ONG aponta recorde de LGBTS mortos no Brasil em 2017



Até o dia 20 de setembro de 2017, aconteceram 277 homicídios contra LGBTs no Brasil, segundo levantamento do Grupo Gay da Bahia. É a maior média de assassinatos desde que os dados passaram a ser contabilizados, em 1980. Pela primeira vez, a média de mortes ligadas à homofobia passou de um assassinato por dia. Em 2017, a média foi 1,05 mortes por dia. Até então, a maior média tinha sido registrada em 2016, quando aconteceram 343 assassinatos --o equivalente a 0,95 morte por dia.

Do 247 - Como nem todos os casos são notificados, a situação dos LGBTs é ainda pior. Segundo o presidente do GGB, Marcelo Cerqueira, são registrados os casos em que a homofobia ou a transfobia foram um dos motivadores. A brutalidade é marca presente em muitos dos crimes. Para Cerqueira, o aumento de violência ano a ano é resultado de uma série de fatores: impunidade, a vulnerabilidade social e o preconceito contra essas pessoas. O presidente do GGB cobra uma lei que criminalize diretamente a homofobia.

Outra entidade que faz um levantamento de casos é a Rede Trans Brasil. Segundo a coordenadora de comunicação da rede, Sayonara Nogueira, desde 2008 o número só cresce: em 2017, já foram registrados 125 assassinatos. No ano passado inteiro foram 144. Sayonara não acha que exista aumento nesse tipo de crime. A maior notificação acontece por mais circulação de informações e do monitoramento da sociedade sobre esse segmento social.

O Ministério dos Direitos Humanos recebeu 1.876 denúncias de violências contra LGBTs em 2016. Os casos com maior número de registros contra LGBTs são violência física, lesão corporal e maus-tratos, seguidos por homicídios.



Capital Inicial dedica "Que País é esse?" a Temer no último dia do Rock in Rio 2017



A banda Capital Inicial criticou o presidente Michel Temer neste domingo, 24, em show realizado no Rock In Rio, no Palco Mundo. O vocalista Dinho Ouro Preto dedicou a música "Que País é esse?", da Legião Urbana, para o presidente, além de reger um coro contra Temer.

"Essa música é quase um dever cívico tocar. Tem que dedicar a uma longa lista de pessoas, indo de A até Z. Políticos de esquerda, de centro, de direita. Do Aécio à Dilma, ao Eduardo Cunha, Sergio Cabral, Collor. Uma longa lista de políticos que sequestrou a democracia brasileira. Conspiraram contra a esperança de todos nós, cidadãos brasileiros", disse Dinho. "Estou convencido cada vez mais de duas coisas: o poder corrompe e o Brasil é maior e melhor que seus representantes. Essa aqui é pro Michel Temer", completou o vocalista.

Este domingo foi o último dia do Rock in Rio 2017. A noite tinha como atração principal o Red Hot CHili Peppers, 30 Seconds to Mars e The Offspring.


Foto: Reprodução/ O Povo.

Apenas seis brasileiros concentram a mesma riqueza que a metade da população mais pobre



Jorge Paulo Lemann (AB Inbev), Joseph Safra (Banco Safra), Marcel Hermmann Telles (AB Inbev), Carlos Alberto Sicupira (AB Inbev), Eduardo Saverin (Facebook) e Ermirio Pereira de Moraes (Grupo Votorantim) são as seis pessoas mais ricas do Brasil. Eles concentram, juntos, a mesma riqueza que os 100 milhões mais pobres do país, ou seja, a metade da população brasileira (207,7 milhões). Estes seis bilionários, se gastassem um milhão de reais por dia, juntos, levariam 36 anos para esgotar o equivalente ao seu patrimônio. Foi o que revelou um estudo sobre desigualdade realizado pela Oxfam.

