3 de dezembro de 2017

Não é só na Líbia: Brasil também vende escravos a céu aberto


Imagens de mercados de compra e venda de seres humanos na Líbia, com leilões de escravos à céu aberto, chocaram o mundo. Migrantes da África subsaariana, que tentam alcançar a Europa fugindo da guerra e da pobreza, acabam capturados e transformados em mão de obra cativa. A situação é denunciada, há anos, pela sociedade civil, mas foi só com as imagens da CNN que se tornou comoção global.

Neste sábado (2), quando celebramos o Dia Internacional pela Abolição da Escravidão, gostaria de poder dizer que a possibilidade de você ''comprar alguém'' se limita às tristes situações de guerra ou a países com Estados tão enfraquecidos que se tornam incapazes de cumprir suas leis e convenções e tratados internacionais que proíbem essa prática.

A situação dantesca, contudo, se repete diariamente em outras partes do mundo, adotando formas escancaradamente abjetas ou mais sutis, mas ainda assim violentas por sua própria natureza. Seja em democracias ou ditaduras, exemplos capitalistas ou últimos bastiões socialistas, o trabalho escravo contemporâneo é uma realidade e está conectado com as principais redes de produção globais.

A da pesca, por exemplo. Conheci James Kofi Annan, de Gana, na África, vendido como escravo aos seis anos de idade. Até os 13, trabalhou para pescadores, experimentando diariamente tortura, fome, negligência, abuso verbal e físico. Viveu com doenças dolorosas que nunca foram tratadas e lhe foi negado acesso a cuidados médicos. Escapou do cativeiro e conseguiu ir para a escola, estudando até concluir a universidade. Mas largou o emprego estável para criar uma ONG e ajudar outras crianças e famílias que estão nas mesmas condições pelas quais ele passou.

Ou a da produção de carne bovina. Entrevistei Antônio, há alguns anos, no Sul do Maranhão. Ele havia sido comercializado junto com um grupo de outros 41 homens para limpar o pasto do gado na fazenda de Miguel de Souza Rezende na região amazônica. ''Nós fomos vendidos! Oitenta reais pra cada cabeça, os 42'', lembra. ''Quando completou 30 dias eu disse: meninos, quem quiser ir embora mais eu, nós vamos. Aí o cantineiro avisou nós: ''rapaz não sai de nenhum de vocês, se saírem vocês morrem. Tem muito jagunço na fazenda.'' Os esforços da sociedade civil, governos e empresas para erradicar esse no Brasil fez com que a situação pela qual passou Antônio seja menos comum. Mas ela ainda acontece.

Por exemplo, na fabricação das roupas que vestimos. Para quem acha que comércio de gente ocorre apenas em locais distantes dos grandes centros, conto um caso na capital paulista. No dia 9 de fevereiro de 2014, dois migrantes bolivianos aguardavam pacientemente o dono de uma confecção de costura para a qual trabalhavam tentarem concluir a ''venda'' de ambos, estipulada em R$ 1 mil por cabeça. Se não fosse a solidariedade de outras pessoas que presenciaram a cena, o negócio teria sido concretizado e a Polícia Militar não teria sido chamada para por fim ao comércio de gente que ocorria em uma via pública.

Logo depois do ocorrido, a Repórter Brasil foi a Sucre, na Bolívia, e conseguiu encontrar uma das vítimas. “Não conhecemos nenhuma rua da cidade e não falamos português. Você acha que nós fugiríamos para onde?”, perguntou. Posteriormente localizado pelas autoridades, o dono da confecção afirmou que estava tentando ''ajudar'' os dois a conseguir outro emprego.

A Organização Internacional do Trabalho estima a existência de, pelo menos, 40 milhões de pessoas submetidas a trabalho escravo em todo o mundo, produzindo lucros anuais superiores a 150 bilhões de dólares. É um cálculo modesto, considerando que os processos migratórios forçados por conflitos armados e mudanças climáticas alimentaram fortemente o tráfico de seres humanos para a exploração econômica e sexual nos últimos anos.

No Brasil, não temos uma estimativa confiável de quantas pessoas estão sob essas condições. Mas dados do Ministério do Trabalho apontam que, desde 1995, mais de 50 mil pessoas foram, oficialmente, resgatadas da escravidão.

O país costumava ser considerado um exemplo global no combate ao trabalho escravo pelas Nações Unidas. Contudo, ações do governo Michel Temer – como a desastrosa tentativa de reduzir o conceito de escravidão contemporânea e dificultar a libertação de pessoas através de uma portaria publicada no dia 16 de outubro – têm sido vistas como preocupantes pela comunidade internacional.

A medida, suspensa por liminar pelo Supremo Tribunal Federal após forte indignação da sociedade, visava a atender reivindicações da bancada ruralista e de empresas do setor de construção civil e foi tomada em meio ao processo de angariar votos de deputados federais para rejeitar a denúncia contra Temer por organização criminosa e obstrução de Justiça.

Em um evento nas Nações Unidas, em Genebra, nesta sexta (1), um representante do Reino Unido falou logo na sequência do representante do Haiti sobre a importância de combater globalmente o problema. A cena me lembrou que o espaço das palavras diplomáticas não traduz, necessariamente, a ironia da realidade. No final de 2013, a Anglo American, gigante da mineração sediada em Londres, foi responsabilizada pelo governo por escravizar 172 trabalhadores, em Minas Gerais – dos quais 100 eram refugiados haitianos. O Reino Unido vem se esforçando para criar leis e combater o trabalho escravo e tem sido um ator importante nesse processo. Mas a responsabilização de suas empresas por seu governo ainda engatinha.

