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No Brasil, presidente escolhe membros do Supremo e Senado Federal aprova os indicados. |
Uma
proposta de emenda constitucional da deputada Luiza Erundina (PSB-SP) propõe
significativas mudanças no Supremo Tribunal Federal, a começar por sua
composição, passando pela alteração na sistemática da nomeação de seus
ministros e até mesmo alterando suas atribuições.
A
PEC 275/13 aguarda análise pela Comissão de Constituição e Justiça e de
Cidadania (CCJC) da Câmara dos Deputados. O relator é o deputado Beto
Albuquerque (PSB-RS). Se aprovada no colegiado, será encaminhada a uma comissão
especial e depois votada em dois turnos pelo Plenário.
Pela
proposta, o tribunal seria transformado em uma corte estritamente
constitucional, deixando de julgar processos de interesse individual ou de
grupos privados, sem relevância na Constituição, e o número de ministros seria
aumentado de 11 para 15. A PEC prevê que os atuais componentes do STF
permaneceriam no cargo.
Os
que começarem a entrar com a eventual aprovação da proposta serão nomeados pelo
presidente do Congresso Nacional, após aprovação de seus nomes pela maioria
absoluta dos membros da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, a partir de
listas tríplices de candidatos elaboradas pelo Conselho Nacional de Justiça,
Conselho Nacional do Ministério Público e Conselho Federal da Ordem dos
Advogados do Brasil. Atualmente, os ministros são nomeados pelo presidente da
República e aprovados pelo Senado. Eles ficam no cargo desde sua indicação até
a aposentadoria compulsória, aos 70 anos.
De
acordo com a PEC, a competência do que a autora chama de nova Corte
Constitucional será limitada às causas que dizem respeito apenas à
interpretação e aplicação da Constituição. As que não tiverem esse caráter
seriam de competência do Superior Tribunal de Justiça (STJ), cuja composição
também aumentaria, de 33 para 60 ministros.
Para
o advogado Marcelo Figueiredo, professor de Direito Constitucional da PUC-SP,
presidente da Comissão de Estudos Constitucionais da OAB-SP e membro da
Comissão de Estudos Constitucionais do Conselho Federal da OAB, a proposta de
Erundina é correta “no sentido de não mexer com quem está lá, deixando os
atuais ministros se aposentarem ir mudando devagar”.
No
entanto, ele defende que é preciso “discutir o modelo” de tribunal adequado ao
Brasil, “chamar a sociedade, a OAB, os presidentes das cortes mais importantes
do mundo, para ver as vantagens e desvantagens de termos uma suprema corte,
como é hoje, mas aperfeiçoada, ou um tribunal constitucional. O problema é que
o Congresso no Brasil não discute mais nada”.
Aqui,
vigora o modelo norte-americano, um tribunal que julga matéria constitucional
mas também casos “normais”, que chegam como recurso a decisões de outras
instâncias. "A dificuldade é que nossa Constituição é muito analítica e
praticamente tudo pode ser considerado constitucional, tudo pode subir [ao STF],
desde que se tenha um bom advogado e puxe para um tema constitucional",
explica o advogado.
Figueiredo
diz preferir o modelo europeu, em que há um tribunal estruturado "acima ou
fora da Justiça”.
“Na Europa, a corte constitucional não
integra necessariamente o poder judiciário, é um quarto poder, digamos assim.
Há juízes, em geral, com mandato, que varia de oito a 12 ou 13 anos. Como
chegam lá depende do país: em alguns há uma cota por origem, como por exemplo:
um terço de professores de direito, um terço de juízes, um terço de promotores.
Em outros são nomeados pela Câmara, Senado e pelo presidente, e assim por
diante”.
Europa e América do Sul
Figueiredo
afirma que as cortes constitucionais de Portugal, Alemanha e Espanha são
exemplos de instituições prestigiadas, cujas jurisprudências são citadas em
julgamentos em todo o mundo. “Se não fossem bons ninguém citava.”
Na
América do Sul, o advogado menciona a Corte Constitucional da Colômbia, criada
em 1991, como “avançada e afinada com a
Corte Interamericana de Direitos Humanos, e a do Peru, excelente também, porque
tem juízes que ficam por um mandato, e são pessoas muito respeitadas que vêm da
academia ou da advocacia”.
Na
Justificativa da PEC, Erundina diz que a escolha, feita apenas pelo presidente
da República e aprovada pelo Senado, acaba tornando o processo brasileiro
objeto de pressões políticas.
Porém,
para o presidente da Comissão de Estudos Constitucionais do Conselho Federal da
OAB, o problema não está na origem da indicação e a questão da indicação mudar
do presidente para a lista tríplice proposta pela deputada não é
necessariamente uma solução.
A
indicação dos componentes só ser feita só por instituições ligadas ao Direito,
como determina a PEC, não é uma garantia de melhoria, diz o advogado, já que o
indicado ser membro do CNJ, um promotor ou um juiz não significa que seja o
mais capacitado. “Fica uma coisa
corporativa. Quem disse que as entidades vão indicar os melhores e não vão
fazer política? Ou um ex-presidente da Ordem ser indicado só porque é
ex-presidente? Isso é muito relativo. O
ponto é outro: como fazer para os juristas mais competentes e melhores estarem no tribunal mais
importante. Esse é o ponto.”
Segundo
Figueiredo, no modelo atual, se o STF não é composto pelos melhores
representantes do Direito, “o culpado
dessa situação é o Senado”. “Por que
o Senado não rejeita? Por que não rejeitaram o Dias Toffoli? Foi advogado do
ex-presidente Lula, não tem experiência, não tem obras publicadas."
Com
a lista tríplice oriunda do MP, da OAB e do CNJ para a nomeação dos ministros
da corte constitucional, o que Erundina pretende com a PEC 275/13 é
democratizar o processo, acabando com o automatismo que faz do Senado apenas o
órgão que carimba a escolha do presidente da República. Esse automatismo, dizem
especialistas, é institucional e independe da orientação politica do
presidente: o processo se dá seja no regime militar (1964-1985), no governo de
Fernando Henrique (1995-2002) ou no de Lula e Dilma Rousseff (2003-2014).
Modelo colombiano
Na
Colômbia, a Constituição de 1991 criou a Corte Constitucional, separada da
Corte Suprema de Justiça (equivalente ao nosso STF) e responsável por julgar
apenas temas constitucionais. A Corte Constitucional colombiana é integrada por
nove magistrados, escolhidos pelo Senado para períodos de oito anos, a partir
de listas apresentadas pelo presidente da República, pela própria Corte Suprema
de Justiça e pelo Conselho de Estado.
Marcelo
Figueiredo considera “difícil, pelo
conservadorismo político”, uma transformação profunda do sistema
brasileiro. “Mudar uma instituição
radicalmente é difícil. Quem está nela ou no entorno dela reage naturalmente
contra. Vai haver todo o trabalho dos políticos, juízes, a magistratura, o CNJ
etc., que apoiam o Supremo. O STF tem muita força hoje no Brasil. Precisamos de
uma proposta de consenso ou de transição, senão eles vão bombardear, porque é
contra eles”, avalia. “Mas se é
preservada a aposentadoria deles, tem mais chance.”
Segundo
Figueiredo, “talvez fosse melhor começar
a reforma pelo mandato. Por exemplo de 13 anos, porque iria renovando o
tribunal até chegar aos 15 ministros”.
Via
Rede Brasil Atual