

Obvio que não se sugere aqui nenhuma política do tipo “força cega”. A política real, das alianças, da administração de alianças e meios eleitorais é importante e precisa ser feito por gente capaz, não por tecnocratas.

Mas nunca será bem-sucedida se não se puder representar, diante da população, um horizonte que a anime a fazer verdadeiros os versos que dizem que “quem sabe onde quer chegar, escolhe o caminho certo e o jeito de caminhar”.

E, neste Brasil de hoje, depois de anos em que a esquerda abriu mão, no dia a dia, do debate ideológico e que não conseguiu dar corpo físico às conquistas e desafios do Brasil, só resta uma figura capaz de provocar uma mudança no diapasão da política.

Lula.

Sua ausência prejudica o próprio desempenho de Dilma, que está, como todos sabem, manietada por um “politicamente correto” que limita sua capacidade de polemizar.

O ex-presidente – que já considera acelerar  sua reentrada na cena político-eleitoral –  precisa entrar logo neste ringue.

E levar a contenda para onde ela está, de fato, e onde ela vai decidir algo essencial, não insignificâncias: o rumo do desenvolvimento brasileiro.

Porque, se é para “acalmar o mercado” sendo “bonzinho”, melhor chamar o Palocci  ou o Meirelles.

Não vencemos as eleições, uma vez depois da outra, por sermos iguais, mas por sermos diferentes.

Michel Foucault e o neoliberalismo




O Filósofo Foulcault dá importância secundária à hipótese
 mais óbvia sobre a arte neoliberal de governar
O mundo se abriu para o novo milênio dominado por certezas que hoje se desmancham sob a ação demolidora da crise financeira. A ideologia neoliberal, quase sem resistências, tentou demonstrar que, com a queda do Muro de Berlim, o espaço político e econômico tornou-se mais homogêneo, menos conflitivo, com a concordância a respeito das tendências da economia e das sociedades. 

Não há mais razão, diziam, para se colocar em discussão questões anacrônicas, como a reprodução das desigualdades ou as tendências dos mercados a sair dos trilhos, frequentemente destrambelhados pelos excessos nascidos de suas engrenagens.

Após a crise, os porta-vozes desse quase consenso, economistas e que tais, recolheram-se ao silêncio. Passado o vendaval que ajudaram a semear, já agarrados aos salva-vidas lançados pela famigerada intervenção dos governos, entregaram-se a tortuosas e acrobáticas manobras para justificar suas convicções.

Michel Foucault, um dos pensadores mais fecundos do século XX, não é economista. Talvez por isso tenha compreendido com maior abrangência e profundidade o significado do neoliberalismo. Contrariamente ao que imaginam detratores e adeptos, diz ele, o neoliberalismo é uma “prática de governo” na sociedade contemporânea. O credo neoliberal não pretende suprimir a ação do Estado, mas, sim, “introduzir a regulação do mercado como princípio regulador da sociedade”.

Foucault dá importância secundária à hipótese mais óbvia sobre a arte neoliberal de governar, a que afirma a imposição do predomínio das formas mercantis sobre o conjunto das relações sociais. Para o filósofo, “a sociedade regulada com base no mercado em que pensam os neoliberais é uma sociedade em que o princípio regulador não é tanto a troca de mercadorias quanto os mecanismos da concorrência... Trata-se de fazer do mercado, da concorrência, e, por consequência, da empresa, o que poderíamos chamar de ‘poder enformador da sociedade’”.

As transformações ocorridas nas últimas décadas deram origem a fenômenos correlacionados que não se coadunam com os princípios do liberalismo clássico e sua imaginária concorrência perfeita protagonizada por um enxame de pequenas empresas sem poder de mercado.

A nova concorrência louvada pelos neoliberais admite a “centralização” da propriedade e o controle dos blocos de capital. O processo se deu pela escalada dos negócios de fusões e aquisições, alentada pela forte capitalização das bolsas de valores nos anos 80, 90 e 2000, a despeito de episódios de “ajustamento de preços”. A “terceirização” das funções não essenciais à operação do core business aprofundou a divisão social do trabalho e propiciou a especialização e os ganhos de eficiência microeconômica, além de avanços na produtividade social do trabalho.

A grande empresa que se lança às incertezas da concorrência global necessita cada vez mais do apoio de condições institucionais e legais – sobretudo na derrogação das regras de proteção aos trabalhadores – que a habilitem à disputa com os rivais em seu próprio mercado e em outras regiões.

Elas dependem do apoio e da influência política de seus Estados Nacionais para penetrar em terceiros mercados (acordos de garantia de investimentos, patentes etc.), não podem prescindir do financiamento público para exportar nos setores mais dinâmicos, não devem ser oneradas com encargos tributários excessivos e correm o risco de serem deslocadas pela concorrência sem o benefício dos sistemas nacionais de educação e de ciência e tecnologia.

Tanto a “nova ordem mundial” como a sua crise foram construídas e deflagradas no jogo estratégico disputado entre as empresas globais e seus respectivos Estados. Esse fenômeno político-econômico envolveu os protagonistas relevantes da cena global: os Estados Unidos, apoiados em sua liderança financeira e monetária, e a China, ancorada em sua crescente superioridade manufatureira.

A superação da crise atual não depende apenas da ação competente dos Tesouros Nacionais e dos Bancos Centrais, mas supõe um delicado rearranjo das relações políticas e concorrenciais que sustentaram o modelo sino-americano. Parece que não é fácil.