A verdade é que é o investimento de governos e empresas no combate ao trabalho escravo tem sido dinheiro de troco em comparação ao que se lucra anualmente com a superexploração de trabalhadores migrantes. É o que chamamos de ''Efeito Batman'': de dia, um bilionário que, de uma forma ou de outra, explora os cidadãos de Gotham. De noite, um vingador que quer ser o exemplo da Justiça. Claro que o impacto do que ele faz de noite não chega aos pés do problema causado por sua ação de dia.

Passou da hora do mundo atuar para que países e empresas sejam responsáveis por suas ações. Precisam injetar, urgentemente, recursos no atendimento e inclusão de vítimas e sobreviventes ao mesmo tempo em que atacam os lucros provenientes dessa forma de exploração. Países precisam punir as empresas que não cuidam de suas cadeias produtivas e fecham os olhos para as consequências. E, principalmente, precisamos combater o que está na origem da venda de escravos a céu aberto, na África, na Europa, no Brasil. Pois escravidão é sintoma, não doença. É um indicador de que nosso modelo de desenvolvimento, concentrador e excludente, precisa ser alterado. Só a redistribuição de riquezas, de oportunidades e de Justiça é capaz de erradicar cenas como as que temos visto.

Faz quase duas décadas que atuo no combate ao trabalho escravo. Imagens como as que circularam nas redes sociais, por mais que sejam desesperadoras, não configuram novidade. Comoções passam com o tempo, soterradas por outras tragédias. Novidade será se, desta vez, o mundo resolver não esquecer. (Com informações do Blog do Sakamoto).


Trabalhadores vítima do tráfico de pessoas para o trabalho escravo são resgatados no Pará.
(Foto: Leonardo Sakamoto).

2 de dezembro de 2017

Lula amplia vantagem e ganha fácil em todos os cenários, diz pesquisa Datafolha


Luiz Inácio Lula da Silva (PT) fortaleceu ainda mais sua liderança no cenário eleitoral e o deputado Jair Bolsonaro está isolado na segunda colocação da corrida presidencial, de acordo com pesquisa do Datafolha. A constatação coincide com o momento em que o PSDB tenta emplacar o nome do governador Geraldo Alckmin como o candidato das forças de centro no pleito de 2018, contrapondo-o aos extremos da esquerda e direita, personificados respectivamente em Lula e Bolsonaro, na visão dos tucanos.

Além disso, o apresentador Luciano Huck, alvo de especulações para a mesma tarefa, disse que não será candidato. O instituto fez 2.765 entrevistas entre 29 e 30 de novembro, em 192 cidades. A margem de erro é de dois pontos para mais ou menos. Como houve alterações em cenários, só é possível comparação com levantamentos anteriores nas simulações de intenção espontânea de voto no primeiro turno e estimuladas no segundo.

O tucano, hoje, está em quarto lugar na disputa em um cenário com a maior gama de candidatos colocada, empatado numericamente com o ex-governador Ciro Gomes (PDT, 6%) e tecnicamente com o ex-ministro do Supremo Joaquim Barbosa (sem partido, mas cortejado pelo PSB, 5%) e o senador Alvaro Dias (Podemos, 3%).

Aqui, Lula lidera com 34% e Bolsonaro o segue com 17%. Marina Silva (Rede) aparece numericamente acima do pelotão encabeçado por Alckmin e Ciro, mas tecnicamente empatada com ambos. Na simulação em que o nome de Alckmin é substituído pelo do prefeito paulistano João Doria, que disputava a indicação tucana, o desempenho é semelhante.

Quando a intenção de voto é questionada sem apresentação de nomes, Lula surge com 17% das citações e Bolsonaro, com 11%. Todos os outros pontuam de 1% para baixo. O “ninguém” tem 19% e não sabem afirmar em que candidato votariam, 46%.

Lula ganha em todos os cenários de segundo turno. Ele ampliou em quatro pontos percentuais sua vantagem, em relação à pesquisa feita no fim de setembro, no confronto com Alckmin (52% a 30%), Marina (48% a 35%) e Bolsonaro (51% a 33%). O tucano empata tecnicamente com Ciro (35% a 33%) e Marina ganharia de Bolsonaro (46% a 32%).

O principal cenário sem Lula vê Bolsonaro com 21%, Marina com 16% e Ciro se beneficiando de votos do petista, com 12%. Alckmin segue com 9%, empatado tecnicamente com Alvaro Dias (5%). Um dos nomes citados para substituir Lula, o ex-prefeito paulistano Fernando Haddad ficaria com 3%, empatado tecnicamente com a Manuela D´Ávila (PCdoB, 2%). Nas simulações sem Lula, o voto em branco ou nulo sobe bastante, de 12%-14% para de 25% a 30%.

Isso indica um mar de eleitores a serem pescados pelos remanescentes na corrida, se Lula estiver ao fim fora. Em termos de perfil do eleitor, não há mudanças significativas em relação ao que já foi apurado até aqui. Lula tem a preferência entre mais pobres e moradores da região Nordeste. Bolsonaro faz especial sucesso entre homens, jovens e com renda maior. No estrato mais rico do eleitorado, a disputa é mais pulverizada.