Do El Pais Brasil - O levantamento também mostrou que os 5% mais ricos detêm a mesma fatia de renda que os demais 95% da população. E que aqueles que recebem um salário mínimo (937 reais) por mês (cerca de 23% da população brasileira) teriam que trabalhar por 19 anos para obter a mesma renda que os chamados super ricos. Os dados também apontaram para a desigualdade de gênero e raça: mantida a tendência dos últimos 20 anos, mulheres ganharão o mesmo salário que homens em 2047, enquanto negros terão equiparação de renda com brancos somente em 2089.

Segundo Katia Maia, diretora executiva da Oxfam e coordenadora da pesquisa, o Brasil chegou a avançar no caminho rumo à desigualdade nos últimos anos, por meio de programas sociais como o Bolsa Família, mas ainda está muito distante de ser um país que enfrenta a desigualdade como prioridade. Além disso, de acordo com ela, somente aumentar a inclusão dos mais pobres não resolve o problema. "Na base da pirâmide houve inclusão nos últimos anos, mas a questão é o topo", diz. "Ampliar a base é importante, mas existe um limite. E se você não redistribui o que tem no topo, chega um momento em que não tem como ampliar a base", explica.

América Latina

Neste ano, o Brasil despencou 19 posições no ranking de desigualdade social da ONU, figurando entre os 10 mais desiguais do mundo. Na América Latina, só fica atrás da Colômbia e de Honduras. Para alcançar o nível de desigualdade da Argentina, por exemplo, o Brasil levaria 31 anos. Onze anos para alcançar o México, 35 o Uruguai e três o Chile.

Mas para isso, Katia Maia propõe mudanças como uma reforma tributária. "França e Espanha, por exemplo, têm mais impostos do que o Brasil. Mas a nossa tributação está focada nos mais pobres e na classe média", explica ela. "Precisamos de uma tributação justa. Rever nosso imposto de renda, acabar com os paraísos fiscais e cobrar tributo sobre dividendos". Outra coisa importante, segundo Katia Maia, é aproximar a população destes temas. "Reforma tributária é um tema tão distante e tecnocrata, que as pessoas se espantam com o assunto", diz. "A população sabe que paga muitos impostos, mas é importante que a sociedade esteja encaixada neste debate para começar a pressionar o Governo pela reforma".

A aprovação da PEC do teto de gastos, de acordo com Katia Maia, é outro ponto importante. Para ela, é uma medida que deveria ser revertida, caso o país realmente deseje avançar na redução da desigualdade. "É uma medida equivocada", diz. "Se você congela o gasto social, você limita o avanço que o Brasil poderia fazer nesta área". Para ela, mais do que controlar a quantidade do gasto, é preciso controlar o equilíbrio orçamentário e saber executar o gasto.

Além das questões econômicas, o cenário político também é importante neste contexto. "Estamos atravessando um momento de riscos e retrocessos", diz Katia Maia. "Os níveis de desigualdade no Brasil são inaceitáveis, mas, mais do que isso, é possível de ser mudado".

Foto da favela de Santa Marta no Rio de Janeiro. Apu Gomes (AFP).

Paulo Freire exilado mais uma vez?, por Luiza Erundina


A direita raivosa da escola sem partido faz campanha para retirar de Paulo Freire o título de Patrono da Educação Brasileira que lhe foi outorgado pela Lei 12.612, de 13 de abril de 2.012, de minha autoria, e sancionada pela presidente Dilma Rousseff. Justa e merecida homenagem do povo brasileiro, através de seus representantes no Congresso Nacional, a um dos seus maiores mestres da educação, reconhecido e celebrado em todo o mundo.

Publicado originalmente em sua página, no facebook - Só mesmo o obscurantismo da era Temer é capaz de cometer tamanho absurdo que coloca a imagem do Brasil na lata do lixo e a difama diante dos países democráticos e civilizados do mundo, que já se manifestam deplorando a desfeita ao mestre, cujo legado eles admiram.

