Por
6 votos a 5, o Supremo Tribunal Federal (STF), considerou constitucional o
ensino público religioso confessional, ou seja, ligado a uma crença específica.
Ministros rejeitaram a ação da Procuradoria Geral da República para que as
aulas fossem genéricas e abordassem aspectos históricos e sociais das
religiões. A partir do julgamento, a matéria confessional pode ser oferecida
pelas escolas públicas de forma facultativa.
Votaram
pela manutenção do ensino confessional os ministros Alexandre de Moraes, Luiz
Edson Fachin, Gilmar Mendes, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e Cármen Lúcia,
que desempatou o caso.
Os
ministros Luís Roberto Barroso, Rosa Weber, Luiz Fux, Marco Aurélio, Celso de
Mello votaram contra.
Apesar
do placar apertado, a decisão causou espanto na comunidade jurídica. Para quem
não entendeu a dimensão do que foi julgado, vale destacar que a corte autorizou
que escolas públicas de todo o país instituam para seus alunos e alunas ensino
religioso confessional – isto é, com crença religiosa. Logo, um ensino
confessional teria oração, costumes e tudo o que está ligada à determinada
religião. No Brasil, de imensa maioria cristã, é possível imaginar quais
religiões serão professadas.
O
Justificando conversou com diversos pensadores do Direito e de outras áreas do
conhecimento, que rebateram a decisão sob o argumento da violação ao estado
laico, das evidentes prioridades reacionárias da corte, e do “ingenuidade” da
corte ao estabelecer a ideia de que o ensino será pluralista. As declarações
sobre a decisão podem ser lidas abaixo:
Eloísa Machado, Doutora em Direito
Constitucional e Coordenadora do curso de Direito da FGV-SP
“A decisão do STF é um grande retrocesso. Toda
uma pauta liberal e progressista que vem sofrendo investidas conservadoras no
legislativo e no executivo e que ainda aguarda posição do STF fica em suspenso:
de código florestal a direito mudança de registro civil das trans.
Assumir a confessionalidade do
ensino, além afetar profundamente a lógica do que deve ser a educação pública,
laica e inclusiva, abre espaço para uma infinidade de outros problemas. É
inadmissível, por exemplo, que os escassos recursos públicos sustentem a
doutrinação religiosa nas escolas. Mas o STF não se pronunciou sobre isso”.
Joice Berth, Feminista negra:
“Trevas. Essa decisão é mais uma assunção de
racismo por parte do nosso sistema judiciário, pois sabemos que não será ensino
religioso de maneira abrangente e democrática, será sim um esquema de
doutrinação neopentecostal, uma imposição de pensamento evangélico, já que essa
é uma bancada que só cresce dentro de todas as estruturas políticas. Lamentável
e que os pais estejam atentos a essa agressão fascista a laicidade do estado
brasileiro”.
Luis Felipe Miguel, Professor de
ciência política na UnB:
“O ensino religioso no Estado laico é uma
excrescência. Se as famílias e as igrejas querem dar educação doutrinal às suas
crianças, que o façam em seus próprios espaços. Ao interpretar a regra
constitucional como sendo a necessidade de inculcação da “religiosidade”, o
Supremo rasga a ideia da neutralidade estatal em relação aos diversos sistemas
de crença”.
Márcio Sotelo Felippe, Procurador do
Estado de São Paulo:
“Não temos mais constituição. O STF julga ao
sabor de injunções políticas ou para agradar setores da opinião pública. São
tempos sombrios, uma reação termidoriana que enterra séculos de conquistas
iluministas, de avanços no processo civilizatório. Este é um estado de exceção
com sabor de fascismo. A inteligência está morta no Brasil”
Renan Quinalha, Doutor em Direito e
Professor na Universidade Federal de São Paulo:
“A decisão do STF faz com que o Estado laico
promova, nas escolas públicas, o ensino religioso confessional. Isso é um
absurdo, pois se está permitindo que religiões se apropriem do espaço público
da escola para propagar sua própria fé. Considerando o contexto atual, isso se
torna ainda mais grave. Os discursos de “escola sem partido” e “combate à
ideologia de gênero” poderão agora contar com o reforço do ensino religioso
confessional nas escolas, minando o que restava de laicidade do Estado no
sistema de ensino”.
Alexandre Melo Franco Bahia,
Professor Doutor de Direito Constitucional na Universidade Federal de Ouro
Preto:
“A decisão do STF afirmando que o Estado
Brasileiro deve custear um Ensino Religioso “Confessional Pluralista” ofende a
tantas ordens diferentes do Direito que fica difícil definir por onde começar.
Como um Estado Laico pode atuar de
forma Confessional? Em que mundo isso faz sentido? Ainda que a maioria queira
dizer que esse ensino deve ser “pluralista”, ou eles são muito “inocentes” – e
não sabem do que é o ensino religioso na maioria das escolas públicas do país,
ou estão assumindo estarem prontos para receberem centenas de pedidos de
Reclamação contra – o que acontece todos os dias e agora só vai piorar – o
proselitismo fundamentalista e, claro, nada plural, que é feito em escolas
públicas todos os dias”. (Com informações do Justificando).