O ministro Henrique Meirelles (Fazenda) deseja ser candidato, mas tem desempenho baixo hoje. Oscila entre 1% e 2% de intenções, mesmo nível de Paulo Rabello de Castro (PSC), João Amoêdo (Novo) e Guilherme Boulos (cortejado pelo PSOL). Rabello de Castro é o atual presidente do BNDES e apareceu no programa partidário na TV, há duas semanas, como pré-candidato. (Com informações da Revista Fórum/ Folha de São Paulo).

Lula amplia vantagem na corrida presidencial 2018. (Foto: Ricardo Stuckert/ Fotos Públicas).

Mesa Redonda em Altaneira debate os avanços e os desafios a partir dos 500 anos da Reforma Protestante


O Auditório da Fundação Educativa e Cultural ARCA sediou na noite desta sexta-feira, 01/12, uma mesa redonda alusiva aos 500 anos da Reforma Protestante.

A mesa foi composta por Carlos Alberto Tolovi, Doutor em Ciência das Religiões, Filósofo e Professor de Filosofia da Universidade Regional do Cariri (URCA), Vinícius Freire, Líder do Ministério Nissi e professor de História da Escola de Ensino Médio Santa Tereza (Altaneira) e por este professor signatário com especialização em Docência do Ensino Superior, licenciado em História, blogueiro e ativista pelo Grupo de Valorização Negra do Cariri (Grunec), tendo como finalidade discutir os avanços e os desafios advindos da Reforma Protestante.

Para tanto, alguns temas foram geradores do debate como as consequências da reforma no contexto atual, a relação Política e Religião, o Gênero e o Ensino Religioso. Segundo Vinícius, a ideia inicial era promover um momento só para as pessoas ligadas a religiosidade de cunho protestantes. “Pensávamos em evento com pastores e os fiéis com a presença de pregadores de outros lugares, mas por falta de recursos e de outras questões, não foi possível esta realização”, disse. “Depois", ponderou, "pensei em construir um momento mais democrático e de debates em que pontos de vistas diferentes fossem expostos. Por isso, essa mesa hoje aberta a toda a comunidade altaneirense".

Contexto da Reforma

Tolovi propôs 15 minutos de fala para cada componente da mesa e em seguida abrir para as intervenções, curiosidades e questionamentos do público. O professor da URCA trouxe a cena o que levou um dos principais expoentes da reforma se rebelar contra o clero católico romano. Segundo ele, as ideias de Martino Lutero eram legítimas, pois questionou um dos principais erros cometidos pela igreja, a venda de indulgências ou a compra do perdão. Outro grande feito dele que ninguém conseguirá apagar foi permitir que outras pessoas tivessem acesso aos escritos bíblicos, antes restritos só ao clero.

Tolovi fala das condicionantes da Reforma
Protestantes. (Foto: Professor Paulo Robson).
Lutero se notabilizou porque ele conseguiu mexer com uma das instituições mais poderosos do período, quase foi queimado por isso”, disse. “Mas porque não foi”, indagou? Porque as alianças com os monarcas o livraram, em uma clara demonstração de que política e religião estavam juntas.

O filósofo também apontou falhas na reforma e no reformador. “Quem precisa de reforma”?, perguntou. A igreja católica cometia erros e por isso Lutero sentiu a necessidade de corrigi-los. “Mas se antes seu reformador foi um rebelde ao questionar a doutrina católica, ele cometeu os mesmos erros que criticou ao mandar executar camponeses que estavam fazendo como ele – se rebelando”. Ainda conforme Tolovi, outro erro marcante do reformador foi ter afirmado que só a fé pode salvar. “Isso acabou servindo para alimentar o individualismo”, realçou.

Por fim, ele mencionou que hoje a venda de indulgência, principal motivo da explosão da reforma protestante e que dividiu o cristianismo, continua sendo praticado em larga escala, principalmente pelas igrejas protestantes.

Permanências, Mudanças, Gênero e Ensino Religioso

O professor Nicolau Neto seguiu a linha de raciocino de seu antecessor, trazendo para o debate questões em voga atualmente como forma de tentar chegar ao cerne da questão – O que mudou desde 1517? Nicolau afirmou que Lutero não foi o único que ousou colocar em xeque o poder da igreja católica, mas foi o que mais se notabilizou porque mexeu com as estruturas do clero. 

Nicolau discorre acerca de temas defendidos pelas instituições
religiosas que reforçam a segregação e o preconceito.
(Foto: Paulo Henrique Maia).
"A partir século XVI, testemunhamos o surgimento de várias vertentes religiosas de linhagem protestantes e de líderes que assim como Lutero marcou históriaForam até além dele porque não ficaram apenas no seio religioso, mas que usando da prerrogativa religiosa lutaram por justiça social e racial, como o pastor Martin Luther King, o Metodista Nelson Mandela e o anglicano Desmond Tutu”, argumentou. “Estas pessoas, ao contrário do Lutero”, pontuou, “não caíram em contradição”.