Espero que a sociedade se manifeste e impeça que essa iniciativa nefasta prospere, o que significaria condenar Paulo Freire ao exílio pela segunda vez. Isso não vamos permitir.

Fortaleza disputará Série B em 2018



O Fortaleza vai disputar a Série B em 2018. Apóis oito anos na Série C, a equipe  conseguiu finalmente a redenção, esperada desde 2010. Neste período foram temporadas de bastante sofrimento, quase rebaixamento para a quarta divisão e insucessos marcantes desde 2012, quando o regulamento registrou a necessidade do mata-mata. 

Do O Povo - O jogo histórico ocorreu neste sábado, em Juiz de Fora, interior de Minas, contra o Tupi, com a presença de quase dois mil torcedores do Fortaleza. Depois de vencer o confronto de ida por 2 a 0, no Castelão, na semana passada, o Tricolor perdeu por 1 a 0, neste sábado, no estádio Mário Helênio, gol marcado por Fernando.

O início do jogo já deu mostra da postura do Fortaleza, esperando as iniciativas do Tupi e tentando sair nos contra-ataques. Logo aos três minutos, em impedimento, a equipe mineira abriu o placar, gol marcado por Romarinho. O time da casa insistia e quase marcou mais duas vezes, novamente com Romarinho, em saída errada de Marcelo Boeck, e com Italo, acertando a trave.

A partir dos 30 minutos os comandados de Antonio Carlos mostraram outra postura. Com mais calma, trocavam passes e tinham em Hiago a saída de segurança e velocidade, especialmente pelo lado esquerdo. Foi assim que o atacante finalizou com perigo em duas oportunidades.

O segundo tempo mais uma vez teve domínio do Tupi. Aos sete minutos, Andrei teve gol anulado também por impedimento e aos 14 minutos foi a vez de Marcelo Boeck - o melhor atleta da campanha do acesso - ser decisivo em chute de Helder, de bicicleta.

Restanto 30 minutos para o acesso e tendo que fazer pelo menos dois gols para levar a decisão para os pênaltis, o Tupi mantinha a postura tática de ataque, mas encontrava até então uma sólida defesa do Fortaleza, que permitia pouco ao adversário.

Aos 36 minutos, o Tupi abriu o placar. Após ótima jogada pela direita, Edmário ajeitou de cabeça para Fernando e o zagueiro fez 1 a 0, na pequena área tricolor. O jogo se tornava ainda mais dramático e, na sequência, Marcelo Boeck fez duas ótimas intervenções.

Nos minutos finais, já com Leandro Cearense e Jô em campo, o Fortaleza, de forma inteligente, segurou a posse de bola no campo de ataque e só restava algo a se fazer, após oito anos: comemorar o acesso.

Foto: Fábio Lima/ O Povo.

Como anda as discussões na Câmara de Altaneira?


A nova legislatura altaneirense começou e com ela novos assentos. Três estreantes e um retorno. Destes, apenas uma mulher garantiu vaga na casa, fazendo com que este número permanecesse o mesmo, já que Lélia de Oliveira não se reelegeu. A casa tem 3 mulheres e 6 homens. Gilson Cruz e Genival Ponciano tiveram o mesmo resultado de Lélia e, Devaldo Nogueira voltou a ocupar cargo de vereador pelo PMDB depois de ter se ausentado nas últimas disputas.

Mas o que esse cenário diz sobre as discussões na Câmara? Em um passado bem recente o legislativo altaneirense era visto pela grande maioria como ineficiente. As desavenças pessoais, as picuinhas e os constantes desrespeitos ao Regimento Interno - espécie de “bíblia” - dos (as) edis superavam as matérias de interesse da coletividade. As expressões “hoje tem sessão” eram facilmente substituídas (e com sinceridade correspondiam aos fatos) por “hoje tem brigas” e “hoje tem mais embates pessoais”.  Esse era o cenário de 2013 a 2016.