Para o professor, esses bons exemplos de protestantes não apagam o que foi feito de ruim quando do desenrolar da reforma, tão pouco o que vem sendo praticada na atualidade. Ao mencionar a grande visibilidade na mídia e a atuação na política partidária a partir de 2001 dos “evangélicos”, Nicolau destaca o ódio praticado por eles a grupos historicamente massacrados, tendo um esforço gigante para demonizar ações indígenas e grupos religiosos de matrizes africanas e para ampliar esse ódio, a bancada evangélica imbuída de um projeto “Escola Sem Partido” querem inserir nas escolas o ensino religioso de vertente protestante e católica, corroborando para segregar mais e silenciar cada vez mais quem não se encontra em nenhuma destas linhagens.

O ativista ainda mencionou acerca das questões de gênero que tem conseguido juntar os que estão separados historicamente - igrejas protestantes e igreja católica em alguns municípios - provocando um verdadeiro desastre humano ao reforçar a política religiosa de segregação e de preconceito: 


São esses grupos, as exceções são algumas pessoas dentro destas instituições, que estão continuando a defenderem ideias de submissão da mulher, os maus-tratos a comunidade LGBTTs, o controle do corpo e da sexualidade, além de apoiarem políticos homofóbicos, racistas e machistas, tudo em nome de deus e da defesa da ‘família’”.


Segundo Nicolau, a verdadeira reforma não está nas instituições em si, em prédios, mas em nós mesmo. “Nós precisamos aprender a conviver com o diferente”, finalizou.

Vinícius fala da chegada dos protestantes em
Altaneira. (Foto: Prof. Nicolau Neto).
Crescimento do Movimento Protestante em Altaneira

Vinícius Freire fez um resgate de como as igrejas protestantes se instalaram em Altaneira. Para o professor, que já tem estudos nesse sentido, o movimento começou a chegar ainda na década de 70 do século passado, tendo na Igreja Congregação Cristã no Brasil a sua maior expressão e ainda hoje é a que tem o maior número de adeptos. A Igreja Assembleia de Deus Templo Central ganharia espaço na cidade alta nos anos 80.

O líder do Nissi pontuou que diferente de outras localidades, em Altaneira a entrada dos evangélicos se deu por migração. Enquanto os primeiros grupos que se desenvolveram no Brasil eram invasores - franceses e holandeses protestantes - aqui grupos viajaram e conheceram as doutrinas em outros estados, como São Paulo e trouxeram para cá, ressaltou. 

Intervenções

Após as explanações, o público passou a intervir. Para o professor e coordenador Paulo Robson, o momento foi muito rico e merecia uma maior participação se referindo a professores, professoras e estudantes. Já o professor e sindicalista José Evantuil, preferiu não lamentar as ausências, afirmando que o momento foi proveitoso. Essa ideia foi compartilhada pelo mestrando Cícero Lourenço. Já o radialista João Alves parabenizou a mesa pelo bom debate.

A mesa foi idealizada pelo Nissi Altaneira e apoiada pela Fundação Educativa e Cultural ARCA, tendo como público alvo estudantes do Ensino Médio, universitários (as), professores (as), pastores e líderes de outras denominações religiosas e pessoas com afinidades na temática.

Professores, estudantes e demais pessoas por ocasião da Mesa Redonda que debateu os 500 anos da Reforma Protestante em Altaneira. (Foto: Professor Nicolau Neto).










Mobilização contra a Reforma da Previdência será realizada em Crato nesta terça-feira


Estava prevista para ocorrer na próxima terça-feira, 05, em todo o país, uma greve geral convocada por centrais sindicais e movimentos sociais em protesto à Reforma da Previdência. Porém, partes destas centrais decidiram adiá-la.

A decisão não interferiu na mobilização como um todo, permanecendo os eventos de ruas já previamente marcados. Segundo o coordenador da a Frente Povo Sem Medo, Guilherme Boulos, as ameaças aos direitos sociais e individuais permanecem, exigindo mobilização permanente dos setores populares contra este grave ataque do governo Temer e que irá apoiar, enquanto Frente, todas as paralisações dos trabalhadores, orientando junto com a Frente Brasil Popular na construção das atividades.

No Cariri cearense, o ato ocorrerá em Crato com concentração na Praça São Vicente a partir das 08h00. “A manifestação do Cariri no dia 05/12 está mantida. No direito de me aposentar ninguém mete a mão!”, disse o vereador Amadeu de Freitas (PT – Crato), um dos construtores do evento.

Em junho de 2017 o centro comercial de Crato fechou em protesto contra as reformas de Michel Temer (PMDB).
(Foto: Divulgação).



1 de dezembro de 2017

STF suspende lei que proibia ensino sobre gênero em escolas


A controvérsia em torno da chamada "ideologia de gênero" ganhou um novo e importante capítulo nos tribunais. Uma decisão ainda inédita do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso obtida pelo GLOBO suspendeu lei de Paranaguá (PR) que proíbe informações sobre gênero e orientação sexual nas escolas mantidas pela prefeitura do município paranaense e até mesmo a utilização de tais termos.

A decisão em caráter liminar, que precisa passar pelo plenário do Supremo, representa uma vitória da Procuradoria-Geral da República (PGR) que, somente no último mês, protocolou sete ações na Corte, incluindo a de Paranaguá, contra leis municipais que vetam conteúdos relacionados à sexualidade e gênero nas escolas.