2017 começou e parece que o desalento da população com os (as) edis diminuiu. Pouco mais de sete meses de discussões na Câmara e alguns nomes antes mesmo da comunidade elogiar se autoelogiaram. Regimento seguido à risca, conflitos pessoais deixado da porta para fora, harmonia entre oposição e situação e matérias que precisam ir ao encontro dos interesses da coletividade.....  

É bem verdade que o que mais tem chamado à atenção nesse início de trabalho legislativo é o cumprimento do horário das sessões. Esta não vem se alongando por horas e horas como outrora, o que ajuda e muito que discussões fora de propósito ocorram. Mas votando ao parágrafo anterior. Vejo com muita desconfiança e até com receio quem prega a harmonia cega entre polos opostos na administração. Esta é importante, deve SEMPRE ser destacada, mas harmonia não pode e nem deve ser vista como ausência do contraditório – ponto mestre para que se tenha uma gestão eficiente, eficaz, transparente e a serviço da eliminação/diminuição das desigualdades raciais. As questões do nosso país precisam ser vista pelo lado racial e não social.

Quanto ao Regimento Interno, cumpri-lo sem desrespeitá-lo não é uma das tarefas das mais fáceis. Se se levar em conta a comparação que fiz ao iniciar o texto, ela não para por ai. Regimento e Bíblia não só são vistas como base para quem as usa, mas seus usuários e usuárias líderes também se equivalem (com raríssimas exceções). A grande maioria não lê e quando executa a leitura usa em benefício próprio. Espero que essa nova composição legislativa faça diferente.

Mas para quem acompanha semanalmente as sessões percebeu que aqueles velhos conflitos entre oposicionistas e base da administração retornaram. Para quem estava cansado (a) de testemunhar as mesmas músicas tocando.... Pediu para sair do salão. Se a memória não me falha há três sessões um embate entre o vereador Valmir Sousa (PDT) e a vereadora Alice Gonçalves (PRP) chamou a atenção. Ambos discutiam acerca de iluminação do distrito do São Romão. O que deveria ser um debate saudável acabou desembocando para o lado pessoal.

Já na sessão passada.... Figurinhas repetidas e discursos reeditados. Adeilton Silva (PSD) e Flávio Correia (SD) foram os antagonistas da situação. Eles travaram debate para enfatizar o que uma gestão não fez ou não priorizou e o outro o seu inverso.

As sessões melhoraram. É notável, mas parece que o clima saudável do início está retornando para o seu oposto. O que a população mais deseja é que haja mudança, mas não aquela de aparência ou ainda a que se muda para permanecer tal qual outrora. Mas para isso, ela precisa participar. Não só ouvir pela rádio ou acompanhar diretamente no plenário, mas apresentando críticas construtivas, elogios e sugerindo melhorias.

Não sei se ainda é cedo para fazer essa análise, mas tarde nunca é. Posteriormente, o Blog Negro Nicolau irá produzir um artigo acerca do desempenho de cada parlamentar e o grau de importância das matérias apresentadas, discutidas e aprovadas/rejeitadas.

Parlamentares de Altaneira em face de sessão ordinária realizada na última quarta-feira, 20/09. Foto: Júnior Carvalho.



“Paulo Freire nunca foi um doutrinador”, diz em entrevista viúva do educador



A pedagoga e Doutora em Educação, Ana Maria Araújo Freire, que relançou pela editora Paz e Terra a obra Paulo Freire, uma história de vida, vai logo avisando: “não me chama de Doutora, pode me chamar de Nita mesmo. Nem de professora, eu já não estou lecionando. Estou com 83, vou fazer 84”. Nesta entrevista, a viúva de Paulo Freire (1921-1997) relata um pouco do que o educador português Licínio Lima diz no prefácio ser um trabalho ‘incontornável para os estudiosos do pensamento de Paulo Freire’, especialmente pelos documentos inéditos.

Do Extra Classe - Com a intimidade que privou com o patrono da educação brasileira, Nita Freire ainda se coloca na pele daquele que é considerado um dos pensadores mais notáveis da história da pedagogia mundial. Fala do movimento Escola Sem Partido, da violência contra professores e sobre os ataques que Paulo Freire tem recebido de pessoas “do calibre” de Magno Malta e Marco Feliciano. “Tenho pena de todas essas pessoas que se envolveram para levar uma coisa que traduz ignorância, porque o Paulo nunca foi um doutrinador. Pelo contrário, todo o trabalho de Paulo é de conscientização para a autonomia dos sujeitos, para as escolhas dos caminhos que cada homem e cada mulher quiserem tomar”, esclarece.

Extra Classe – O movimento Escola sem Partido e seus simpatizantes atacaram até Paulo Freire nas manifestações a favor do golpe. “Chega de doutrinação marxista. Basta de Paulo Freire”, estava escrito em uma faixa. O que dizer disso?

Ana Maria Araújo Freire – Às vezes causa raiva; às vezes causa compaixão, diante do fato de que ou aquele rapaz que carregava essa faixa foi pago para carregar ou ele próprio confeccionou talvez com amigos. Tenho pena de todas essas pessoas que se envolveram para levar uma coisa que traduz ignorância, porque o Paulo nunca foi um doutrinador. Pelo contrário, todo o trabalho dele é de conscientização para a autonomia dos sujeitos, para as escolhas dos caminhos que cada homem e cada mulher quiserem tomar. O que o Paulo fez foi mostrar que o oprimido tem uma maneira de sair da condição de opressão. Ele se preocupou muito com as condições em quaisquer relações entre as pessoas. Não é justo ser apenas mandado, ser vilipendiado, em condições miseráveis. Essas pessoas têm que ascender socialmente.

EC – Isso tem incomodado muita gente nos últimos anos, não?

Ana Maria – Quem bota essa placa ‘Basta de Paulo Freire’ na realidade não quer uma divisão menos injusta das riquezas do país, não é? Tanto que os governos até FHC calculavam o orçamento da União baseado em 100 milhões de pessoas. Os 53 milhões que estavam de fora, esses não se contavam. Para eles não ia nenhuma obra de escola, de saneamento, de moradia, não ia.

EC – Voltando ao Escola sem Partido…

Ana Maria – Então, esse movimento Escola Sem Partido é uma coisa terrível, porque ele não quer que os alunos reclamem sobre o que a professora por acaso disse de errado ou por ver a professora levando temas da vida real para a sala de aula. De fato, eles não dizem nada e, depois, se queixam dizendo que se tem a obrigação de fazer reclamações para a diretoria. Abriram até um canal, não sei se funcionou, para as crianças escreverem diretamente para o MEC nessa linha: ‘professor tal falou de Marx na aula e disse que ele é muito bom’, por exemplo; falou de Paulo Freire: ‘Foi um homem muito católico, de muita fé, mas que alfabetizava’. Então, a alfabetização ficou no ‘mas que’… Que coisa perigosa!

EC – Não sabem o que estão falando.

Ana Maria – Então, são pessoas desse calibre! Aquele senador do Espírito Santo (Magno Malta – PR), que divulgou isso; que lutou por isto e na televisão está sempre nas discussões sobre esse movimento. Eu ficava boquiaberta sobre o que as pessoas diziam sobre Paulo. Não tinha nada a ver. Não conhecem e entram dentro de escolas fascistas, de ideologias fascistas, onde tudo que não é da dureza, do fascismo, é considerado como nocivo à pessoa e à Nação.
EC – Nesse contexto, além de marcar os 20 anos da morte do patrono da educação brasileira, o que significa para a senhora reeditar a biografia de Paulo Freire?