Na decisão, Barroso afirma que a lei de Paranaguá é inconstitucional porque somente a União teria competência para legislar sobre diretrizes educacionais e normas gerais de ensino. Mas também pelo fato de, ao impedir o acesso a conteúdos sobre uma dimensão fundamental da experiência humana e para a vida em sociedade, viola o princípio constitucional da proteção integral da criança e do adolescente.

"Não tratar de gênero e de orientação sexual no âmbito do ensino não suprime o gênero e a orientação sexual da experiência humana, apenas contribui para a desinformação das crianças e dos jovens a respeito de tais temas, para a perpetuação de estigmas e do sofrimento que deles decorre", aponta Barroso na decisão.

"Por óbvio, tratar de tais temas não implica pretender influenciar os alunos, praticar doutrinação sobre o assunto ou introduzir práticas sexuais. Significa ajudá-los a compreender a sexualidade e protegê-los contra a discriminação e a violência", pontua o ministro. "Impedir a alusão aos termos gênero e orientação sexual na escola significa conferir invisibilidade a tais questões. (...) Significa valer-se do aparato estatal para impedir a superação da exclusão social e, portanto, para perpetuar a discriminação".

Barroso citou dados sobre violência contra transgêneros no Brasil, mencionando que eles têm expectativa de vida em torno de 30 anos no país, contra os quase 75 anos do brasileiro médio. O ministro colocou a escola como local fundamental para que os estigmas sejam rompidos, até mesmo porque em geral é onde o preconceito começa.
  
"Nesse sentido, o mero silêncio da escola nessa matéria, a não identificação do preconceito, a omissão em combater a ridicularização das identidades de gênero e orientações sexuais, ou em ensinar o respeito à diversidade, é replicadora da discriminação e contribui para a consolidação da violência às crianças homo e trans", afirma ele.

O ministro citou um caso famoso da Suprema Corte dos Estados Unidos, Brown versus Board of Education, no qual foi reconhecida a inconstitucionalidade da imposição de escolas separadas para brancos e negros. Um dos fundamentos foi de que "as escolas são um ambiente essencial para a formação da cidadania, para promoção de valores culturais e da igualdade, e que a mera separação contribuía para a perpetuação da discriminação racial", destacou Barroso em sua argumentação.

Ele mencionou ainda que o Tribunal Constitucional Alemão reconheceu a constitucionalidade da introdução da educação sexual no currículo do ensino fundamental, observando que "a missão das escolas não é apenas a de transmitir conhecimento geral, mas sobretudo de possibilitar uma educação mais ampla e preparar o cidadão para a vida em sociedade", esclarecendo que "a educação sexual é parte da formação do indivíduo e que o Estado tem o dever de oferecer aos jovens uma educação compatível com a vida contemporânea".

Barroso encaminhou a liminar para o plenário do Supremo, que pode referendar ou derrubar a decisão, e pediu ao prefeito e à Câmara Municipal de Paranaguá que se manifestem, assim como a Advovacia-Geral da União. Além do caso de Paranaguá, a PGR protocolou no último mês ações questionando leis semelhantes editadas pelas prefeituras de Novo Gama (GO), Cascavel (PR), Blumenau (SC), Palmas (TO), Tubarão (SC) e Ipatinga (MG).

No caso do Novo Gama (GO), o relator da ação, o ministro Alexandre de Moraes, determinou que o processo não seguisse no Supremo porque entendeu que a PGR deveria ter acionado o Tribunal de Justiça de Goiás para questionar a lei do município. Nas demais ações, distribuídas a diferentes ministros, não houve decisão ainda.

A decisões divergentes de Alexandre e Barroso em relação a ações semelhantes mostram um longo caminho no Supremo para a ofensiva da PGR contra leis que proíbem conteúdos relacionados a gênero nas escolas país afora. Além dos processos recentes que questionam normas municipais, há duas ações diretas de inconstitucionalidade no STF para derrubar uma lei estadual de Alagoas com o mesmo tipo de proibição. (Com informações do O Globo).
 
O Ministro do Superior Tribunal Federal Luís Roberto Barroso. (Foto: Jorge William/ Agência o Globo).

Vande Araújo é o novo presidente da Câmara de Nova Olinda e Zé de Naninha faz despedida dupla


Os trabalhos dos vereadores e vereadoras da Câmara Municipal de Nova Olinda, no cariri cearense, foi encerrado na noite desta quinta-feira, 30, com a escolha dos novos componentes da mesa diretora para o anuênio de 2018.

Nova Mesa Diretora da Câmara de Nova Olinda.
(Foto: Reprodução/Facebook).
Os vereadores Adriano Dantas (PSB) e o então presidente da casa Zé de Naninha (PR) foram os únicos que discursaram na última sessão do ano. O primeiro afirmou que a casa conta com alguns parlamentares novatos e que o pouco tempo de vereança está servindo de aprendizado. “Eu acredito que o próximo ano a gente vai aprender mais”, ponderou.  Já Zé de Naninha fez um discurso de dupla despedida. De presidente da Câmara e da função de vereador. “Possivelmente a gente não se reunirá mais até o final do ano, a não ser que tenha uma sessão extraordinária”, disse. Zé agradeceu a todos/as que o elegeram presidente e afirmou que estava se afastando dos trabalhos como vereador. “Recebi o convite do senhor prefeito para ser secretário e aceitei o convite”, realçou.

Passados os discursos e a aprovação de uma emenda 01/2017 ao Projeto Lei 16/2017 e do requerimento 031/2017, foi eleita a nova composição da Mesa Diretora para o Anuênio de 2018. Apenas uma chapa foi inscrita, colocando o presidente os nomes para o crivo dos (as) edis.

Sexto colocado nas eleições de 2016 com 6,25% dos votos, Vande Araújo com assento pelo PSD foi eleito presidente. Tier Feitosa (PSDB), o mais votado no processo eleitoral com quase 9% do eleitorado de Nova Olinda irá ocupar a cadeira de vice-presidente, enquanto que a mesa continuará sendo secretariada pela 10ª colocada na eleição com 4,5% dos votos, a Lourdes da Saúde (PRTB).





30 de novembro de 2017

Temer destina mais R$ 70 milhões para publicidade da Reforma da Previdência


O governo de Michel Temer (PMDB) tem tentado a todo custo e de todas as formas angariar apoio à reforma da Previdência. Sob o discurso de cortar privilégios de servidores públicos, busca aceitação do trabalhador da iniciativa privada. Conforme publicação na coluna Painel, do jornal Folha de S. Paulo, desta quinta-feira (30), após as primeiras pesquisas sobre a repercussão das publicidades feitas pelo governo pela reforma da Previdência terem sido positivas, o Planalto decidiu dobrar a aposta e “liberou mais R$ 72 milhões para reforçar a ofensiva de comunicação”.

De acordo com a coluna, parlamentares do Nordeste também fizeram levantamentos que indicam um crescimento na aceitação da proposta, mais ainda entre as classes D e E. A melhora é apontada pelo mote do combate a privilégios, principal discurso dos governistas pró-reforma. As propagandas do governo enfatizam para o trabalhador da iniciativa privada, com rendimentos mais baixos, que nada vai mudar.

Na ofensiva pela aprovação da proposta na Câmara ainda este ano, o Planalto usará a nova verba para ampliar a exibição das peças que defendem as novas regras de aposentadoria. Uma outra parte, só que bem menor, conforme informa a coluna, será utilizada para divulgação do programa Avançar.

Na última publicidade direcionada para a reforma, a campanha frisa o corte de privilégios e a manutenção de direitos, além disso ressalta o que permanece no texto, como a fixação de uma idade mínima para aposentadoria e a unificação das regras para servidores públicos, e também indica o que já foi descartado, como as propostas de mudança na Previdência rural.

Desde que o presidente Michel Temer (PMDB) decidiu enviar a proposta de reforma na Previdência à Câmara, em dezembro de 2016, a batalha pela aprovação parece não ter fim. O texto foi modificado pelos próprios parlamentares, nas comissões pelas quais passou, e, posteriormente, pelo governo, que apresentou uma nova versão esse mês. As denúncias da Procuradoria-Geral da República (PGR) contra o Temer, para os deputados da base, atrasaram a aprovação do tema na Casa.

Para que a proposta seja aprovada na Câmara, são necessários 308 votos. O governo ainda não conseguiu esse apoio, mas trabalha para aprovar a proposta na Casa até o dia 13 de dezembro. Com o anunciado desembarque do PSDB da base aliada e as pressões do “Centrão”, conglomerado de bancadas que reúne mais de 200 deputados, até parlamentares da base já assumem que o texto pode não ser aprovado ainda este ano. (Com informações do Congresso em Foco).


O governo trabalha para aprovar a proposta na Câmara ainda até o dia 13 de dezembro. (Foto: Beto Barata/ PR).

29 de novembro de 2017

“Gênero não é ideologia: explicando os Estudos de Gênero”, por Georgiane Garabely*


Nos últimos anos, pesquisadores e pesquisadoras dos Estudos de Gênero vêm sofrendo uma série de ataques (alguns, violentos) contra as temáticas que estudam e problematizam. A princípio, nada de novo, uma vez que os Estudos de Gênero foram durante muito tempo marginalizados por setores dentro das próprias universidades. No entanto, o aumento da propagação de discursos equivocados sobre o campo nos últimos anos, especialmente no Brasil, chama a atenção para um de seus principais combustíveis: a desinformação.

A fim de desfazer certas confusões – algumas mal-intencionadas – proponho discutir o que é, afinal de contas, o conceito de gênero. De uma forma simples, direta e acadêmica, pretendo contribuir para um debate bastante pertinente tanto no campo das pesquisas como nos debates públicos que ocorrem pelo país.

Gênero e Feminismos

Não é possível entender o que são Estudos de Gênero sem compreender o movimento feminista, que começa no cenário internacional no século XIX e reivindica direitos civis para as mulheres. É muito reconhecida a luta pelo direito ao voto, mas é importante lembrar que essa não era a única reivindicação – as mulheres tinham pouco direitos e muito pelo que lutar. A mulher casada, por exemplo, era considerada pela lei brasileira “incapaz” e sob tutela do marido – o que somente foi alterado na legislação em 1962, com a Lei 4.121.

Diversidade e respeito são questões importantes na perspectiva social dos Estudos de Gênero. (Foto: Pixaby).