Ana Maria – Eu tinha muita vontade de reeditar, porque o livro fez dez anos e ele tinha dois erros meus, de extração minha, de dois nomes que eu coloquei errado. Tinha ainda duas questões importantes que é atualizar a linguagem e acrescentar os dados da vida de Paulo nesses dez anos que se passaram. Então eu acho que foi muito importante que a editora Paz e Terra quisesse reeditar o livro fazendo essas correções que eu apontei e pondo a público a vida, nos menores detalhes, do homem que lutou, lutou, lutou a vida inteira pela educação no Brasil. Paulo deu o seu corpo e a sua alma ao povo brasileiro; ao povo do mundo, mas sobretudo ao povo brasileiro.

EC – A atualização mantém vivo o pensamento do autor?

Ana Maria – Reeditar a biografia é deixar Paulo vivendo. Se eu não publicasse mais os livros que eu tenho direito, que Paulo me deixou como direito, se não tivesse atenta, procurando que a editora não se acomode em situações pouco visíveis para Paulo, ele já teria morrido com 20 anos. O Mario Sergio (Cortella, filósofo) conversando comigo me disse ‘Nita, os grandes pensadores daquela época de Paulo, como Darcy Ribeiro, Florestan Fernandes, FHC, Celso Furtado, têm livros que estão vendendo muito pouco, quase nada, e o Paulo é campeão de vendas de livros científicos há muitos anos’.

EC – Freire é mais lido na atualidade do quando era vivo?

Ana Maria – Continua vendendo! Ele está sendo mais consagrado. Engraçado, quanto mais parece que perseguem Paulo; quanto mais batem em Paulo, mais ele cresce. É uma coisa impressionante. Mês a mês, ano a ano, de pouquinho em pouquinho Paulo vai sendo mais lido e mais conhecido. Sobretudo pelos livros Pedagogia da Autonomia e Pedagogia do Oprimido, sendo este a obra mais clássica, considerado o grande livro.

EC – E ao contrário de alguns intelectuais por aí, ele nunca disse ‘esqueçam o que eu escrevi’…

Ana Maria – E aí (gargalhadas) acontece que não está vendendo. Ele (FHC) não está vendendo. Pediu e levou, né?

EC – Na sua opinião, o Pedagogia do Oprimido é realmente o melhor livro de Paulo Freire?

Ana Maria – Eu considero par a par o Pedagogia do Oprimido com o Pedagogia da Autonomia, que é um outro enfoque da educação. É um livro que traz tudo o que o Paulo escreveu desde o princípio, lá no Recife e vem vindo, vem vindo, vem vindo num fio condutor que é a pedagogia em favor do oprimido. Não é a pedagogia do oprimido, mas é uma obra – lembrando que toda a obra de Paulo é a favor do oprimido – que eu acho que é muito mais carregada dessa linha de vamos nos fazer todos iguais, marcando nossas diferenças.

EC – Em que os documentos inéditos que serão disponibilizados nessa reedição, como poemas escritos de próprio punho pelo educador deverão contribuir para conhecermos um pouco mais do homem Paulo Freire?

Ana Maria – Eu acho que contribui em especial a poesia. O homem se abre muito. Tem menos censura, mostra mais a alma, o sentimento. Embora eu considere que vários livros do Paulo, por exemplo, Cartas a Cristina, mostra muito mais sensibilidade do que razão. Em Paulo nunca falta a razão, mas o caminho dele é o caminho do sensível.

EC – Por exemplo?

Ana Maria – Tem partes do Cartas a Cristina que são muito poéticas. Infelizmente é um livro pouco lido. Talvez por ser maior e tenha sido mais difícil de vender, mas é um livro que eu acho fenomenal, no qual ele fala do princípio da sua vida, da saída de Recife para Jaboatão; aquele sofrimento do pai, eles indo para uma casa muito pobre que, felizmente, ainda está de pé. Eu tenho lutado, mas ainda não consegui que algum órgão tombe aquela casa.