No espaço universitário, os feminismos – no plural devido à heterogeneidade do movimento – iniciaram uma trajetória em meados do século XX. Na História, por exemplo, a incorporação da categoria mulher está relacionada a todo um movimento historiográfico de renovação no campo de conhecimento. A história demográfica, a história da família e a ideia de uma história “vista de baixo”, na qual também deveriam ser contadas as vidas de pessoas comuns, de operários e operárias, de camponeses e camponesas, entre outros, contribuíram significativamente para a compreensão de que era necessário se escrever sobre Mulher – nesse primeiro momento ainda no singular, ou seja, ainda pensada como uma categoria homogênea.1

Entre o fim dos anos de 1970 e o início da década de 1980 as historiadoras feministas – principalmente ligadas ao feminismo norte-americano – começaram a problematizar as particularidades que existiam entre elas próprias. A categoria Mulher já não dava conta de explicar a multiplicidade de experiências e subjetividades. Joana Maria Pedro argumenta que as mulheres negras, particularmente, questionaram o gesto excludente da escrita da História das Mulheres, revelando as fraturas internas não só da História, mas do próprio feminismo acadêmico ao mostrar as armadilhas e ilusões da categoria Mulher. Desde então, feministas como Angela Davis e Bell Hooks, colocaram o dedo na ferida ao dizer que as mulheres não viviam da mesma forma a experiência de ser mulher. Outras variáveis precisavam ser levadas em consideração, como classe, cor, escolaridade, dentre outros aspectos que precisavam ser compreendidos.

Gênero: que negócio é esse?

É neste contexto que chegamos à questão do uso da palavra Gênero no final da década de 1980. Quando Joan Scott publicou seu famoso artigo “Gênero: uma categoria útil de análise”, na American Historical Review, em 1986 (clique para ver o original em inglês e traduzido para o português em 1990), ela visava demonstrar que a imensa produção da História das Mulheres havia chegado a um impasse: ou ficava numa categoria suplementar ao mainstream historiográfico, ou forçava uma transformação no interior da disciplina e do conhecimento histórico. Defendendo a segunda posição, Scott então propõe o gênero como categoria de análise e não como um tema ou um objeto. E como categoria, ela propõe a perspectiva de gênero para análise, inclusive, das estruturas e dos discursos políticos:

O gênero é uma das referências recorrentes pelas quais o poder político tem sido concebido, legitimado e criticado. Ele não apenas faz referência ao significado da oposição homem/mulher; ele também o estabelece. Para proteger o poder político, a referência deve parecer certa e fixa, fora de toda construção humana, parte da ordem natural ou divina. Desta maneira, a oposição binária e o processo social das relações de gênero tornam-se parte do próprio significado de poder; pôr em questão ou alterar qualquer de seus aspectos ameaça o sistema inteiro (SCOTT, 1990, p.92).


Scott aponta, de maneira muito interessante, para um dos eixos mais polêmicos que os Estudos de Gênero enfrentam hoje no Brasil. Não se trata de negar as diferenças sexuais e corporais entre homens e mulheres, mas de compreendê-las não como naturais e determinadas, mas como relações sociais e de poder, que produziram hierarquias e dominação. Para Scott, gênero é a organização social das diferenças sexuais. É um saber que estabelece significados para as diferenças corporais.

Já em 1989, Judith Butler publica “Gender Trouble", que no Brasil foi lançado em 2003 com o título “Problemas de Gênero: Feminismo e Subversão da Identidade", mostrando o caráter performativo do gênero. Nele, Butler questionou a ideia de que sexo está exclusivamente ligado à biologia e de que gênero relacionado à cultura, como o debate era apresentado até aquele momento por boa parte das pesquisadoras e pesquisadores da área. Ela questionou a ideia de que o gênero fosse uma espécie de “interpretação cultural do sexo”.

Para Judith Butler, a ideia de performatividade de gênero compreende a noção de que sexo e gênero são discursivamente criados e que, ao se desnaturalizar o sexo, deve-se também desnaturalizar o gênero. Portanto, não se trata de negar a existência de sexo ou de gênero, mas de historicizar tais diferenças, procurando analisar as estratégias discursivas que as consolidaram. Nesse ponto, a meu ver, encontra-se uma das contribuições mais significativas da obra de Judith Butler: dar visibilidade ao fato de que existem corpos que “importam” – corpos enquadrados no sistema heteronormativo – e corpos que “não importam” – o que a autora chama de corpos abjetos. Esses, dentro da lógica binária, podem ser vistos como “corpos desviantes”, culturalmente inintelegíveis e que ameaçam as estruturas de poder. Pessoas gays, lésbicas, transexuais e intersexuais acabam por demarcar fronteiras que não deveriam ser cruzadas dentro do sistema heteronormativo e, dentro desse sistema excludente, seus corpos não são aceitos, ou melhor, a existência dessas pessoas não é aceita. Tal exclusão acabou por colocar em risco a vida dessas pessoas, gerando intolerância, mortes e inúmeras outras violências.

Assim, Butler propôs a reflexão sobre as armadilhas na naturalização do gênero.  De lá para cá, se passaram 30 anos. E todo esse período foi de muita luta para a consolidação de um campo de investigação acadêmica.2

A expressão “ideologia de gênero”, que tanto tem sido empregada nos dias de hoje para criticar os Estudos de Gênero, não é uma categoria acadêmica ou um objeto de pesquisa. Como vimos, os pesquisadores e pesquisadoras que se dedicam o entendem justamente no contrário: que gênero não é uma ideologia. Para eles, a expressão “ideologia de gênero” é estranha, uma anomalia. Quem fala (e muito) em “ideologia de gênero” são os movimentos conservadores – muitas vezes com explicações falsas e sem fundamento.

Estudos de gênero hoje

Os Estudos de Gênero nunca tiveram como objetivo modificar a sexualidade de ninguém – até porque os pesquisadores e pesquisadoras da área não acreditam que a orientação sexual ou a identidade de gênero das pessoas sejam modificáveis como querem fazer crer seus detratores. Nunca defenderam pedofilia ou incentivaram a erotização infantil. Nunca foram “ideologia”.

Os Estudos de Gênero nunca tiveram como objetivo modificar a sexualidade de ninguém. Estudar Gênero significa estabelecer um recorte sobre aspectos da realidade social existente – no presente e/ou no passado – que têm como peça fundamental a organização de papeis sociais baseada numa imagem socialmente construída acerca do que foi consolidado como sendo masculino ou feminino por exemplo. Portanto, procura compreender como a ideia de uma masculinidade hegemônica influencia nas relações e restringe as opções sociais de mulheres, de crianças e dos próprios homens, e propor estratégias de libertação. Aqui, nos Estudos de Gênero, estão as pesquisas sobre violência doméstica, violência sexual, feminicídio, desigualdade econômica e outras assimetrias relacionadas às desigualdades de  gênero.

Aliás, os Estudos de Gênero possuem como uma de suas principais características a interdisciplinaridade, o que amplia seus temas de pesquisa. Diferentes áreas, não só das Ciências Humanas, mas também as Ciências Sociais Aplicadas, as Ciências da Saúde e as Ciências Exatas vêm se dedicando às pesquisas em Gênero.

Trata-se, ainda, de respeitar as diferenças sexuais e enxergar sujeitos históricos que têm sido apagados das narrativas históricas: gays, lésbicas, trans, intersexuais e bissexuais. Significa compreender que o “mundo privado” também é político e que, portanto, o direito à cidadania deve efetivamente ser de todas, todos e todes.

Pesquisas sobre sexualidades existem dentro dos Estudos de Gênero, porém – e parece ser necessário repetir – não se trata de conspirar para mudar a orientação sexual de ninguém. As pesquisas sobre sexualidade variam em quantidade proporcional e, na maioria das vezes, procuram analisar trajetórias, sociabilidades ou mesmo subjetividades dos indivíduos relacionando tais conceitos à sexualidade – sejam os indivíduos heterossexuais ou não.

Também são temas dentro dos Estudos de Gênero: a maternidade, os sentimentos, a religiosidade, a assistência, a participação política, os racismos, as interseccionalidades e o próprio movimento feminista, isso só para citar algumas poucas áreas.

Não existe ideologia de gênero! E se os Estudos de Gênero puderem impactar de forma transformadora em nossa sociedade, será na construção de um mundo mais justo e igualitário. Um mundo em que meninas não sejam mortas por namorados. Um mundo sem violência doméstica, sem exploração sexual. Um mundo em que ninguém tenha medo da igualdade de direitos e deveres. 

Notas

1 É importante destacar, assim como fez Joana Maria Pedro (2011), que não existe, pelo menos no Brasil uma total linearidade entre as categorias mulher, mulheres, gênero. Tais palavras/conceitos/categorias, transitam em títulos de artigos e projetos variados, sem um rigor cronológico.

2 Os Estudos de Gênero hoje figuram como uma das áreas mais consolidadas nas universidades internacionais e brasileiras. No Brasil contam com revistas especializadas de alto impacto como a REF (Revista de Estudos Feministas) vinculada à UFSC e os Cadernos Pagu, da UNICAMP, dentre inúmeras outras especializadas no tema. Além disso, a área já possui um curso de bacharelado específico (Bacharelado em Gênero e Diversidade, na UFBA), disciplinas de graduação e pós-graduação em várias áreas, além de inúmeros projetos de pesquisa e extensão.

Referências Bibliográficas

ALVES, B. PITANGUY, J. O que é feminismo. 8aed. São Paulo: Brasiliense, 2003

BUTLER, Judith. Problemas de Gênero: Feminismo e Subversão da Identidade. 8aed. São Paulo: Civilização Brasileira, 2015.

SCOTT, Joan. Gênero: uma categoria útil de análise histórica. Revista Educação e Realidade. v.lS, n.2, jul./dez. 1990.

PEDRO, Joana Maria. Traduzindo o Debate: o uso da categoria gênero na pesquisa histórica. HISTÓRIA, São Paulo, v.24, N.1, P.77-98, 2005.

________. Relações de Gênero como categoria transversal na historiografia contemporânea. Topoi, v. 12, n. 22, jan.-jun. 2011, p. 270-283.

*Georgiane Garabely Heil Vázquez é historiadora e feminista. Doutora e Mestra em História pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). É professora do Departamento de História da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), coordenadora do GT Estadual de Estudos de Gênero da Associação Nacional de História – Seção Paraná, (ANPUH/ PR) e membro fundadora do LAGEDIS – Laboratório de Estudos de Gênero, Diversidade, Infância e Subjetividades.

VÁZQUEZ, Georgiane Garabely Heil. Gênero não é ideologia: explicando os Estudos de Gênero. (Artigo) In: Café História – história feita com cliques. Disponível em: https://www.cafehistoria.com.br/explicando-estudos-de-genero/. Publicado em: 27 nov. 2017. Acesso: [29 nov. 2017].