EC – Ou seja, um pensador que é referenciado no mundo inteiro, mas no seu país sofre ataques de setores conservadores e a resistência à preservação da sua memória…

Ana Maria – Aquela casa deveria ser tombada pelo Iphan! Porque ainda está de pé e é uma casa de mais de cem anos que não tem condições de sobrevivência por ser muito modesta. A gente vê no mundo inteiro as casas dos importantes, dos políticos, dos poetas, dos escritores, placas indicando que eles viveram lá. Aqui no Brasil, a memória histórica é muito desprezada. A cultura no Brasil ainda não foi entendida como parte necessária e fundamental para a formação da cidadania.

EC – Como a senhora analisa o surgimento desses movimentos fundamentalistas após o período de democratização?

Ana Maria – O mundo todo está caminhando para a direita. Quando os pobres, no caso da Europa, olham os exilados chegando, o medo que os nacionalistas têm é que esses vão tomar os seus empregos. Raramente aparece um nacionalista defendendo, acolhendo e protegendo pessoas que aparecem nesses barcos precários, chegando à Espanha, por exemplo. Mas, enfim, aqui no Brasil houve 13 milhões, há quem diga 40 milhões de pessoas que mudaram de classe social. Essa população que entra começa a abrir espaços. Ela quer espaço na universidade e quer espaço no emprego e vai conseguindo. Isso deixa a direita, a classe média, que é preponderantemente de direita no Brasil, revoltada. Esses movimentos, como você citou, misóginos, partem realmente dos que se sentem desprezados. Se fala tanto que Lula fez isto e isto, não! Na realidade, o que eles querem dizer é ‘trouxe essa classe que está nos aborrecendo e abafando e nós não conseguimos passar para o patamar acima, que é a classe de elite dominante’. Por que eles acreditam que podem passar (risos).

EC – Aqui em São Paulo isso é realmente muito perceptível…

Ana Maria – Não tem chance! Você não é aceito desde o clube que eles frequentam; você não é aceito numa mesa de banquete porque pode se atrapalhar com tantos talheres e tantos copos. Desde essas coisas pequenas, eles repudiam aquele que está querendo entrar, e não ajudam. Antes, preconizam o fracasso daquele cara pra ele deixar de ter a pretensão de ser classe alta, pra ele voltar pro seu canto. ‘Vá pro seu lugar que é classe média’. Então eu acho que nesses movimentos todos surgem novas ideologias e essas ideologias que estão surgindo não são as da tolerância, do respeito ao direito, do acolhimento, da seriedade, da concessão; aberta ao direito do outro. Pelo contrário, essas ideologias são combatidas nas ruas com pedras cassetes, etc.

EC – Recentemente uma professora do Paraná foi agredida por um aluno. Em média, dois professores por dia são agredidos em sala de aula no estado de São Paulo. O interessante, além de trágico nisso tudo, é que no ano de sua morte, Paulo Freire escrevia o terceiro capítulo do livro Cartas Pedagógicas, no qual analisa a banalização da violência como resultado de uma educação precária. O que a senhora acha que Paulo Freire diria sobre isso?

Ana Maria – Paulo diria que falta, primeiro, autoridade do professor. Essa autoridade não vem sendo concedida como antigamente pela família, pelo Estado, pela sociedade toda. O professor antigamente tinha um status alto, embora não ganhasse tanto dinheiro assim, ele tinha um alto status. No momento em que os professores começam a ser degradados, esse é um dos motivos. O outro motivo é que essas classes emergentes, que subiram, acham que o filho do rico insulta todo mundo, inclusive o professor, porque tem dinheiro e tem poder. E isso não é verdade. Então é por imitação, querer ser igual em tudo que ele (o aluno) vai e bate e diz ‘e aí qual é? Eu conheço o pessoal do município de Itapevi e um rapaz negro, muito modesto, superesforçado, competente, me parece que ele é homossexual também, foi agredido várias vezes pelos alunos. O que que a Secretaria fez? Colocou ele em casa. Deu licença de seis meses.

EC – Quer dizer que o agredido é que foi afastado?

Ana Maria – A Secretaria não enfrenta porque os pais desses meninos vão lá na escola e dizem ‘meus filhos aqui podem fazer o que quiserem. Podem subir em sofá, porque na minha casa sobem; podem insultar, porque na minha casa insultam’. Então, existe um respaldo também dos pais. E porque os pais dão esse respaldo? Porque estão muito ausentes, da presença, da presença educadora com relação a seus filhos.

EC – Como assim?

Ana Maria – Não existe uma grande preocupação. O que acontece aí é que eles enchem as crianças de mimos e de presentes. Brinquedos, cada vez mais brinquedos, ‘eu quero isso, eu quero isso’, as crianças fazem birra, batem os pés no chão e os pais dão, mesmo pagando em dez, quinze vezes se for possível. Ele não pode comprar aquilo, mas ele dá. Eu acho que é esse conjunto de coisas relacionadas que determina essa falta de respeito à pessoa do professor e da direção das escolas também.

EC – O deputado federal Marco Feliciano afirmou que o aluno agressor deveria ser considerado um sujeito oprimido pelo sistema. Como a senhora recebe esse tipo de ironia?

Ana Maria – (Longa pausa) Sintoma de almas perdidas pelo mundo, não é? Porque não é possível pessoas como alguns desses pastores que estão em evidência tratarem os seres humanos como um demônio que eles têm que exorcizar. Então essa professora, para ele, comete erros horríveis! Então, o menino ainda fez bem de bater porque está exorcizando o que ela tem de mal. É a única maneira como eu vejo essa coisa, que não é através de conhecimento científico, nem religioso, nem do senso comum. É uma coisa que parte do conhecimento de um ‘místico’ que vê as pessoas da seguinte forma: ‘aquela é ruim esse aqui é bom’. Não vê que o aluno já tinha uma ficha policial por muitas passagens de agressão, inclusive a professores. E o que a família estaria fazendo? Aquilo que eu disse antes: não estava fazendo nada.

EC – Como tratar agressores como esse?

Ana Maria – Vai ter que ter uma iniciativa do Estado de colocar o menino em um reformatório. Acho que nenhum lugar hoje se chama reformatório, mas deveria voltar a se chamar re-for-ma-tó-rio, porque essas crianças, adolescentes que vão pra lá são absolutamente insuportáveis para o convívio social.

EC – Paulo Freire se declarava cristão. Em seu exílio, inclusive foi consultor do Conselho Mundial das Igrejas, em Genebra (Suíça). Não é no mínimo anacrônico segmentos neopentecostais da Câmara Federal e do Senado, que se dizem cristãos, serem grandes opositores ao pensamento de Freire e defensores do Escola sem Partido?


Ana Maria – Essas igrejas novas, ao contrário da igreja católica, que está marchando para a esquerda, estão marchando para a direita e eles querem ter os seus fiéis absolutamente submissos. Às vezes eu deixo ligada a televisão e os meus filhos dizem ‘tira, tira mamãe’, mas eu quero ver como é! As pessoas ficam absolutamente enlouquecidas. A lógica usada é quanto mais você dá, mais você ganha. Eu acho que falta para as pessoas que frequentam essas igrejas aquilo pelo qual Paulo tanto lutou: cons-ci-en-ti-za-ção! Falta saber quem eu sou; quem está contra mim; quem está a favor. Só essas perguntas já as ajudariam, pois, muitas vezes, lhes foram negadas o ato de pensar. Você acha que um Magno Malta, um Feliciano e um Bolsonaro, por exemplo, iriam apoiar o trabalho de Paulo Freire? É até bom que não apoiem, porque até poderia manchar um pouco a biografia do Paulo (risos).

Ana Maria Freire e Paulo Freire. Fotomontagem: Reprodução/ Blog Negro Nicolau.